domingo, 20 de setembro de 2015

810 minuten: como foi a 6ª rodada da Eredivisie

Frank de Boer aplaude a vitória e a liderança do Ajax. Mas também reclama (Louis van de Vuurst/Ajax.nl)

NEC 2x0 Heerenveen
Fazia algumas rodadas que o NEC precisava mostrar a que veio no Campeonato Holandês. Estava (e ainda está, a bem da verdade) com uma campanha de mediana para baixo. Pelo menos nesta sexta, os Nijmegenaren mostraram lampejos da qualidade que os fez campeões da segunda divisão, com a melhor campanha da história da Eerste Divisie. Quando era para atacar, no primeiro tempo, sufocaram o Heerenveen até o venezuelano Christian Santos abrir o placar, aos 18 minutos. Descontente, o técnico dos frísios, Dwight Lodeweges, fez duas alterações já aos 39 minutos do primeiro tempo. Até deu certo, e o Heerenveen atacou bem mais no restante do jogo. Só que num escanteio, Santos aproveitou rebote, fez 2 a 0 e garantiu um triunfo que já era necessário aos Nijmegenaren.

Cambuur 0x0 Twente
Mesmo com apenas seis rodadas, já era possível chamar a partida no Cambuur Stadion de "jogo dos desesperados": nem Leeuwarders nem Tukkers tinham uma vitória na Eredivisie, ocupando respectivamente 17ª (penúltima) e 16ª (antepenúltima) posições. E nenhum deles saiu da situação ruim: em jogo nervoso, o primeiro tempo foi bastante cauteloso. As coisas só ficaram mais ofensivas no segundo tempo. Ainda assim, com muitas falhas de finalização. O Cambuur até escapou de ter contra si um pênalti: já na etapa final, Wessel Dammers desequilibrou Felipe Gutiérrez na área com um carrinho, mas nada foi marcado. Entre marchas e contramarchas, o empate sem gols manteve o mau começo de temporada de Cambuur e Twente.

Heracles Almelo 2x1 PSV
O gol precoce de Luuk de Jong, em má saída de gol do arqueiro Bram Castro, fazia crer que os Boeren controlariam o jogo a seu bel-prazer, e que colocariam fim ao ótimo início de temporada dos Heraclieden. Doce ilusão: com os visitantes recuando demais, o time da casa colocou em prática a sua principal qualidade neste início de temporada, a velocidade de seus meio-campistas e atacantes. Com Oussama Tannane investindo pela direita, mais o auxílio de Thomas Bruns e Iliass Bel Hassani, o Heracles investiu até conseguir os dois belos gols da virada. No segundo tempo, os Eindhovenaren até insistiram no ataque, com a entrada de Jürgen Locadia e Gastón Pereiro. Além disso, por vezes Castro demonstrou insegurança. E Tannane ainda saiu de campo com dores no joelho, após carrinho imprudente (mais um...) de Héctor Moreno. Todavia, o time alvinegro segurou a vantagem, derrubando um PSV animado pela vitória de meio de semana na Liga dos Campeões. E conseguiu a quinta vitória seguida, no 500º jogo de sua história na primeira divisão. Pelo menos na noite de sábado, dormiu na liderança do campeonato. Nada mal para uma equipe que perdera seus sete primeiros jogos, na Eredivisie passada.

Zwolle 2x1 ADO Den Haag
Num jogo entre duas equipes que almejam ser o que o Heracles já é - ou seja, o médio/pequeno que deseja ser a pedra no sapato dos grandes ao longo da temporada -, o ADO Den Haag se valeu de seu bom ataque para abrir o placar, com Mike Havenaar, após jogada de Roland Alberg (este, novamente com a faixa de capitão). Só que a juventude e a velocidade dos Zwollenaren resolveram as coisas no segundo tempo. Demorou um pouco, mas Sheraldo Becker e Lars Veldwijk, dois dos destaques dos Dedos Azuis, viraram a partida. E o Zwolle segue na parte de cima da tabela, mesmo após perder alguns jogadores de destaque nas últimas duas temporadas. Ao que parece, gostou da história de querer se transformar num "médio".

Willem II 3x1 Utrecht
A partida era entre duas equipes que ainda procuram seu lugar e sua aspiração no campeonato. Ainda assim, os Utregs pareciam um time mais regular para vencerem, mesmo fora de casa. Aí veio a boa sacada do técnico Jurgen Streppel. Sem muitos atacantes, vários afastados por lesão (Bruno Andrade ficará longos meses fora, por fratura na fíbula; Zivkovic tem problemas musculares), Streppel deu a primeira chance a Lucas Andersen. E o ponta-de-lança, mais um dos emprestados pelo Ajax aos Tricolores, foi responsável pelos passes para dois dos três gols: o primeiro, de Erik Falkenburg. Ainda no primeiro tempo, a expulsão de Sébastien Haller, justamente o grande destaque dos visitantes, só facilitou as coisas. O empate de Nacer Barazite até foi surpreendente, mas logo o Willem II recolocou-se na frente. Um gol contra, de Louis Nganioni, e outro cruzamento de Andersen para Robbie Haemhouts completar foram suficientes para a primeira vitória do time de Tilburg na Eredivisie 2015/16. Vitória justa.

Roda JC 1x1 Feyenoord
Mesmo como visitante, o Stadionclub tinha condições de superar o Roda e retornar à segunda posição da Eredivisie. Num dia em que o clube de Kerkrade homenageou Dick Nanninga, maior goleador da história dos Koempels (e falecido recentemente), o time de Roterdã começou melhor, mais ágil no ataque. Tanto pela presença de Elia, titular pela primeira vez, como por nova boa atuação de Rick Karsdorp, que num de seus vários avanços fez o cruzamento para Michiel Kramer abrir o placar. Porém, a partir daí os Rotterdammers pararam de jogar. Sorte dos anfitriões, que foram à frente no segundo tempo até conseguirem o empate, com Ard van Peppen. Ainda houve novas tentativas dos Feyenoorders - a maior delas, uma bola na trave, com Dirk Kuyt, já no final da partida. Mas o Roda JC segurou o empate, amparado no bom sistema defensivo, seguro num 4-1-4-1. E o primeiro empate da temporada para o Feyenoord foi mais um resultado a ajudar no ótimo final de semana que teve o Heracles Almelo, agora fixo na vice-liderança.

