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quarta-feira, 31 de julho de 2024

Laranja Mecânica, primeira e única - 5º capítulo: a euforia cresce e diminui

Na segunda partida pela Copa de 1974, a Holanda atacou, mas teve na Suécia um adversário que se segurou e até tentou responder. O 0 a 0 diminuiu um pouco a empolgação (Getty Images)

Introdução





O que uma grande estreia não faz... bastou a seleção da Holanda (Países Baixos) fazer 2 a 0 com tremenda atuação em seu primeiro jogo na Copa de 1974, contra o Uruguai, para que hordas e hordas e mais hordas de holandeses atravessassem a fronteira, fosse da maneira que fosse, para assistirem à Laranja na Alemanha. Um bom exemplo vinha da agência de viagens Maduro, sediada em Haia. Antes da estreia, ela tinha vendido mil pacotes de viagens para a Copa do Mundo, ingressos inclusos; depois da vitória, foram dez mil pacotes vendidos. Parecia que todos os problemas anteriores haviam desaparecido. Como as citadas dificuldades na campanha pelas eliminatórias do Mundial. Ou as dificuldades de Rinus Michels para montar a equipe titular. Ou mesmo a oposição da torcida à postura dos jogadores, considerada mercenária. 

Não era sem motivo: a partir da influência do agente - e sogro - Cor Coster (1920-2008) sobre Johan Cruyff, o capitão da seleção, ele influía no desejo do grupo de jogadores em pedir mais dinheiro à federação, por sua própria postura. Cruyff era dos primeiros futebolistas daqueles tempos a se comportar - e a pedir pagamentos - como uma estrela. Prova disso era a negociação para que o "Número 14" divulgasse uma empresa de material esportivo, pouco antes da Copa. A Puma tinha a proposta de 1,5 mil florins (moeda dos Países Baixos pré-euro); Cruyff achava pouco, e Cor Coster já tinha um princípio de acordo com a Adidas, para usar como trunfo na negociação. A Puma soube e... aumentou a oferta para 250 mil florins. Pronto: Cruyff aceitou, e como contratado da empresa fundada por Rudolf Dassler, se negou a usar a camisa holandesa "normal" da Copa, com as três listras da Adidas (de Adolf "Adi" Dassler). Exigia as duas listras. E foi acompanhado pelos irmãos Van de Kerkhof, Willy e René. Tais posturas desagradavam a torcida. Ainda mais com a falta de resultados dentro de campo.

Cor Coster (à direita) ajudou o genro Cruyff a fortalecer sua imagem e seus ganhos, mas também tornou a postura dele controversa (Arquivo ANP)

Mas isso era passado. A euforia tinha crescido logo que a Copa começou - ainda mais com um começo daqueles para a Laranja... e a popularidade começava a rondar mais o Waldhotel, na cidade alemã de Hiltrup, quartel-general da delegação neerlandesa durante o torneio. No ambiente interno, porém, antes do jogo contra a Suécia, Rinus Michels surpreendeu de novo. Durante a preparação para a Copa, ainda nos treinos em Hengelo, o treinador já comunicara a Piet Keizer (1943-2017): ele ficaria na reserva de Rensenbrink, por se encaixar menos no time do que o camisa 15 faria. Keizer, dos melhores pontas holandeses dos anos 1960 e 1970, destaque do Ajax campeoníssimo dos anos recentes, até achava que poderia ser titular, mas aceitou bem a decisão de Michels - e, de fato, vivia em má fase. Tudo isso, para, dias antes do jogo contra a Suécia, saber que ele seria o titular do ataque holandês, ao lado de Johnny Rep (e à frente de Johan Cruyff), e não Rensenbrink. Explicações? Rinus Michels não deu. Seria daquele jeito, e pronto. 

Piet Keizer se destacou muito no futebol holandês, nos anos 1960 e 1970, mas já estava na descendente da carreira na Copa de 1974. E só apareceria em campo contra a Suécia (Bert Verhoeff/Anefo)

Assim a Holanda começou o jogo, num Waldstadion de Dortmund que já estava bem mais repleto de holandeses do que o estádio Niedersachsen, em Hannover, estava na estreia. Só que a Suécia também era um time bem mais exigente do que o Uruguai tinha sido. Tinha um goleiro respeitável em Ronnie Hellström (1949-2022); um zagueiro já experiente em Bjorn Nordqvist; e a dupla de ataque formada por Ralf Edström e Roland Sandberg não faria nada feio naquela Copa. Tanto que a Suécia seria a outra classificada do grupo 3 para a segunda fase. E tanto que a Suécia é que começaria atacando. Aos 2', Edström tentou um cabeceio e só não conseguiu porque Jongbloed se antecipou e afastou; no minuto seguinte, o meio-campo Ove Grahn arriscou de fora, e o goleiro da camisa 8 defendeu firme.

Depois dos sustos, a Laranja acordou. No ataque (aos 4', Keizer passou e Van Hanegem bateu para fora) e na defesa (só aos 8', a defesa já tinha montado duas linhas de impedimento, deixando os suecos em condição ilegal de jogo). Aos poucos, Keizer deu razão às desconfianças, se mostrando tímido demais nos ataques pela esquerda. Krol até tentou avançar no começo, mas quem cobriu a lacuna? Claro, o homem que sempre se mexia, tudo via e tudo sabia de bola na Holanda: Hendrik Johannes Cruijff, o Johan Cruyff, que começou a cruzar bolas (como a que passou por Johan Neeskens na pequena área, aos 12'; a que Neeskens voleou para fora, aos 17'; e a que Johnny Rep escorou por cima do gol, aos 29'), a chutar (aos 14', arremate defendido por Hellström)... e a driblar. Como faria em lance que se tornou histórico, aos 23 minutos da etapa inicial: tentando passar pelo lateral Jan Olsson na área, Cruyff deu um giro de corpo que "descadeirou" Olsson. Nascia ali a "Cruyff Turn", o "giro de Cruyff". No triste 24 de março de 2016 em que o "Número 14" faleceu, o lateral sueco foi ouvido pelo jornal inglês The Guardian. E celebrou: "Eu me lembro daquele lance todo dia".


