quinta-feira, 27 de julho de 2023

Valeu

Não, não foi a foto de uma vitória. Mas que a Holanda jogou bem em boa parte do empate contra os Estados Unidos, jogou. E pelo menos, se aguentou na hora da pressão (ANP)

Pegar a seleção feminina dos Estados Unidos era um desafio traumático para a equipe da Holanda (Países Baixos), nos últimos anos. Mostrar a segurança vista no primeiro tempo do encontro entre ambas, pela segunda rodada da fase de grupos da Copa do Mundo, trouxe a esperança de apagar esses traumas, com o que seria a primeira vitória contra as norte-americanas desde 1996. Só que, no segundo tempo, veio a inferioridade, o empate, o medo de tudo se perder. Medo controlado, ficou uma impressão boa e até tranquila: o 1 a 1 teve momentos bons, momentos ruins, mas a Holanda mostrou valor e fez sua parte naquele que foi considerado um dos melhores jogos da Copa, até agora. No fim, valeu.

Parecia que não ia valer, pelo menos nos 15 primeiros minutos de jogo em Wellington. Jogando lentamente, sem espaço para pelo menos buscar a bola, a Holanda se viu com a temida pressão do ataque dos Estados Unidos. Alex Morgan poderia ter finalizado, aos 3', mas fracassou ao tentar dominar. Pelos lados, tanto Trinity Rodman quanto Sophia Smith superavam Esmee Brugts e Victoria Pelova. E Savannah DeMelo se destacava: forçando erros, dominando o jogo na esquerda, quase fazendo gol aos 9' (desvio na área, para fora). O desastre parecia próximo.

Até Lieke Martens, aos 17', escapar do bote de Andi Sullivan no meio-campo. Passar para Victoria Pelova. Da primeira, ela não conseguiu chutar; da segunda, passou a Jill Roord, que arrematou para fazer o 1 a 0 - após doze anos e duas Copas do Mundo, os Estados Unidos voltavam a estar em desvantagem no placar. Foi a senha para a Holanda crescer no jogo. Não só na frente, em que Martens começou a aparecer como havia tempos não aparecia, além de Roord aparecer bastante (até para compensar a atuação muito decepcionante de Katja Snoeijs, sem aproveitar a chance com a ausência da machucada Lineth Beerensteyn, sem participar). Mas também atrás, com Jackie Groenen seguindo incansável nos desarmes, além da atenção notável de Sherida Spitse e Stefanie van der Gragt no miolo de zaga, compensando os erros aqui e ali. A posse de bola era mantida sem desespero. A Holanda voltava a passar uma impressão segura. A façanha parecia próxima.

Só que Van der Gragt, golpeada involuntariamente pela cabeça de Julie Ertz num escanteio, precisou ser substituída - "quando um médico fala que a jogadora precisa ser substituída imediatamente, eu preciso respeitar", descreveu o técnico Andries Jonker após a partida. Sua substituição, por Aniek Nouwen, já abaixava bastante o nível da defesa holandesa ("Nouwen foi aceitável, mas é um mundo de diferença em relação a Van der Gragt", reconheceu Jonker). Paralelamente, nos Estados Unidos, Rose Lavelle veio a campo. E sua presença voltou a tornar o USWNT dominante no setor, segurando mais a posse de bola.

Após o susto de perder o domínio do jogo com o gol da Holanda, Lavelle entrou, Horan cresceu... e os Estados Unidos passaram a etapa final bem perto da virada (Daniela Porcelli/Eurasia Sport Images/Getty Images)

Daí decorreu o melhor começo norte-americano. Pela esquerda, Smith começou a ter mais espaço para avançar - e mais velocidade, nas trocas de passes com Lindsey Horan (também crescendo na partida). Algo desestruturada, a Holanda foi punida pelo gol de Horan, aos 62', na desatenção de um escanteio. Com Janssen e Nouwen sem se entenderem (e Spitse sobrecarregada), a desorganização só não deixou resultados piores porque Alex Morgan, de fato, estava impedida no gol anulado que fez, três minutos depois. Contudo, mesmo escapando, a Holanda precisava de mudanças.

Andries Jonker começou com elas, trazendo Damaris Egurrola, que até trouxe mais equilíbrio no meio-campo. Só que a equipe laranja voltou a trazer ecos de um período frágil: nos cerca de vinte minutos finais, não conseguia dominar um rebote, não conseguia um contra-ataque, sofria tentando se segurar - com a exceção quase honrosa de um avanço em que Roord cruzou e Brugts teve o chute interceptado por Ertz, aos 79'. As entradas de Casparij e Renate Jansen, nos minutos finais, tinham exatamente essa intenção: segurar mais a bola.