Excelsior 0x2 Ajax
Após o empate contra o Celtic, pela Liga Europa, Frank de Boer foi bastante criticado, pela postura excessivamente defensiva (e ainda assim, insegura) que o Ajax teve em campo. Neste domingo, ele é que criticou seus jogadores. "De um time assim, você ganha como um rolo compressor, fazendo 6 a 0 ou coisa assim. Quando se joga tomando cuidados, em geral só se perde a chance se o goleiro evitar", comentou o técnico Ajacied à FOX Sports holandesa, deixando claro que desejava mais pressão ofensiva. De fato, a vitória dos Amsterdammers foi simples, definida já no primeiro tempo, com os gols de Anwar El Ghazi e Arkadiusz "Arek" Milik. Porém, o time tomou cuidados até demasiados: como de costume nesta temporada, apenas controlou o jogo na etapa final, mesmo contra um Excelsior que não oferecia perigo algum (única jogada notável dos Kralingers foi num cabeceio de Bas Kuipers, bem defendido por Cillessen). E o Ajax retomou a liderança da Eredivisie. No que tem sido sua tônica nesta temporada 2015/16: sem encantar, com críticas, mas seguramente. Devagar e sempre. Pelo menos dentro da Holanda...

Groningen 2x0 AZ
Os dois times tinham algo a provar às torcidas, derrotados que foram na primeira rodada da fase de grupos da Liga Europa. E foi justamente o Groningen, que sofrera a derrota mais dura (3 a 0 para o Olympique de Marselha, em pleno Euroborg - maior derrota dos alviverdes em competições continentais), o time que se recuperou. Com boa atuação de Bryan Linssen, como na rodada passada, os Groningers dominaram o jogo do início ao fim. Demoraram até mais do que o necessário para resolver o jogo, após Linssen abrir o placar. Os Alkmaarders se esforçaram, mas não tiveram força ofensiva (o primeiro chute a gol veio já no segundo tempo). Sorte de Mimoun Mahi, que substituíra Danny Hoesen no intervalo: fez o segundo gol, já nos acréscimos, e garantiu a terceira vitória do "Orgulho do Norte" na temporada. E mantiveram a impressão de que o AZ é a decepção principal do início de campeonato.

Vitesse 3x0 De Graafschap
Um time razoável, para os padrões do futebol holandês, enfrentando o último colocado da Eredivisie, a única equipe da elite a não ter pontuado ainda em 2015/16. Não havia dúvidas sobre quem era o favorito. Se por acaso houvesse, elas foram dissipadas logo aos seis minutos da etapa inicial, quando Guram Kashia abriu o placar para o Vites. O resto foi apenas um passeio dos aurinegros, pelos quais o meio-campista georgiano Valeri "Vako" Qazaishvili fez 2 a 0 já aos 21 minutos, ainda na etapa inicial. E enquanto o Vitesse já ensaia chegar ao alto da tabela - é o sétimo colocado, a três pontos do Feyenoord -, os Superboeren já "despontam" como os infelizes candidatos à última posição, logo, ao rebaixamento direto.

sábado, 19 de setembro de 2015

O PSV mostra que está vivo

A sorte ajudou claramente o PSV. Só que o time também mostrou qualidades conhecidas (Andrew Couldridge/Reuters)
Muito se falou a respeito de como a fratura do lateral esquerdo Luke Shaw mudou o destino da estreia do PSV pela Liga dos Campeões, na terça passada, contra o Manchester United. Só que a partida anterior da equipe também tivera um momento capital para o placar final. Precisamente no sábado passado, contra o Cambuur, pela quinta rodada do Campeonato Holandês, aos oito minutos do primeiro tempo.

Após rápida jogada de ataque, Luciano Narsingh chegou à área, pela direita, e tentou cruzar. O goleiro Harm Zeinstra desviou, só que a bola foi para o meio da área, limpa para o chute de Luuk de Jong. E não restou outra alternativa a Sander van de Streek, lateral esquerdo dos Leeuwarders, a não ser desviar para a linha de fundo, com a mão. Não deu outra: o árbitro Kevin Blom marcou o pênalti, deu o cartão vermelho a Van de Streek, e De Jong cobrou para fazer o primeiro de seus três gols na partida. E para abrir a goleada por 6 a 0 – a maior que o Cambuur já sofreu em sua história na Eredivisie.

Foi um lance fortuito. Mas nem por isso apaga as qualidades que os Boeren exibiram, tanto contra o Cambuur, quanto (e principalmente) contra o United, na surpreendente vitória por 2 a 1, no primeiro jogo pela Champions League. Qualidades que já eram vistas na temporada passada. E que resistiram até às saídas de Memphis Depay e Georginio Wijnaldum. São o entrosamento que o time esbanja em campo e a velocidade na saída para o ataque.

A principal delas, na verdade, é o entrosamento, mais até do que a habilidade. Enquanto a linha de quatro marcadores joga de modo muito concentrado, evitando avanços desnecessários, o meio-campo tem a chave para evitar dores de cabeça. No 4-3-3 com que Phillip Cocu arma a equipe, Andrés Guardado mantém, e até amplia, sua importância maciça para os Eindhovenaren. É o controlador do jogo: numa posição central, cuida de ditar a postura dos meio-campistas. Algo que também é exibido pela escalação. Se o caso é ter um time mais ofensivo e criativo, Adam Maher joga (assim foi contra o Cambuur). Para mais cuidados na marcação, entra o volante Jorrit Hendrix.

Seja como for, os destaques estão mais na armação, mesmo. Se Guardado consolida-se como o principal jogador de meio-campo, Davy Pröpper ameniza bastante, pelo menos por enquanto, a ausência de Wijnaldum. Com toques rápidos, o meio-campista vindo do Vitesse facilita a velocidade nas chegadas ao ataque. Certo, não é tão forte na função de “elemento-surpresa”, como era o atual meio-campista do Newcastle. Mas faz com que a bola chegue mais rápido ao trio de ataque.

Por sua vez, no trio de ataque a única mudança foi de nomes. Luuk de Jong segue como um dos principais atacantes do futebol holandês. Não significa muito, mas para quem fracassara em Alemanha e Inglaterra, não só era necessário, mas também significa maior facilidade. Tanto que Luuk já fez cinco gols na temporada. É algo semelhante ao processo por que Klaas-Jan Huntelaar passou: fracassado em Real Madrid e Milan, enfim achou no Schalke 04 – e na Bundesliga – um campeonato de nível mais acessível a ele.

Mas a prova de que só mudaram os nomes, não o jeito de jogar, veio na ponta esquerda. Parecia que a ausência de Memphis Depay seria a maior dificuldade por que o PSV teria de passar. Pois Maxime Lestienne consegue dar a impressão de que joga há tempos na equipe, seja por talento ou pelo baixo nível técnico dos adversários na Eredivisie. Em algumas partidas, foi até decisivo para as vitórias do time. Bons exemplos são as viradas sobre o Feyenoord, na quarta rodada do Holandês, e… contra o Manchester United.