A Holanda sempre atacava. Mesmo assim, a Suécia lembrava aqui e ali que não estava morta no jogo, e que tinha capacidade técnica. Assustou no primeiro tempo, aos 21': em cobrança de falta ensaiada, Sandberg bateu após ajeitarem, e Jongbloed rebateu - na sequência, o meio-campo Inge Ejderstedt chegou à área com a bola, mas completou para fora. Na etapa final, Ejderstedt voltou a aparecer, aos 49', num chute após escanteio (Jongbloed pegou). Só que a Holanda, mais veloz, amparada por Cruyff velocíssimo e Neeskens em outra boa atuação, criou várias chances - a primeira, aos 52', voleio de Rep por cima do gol. As chances fizeram Hellström brilhar no gol da Suécia. Mesmo sem milagres, o camisa 1 esteve a postos para pegar chute colocado de Cruyff, aos 55'; arremate de Van Hanegem, aos 62'; cruzamento rasteiro de Keizer na pequena área, aos 65' (pouco antes, Keizer chutara torto para fora, da entrada da área, causando reclamações de Cruyff); e nova tentativa de Cruyff, aos 79'. A Suécia só teve mais uma grande chance, aos 80': após lançamento e desvio de cabeça, Ejderstedt ajeitou, mas Sandberg perdeu o gol. No mais, a Laranja tentou o "abafa", até defensores como Wim Rijsbergen foram para a área... mas o placar ficou num 0 a 0. Divertido, mas 0 a 0.

Que diminuiu um pouco a euforia da estreia. Só um pouco. Porque, no jogo seguinte da Holanda na Copa de 1974, ela cresceu e nunca mais diminuiu.




COPA DO MUNDO FIFA 1974 - FASE DE GRUPOS - GRUPO 3

Holanda 0x0 Suécia

Data: 19 de junho de 1974
Local: Waldstadion (Dortmund)
Árbitro: Werner Winsemann (Canadá)

HOLANDA
Jan Jongbloed; Wim Suurbier, Arie Haan, Wim Rijsbergen e Ruud Krol; Wim Jansen, Willem van Hanegem (Theo de Jong, aos 73') e Johan Neeskens; Johan Cruyff; Piet Keizer e Johnny Rep. Técnico: Rinus Michels

SUÉCIA
Ronnie Hellström; Jan Olsson (Roland Grip, aos 75'), Kent Karlsson, Bjorn Nordqvist e Björn Andersson; Ove Grahn, Bo Larsson, Staffan Tapper (Örjan Persson, aos 61') e Inge Ejderstedt; Ralf Edström e Roland Sandberg. Técnico: Georg Ericson

sábado, 9 de julho de 2022

Dos males, o menor

Com vários erros e alguns azares, a Holanda temeu a decepção contra a Suécia. Mas se aprumou no segundo tempo, Roord empatou... e a sensação foi positiva (Alex Livesey/UEFA/Getty Images)


Tudo bem, uma Euro feminina é sempre divertida. Mas nem mesmo a festa habitual que a torcida faz pela seleção de mulheres da Holanda (Países Baixos) escondia o fato de que havia fortes desconfianças sobre o que as Leoas Laranjas poderiam fazer - ainda mais tendo como adversário da estreia a Suécia, outra seleção mais respeitada do grupo C. E no começo, o azar de fatos adversos e a conhecida fragilidade crônica defensiva das neerlandesas parecia indicar uma estreia que confirmaria os piores temores a respeito das possibilidades da atual campeã europeia de futebol feminino. Contudo, a Holanda melhorou no segundo tempo. Conseguiu o empate. Teve até perspectivas de virar o jogo. E o 1 a 1 final deixou a saudável impressão de que, no fim, as coisas poderiam ter sido bem piores no começo do caminho pela Euro.

Porque, mesmo que a equipe laranja tenha mostrado mais esforço e intensidade no meio-campo, tentando desarmar as suecas, o time azul logo mostrou sua experiência e seu ótimo posicionamento tático. Que teve a válvula de escape na direita, onde Kosovare Asllani mostrava superioridade sobre Dominique Janssen - e Aniek Nouwen, que tentava ajudar. Além do mais, uma disputa aérea, aos 9', já trouxe péssimas consequências, com o envolvimento de Stefanie van der Gragt, Lynn Wilms e Sari van Veenendaal. Nem tanto para as duas primeiras, que puderam seguir jogando. Mas a goleira e capitã Van Veenendaal seguiu meio tonta. Para piorar, numa reposição de bola, sentiu dores no músculo posterior da coxa. E teve de dar lugar a Daphne van Domselaar: a goleira do Twente faria sua segunda partida pela seleção num momento altamente arriscado.

Ela não comprometeu, nem nas defesas, nem nas saídas de gol. Todavia, o miolo de zaga da Holanda errava de vez em quando. Aos poucos, o meio-campo afrouxou sua marcação e deixou a Suécia dominar - além de minimizar a presença de Vivianne Miedema no ataque. Essa superioridade sueca enfim trouxe chances: Asllani chutando na rede pelo lado de fora, aos 28', Fridolina Rolfö tentando o gol do meio-campo no minuto seguinte... e enfim, o gol, aos 35', exibindo várias coisas. A habilidade de Asllani e a falha de Nouwen, driblada facilmente com a bola por baixo das pernas; a desorganização defensiva holandesa, que deixou o espaço pelo qual Jonna Andersson entrou com facilidade; e o mérito sueco para o 1 a 0. Depois, as holandesas até tiveram chances: um chute de Lieke Martens na área aos 37', e dois arremates por cima - Daniëlle van de Donk aos 41', Sherida Spitse aos 45'. Jill Roord se movimentava bastante, é justo dizer. Entretanto, outra lesão ocorreu - até mais grave: uma torção no tornozelo que deixou Aniek Nouwen chorando, e forçou a entrada de Marisa Olislagers na zaga. E a Holanda terminou com a impressão de que precisava se cuidar, para não perder a calma no meio de tanta adversidade.