Enfim, a Holanda conseguiu. Se não venceu, manteve as chances de terminar com a primeira posição do grupo. A tranquilidade de todos quantos foram entrevistados - Roord, Van de Donk, Spitse, o próprio Andries Jonker - deixou claro que o empate foi visto como um resultado válido, tendo em vista que a partida contra o Vietnã tende a ser mais amena do que o jogo altamente competitivo desta quarta-feira (quinta, na madrugada dos Países Baixos). A Holanda pode não ter recuperado o respeito total de quem acompanhe a Copa, mas teve exatamente o que Roord descreveu em suas palavras: "Um bom sentimento para o resto da Copa". 

Copa do Mundo Feminina da FIFA 2023 - fase de grupos - Grupo E

Estados Unidos 1x1 Holanda
Data: 26 de julho de 2023
Local: Estádio Regional (Wellington)
Juíza: Yoshimi Yamashita (Japão)
Gols: Jill Roord, aos 17', e Lindsey Horan, aos 62' 

Holanda
Daphne van Domselaar; Sherida Spitse, Stefanie van der Gragt (Aniek Nouwen, aos 46') e Dominique Janssen; Jackie Groenen; Victoria Pelova (Kerstin Casparij, aos 87'), Jill Roord (Renate Jansen, aos 90' + 3), Daniëlle van de Donk e Esmee Brugts; Katja Snoeijs (Damaris Egurrola, aos 70') e Lieke Martens. Técnico: Andries Jonker

Estados Unidos
Alyssa Naeher; Crystal Dunn, Julie Ertz, Naomi Girma e Emily Fox; Savannah DeMelo (Rose Lavelle, aos 46'), Lindsey Horan e Andi Sullivan; Trinity Rodman, Alex Morgan e Sophia Smith. Técnico: Vlatko Andonovski

domingo, 23 de julho de 2023

Campo dos sonhos

Superior no primeiro tempo, calma no segundo, a Holanda estreou com a vitória que desejava na Copa feminina (KNVB Media/FIFA)

Nos dias que antecederam a estreia da seleção feminina da Holanda (Países Baixos) na Copa do Mundo, o principal tema de reclamações do técnico Andries Jonker foi a dureza do campo de treinamentos do Bay Oval, na cidade neozelandesa de Tauranga, quartel-general das Leoas Laranjas no Mundial - até porque, em campo, nem havia muitos problemas, já que as jogadoras estavam prontas, sem lesões. Na ida ao campo de Dunedin, para começar a trajetória na Copa contra Portugal, porém, o gramado estava melhor. Assim como a seleção laranja, que conseguiu se impor no primeiro tempo, suportar a pressão maior no segundo e estrear com a vitória por 1 a 0.

Talvez a imposição holandesa no começo do jogo se deva a dois fatores. O primeiro veio do adversário. Porque, se as titulares de Portugal eram nomes conhecidos e habituais nas Navegadoras, algumas posições foram diferentes. E para pior: decisões do técnico Francisco Neto (colocar Ana Borges na ala direita, deixar Fátima Pinto no miolo de zaga e demorar para colocar Tatiana Pinto em sua posição normal) foram altamente contestadas. E nos 45 minutos iniciais, cobraram seu preço, com o time português acanhado em campo, quase sem causar problemas.

Van der Gragt começou sua "despedida" imponente no ataque, ao fazer o gol. E na defesa, ao impedir Jéssica Silva de causar maiores danos (Matthew Lewis/FIFA/Getty Images)

O segundo fator foi o mérito da própria Holanda. Para começar, mantendo a posse de bola sem perdê-la facilmente, evitou que a pressão de Portugal no início fizesse efeito. Para isso, colaborou que o trio de zagueiras se mostrasse muito seguro em campo. A começar por Stefanie van der Gragt: começando as últimas partidas de sua carreira, a zagueira abriu o placar na bola aérea (como já fizera na Euro feminina do ano passado, aos 13', num escanteio cobrado por Sherida Spitse). Mais do que isso: quando as neerlandesas sofreram mais, Van der Gragt mostrou precisão nas antecipações, impedindo que passes em profundidade alcançassem Jéssica Silva - bem no ataque -, para que ela fizesse as jogadas pelas pontas nas quais vai tão bem.