E aqui, é preciso retomar o início da coluna. De fato, a séria fratura de Shaw mudou o jogo – curiosamente, em falta cometida pelo mesmo Héctor Moreno que fraturou a fíbula ao cometer suposto pênalti em Arjen Robben, no final do primeiro tempo de Holanda x México, na Copa do Mundo. É justo supor que a teórica superioridade técnica dos Red Devils lhes daria a vitória, por mais que o time inglês ainda sofra com a irregularidade em campo. Em suma: o 2 a 1 teve seu lado injusto.

O que não necessariamente precisa tirar os méritos do PSV, até porque o gol do Manchester United veio após a lesão. Só que aí foi a vez do segundo momento de sorte de Moreno: escapara do cartão vermelho que merecia, e ainda empatou o jogo. Aí, o time holandês se esforçou para praticar o que Luciano Narsingh explicou à emissora de tevê SBS6, ainda na zona mista do Philips Stadion, após o jogo: “Vimos os vídeos e sabíamos que os laterais avançariam, e que poderíamos marcar nos contragolpes”. Dito e feito: com a velocidade de Lestienne e do próprio Narsingh, veio a virada.

O PSV ainda precisa provar muito, obviamente. Na Eredivisie, já chegou ao quarto lugar, a dois pontos do líder Ajax, mas teve tropeços desnecessários. Na Liga dos Campeões, só eventuais vitórias contra CSKA Moscou e, principalmente, Wolfsburg tirarão a sensação de que o triunfo da estreia foi “sorte de principiante”. Ainda assim, por tudo que mostra em campo, o atual campeão holandês já deixou claro: está vivo na temporada. Convém não ignorá-lo.

(Coluna originalmente publicada na Trivela. em 18 de setembro de 2015)

domingo, 13 de setembro de 2015

810 minuten: como foi a 5ª rodada da Eredivisie


O gol de Fischer recolocou o Ajax no jogo contra o Twente (Louis van de Vuurst/Ajax.nl)
Roda JC 0x0 NEC
O Roda vinha numa sequência promissora. Junto do Heracles, era o pequeno que mais surpreendia neste começo de Campeonato Holandês. Só que encontrou um NEC bastante defensivo, até pelos resultados vistos até agora (duas vitórias por 1 a 0, duas derrotas). E o campeão da segunda divisão não fugiu à regra, tornando o jogo bastante truncado. Restou o 0 a 0 que diminuiu um pouco a moral dos de Kerkrade. E que deu um respiro ao time de Nijmegen, que saiu de uma situação que começava a ficar incômoda.

De Graafschap 1x3 AZ
Mesmo jogando fora de casa, no De Vijverberg, era de se esperar que o AZ fosse para cima contra o lanterna. Até porque precisava, já que os Alkmaarders também não haviam vencido na temporada. E a vitória correu, sim, algum risco: mesmo tendo aberto o placar com o lateral esquerdo Rajko Brezancic (estreante), os visitantes sofreram o empate. E estava temeroso até o armador Markus Henriksen fazer dois gols em dois minutos e garantir a primeira vitória para a equipe de John van den Brom. Era necessário, repita-se. Agora, cabe ao AZ recuperar o tempo perdido, enquanto o De Graafschap, único time a só ter perdido, desponta como principal ameaçado pela queda.

Twente 2x2 Ajax
Se os Tukkers precisavam de algum estímulo para a temporada difícil, ele veio com a boa atuação contra o líder do campeonato. Guiados por Felipe Gutiérrez e Hakim Ziyech, líderes no meio-campo, a equipe de Enschede se mostrou mais organizada e agrupada na defesa, e ensaiou bem as jogadas de bola parada (algo visto no primeiro gol, em que Ziyech cobrou escanteio para o meio da área e Gutiérrez, desmarcado, concluiu de primeira). O Ajax parecia batido em campo, tendo perdido uma invencibilidade de 380 minutos sem sofrer gols na Eredivisie desta temporada e prestes a perder o jogo.

Aí veio o gol de Viktor Fischer, vindo do banco de reservas (substituiu Milik). E os Ajacieden se reanimaram no jogo. Embora o Twente até atacasse mais, os visitantes saíam mais rápido para o contra-ataque. A entrada de Yaya Sanogo, já no final do jogo, só ampliava o espírito de "abafa". Premiado por vias tortas, é verdade: o pênalti sofrido pelo francês foi, no mínimo, bem duvidoso, já que o contato com o goleiro Joel Drommel, 19 anos, novo titular dos Tukkers (boa estreia), foi muito leve. Mas Gudelj cobrou, empatou e transformou o que poderia ser um primeiro revés num empate que animou o Ajax, sem deixar de alertá-lo. Até porque o Celtic vem aí, pela Liga Europa.

Zwolle 3x0 Excelsior
Luuk de Jong se consolidou como um dos melhores jogadores deste início de Eredivisie, fazendo três gols na vitória do PSV (mais logo abaixo). Só que Lars Veldwijk fez a mesmíssima coisa, pelo Zwolle, e foi o grande destaque dos Dedos Azuis na vitória sobre o fraco Excelsior. Justamente o clube onde Veldwijk despontou, pela segunda divisão holandesa, na temporada 2013/14, conseguindo até transferência para o Nottingham Forest. A vitória podia ter sido até maior: no final do jogo, Stef Nijland perdeu pênalti. Ainda assim, o triunfo categórico colocou o Zwolle na quinta posição da Eredivisie. E deixa a pergunta: continuarão os Zwollenaren a poder sonhar com as surpresas dos últimos tempos? A ver.

Cambuur 0x6 PSV
A bem da verdade, o jogo na cidade de Leeuwarden já poderia ter acabado aos oito minutos do primeiro tempo. Foi quando ocorreu a jogada decisiva: após ataque rápido dos Boeren e chute de Luciano Narsingh, a bola ficou limpa para Andrés Guardado, no rebote. O mexicano bateu, e o volante Sander van de Streek desviou com as mãos para fora. Pênalti indiscutível. Cartão vermelho para Van de Streek. E Luuk de Jong bateu para fazer o primeiro de seus três gols no jogo. Diante do péssimo dia que teve a defesa auriazul, face ao já claro entrosamento do ataque dos Eindhovenaren, não foi difícil para o atual campeão holandês emplacar a goleada (maior sofrida pelo Cambuur em sua história na primeira divisão, aliás). Pelo menos, serve de ânimo para o gigantesco desafio da semana: enfrentar o Manchester United, na estreia pela fase de grupos da Liga dos Campeões. 