O problema de Van Veenendaal foi a sorte de Van Domselaar: a goleira reserva entrou e se saiu bem numa situação difícil (Joris Verwijst/Orange Pictures/BSR Agency/Getty Images)

Manteve. Em que pesem as chances que continuaram aparecendo para a Suécia, até em maior quantidade, a defesa pareceu mais assentada com a entrada de Olislagers - e Janssen melhorou, interceptando chances (cruzamento de Andersson aos 49', cruzamento de Hanna Glas no minuto seguinte). O meio-campo se dividiu melhor: Spitse ajudou na marcação - foram pelo menos quatro cruzamentos interceptados na esquerda -, e Groenen foi melhor nos desarmes. No mais primoroso, aos 52', começou a jogada do empate, se livrando de Hanna Glas com um giro e lançando Miedema. A camisa 9 mostrou porque é craque: deu uma meia-lua em Amanda Ilestedt, reteve a bola perto da área, até o passe para o chute de Roord, no canto.

A Holanda estava salva. E reanimada. Na defesa, se Stina Blackstenius veio do banco para fortalecer o ataque sueco, houve o esforço de marcação e a qualidade que Van Domselaar revelou, ao fazer algumas boas defesas - culminando em duas aparições decisivas, em chutes de Asllani (84') e Rolfö (87'). No meio e no ataque, se Van de Donk sentiu novas dores, a entrada de Victoria Pelova ajudou a aumentar o poder ofensivo nos contra-ataques - e Miedema, criativa como costumeiro, criou o que seria o gol da virada, só não feito porque Roord demorou para chutar, e foi desarmada perfeitamente por Magdalena Eriksson.

Faltou a vitória, que animaria ainda mais a Holanda neste começo de Eurocopa. De todo modo, reagir após tantas adversidades deixou à delegação a impressão aliviante de que o empate foi o menor dos males. E que há perspectivas para os jogos - menos exigentes - contra Portugal e Suíça. O clima fica um pouco melhor. Um pouco...

Euro feminina 2022 - fase de grupos - Grupo C
Holanda 1x1 Suécia
Data: 9 de julho de 2022
Local: Bramall Lane (Sheffield)
Juíza: Cheryl Foster (País de Gales)
Gol: Jonna Andersson, aos 35', e Jill Roord, aos 52'

Holanda
Sari van Veenendaal (Daphne van Domselaar, aos 21'); Lynn Wilms, Stefanie van der Gragt, Aniek Nouwen (Marisa Olislagers, aos 41') e Dominique Janssen; Jackie Groenen, Daniëlle van de Donk (Victoria Pelova, aos 78') e Sherida Spitse; Jill Roord (Lineth Beerensteyn, aos 78'), Vivianne Miedema e Lieke Martens. Técnico: Mark Parsons

Suécia
Hedwig Lindahl; Amanda Ilestedt, Nathalie Bjorn e Magdalena Eriksson; Hanna Glas, Filippa Angeldal (Hanna Bennison, aos 70'), Caroline Seger e Jonna Andersson (Johanna Rytting Kaneryd, aos 70'); Kosovare Asllani, Lina Hurtig (Stina Blackstenius, aos 70') e Fridolina Rolfö. Técnico: Peter Gerhardsson

quarta-feira, 3 de julho de 2019

O teste que faltava

Numa semifinal equilibradíssima contra a Suécia, a Holanda conseguiu acertar a chance que teve. Conseguiu ser precisa defensivamente. E chegou à final da Copa. Merece aplausos ainda mais fortes (Getty Images)

"Jij krijgt die lach niet van mijn gezicht" (em holandês, "você não tira o sorriso do meu rosto") é o título de uma das canções mais queridas do grupo de jogadoras da seleção feminina da Holanda. A música do cantor John de Bever já descrevia bem o clima com que as Leoas Laranjas encaravam a chegada às semifinais da Copa do Mundo feminina: ganhando ou perdendo, manteriam o sorriso no rosto, pois já faziam história apenas na segunda participação do país num Mundial. Mas, claro, dava para superar a Suécia. E numa campanha que teve atuações de todos os jeitos, a Holanda passou pelo teste que lhe faltava: numa partida altamente equilibrada, em que erros eram proibidos, a Laranja quase não errou. Aguentou a pressão psicológica. Foi eficiente. Fez 1 a 0. E está na final.

Se o ponto de vista aqui fosse o da seleção da Suécia, seria possível dizer que foi uma classificação injusta. Ainda mais pelo que se viu no primeiro tempo, no Parc Olympique Lyonnais, em Lyon. Jogando mais avançada do que se supunha, a seleção auriazul dominou as ações. Pelas pontas, Lina Hurtig e Sofia Jakobsson causavam tormentos. Hurtig foi ativa num cruzamento aos 9' (Sari van Veenendaal defendeu). E Jakobsson, o destaque da classificação sueca para cima da Alemanha, foi ainda mais perigosa aos 13': a camisa 10 fez bela jogada, se livrando de Sherida Spitse com um giro, carregando a bola no contra-ataque e passando para Stina Blackstenius bater cruzado. Mas Van Veenendaal mostrou segurança, de novo: a goleira da Holanda pegou, e resistiu às dores após pisão involuntário de Jakobsson.