Além disso, pareceu diminuído um defeito comum da seleção feminina da Holanda (Países Baixos) nos últimos anos: o excesso de contra-ataques cedidos. Com mais marcação no meio - graças a Jackie Groenen, com a ajuda de Daniëlle van de Donk e Esmee Brugts -, a equipe alaranjada conseguiu ganhar mais a bola nas divididas. Logo, conseguiu chegar mais ao ataque. E sobraram chances para ter uma vantagem até maior no primeiro tempo: Lieke Martens chutou fraco aos 37', Van de Donk cabeceou também fracamente aos 39', Lineth Beerensteyn chutou para fora aos 44'.

As chances fizeram falta - assim como a perdida por Van de Donk já aos 49', na qual Inês Pereira fez grande defesa. Porque Portugal começou a ter mais espaço nos 45 minutos finais em Dunedin. A entrada de "Kika" Nazareth (ainda se recuperando de leve lesão muscular) devolveu Tatiana Pinto à ponta direita, onde se sai melhor. E vieram a campo nomes como Andréia Jacinto e Telma Encarnação para aumentarem as chances de empate. Telma, inclusive, teve a melhor oportunidade para isso, aos 82', driblando Janssen e chutando para a defesa de Van Domselaar.

Só que a Holanda se aguentou, mesmo nesse momento de baixa. A entrada de Damaris estabilizou o meio-campo; Victoria Pelova, em queda física (e mesmo antes disso, sem velocidade para dar sequência a alguns ataques), deu lugar a Kerstin Casparij nos acréscimos. E veio a vitória, melhor jeito de resolver o nervosismo de uma partida de estreia numa Copa do Mundo.

A Holanda vai voltar ao gramado duro do Bay Oval, em Tauranga, para seus treinos. Mas segue no campo dos sonhos, na Copa do Mundo feminina.

Copa do Mundo Feminina da FIFA 2023 - fase de grupos - Grupo E

Holanda 1x0 Portugal
Data: 23 de julho de 2023
Local: Estádio Dunedin (Dunedin)
Juíza: Kateryna Monzul (Ucrânia)
Gols: Stefanie van der Gragt, aos 13'

Holanda
Daphne van Domselaar; Sherida Spitse, Stefanie van der Gragt e Dominique Janssen; Jackie Groenen; Victoria Pelova (Kerstin Casparij, aos 90' + 4), Jill Roord, Daniëlle van de Donk (Damaris Egurrola, aos 80') e Esmee Brugts; Lineth Beerensteyn (Katja Snoeijs, aos 87') e Lieke Martens. Técnico: Andries Jonker

Portugal
Inês Pereira; Catarina Amado (Lúcia Alves, aos 79'), Fátima Pinto, Diana Gomes e Carole Costa; Tatiana Pinto, Dolores Silva (Francisca "Kika" Nazareth, aos 67'), Andreia Norton (Andréia Jacinto, aos 79') e Ana Borges; Diana Silva (Telma Encarnação, aos 79') e Jéssica Silva. Técnico: Francisco Neto

domingo, 2 de julho de 2023

Um sinal promissor

Demorou pouco para a seleção feminina da Holanda (Países Baixos) dar a certeza: se despediria bem de seu país, goleando no último amistoso antes da Copa de mulheres (Pro Shots)

A opção por fazer a seleção feminina da Holanda (Países Baixos) jogar com três zagueiras, algo incomum nela até o ano passado. Algumas escolhas polêmicas na convocação para a Copa do Mundo de mulheres, anunciada nesta sexta-feira, como deixar de fora das escolhidas para o ataque nomes jovens de talento, como Fenna Kalma e Romée Leuchter. Por mais que fosse despretensioso, o amistoso de despedida das Leoas Laranjas rumo ao Mundial, em Kerkrade, contra a Bélgica, precisaria de um bom resultado para não aumentar a desconfiança que existe. O bom resultado veio, na forma de uma goleada por 5 a 0, fortalecendo o bom clima na preparação neerlandesa.

A rigor, qualquer temor se acabou logo aos dois minutos. Foi quando Lieke Martens fez 1 a 0, completando cruzamento de Daniëlle van de Donk - com certa colaboração da goleira belga, Nicky Evrard. Na sequência, a Holanda seguiu mostrando boa capacidade ofensiva. Apenas exagerava na quantidade de jogadas pela esquerda, onde jogaram Martens e Esmee Brugts - esta, como a ala desejada pelo técnico Andries Jonker. De todo modo, dava certo. Só que alguns problemas mantinham o sinal de alerta. Como o pênalti perdido, aos 14': após a zagueira Kees colocar a mão na bola, impedindo que ela chegasse antes a Van de Donk, a juíza alemã Angelina Söder marcou o pênalti após a revisão aconselhada pelo VAR. Hora de Stefanie van der Gragt bater, no que seria uma homenagem, no último jogo da zagueira pela seleção em casa (lembrando que Van der Gragt encerra a carreira nos campos nesta Copa). Só que ela bateu mal, e Evrard pegou. Isso, mais o chute de Blom aos 17', passando por cima do gol de Daphne van Domselaar, poderiam abrir a reação da Bélgica.