Groningen 3x1 Heerenveen
Ganhar um clássico é sempre agradável. E voltar a ganhá-lo, após quatro edições dele, aumenta o otimismo. Foi o que aconteceu com o Groningen neste domingo: desde 7 de abril de 2013 a equipe não sabia o que era sair com vitória do "Derby van het Noorden" (como dá para imaginar, significa "dérbi do norte"), contra o Heerenveen. Saíram com mais razões ainda para comemorar dois atacantes: Bryan Linssen, que marcou seu primeiro gol pelo Orgulho do Norte - abriu o placar -, e Danny Hoesen, que aproveitou a chance entre os titulares e foi considerado o grande destaque da partida. Ao diminuir a vantagem, com, o Heerenveen até ameaçou estragar a alegria no Euroborg. Mas Mimoun Mahi definiu as coisas, num jogo em que o Groningen viu motivos para esperança na dupla de volantes: Simon Tibbling, campeão europeu sub-21 com a Suécia, terá em Hedwiges Maduro (de volta ao futebol holandês) um bom "conselheiro" na marcação.

Feyenoord 1x0 Willem II
Se a derrota por 3 a 1 para o PSV diminuiu um pouco a esperança na equipe, ter vencido o jogo realizado na manhã deste domingo, em De Kuip, foi bastante útil. Primeiramente, porque os Tricolores deram algum trabalho à defesa, principalmente no primeiro tempo. A saída do lesionado Richairo Zivkovic prejudicou o ataque, é verdade, mas Lesly de Sa teve boa atuação. Depois, o Feyenoord também foi atingido por uma contusão: Michiel Kramer enfim iniciou como titular, como se sugeria na imprensa, mas lesionou-se no segundo tempo, levando à volta imprevista de Colin Kazim-Richards. Mas foi outro jogador vindo do banco de reservas que definiu o jogo: Eljero Elia aproveitou ótimo passe em profundidade, do defensor Rick Karsdorp (promissor), e chutou forte para o 1 a 0 decisivo. Que representa o melhor começo do Feyenoord numa temporada, desde 2007/08. Se ainda falta um pouco para brigar com PSV e Ajax, pelo menos a equipe de Roterdã não tropeça contra pequenos, falha constante em temporadas anteriores. Isso pode ajudá-la a disputar o título.

Heracles 1x0 ADO Den Haag
Se o início da temporada passada foi terrível (sete rodadas até a primeira vitória), o Heracles mostra que aprendeu a lição, rodada após rodada. Num jogo entre duas equipes que fazem papel elogiável nesta fase inicial da Eredivisie, os Heraclieden valeram-se do oportunismo - e também da sorte, diga-se de passagem. Aos 30 minutos do primeiro tempo, o japonês Mike Havenaar, destaque no ataque do Den Haag, cabeceou forte para as redes, mas o juiz Jeroen Manschot alegou que o nipônico cometera falta antes. Na jogada seguinte, Wout Weghorst recebeu bola desviada, e mandou, também de cabeça, para as redes. Só que, desta vez, valeu. E mesmo com as ofensivas do adversário (no final do jogo, o goleiro Martin Hansen - autor do inesquecível gol de calcanhar contra o PSV - até falta cobrou), o time de Almelo manteve o 1 a 0. E figura na segunda posição, com pontuação igual ao do Feyenoord, mas maior saldo de gols. Nada mal para um time que passou 2014/15 ameaçado pelo rebaixamento por toda a temporada

Utrecht 2x1 Vitesse
Jogando de modo mais controlado (Erik ten Hag escala o time atualmente num 5-3-2), o Utrecht soube levar a partida à sua maneira. Raras vezes sofreu contra um Vitesse que esteve apagado neste domingo, até de modo anormal. Tanto que, para marcar os gols, nem precisou do francês Sébastien Haller, sua principal estrela (marcou gol no 2 a 1 da equipe olímpica francesa sobre o time igualmente "sub-23" do Brasil, no meio de semana). Bastaram os gols de Willem Janssen e Bart Ramselaar - este, o nome  do jogo, com rapidez no ataque - para dar a segunda vitória seguida aos Utregs.

sábado, 12 de setembro de 2015

O buraco é bem mais embaixo

Twente precisará de mais união do que esperava para evitar um destino terrível na temporada (fctwentenieuws.nl)
Havia muitas dúvidas sobre o Twente, no início do atual Campeonato Holandês. Sabia-se que a temporada 2014/15 já terminara com o time afligido pela grave situação financeira (leia mais aqui), tendo perdido três pontos como punição, em meio à Eredivisie, e terminando em 11º lugar. Ainda assim, para os padrões do campeonato, o time não era de todo ruim, e poderia fazer uma campanha honrosa, ainda.

A estreia na temporada serviria como bom augúrio: empate por 1 a 1 contra o Groningen, campeão da Copa da Holanda, com elogios ao desempenho da nova dupla de zaga, formada por Bruno Uvini (ele mesmo, ex-São Paulo, ex-Santos, emprestado pelo Napoli) e o grego Giorgos Katsikas. Enfim, a sensação era de que o bicho não era tão feio.

Bastaram três rodadas para a sensação mudar. Três derrotas depois, a equipe de Enschede está na 16ª posição, antepenúltima do campeonato. Antes desta, somente em três temporadas (1982/83, 1987/88 e 2002/03) os Tukkers haviam conseguido apenas um ponto nas quatro primeiras rodadas – em 2002/03, a equipe foi rebaixada e esteve à beira da falência. Pior: a última derrota deu-se no clássico da região do Twente (província do Overijssel), contra o Heracles Almelo, há duas semanas (2 a 0).

Não houve jeito de manter Alfred Schreuder: pressionado pela torcida desde o fim da temporada passada, ele foi demitido. E será sob o comando do interino René Hake que os Tukkers enfrentarão um grande desafio nesta quinta rodada do Campeonato Holandês: jogar contra o líder Ajax, ainda invicto, neste sábado. Ainda assim, a confiança é pequena para a sequência da temporada.

Primeiramente, porque a situação financeira continua aflitiva. No fim da temporada passada, o presidente Joop Munsterman deixou o clube, com uma história de 12 anos em que o Twente conheceu o auge (título holandês em 2009/10, participação em Liga dos Campeões etc.) mas também fez muitas dívidas. E a responsabilidade de rolar essas dívidas, e pagá-las, ficou para Aldo van der Laan.