Claro que, de vez em quando, a Holanda tentava. Mas diante de uma zaga experiente e muito fechada (e de Hedvig Lindahl, talvez a melhor goleira da Copa), só se viam chutes inócuos. Enfim tendo a chance que tanto queria como titular, Lineth Beerensteyn tentou aos 17', mas Lindahl pegou. Lieke Martens não tinha espaço e nem mostrava ritmo. Vivianne Miedema sempre dava um toque a mais na bola. Daniëlle van de Donk tinha atuação ruim, perdendo muitas bolas ou errando os passes nas raras jogadas. Restava à Holanda ter cuidado na defesa. Principalmente nas bolas paradas, como os escanteios cobrados por Magdalena Eriksson - foi assim que aos 37', após escanteio, Hurtig ficou com a sobra, na área, e chutou cruzado, para Van Veenendaal evitar o gol sueco com os pés, e Stefanie van der Gragt afastar.

Era a sorte holandesa: além da segurança de Van Veenendaal no gol, o miolo de zaga se mostrava muito atento. Tanto Van der Gragt quanto Dominique Bloodworth eram precisas nos desarmes e nas devoluções. A mesma coisa nas laterais, com Desiree van Lunteren contendo Hurtig (ainda que com dificuldades) e Merel van Dongen crescendo mais e mais na partida, mostrando admirável poder de antecipação. Mesmo se houvesse o erro de uma, outra consertava - foi assim aos 48', quando Van Dongen errou passe, Blackstenius puxou o contra-ataque com a bola que sobrara, mas Bloodworth desarmou a atacante da Suécia na área, na exata hora do chute. E mesmo se a bola passasse da zaga das Leoas Laranjas, a sorte as ajudava: como na grande chance sueca para o 1 a 0, aos 56', quando Nilla Fischer chutou cruzado, Van Veenendaal desviou, e a bola foi para a trave.

A Suécia foi melhor em boa parte do tempo normal, atacando mais. Parou nas excelentes atuações de defesa da Holanda (Getty Images)

Faltava o ataque e o meio-campo crescerem, manterem mais a posse de bola, fazerem a defesa adversária trabalhar. Começou a acontecer, com o cansaço maior da Suécia. Van de Donk começou a acertar mais as jogadas. Spitse auxiliava na marcação. E Jackie Groenen, sempre incansável, despontava como destaque no meio-campo da Holanda: corria, desarmava, vinha com a bola para ajudar Beerensteyn na direita, não parava. A bola que Miedema mandou no travessão de Lindahl, de cabeça, após escanteio, aos 64', era um auspicioso sinal: a Holanda estava viva.

E a entrada de Shanice van de Sanden - desta vez, no banco -, no lugar de uma Beerensteyn discreta, ampliou a sensação de reação da Holanda. Não que a camisa 7 estivesse embalada, mas conseguiu reter mais a bola, dar mais trabalho a Eriksson na direita, fazer mais tabelas e jogadas. A Holanda cresceu, teve chance com Van de Donk (errou o chute, aos 85') e Van de Sanden (defesa de Lindahl nos acréscimos), mas começou a se resguardar para a prorrogação que vinha. E a Suécia, mais cansada, também.

Terminaram os 90 minutos. Começou a prorrogação. E a sensação era de jogo de bichos grandes: ninguém podia errar. A Suécia parecia mais ofensiva, rondando a área de Van Veenendaal. Até que uma hora, aos 99', Van der Gragt devolveu um chutão ao meio-campo. Spitse pegou a bola e passou a Van de Donk. Desta, a bola foi para Groenen. A camisa 14 (como a de Johan Cruyff, seu ídolo) viu o espaço. Decidiu fazer o que lhe pediram nos treinos: chutar a gol. Bola precisa, no canto direito de Lindahl. Era o 1 a 0. A Holanda acertava a chance que precisava acertar.

Groenen experimentou o que lhe pediam: chutar de fora da área. Conseguiu o gol da vitória (Getty Images)

O que não significava, nem de longe, que a Suécia tinha desistido. Ao contrário: cresceu na segunda metade da prorrogação. Julia Zigiotti e Madelen Janogy ajudavam o ataque a manter a posse de bola. Blackstenius, Jakobsson e Kosovare Asllani tentavam. Mas agora, elas é que paravam no monolito defensivo holandês, com as grandes atuações de Van Veenendaal, Van der Gragt e Bloodworth - única chance perigosa foi um chute por cobertura de Asllani, aos 119'. A Holanda corria perigos, seguia sem a bola. E quando a tinha, perdia chances incríveis - como nos acréscimos, quando Van de Sanden errou bisonhamente um chute na área.

Asllani teve azar: atingida por uma bola no rosto, ficou com sérias dores no pescoço e teve de sair. O que só aumentou o drama: os dois minutos de descontos na prorrogação chegaram a sete, com o atendimento à sueca. Mas Van Veenendaal pegou a bola vinda de um cruzamento de Jakobsson, aos 120' + 7. Caiu no chão. E o apito final se ouviu. A Holanda tinha superado o teste que faltava. Jogou medianamente, e dificilmente superará os Estados Unidos, muito favoritos a conquistarem o quarto título mundial no domingo. Tudo bem: nada mais tirará o sorriso no rosto das jogadoras holandesas.