Não abriram. Porque a medida de Andries Jonker, pelo menos no amistoso, se revelou certeira. Com Sherida Spitse recuada, a zaga da Holanda ganhou em segurança, e até em toque de bola. Além do mais, a firmeza nas divididas e na busca da posse de bola foi maior. Com isso, a seleção da casa continuou a atacar mais, embora seguisse buscando excessivamente a esquerda. E não deveria. Porque foi pela direita, com Victoria Pelova ainda tímida nos 45 minutos iniciais, que surgiu mais um pênalti: após receber de Pelova, Beerensteyn foi derrubada por Féli Delacauw (conhecedora do futebol holandês, por jogar no Fortuna Sittard). Spitse, a cobradora oficial das bolas paradas da Holanda, bateu com competência, fazendo 2 a 0. E a Holanda se tranquilizou de vez, voltando a exibir entrosamento no terceiro gol: Martens cruzou, Beerensteyn bateu forte na grande área.

Victoria Pelova atacou pouco no primeiro tempo. No segundo, resolveu isso, cresceu e fez um belo gol (KNVB Media)

Até mesmo alguns temores, como os de que as alterações previsíveis no segundo tempo tirassem a velocidade da Holanda, foram desmentidos pelo jogo. A concentração continuou, e a superioridade laranja foi até maior - Van Domselaar mal trabalhou. Tudo isso, porque a esquerda do ataque holandês seguiu bem, com as boas atuações de Martens e Brugts. E principalmente, porque Victoria Pelova também cresceu muito nos 45 minutos finais. Tabelando mais com nomes como Jill Roord e Wieke Kaptein (esta entrou depois), a meio-campista transformada em ala chegou muitas vezes ao ataque. Numa delas, fez o gol mais bonito da partida, em jogada individual, enganando Davina Philtjens, sua marcadora na Bélgica, e chutando cruzado com precisão. Se este gol de Pelova foi bonito, o gol que completou a goleada - Katja Snoeijs, provando sua capacidade para colocar a bola na rede - também agradou pela jogada ensaiada: cobrança de falta, bola rolada, Kaptein cruzou, Aniek Nouwen cabeceou na trave, Snoeijs aproveitou o rebote.

É certo que a goleada não significa que a Holanda está pronta para fazer boa campanha em Nova Zelândia/Austrália. O próprio técnico, Andries Jonker, alertou em declarações pós-jogo: "Fomos bons, mas ainda não estamos lá. Foi o suficiente contra a Bélgica, mas precisamos de muito para superarmos países de ponta, como Portugal". Ainda assim, foi um sinal promissor de que a seleção feminina da Holanda, de fato, pode afastar o risco de vexame. Sinal resumido nas palavras do próprio treinador: "Estamos em boa forma, tivemos concentração por mais tempo, e o ritmo aumentou em campo. Isso agrada". Agrada mesmo.

Amistosos

Holanda 5x0 Bélgica
Data: 2 de julho de 2023
Local: Parkstad Limburg (Kerkrade)
Árbitra: Angelina Söder (Alemanha)
Gols: Lieke Martens, aos 2', Sherida Spitse, aos 25', Lineth Beerensteyn, aos 37', Victoria Pelova, aos 62', e Katja Snoeijs, aos 83'

HOLANDA
Daphne van Domselaar; Stefanie van der Gragt (Caitlin Dijkstra, aos 46'), Sherida Spitse e Dominique Janssen (Aniek Nouwen, aos 70'); Victoria Pelova, Jackie Groenen, Daniëlle van de Donk (Damaris, aos 70') e Esmee Brugts; Jill Roord (Wieke Kaptein, aos 70'); Lieke Martens (Renate Jansen, aos 86') e Lineth Beerensteyn (Katja Snoeijs, aos 46'). Técnico: Andries Jonker

BÉLGICA
Nicky Evrard; Janice Cayman (Laura Deloose, aos 76'), Amber Tysiak, Sari Kees e Davina Philtjens (Sarah Wijnants, aos 76'); Vanhaevermaet, Féli Delacauw (Chloe van de Velde, aos 82') e Kassandra Missipo; Elena Dhont (Welma Fon, aos 69'), Jassina Blom (Jill Janssens, aos 69') e Hannah Eurlings (Tine de Caigny, aos 69'). Técnico: Yves Serneels