Sem muito dinheiro para ousar, restaram duas opções: liberar quem recebesse uma oferta razoavelmente polpuda, e povoar o elenco com gente vinda da base. A primeira alternativa foi posta em prática, quando possível. O volante Kyle Ebecilio recebeu proposta de empréstimo para o Nottingham Forest? Que vá. Sem espaço nos titulares, Younes Mokhtar recebeu uma proposta de 1 milhão de euros, do Al Nassr, da Arábia Saudita? Até logo. Jesús Corona, cada vez mais titular na seleção mexicana, é cobiçado pelo Porto? Pois bem, o clube português pagou 10 milhões de euros para o meio-campista vestir a alviazul tripeira, e ele se foi para o Dragão sem problemas.

Restou a René Hake remontar a base da equipe em torno dos remanescentes, com muitos novatos (isso, até quando ele comandar o Twente – cogita-se a volta de Fred Rutten, de boas memórias no Grolsch Veste). No meio-campo, cuidarão da marcação Renato Tapia e Kamohelo Mokotjo, enquanto armam as jogadas Felipe Gutiérrez (em alta, presença certa na seleção do Chile) e Hakim Ziyech (principal destaque da equipe, líder de assistências em 2014/15). E no ataque, nem referências há: apenas dois reforços que aspiram a tal posto, o alemão (de ascendência nigeriana) Chinedu Ede e Michael Olaitan – este, nigeriano de nascimento e nacionalidade.

De resto, cada vez mais a garotada toma conta da equipe. Até por força das circunstâncias, são ou serão titulares o lateral direito Hidde ter Avest, 18 anos (titular da seleção holandesa sub-19); os zagueiros Peet Bijen (20 anos), Joachim Andersen (19 anos) e Jeroen van der Lely (19 anos); e o atacante Alessio da Cruz, 18 anos. Além do mais, antes da partida contra o Ajax, Joel Drommel, 19 anos, titular da seleção holandesa sub-19, foi escolhido como novo goleiro titular, barrando Nick Marsman, que retornara. Cada vez mais, é com eles que a espinha dorsal da equipe do Twente será feita.

Não que a transição esteja sendo regular. Na primeira derrota desta má sequência atual (4 a 1 para o ADO Den Haag, em pleno Grolsch Veste), ficou clara a ingenuidade dos defensores e a lentidão excessiva do time, que pelejou para marcar o bom ataque dos Hagenaren. Isso também ficou claro na derrota para o rival Heracles: contando com Oussama Tannane, um dos principais destaques deste início de temporada, a rapidez do ataque Heraclied destruiu a inexperiência dos Tukkers.

Obviamente, o Twente ainda pode crescer. Conta com jovens promissores, mais a crescente experiência internacional de gente como Gutiérrez (destaque dos 3 a 2 chilenos contra o Paraguai, em amistoso, com dois gols). Mas o time já sabe: o buraco é mais embaixo. Precisará se esforçar caso queira preencher seu potencial e ficar seguro no meio da tabela, para minorar os impactos da crise nas finanças. E tem oportunidade para isso contra o Ajax, como bem disse Gutiérrez: “Seria fantástico se alcançássemos um bom resultado neste sábado. Isso nos dará um impulso, e confiança para continuarmos”. É tudo que a equipe deseja.

(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 11 de setembro de 2015)

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Não vai acabar. Vai mudar (parte 1)

Seleção holandesa na Euro 2008 deu a dica: é possível unir ataque e cautela. Oranje atual precisa disso (Johannes Simon/Reuters)
Jornalista sul-africano, crescido na Holanda e radicado na França, Simon Kuper é autor de conhecidos livros sobre futebol. Um bom exemplo é "Ajax, The Dutch, The War". Lançado originalmente na Holanda em 2000, sob o título Ajax, Joden, Nederland ("Ajax, Judeus, Holanda"), o livro comenta sobre como a colônia judia em Amsterdã se adonou de um clube que não teve raízes semitas - e parte disso para comentar sobre a excessiva permissividade holandesa com a invasão nazista, durante a Segunda Guerra Mundial. 

Torcedor da seleção holandesa, Kuper lamentou as derrotas contra Islândia e Turquia em seu perfil no Twitter. E foi além, após o 2 a 0 dos turcos que deixou a Oranje próxima da ausência na Euro 2016. Primeiro, Kuper foi apocalíptico: "Não estou certo sobre o que sobrará do futebol holandês, após esta noite, com a geração Van Persie/Sneijder/Robben sumindo e a total inutilidade dos clubes holandeses". Depois, foi mais bem humorado, mas nem por isso menos melancólico: "Um dia nós, torcedores holandeses, olharemos para hoje e riremos, mas provavelmente isso só ocorrerá lá por 2034". 

Tais palavras mostraram o tamanho da desilusão que se abateu sobre torcida e imprensa na Holanda após as derrotas inapeláveis nas eliminatórias do torneio continental de seleções. De fato, a sensação imediata era de que o futebol do país não só entrará num período dificílimo, como dele jamais sairá. De que a Holanda voltará ao segundo/terceiro escalões do futebol europeu, após cerca de 40 anos entre as nações mais tradicionais do ludopédio mundial. Mas só mesmo a passagem do tempo começa a colocar as coisas nos devidos lugares.

Ficará mais difícil ver clubes holandeses ocupando lugares de ponta no cenário europeu? Sim, ficará. Tanto pelo fato de simplesmente não conseguirem segurar as maiores promessas (e isso se vê temporada após temporada), como pelo futebol holandês não ter se preparado direito para um mundo pós-Lei Bosman, como Portugal se preparou. Por isso, Ajax, Feyenoord e PSV - e até médios, como AZ e Twente - falham ao tentarem resultados realmente bons nas competições continentais. E não é raro ver Porto e Benfica chegando às fases decisivas dessas mesmas competições, além de terem uma melhor rede de procura de novos jogadores - e saber negociá-los melhor, de modo que cheguem "na baixa" e saiam "na alta".

E os reveses em série enfrentados pela Oranje desde a volta de Guus Hiddink (e a entrada posterior de Danny Blind) mostram uma certa defasagem tática da seleção. O orgulho holandês em jogar no 4-3-3, em não abdicar de ter o controle do jogo, em apostar na ofensividade quase suicida, está resultando em uma "camisa-de-força tática". Antes do jogo contra a Turquia, por exemplo, Danny Blind foi definitivo: "Não podemos jogar pelo resultado, porque esse não é nosso estilo".

O resultado foi muito bem abordado por um texto do site catenaccio.nl (ATENÇÃO: texto em holandês): um time excessivamente espalhado, dando espaço à vontade para os adversários trabalharem. Um time em que a linha de quatro defensores estava pessimamente treinada e posicionada. Um time que só apostava em jogadas pelas pontas (principalmente com Memphis Depay e Narsingh). E um time que não tinha jogadores em posições estratégicas que permitissem a aceleração do jogo quando necessário - ou seja, apostando na troca de passes estéril, de um lado a outro do campo.