Copa do Mundo feminina - semifinal
Holanda 1x0 Suécia
Data: 3 de julho de 2019
Local: Groupama Stadium/Parc OL (Lyon)
Árbitro: Marie-Soleil Beaudoin (Canadá)
Gol: Jackie Groenen, aos 99'

Holanda
Sari van Veenendaal; Desiree van Lunteren, Dominique Bloodworth, Stefanie van der Gragt e Merel van Dongen; Jackie Groenen, Daniëlle van de Donk e Sherida Spitse; Lineth Beerensteyn (Shanice van de Sanden), Vivianne Miedema e Lieke Martens (Jill Roord). Técnica: Sarina Wiegman

Suécia 
Hedvig Lindahl; Hanna Glas, Nilla Fischer, Linda Sembrandt e Magdalena Eriksson (Mimmi Larsson); Elin Rubensson (Julia Zigiotti), Kosovare Asllani e Caroline Seger; Sofia Jakobsson, Stina Blackstenius (Jonna Andersson) e Lina Hurtig (Madelen Janogy). Técnico: Peter Gerhardsson

terça-feira, 10 de outubro de 2017

Pelo menos isso

A tristeza em ficar fora da Copa foi indisfarçável. Mas pelo menos, a vitória e a atuação esforçada renderam respeito à Holanda (Pim Ras)

"Estas eliminatórias já estavam perdidas quando eu cheguei." Por essa frase de Dick Advocaat à NOS, emissora pública holandesa de tevê, já se nota como era baixa a autoconfiança da seleção da Holanda, antes da partida decisiva contra a Suécia, pela última rodada das Eliminatórias da Copa de 2018. Também não havia muita crença da capacidade da Laranja em vencer os suecos por sete gols de diferença. De fato, a Holanda não passou do sonho. E está fora de uma Copa do Mundo, após 16 anos. Se serve de consolo, pelo menos não terminou a qualificação com derrota, como para a Euro 2016. Ao contrário: a atuação na vitória por 2 a 0 mostrou esforço. E se houve um grande responsável por isso, foi Arjen Robben. Que parecia saber do caráter agridoce do jogo, ao lacrimejar durante o hino holandês.

Jogo começado, duas impressões vieram. A primeira era positiva: as mudanças na escalação que começou o jogo ajudaram a Holanda a mostrar mais ofensividade - tanto nas mudanças pelas laterais (Kenny Tete começou o jogo na direita; Nathan Aké, na esquerda), quanto no início de Daley Blind como volante, qualificando a saída de bola. Mas a segunda impressão neutralizava os efeitos da primeira: o começo de jogo deu a impressão de que a Holanda repetiria a irritante rotina vista nestas Eliminatórias. Contra uma Suécia tranquila e bem postada defensivamente, fechando-se num 4-4-2 sem a bola, restava apenas trocar passes no campo de defesa.

Até Robben começar a aparecer. Não só na direita, o seu setor preferencial, mas também vindo para o meio-campo, buscando jogo, chamando a responsabilidade. Assim, aos poucos, a Laranja foi encurralando a Suécia. Como aos 8', quando Robben puxou a bola para a esquerda, serviu a Aké, e o lateral cruzou para Granqvist tirar de cabeça. Aos 9', o camisa 11 protagonizou a primeira chance, com sua jogada habitual: dominou pela direita, cortou e chutou, mas o goleiro Robin Olsen defendeu sem problemas. Depois, aos 12', Robben perdeu mais uma boa chance, numa jogada atribulada. Aké cruzou, Jakob Johansson tirou da área, mas Tete ainda pegou a sobra e cruzou para o capitão da Oranje tentar o cabeceio, mandando a bola por cima do gol.

Junto de Robben, outros começavam a aparecer. Como Ryan Babel, que fez o que pôde pela esquerda, com jogadas individuais elogiáveis. Junto do apenas esforçado Vincent Janssen, ele provocou a jogada do pênalti que deu o primeiro gol à Holanda: Janssen desviou a bola tentando fazê-la alcançar Babel, e Victor Lindelöf tocou com a mão. Nada absurdo, mas o juiz Sergei Karasev julgou pênalti, apitou. E Robben arriscou uma cavadinha. Saiu mal feita, mas foi suficiente para o 1 a 0 que aumentou as esperanças.

Aliás, a vantagem aumentou também o volume ofensivo holandês, com o segundo gol quase vindo aos 20', num belo lançamento de Blind, do meio-campo, agarrado por Olsen antes que Babel pudesse finalizar. Aos 26', outra boa chance, numa cobrança de falta ensaiada: Robben tocou a Blind, recebeu de volta e lançou Wijnaldum, que só não fez pelo desvio providencial de Sebastian Larsson. E aos 31', em outra falta, Babel mandou a esférica rente à trave esquerda de Olsen.

A garra de Arjen Robben foi inspiradora. E fechou com dignidade seu tempo na seleção (Getty Images)

Avançando mais, obviamente a Holanda cedia espaços. E a traiçoeira Suécia quase os aproveitou duas vezes, graças a Marcus Berg. Aos 20' Larsson manda para a área em cobrança de falta, e Berg cabeceou para Jasper Cillessen defender. O goleiro holandês voltou a aparecer bem aos 35', ao defender outra testada perigosa de Berg (e ainda atrapalhado por Aké, diga-se). Mas o que impressionava era a velocidade e o esforço holandeses em busca do gol. Que quase veio aos 37', em chance perdida por Tete (Aké fez boa jogada pela esquerda, passou a Babel, o atacante cruzou para o lateral tocar por cima, livre na segunda trave). E aos 39', em sequência de duas defesas de Olsen (primeiro em arremate de Babel, depois no rebote de Janssen). Finalmente, aos 40', Robben reapareceu, com o segundo gol. Ou melhor, golaço: de primeira, da meia-lua, aproveitando passe de Babel.

Uma chance de Vincent Janssen, aos 43', simbolizava o único momento em que a Holanda ousou sonhar que a façanha era possível. Mas o placar, frio, estampava apenas 2 a 0. No segundo tempo, para aumentar a pressão e a referência na área, Bas Dost substituiu Janssen. Porém, não demorou muito para se ver que a pressão do primeiro tempo não se repetiria. A velocidade e o entusiasmo haviam ficado no primeiro tempo. Dost não conseguia finalizar - embora os cruzamentos se avolumassem, como aos 48' e aos 50'. Houve exceção aos 53', em boa triangulação de Vilhena com Babel e Aké, cujo cruzamento só foi afastado por Larsson. Mas as bolas altas só serviram para "consagrar" Olsen, que fez boas defesas aos 58 - desviando providencialmente cruzamento de Tete - e no minuto seguinte, em voleio de Wijnaldum.