Obviamente, a Holanda não pode nem precisa abandonar suas crenças tático-futebolísticas. Isso é um erro - no qual o futebol brasileiro incidiu em vários momentos, principalmente após a eliminação traumática na Copa de 1982. Mas precisa saber que há outros modos de ganhar um jogo, que há o momento de atacar e o de defender. E curiosamente, a Laranja já deu outras mostras de que pode aliar ofensividade e cautela. 

O primeiro caso em que isso se viu foi na Euro 2008. Nas eliminatórias para o torneio, a campanha, no 4-3-3, foi apagada. Após conversa com os cardeais do elenco (Van der Sar, capitão da seleção à época, Seedorf e Van Nistelrooy), o técnico Marco van Basten decidiu alterar a equipe para um 4-2-3-1. E a primeira fase da Oranje no torneio continental foi exemplar. Apostando francamente no contra-ataque, a equipe superou um grupo com Romênia, Itália e França, com três vitórias em três jogos. Caiu para a Rússia, é verdade. Mas deixara lições. Bert van Marwijk, sucessor de Van Basten, as aprendeu. E num 4-2-3-1 bem pragmático a Holanda conseguiu seu terceiro vice-campeonato mundial.

E na Copa passada, a equipe treinada por Louis van Gaal fez isso quase à perfeição. Por força das circunstâncias (a atuação desastrosa na derrota para a França, em amistoso, mais a primeira lesão de Kevin Strootman), Van Gaal armou o time para o Mundial num 5-3-2 bastante cauteloso. Com a sorte de tudo ter se encaixado - esquema compreendido, Robben sendo dos melhores jogadores do torneio, coadjuvantes atuando bem, defesa protegida -, a Holanda chegou a um surpreendente terceiro lugar.

Outro problema é a geração que surge. As seleções holandesas de base têm desempenho irregular nos últimos anos. A Jong Oranje (sub-21) foi campeã europeia da categoria em 2006 e 2007, mas desses dois anos só se aproveitou Huntelaar, artilheiro na primeira conquista. Em 2009 e 2011, mal chegou à Euro sub-21. Em 2013, chegou às semifinais. Em 2015, também ficou de fora. A seleção sub-19 caiu na primeira fase, no Europeu deste ano; a seleção sub-17 até mostra desempenhos promissores (campeã europeia em 2011 e 2012), mas pouco disso se viu na seleção adulta atual. Só Memphis Depay e Willems, membros do time de 2011, são convocados com frequência.

Ainda assim, times como Ajax, Feyenoord, PSV e AZ seguem revelando atletas. É o jeito. De mais a mais, ausências holandesas em torneios grandes não são raridade. Eram a regra, aliás, até 1974. Nada leva a crer que o futebol holandês vai "acabar". Mas ele deverá mudar, por bem ou por mal.

O blog voltará ao tema.

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Agora não houve desculpas

A desilusão de Jeffrey Bruma reflete bem a desilusão da Oranje: ausência da Euro é bem provável (VI Images)

15 de outubro de 2013. Já classificada para a Copa do Mundo, a Holanda ainda tinha um desafio em sua última partida pelas eliminatórias: enfrentar a Turquia, em Istambul, com o adversário sedento pela última chance de ganhar a segunda posição do grupo D, disputada com Hungria e Romênia. Pois bem: naquela que foi a primeira partida de Memphis Depay pela Oranje, a equipe não tomou conhecimento da pressão, e fez tranquilos 2 a 0 nos turcos, acabando com as esperanças de chegarem à Copa. Atuação segura a ponto de merecer aplausos da fervilhante torcida turca ao fim dos 90 minutos.

Um ano, dez meses e 21 dias depois, o cenário é bem diferente. A Holanda enfrentou a Turquia, pelas eliminatórias da Euro 2016. Não mais em Istambul, mas em Konya. E a equipe que levou o jogo como bem quis foi a anfitriã, não mais a Oranje. Algo estampado nos categóricos 3 a 0 do placar, que trouxe o cenário que tanto a torcida temia: cair para a quarta posição do grupo A da qualificação, dois pontos atrás dos turcos, competidores diretos pela terceira posição que leva à repescagem. Em suma: nunca foi tão grande o perigo da Holanda perder sua primeira competição grande desde a ausência na Copa de 2002. 

E se o destino ainda fora um adversário a mais, pela lesão de Robben e a expulsão de Martins Indi que jogaram a partida de quinta passada nas mãos da agora classificada Islândia, agora não houve desculpas holandesas para a atuação ainda pior que se viu na Torku Arena. Danny Blind manteve o 4-3-3 velho de guerra, trouxe Van Persie de volta aos titulares (era necessário), e jogou as fichas na improvisação de Jaïro Riedewald, 18 anos (fará 19 nesta quarta), zagueiro do Ajax, na lateral esquerda.

De nada adiantou. Os mesmos defeitos que são vistos desde a segunda passagem de Guus Hiddink foram repetidos: um time excessivamente espaçado, que permitia a troca de passes entre os turcos - e a fácil marcação dos atacantes. Na parte ofensiva, aliás, as tentativas foram estéreis e repetitivas: apenas esforços de Memphis Depay e Luciano Narsingh pelas pontas, e jogadas nas quais Robin van Persie fazia o pivô para Wesley Sneijder chutar, vindo de trás. Não só o destino era sempre o mesmo (ora a linha de fundo, ora as mãos do goleiro Volkan Babacan), como a atuação apagada de Van Persie e Sneijder faz crer, de fato, que já é hora de pensar a seleção sem suas presenças. E que a geração deles está perto de dizer adeus sem um título. Como tantas outras, de tantos outros craques, no caso laranja.

Na defesa? Novamente, ingenuidades gritantes que facilitaram a vida turca. Com a subida da linha de quatro marcadores, o excessivo avanço de De Vrij ao meio-campo abriu o espaço para que Arda Turan (o melhor do jogo, com apenas 55 minutos em campo) lançasse a bola que Oguzhan Özyakup (nascido em Zaandam, e atleta da seleção holandesa sub-17 no mundial da categoria, em 2009) tocou na saída de Cillessen para abrir o placar. O segundo gol, então, foi ainda pior, com mais erros. 1) Van der Wiel cobrou um lateral para Daley Blind, que estava cercado por turcos; 2) Blind estava "na fogueira", mas perdeu a bola facilmente para Arda Turan; 3) A falha de Cillessen, que deixou passar um chute fraco; 4) A inacreditável preocupação de Jeffrey Bruma com um impedimento - que não existe em cobranças de lateral, como se sabe.

No segundo tempo, com a vitória garantida, a Turquia mostrou porque ganhava. Se estava no 4-4-2, isso não impedia de mostrar proximidade entre seus jogadores, envolvendo facilmente a Oranje em sua marcação. Restou a entrada de Luuk de Jong, para o famoso "abafa", que se revelou infrutífero. E o terceiro gol dos turcos, no fim do jogo, só foi a pá de cal numa Holanda ainda mais desalentadora do que fora contra a Islândia. O abatimento era tamanho que Van Persie só conseguiu dizer: "É terrível". O outro veterano, Sneijder, teorizou: "Talvez estejamos numa fase de muito azar". Danny Blind, de novo, atribuiu o revés a falhas individuais ("A Turquia se aproveitou delas").

Torcida e imprensa, atônitos, são catastróficos. O AD Sportwereld, caderno de esportes do diário  Algemeen Dagblad, foi definitivo na manchete desta segunda: "Fracos demais para a Euro". Dentro, a coluna do ex-jogador Willem van Hanegem foi virulenta contra os jogadores: "Na Oranje há alguns jogadores que só se preocupam com eles mesmos. Memphis é um exemplo, com os sapatos bonitos dele, parece Goldfinger. Do jeito que os jogadores se vestem, parecem ir a um jogo amistoso de bodyboarders. (...) A culpa é toda nossa, colocamos os jogadores num pedestal. Memphis toca a bola de calcanhar e o narrador já exagera. (...) Não quero culpar Danny Blind, é fácil demais".

Com tudo isso, incrível é saber que a Holanda ainda pode muito bem chegar à repescagem. Não é nada irreal voltar à terceira posição do grupo, ao vencer o Cazaquistão e ver a República Tcheca superar a Turquia, na próxima rodada. E os tchecos já fizeram isso uma vez, na fase de grupos da Euro 2004. Para ir às quartas de final, a Oranje precisava vencer a Letônia, e também de uma vitória deles, já classificados, contra a Alemanha. Desconfiava-se da motivação do time de Nedvěd, Poborský e cia, que já tinha a vaga assegurada. Mas fez 2 a 1 e despachou os germânicos da Euro, enquanto a Oranje fez 3 a 0 nos letões e foi às quartas.

Pode até acontecer. Mas não depende mais da Holanda. E ela não anda fazendo por merecer tal sorte dentro de campo.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

O desespero continua


Robben deixa o jogo: a seleção holandesa não resistiu aos dois fatos que a perturbaram, e segue em desespero (VI Images)
“Ísland! Ísland!". A seleção holandesa até compreendera escutar isso na vitória dos islandeses, por 2 a 0, em outubro do ano passado, no turno do grupo A das eliminatórias para a Euro 2016. Mas sabia: em casa, tinha de se esforçar para afastar o som incômodo da torcida adversária, vencer a primeira das "quatro finais" e se aproximar da classificação para o torneio continental de seleções. Só que o destino, e as decisões erradas a partir das peças que ele pregou, deixaram a Holanda novamente em apuros. E em situação pior do que antes: se a derrota em Reykjavik ainda tinha como ser revertida com resultados posteriores, agora a Oranje só tem a vaga na repescagem como objetivo possível. Pior: praticamente a decidirá com a Turquia, no confronto direto do próximo domingo.

Curiosamente, o temor de um novo vexame era pequeno, na primeira parte do jogo em Amsterdã. O time treinado por Danny Blind não jogava bem, é verdade. Se estivesse melhor, o 4-3-3 mantido pelo técnico não seguiria deixando desprotegida a insegura defesa. Prova disso foi o gol perdido por Jón Dadi Bödvarsson, logo aos três minutos de jogo: ele só recebeu a bola escorada porque Daley Blind, atrasado na linha de quatro defensores, deu condições para que Johann Berg Gudmundsson desviasse. Fosse como fosse, aos poucos a posse de bola tornou-se majoritariamente holandesa (chegaram a ser 70%), a defesa se recompôs, Depay e Robben criaram algumas chances, o ataque participava de jogadas coletivas... enfim, parecia tudo sob controle.

Mas a tentativa de levar o jogo pragmaticamente foi destruída em oito minutos. Primeiro, aos 26, com a lesão na virilha sofrida pelo capitão Arjen Robben, que forçou a troca dele por Luciano Narsingh. Não bastasse a liderança natural que o fizera dono da braçadeira, os arremates do camisa 11 vinham sendo perigosos, como sempre. Só restou a ele lamentar: "Os especialistas dirão agora que eu não estava bem, mas eu me sentia totalmente em forma. Num curto período de tempo, eu havia chegado duas vezes à grande área. Mas na segunda, algo se distendeu nas minhas costas. Daí foi para a virilha, e eu tive de sair. Para mim, ficou claro que eu não poderia continuar. Não dá para acreditar...”. 

Depois, aos 33 minutos, veio a expulsão de Bruno Martins Indi. Justamente o defensor holandês que mais estava seguro, sem errar tantos botes como Stefan de Vrij (que, aliás, já até tomara o cartão amarelo). Porém, a ingenuidade do quarto-zagueiro foi imperdoável. Está certo que a decisão do árbitro Milorad Mazic em dar o vermelho é até polêmica, já que Kolbeinn Sigthórsson também veio forte na disputa de corpo. Ainda assim, o zagueiro holandês se arriscou demais ao dar uma cotovelada que podia ser (e foi) interpretada como agressão. E a imprudência foi criticadíssima por Robben (“Como capitão, eu devo proteger meus jogadores. Mas não tenho mais nada a fazer além de dizer que [a cotovelada] foi estúpida. Ele deixou o time na mão, e condeno isso”) e Danny Blind (“Ele estava razoavelmente bem no jogo, não havia razão nenhuma para fazer aquilo”).

Os dois acontecimentos fortuitos haviam jogado a Holanda num cenário temível. E Blind, o técnico, não colaborou muito para melhorar a situação, ao tomar uma decisão criticada até agora na Holanda. Tendo de remontar a defesa, precisou queimar a segunda alteração, colocando Jeffrey Bruma no miolo de zaga. Até compreensível. Só que o substituído foi... Klaas-Jan Huntelaar, que seria a única referência de ataque da seleção a partir dali. Foi a senha para trazer a seleção da Islândia mais e mais perto da defesa holandesa, permitindo os contragolpes, principal qualidade da equipe de Lars Lagerbäck e Heimir Hallgrímsson. Ainda assim, o treinador defendeu a substituição (“Não me arrependo, eu precisava tornar o time defensivo”.