Davy Klaassen e Janmaat ainda entraram, para que o toque de bola no meio-campo e os cruzamentos fossem fortalecidos. Mas já estava claro que o sonho dos sete gols estava encerrado. E nem a Suécia estava interessada em avançar - só teve uma chance real, em chute de Emil Forsberg após bola roubada de Blind por Marcus Berg, aos 70'. A oportunidade derradeira para aumentar a honra veio aos 87'. De Robben, como sói acontecer: recebendo de Janmaat e batendo para nova defesa de Olsen.

Nisso, a torcida já apenas gritava "Arjen, bedankt" (Arjen, obrigado), ao ver o esforço de um esfalfado e claudicante Robben. Que era quem mais merecia uma despedida com honra. Afinal de contas, como já se desconfiava, era o último dos 96 jogos que o nativo de Bedum fez pela seleção - terminado com 37 gols, como quarto maior goleador da história da seleção, empatado com Dennis Bergkamp. A dor ficou clara nas palavras do capitão, cumprimentado calorosamente por todos após o apito final: "Não dependia de mim, eu sabia que poderia ser a última [partida]. Foi lindo, mas foi difícil". Aliás, a dor foi tão grande quanto o bom humor: "E o 'Homem de Vidro' foi quem mais durou...".

Restava apenas a gratidão. E a consciência de que a Holanda está diante de um duro caminho para tentar ganhar o respeito de tempos idos. Algo expresso nas palavras também tristes de Bas Dost: "Não quero falar muito. Estou envergonhado. É muito duro". E na serenidade de Babel ("A federação precisa fazer um plano melhor definido") e Blind ("Será um longo verão"). Pelo menos, desta vez, a despedida teve mais honra. Agora, é hora da Holanda ruminar suas dores.

Eliminatórias para a Copa de 2018 - Europa
Holanda 2x0 Suécia
Data: 10 de outubro de 2017
Local: Amsterdam Arena (Amsterdã)
Juiz: Sergei Karasev (Rússia)
Gols: Arjen Robben, aos 16' e aos 40'

Holanda
Jasper Cillessen; Kenny Tete (Daryl Janmaat, aos 71'), Virgil van Dijk, Karim Rekik e Nathan Aké; Georginio Wijnaldum (Davy Klaassen, aos 71'), Tonny Vilhena e Daley Blind; Arjen Robben, Vincent Janssen (Bas Dost, no intervalo) e Ryan Babel. Técnico: Dick Advocaat

Suécia
Robin Olsen; Mikael Lustig, Andreas Granqvist, Victor Lindelöf e Ludwig Augustinsson; Viktor Claesson (Gustav Svensson, aos 68'), Sebastian Larsson (Martin Olsson, aos 82'), Jakob Johansson e Emil Forsberg; Marcus Berg e Ola Toivonen (Isaac Kiese Thelin, aos 76'). Técnico: Janne Andersson

sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Preparada para a decepção

Seleção holandesa ficou tranquila nos treinos antes de decidir a sorte nas Eliminatórias. Talvez seja a paz da descrença (Pim Ras Fotografie)
Diante da situação desesperadora que vive no grupo A das Eliminatórias europeias para a Copa de 2018, era de se esperar um ambiente de alta ansiedade envolvendo a seleção da Holanda, antes das duas últimas rodadas que reservam tarefas dificílimas. Afinal de contas, ou a Laranja vence Belarus (neste sábado, às 15h45, em Borisov) e Suécia (próxima terça, também às 15h45, na Amsterdam Arena) – e supera os suecos no saldo de gols -, ou estará fora de uma Copa do Mundo, após 16 anos. Porém, o que se vê é uma melancólica tranquilidade. Como se a Holanda já não tivesse mais chances. 

A começar pelo próprio técnico. Dick Advocaat, 70 anos completados no dia 27 de setembro, cedeu entrevista inesperadamente calma à revista Voetbal International. Certo, a conversa falava sobre toda a carreira de Advocaat. Ainda assim, eram de se esperar palavras mais nervosas. Que nada: o treinador comentou sobre seu futuro na carreira (“Se eu parar e ninguém mais me telefonar, ficarei tranquilo. Mas telefonarão de novo. Sempre telefonam. (...) Eu já posso me aposentar, mas primeiro quero levar a Oranje à Copa. Depois? Não sei.”). E como se já estivesse de carreira terminada, até comentou sobre um hipotético substituto - o próprio auxiliar: “Ruud Gullit seria um excelente técnico da seleção. Os holandeses esquecem o tamanho do símbolo que ele é”. 

Nem mesmo a convocação causou celeuma. Talvez porque nem haja muito o que questionar, entre caras conhecidas (Arjen Robben, Daley Blind) e nomes que começam a ganhar espaço definitivo para os próximos anos, como Wesley Hoedt, Tonny Vilhena e... Davy Pröpper. Após a boa atuação contra a Bulgária, na rodada passada das Eliminatórias, o meio-campista deverá ocupar o lugar de Wesley Sneijder entre os titulares. 

Eis uma surpresa implícita: por mais que a importância histórica de Sneijder seja indiscutível, ninguém lamentou excessivamente sua ausência na convocação. Justo. Afinal de contas, o meio-campista já perde espaço para Allan Saint-Maximin no Nice (na Liga Europa, sequer é relacionado para algumas partidas). Diante dos perigos que a Holanda corre, e dependendo do que acontecer, pode ser que os 45 minutos jogados contra a França tenham sido os últimos momentos de Sneijder com a camisa laranja, após 14 anos e 132 partidas.

Se a história de um símbolo da seleção holandesa pode ter acabado, a história de um veterano recomeçou graças a uma surpreendente convocação. Certo, convocação merecida: Ryan Babel tem mostrado ótimo desempenho neste começo de temporada, no Besiktas. Mas já não jogava pela Laranja desde 15 de novembro de 2011 (derrota para a Alemanha em amistoso, 3 a 0), quando o técnico ainda era Bert van Marwijk. Babel sequer foi convocado pelos sucessores. Até o bom começo no Besiktas – e a lesão de Quincy Promes, habitual relacionado, possibilitando o retorno de Babel à seleção. Retorno tão imprevisto que o próprio se surpreendeu: “Seis anos é um longo tempo. Achei que todos tinham se esquecido de mim”.

Robben segue imperturbável na confiança da virada laranja (Pieter Stam de Jonge/VI Images)
Os 25 convocados chegaram já com o discurso decorado – e sintetizado nas palavras do capitão Robben à NOS, emissora pública holandesa: “Só vencer dois jogos já é uma tarefa muito difícil. E também precisar vencer por uma diferença de gols dessa... Nunca se deve dizer ‘nunca’, mas é muito, muito difícil. Vai depender muito do que acontecer nos jogos do final de semana. A diferença de saldo está em +6 [a favor dos suecos], e não pode ser maior do que isso depois de sábado”.

Num ambiente com tal obrigação, era de se esperar a contenção de quaisquer prejuízos em potencial. Não aconteceu (afinal, é a Holanda). Já antes da convocação definitiva, o lesionado Stefan de Vrij pediu à dupla Advocaat-Gullit para ficar de fora da lista. Pedido atendido. Mas nem o técnico, nem o auxiliar contavam com o que veriam no domingo: De Vrij jogando 67 minutos pela Lazio, até marcando gol nos 6 a 1 sobre o Sassuolo, pelo Campeonato Italiano. 

Gullit obviamente estranhou, como comentou à mesa redonda Rondo, do canal a cabo Ziggo Sport: “Telefonaram para nós, o médico disse que ele não poderia jogar, e era essa a informação que tínhamos. Aí se vê a escalação, e o nome dele está lá. E você pensa: como assim? Falamos com o jogador, e ele comentou que pôde jogar, mas que não se sentia bem o bastante para atuar pela seleção”. Nenhuma briga aconteceu, e De Vrij engrossou a voz contra as suspeitas de que não quis jogar pela Oranje, falando à NOS: “Joguei 67 minutos, mas não foi sem dor. A cada passe que eu dava, sentia dores. É absoluta besteira [que eu não quisesse jogar pela seleção]”. Mesmo assim, ficaram as desconfianças.

Dentro de campo (com Virgil van Dijk convocado para a zaga), a coisa piorou com o mau desempenho holandês nos treinos de finalização. Além do mais, com uma lesão muscular, Kevin Strootman foi cortado na quarta passada. O que não quer dizer que o ambiente é caótico. É apenas... melancólico. Cercado de opiniões quase unânimes: a Holanda não estará na Copa de 2018. Foi o que afirmou Ruud Gullit, entre um treino e outro: “Temos jovens talentosos, mas eles vão cedo para a Europa e ficam no banco”. Foi também o que escreveu Willem van Hanegem, em sua coluna no diário Algemeen Dagblad: “Naturalmente, seria lindo se alcançássemos o Mundial da Rússia, mas não acontecerá. Temo que os jogos contra Belarus e Suécia sejam os últimos de Robben com a seleção”.

Pois o dono da braçadeira de capitão na Oranje talvez seja o único a não dar o braço a torcer. Robben segue com uma ambição notável, pelas declarações emocionadas dadas à Voetbal International: “Claro que penso até quando aguentarei continuar na seleção. Mas não revelarei publicamente o que penso. Até porque, para mim, não acabou. A curto prazo, penso no cenário mais positivo: que nos classifiquemos para a Copa. Quero estar lá. Os outros cenários não entram na minha cabeça. Estar numa Copa é lindo. E a Oranje me traz algo muito bonito. Não pode terminar assim”.

A revelação sobre as perspectivas que a Holanda ainda pode ter surgirá até antes da equipe entrar no gramado da Borisov Arena, contra os bielorrussos. Afinal, a Suécia jogará antes contra Luxemburgo, às 13h do sábado. Enquanto um importante jogador da seleção da camisa amarela protestou (“É incrivelmente estranho que os dois jogos importantes da rodada não sejam disputados simultaneamente”, lamentou Sebastian Larsson), Robben advertiu: “O resultado [da Suécia] poderá nos impulsionar, saberemos o que será esperado de nós”.

Por enquanto, o que é esperado da Holanda é a confirmação da crise no futebol do país. Até pela baixa expectativa, e pelos maus resultados, ninguém espera que a sorte ajude. Enfim: torcida e imprensa já estão preparadas para a previsível decepção de ficar fora da Copa. A ver se a atitude terá sido precipitada ou previdente.

(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 6 de outubro de 2017)

terça-feira, 6 de setembro de 2016

Meio vazio. Para ficar meio cheio

Sneijder ao resgate: ele apareceu para dar um ponto à Holanda nas eliminatórias (ANP)

Dependendo do ponto de vista, convencionou-se falar que um copo pode estar "meio cheio" ou "meio vazio": otimistas prefeririam ver a primeira alternativa, ao passo que os pessimistas sempre veriam o vazio da situação. Foi exatamente essa a sensação mista que tomou conta de torcida e imprensa holandesas, após o empate por 1 a 1 da Laranja contra a Suécia, em Solna, na estreia de ambas as seleções pelo grupo A das eliminatórias europeias da Copa de 2018. 

Justo. Afinal de contas, por mais que o ataque da Oranje tenha criado até mais chances do que se viu no amistoso contra a Grécia (e já tinha sido promissor então), as falhas de posicionamento tático na defesa seguem como a principal dor de cabeça que o técnico Danny Blind tem a resolver. O primeiro tempo foi prova disso: a mudança que Blind pai fez no meio-campo deu certo. Feito titular, Davy Klaassen apareceu bem na armação das jogadas - e até avançando ao ataque. E jogando pela esquerda do trio de ataque, Wesley Sneijder atuou até melhor do que no amistoso da quinta passada: novamente, o capitão da Oranje teve velocidade na troca de passes.

Assim, durante a maior parte dos primeiros 45 minutos de jogo no Estádio da Amizade, os visitantes laranjas pressionaram mais a equipe da casa. Começando aos 6', com Klaassen, que recebeu ótimo passe de Kevin Strootman em profundidade e chutou em cima do goleiro Robin Olsen, dos grandes destaques da partida. Olsen apareceu novamente com destaque depois, aos 16', quando Klaassen cabeceou para sua defesa. Enfim, ficou claro que o meio-campista do Ajax aparecia com bem mais frequência e velocidade do que Georginio Wijnaldum - discreto no jogo.

Porém, era só a Suécia pegar na bola para que a velha lentidão holandesa na recomposição defensiva aparecesse. Começou a acontecer na parte final do primeiro tempo. E bastou uma falha, aos 42', para o castigo deixar a nu a velha fragilidade: rápido ataque sueco - em que houve reclamação de que Jeffrey Bruma pusera a mão na bola -, Strootman falhou no domínio, e Virgil van Dijk estava fora de lugar, perdendo a sobra. Valeu a esperteza de Marcus Berg para roubar a bola do volante holandês, e mais ainda a sua capacidade de encobrir o goleiro Jeroen Zoet para fazer 1 a 0. Era injusto? Até era. Mas a Holanda também não tinha muito do que reclamar.

E o segundo tempo fazia crer que o mesmo cenário do amigável de Eindhoven seria visto: bolas aéreas a granel - a primeira delas, Van Dijk cabeceou em cima de Robin Olsen aos 52' -, troca de passes infrutíferos para vencer o compacto 4-4-2 sueco pensado pelo técnico estreante Janne Andersson, uma alteração precoce que parecia desesperada - Bas Dost no lugar de Wijnaldum, mandando a equipe para um 4-4-2 com dois avantes altos... até que coube a Sneijder sair novamente ao resgate, como já fez tantas vezes com a Oranje. Aos 67', aproveitando rebote de Olsen em chute de Daryl Janmaat - boa jogada individual -, o meio-campista marcou seu 30º gol pela seleção (sétimo maior goleador no histórico, empatado com Robben), em sua 123ª partida (sete atrás do recordista Edwin van der Sar). E novamente, mostrou porque ainda não se pode prescindir dele...

O gol de Sneijder devolveu o otimismo à Laranja. Que começou, enfim, a transformar a posse de bola maior em chances, como havia algum tempo não acontecia. Mesmo que a Suécia tenha ido ao ataque, com a entrada do atacante Emir Kujovic, as chances eram laranjas. Fossem em bolas aéreas (como num cabeceio de Quincy Promes aos 71'), fossem em chutes de longe (como Sneijder tentou aos 75'), enfim voltava a superioridade vista no início da partida em Solna. Que quase foi premiada de um modo delicioso: nos acréscimos, Dost chegou a mandar a bola para as redes de cabeça, mas o juiz italiano Daniele Orsato anulou o gol, julgando (compreensivelmente) que o camisa 22 deslocara o zagueiro Victor Lindelöf na jogada.

Tal anticlímax influiu nas declarações lamuriosas dos jogadores ao deixarem o campo. Perguntado se estava feliz pelo ponto conseguido contra um adversário provavelmente direto na disputa por uma vaga, Sneijder negou: "Feliz? Eu queria era mais do que um ponto. Ao ver como jogamos, só um time merecia a vitória, e éramos nós. Deveríamos ter vencido, mesmo com o gol injustamente anulado". Danny Blind também reclamou da decisão do juiz à NOS, emissora holandesa: "O juiz ficou no meio do nosso caminho". A verdade é que as palavras mais sensatas vieram de Strootman, também à NOS, reconhecendo a falha no gol de Marcus Berg: "Foi um erro inacreditável de minha parte. A culpa é minha por termos perdido dois pontos aqui. Não posso falar de outras falhas, a minha já é suficiente".

Por tudo isso, dá para supor que a Holanda viu o empate como um copo "meio vazio" - Vincent Janssen descreveu: "Parece que saímos daqui sem ponto algum". Ainda assim, com falhas defensivas e tudo, podia ter sido bem pior para a seleção holandesa. Até porque a França, equipe considerada favorita, também tem do que se queixar, graças ao surpreendente empate sem gols com Belarus. Diante das desconfianças que a Oranje causa atualmente, talvez seja melhor ver o copo meio vazio. Só assim virá o foco para as correções técnicas e táticas que podem fazê-lo ficar meio cheio.

Ficha do jogo

Eliminatórias para a Copa de 2018 - Europa
Suécia 1x1 Holanda
Data: 6 de setembro de 2016
Local: Estádio da Amizade (Friends Arena), em Solna
Juiz: Daniele Orsato (Itália)
Gols: Marcus Berg, aos 42'; Wesley Sneijder, aos 67'

Suécia
Robin Olsen; Mikael Lustig, Victor Lindelöf, Andreas Granqvist e Oscar Wendt; Marcus Rohdén (Emir Kujovic, aos 76'), Alexander Fransson, Oscar Hiljemark e Emil Forsberg; John Guidetti (Christoffer Nyman, aos 64') e Marcus Berg (Jimmy Durmaz, aos 87'). Técnico: Janne Andersson

Holanda
Jeroen Zoet; Daryl Janmaat, Jeffrey Bruma, Virgil van Dijk e Daley Blind; Georginio Wijnaldum (Bas Dost, aos 66'), Kevin Strootman e Davy Klaassen; Quincy Promes (Steven Berghuis, aos 78'), Vincent Janssen e Wesley Sneijder. Técnico: Danny Blind