Se a saída precoce de Robben e a expulsão de Martins Indi haviam sido lances fortuitos, a evolução até o gol foi mérito claro da Islândia. O time manteve a compactação admirável de seu esquema tático: sem a bola, as linhas do 4-4-2 eram visíveis e próximas uma da outra, impedindo a Oranje de chegar ao gol de Hannes Thor Halldórsson por outras maneiras que não chutes de fora da área e inversões de jogo.

Mas o mérito realmente decisivo para a vitória islandesa foi ter calma e saber esperar o momento certo de mais um erro holandês. Mesmo com um 4-2-3 torto, em que Memphis Depay jogava forçosamente na área, a defesa continuava insegura e aberta. O que forçou o exagero de Gregory van der Wiel, arriscando o carrinho em Birkir Bjarnason em que foi marcado o pênalti. Outro ato desesperado que mereceu críticas de Danny Blind (“Ele é experiente o suficiente para saber que você precisa ficar em pé ali. Não dá para dar carrinho naquela situação, é o primeiro ensinamento”). Gylfi Sigurdsson converteu, como já convertera outro penal nos 2 a 0 em Reykjavik. E o azar de Cillessen seguiu: 26 pênaltis contra ele, 25 convertidos. Está certo que, com Cillessen no gol, o Jablonec até perdeu um pênalti contra o Ajax, nos play-offs da Liga Europa. Mas a bola foi na trave. Ou seja, o arqueiro nativo de Groesbeek continua sem defender penais, na prática... 

Depois, restaram as tentativas esparsas e até valorosas, com Memphis Depay, Narsingh e Sneijder. Mas todas indo nas mãos de Hannes Thór Halldórsson. Isso, sem que Blind arriscasse trazer uma referência de ataque de volta, colocando Van Persie ou até Luuk de Jong em campo. Luuk, aliás, poderia levar a uma reedição do trio de ataque tão exitoso na temporada passada, jogando pelo PSV. Todavia, somente em jogadas individuais pelas pontas e chutes de fora a Islândia sofria. 

E veio a derrota. Primeira da Oranje em partidas de eliminatórias em casa desde o 2 a 0 de Portugal, na qualificação para a Copa de 2002. Segundo revés doméstico na história da equipe em eliminatórias para a Eurocopa – a primeira derrota fora num longínquo 30 de novembro de 1963, 2 a 1 para Luxemburgo, em De Kuip. Ainda assim, pelo gol de Valerijs Sabala, que manteve Turquia e Letônia no empate por 1 a 1, a Holanda seguiu na terceira posição do grupo A. Ou seja: por mais que esteja justificando eventual ausência da Euro 2016, a Oranje ainda depende de suas próprias forças. Só que, agora, terá de enfrentar uma pressão incrível dos turcos, no jogo em Konya, na nova Torku Arena - mudança de sede criticada, aliás ("muito longe, muito cara, muito escondida", comentou o chefe da associação de torcedores da seleção, Theo Ponk, ao diário "Algemeen Dagblad").

Mas restou isso à Holanda. Como a própria torcida gritou na parte final do jogo desastroso desta quinta, é tudo ou nada. Veteranos (Van Persie jogará?) e novatos terão de mostrar valentia, calma e talento para tentar salvar a via-crucis, assegurando ao menos o terceiro lugar que leva à repescagem (“Primeiro e segundo lugares não são mais alcançáveis”, reconheceu Blind). Ou então, é esperar pelo desastre supremo: ficar fora de um grande torneio, pela primeira vez desde 2002. O desespero continua. Sonorizado pelo grito das torcidas adversárias: se os turcos já haviam encoberto os holandeses no empate em 1 a 1, em março, na mesma Amsterdam Arena, agora o pesadelo tem os gritos de "Ísland, Ísland...".

terça-feira, 1 de setembro de 2015

A hora da verdade

Em seu primeiro desafio como técnico da Oranje, Danny Blind tem um objetivo claro: vaga na Eurocopa (Ons Oranje)
Quando confirmou-se que Danny Blind estava promovido ao cargo de técnico da seleção holandesa, em 1º de julho, a primeira frase do novo comandante da Oranje foi clara e cristalina: "Eu trabalharei duro com a comissão e os jogadores para que consigamos a vaga para a Euro, no ano que vem. É minha única meta, chegar à Euro. Não olho para trás e nem fico pensando num futuro posterior, só chegar à Euro é que conta".

E agora, enfim, chegou a hora de Blind mostrar o que pode fazer, no maior desafio de sua curtíssima carreira como técnico. Mais do que isso: chegou a hora da própria seleção holandesa cumprir a sua obrigação, solucionando uma campanha problemática nas eliminatórias do torneio continental de seleções. E se chegar à Euro é tudo o que conta, para evitar o aborrecimento de uma repescagem só resta a alternativa de vitórias contra Islândia (na próxima quinta, em Amsterdã) e Turquia (no próximo domingo, em Konya).

Para isso, o espírito de "ou vai ou racha" desejado pelo novo-velho treinador - o "velho" vai por conta de estar desde 2012 na comissão técnica da seleção - foi encampado por todos os 23 jogadores convocados, que treinam desde a segunda passada. Talvez o símbolo disso venha com o principal deles: Arjen Robben, tornado o novo capitão da Oranje. Já antes de ser oficializado como o novo dono da braçadeira, Robben pediu dedicação aos colegas, em entrevista à revista Voetbal International: "Temos uma desvantagem de cinco pontos para a Islândia. Precisamos jogar contra ela com a faca nos dentes. Entrar para matar. Mostrar desde o primeiro segundo que não temos nada a perder".

E é justo que o atacante tenha tomado de Van Persie a capitania da equipe. Afinal de contas, enquanto Robin tem vivido uma fase mais apagada na carreira, Arjen demonstra vitalidade em campo, sempre que as lesões permitem (e elas são cada vez menos frequentes, diga-se de passagem). Já na Copa de 2014, Robben ocupava a liderança da equipe, de certa forma, pelo modo como se impunha com sua técnica e sua velocidade. Além disso, sempre expunha vibração em campo. Exemplo disso se viu antes da decisão por pênaltis contra a Costa Rica, no Mundial, quando foi o cidadão a animar o elenco antes das cobranças. 

E foi exatamente por essa última característica que Blind escolheu trocar de capitão. Em entrevista coletiva, explicou a mudança: "Não escolhi [o capitão] com base nas qualidades futebolísticas. Na liderança e na orientação aos colegas, Robben e Van Persie se equivalem. Mas são duas personalidades diferentes. E eu escolhi um capitão que esteja presente de modo mais forte em campo". Pelo visto, Van Persie (ainda vice-capitão) entendeu bem a escolha: "Eu sempre disse que Robben, eu e os outros veteranos fazemos isso juntos, então também fico orgulhoso de ser o vice-capitão".

Na parte da convocação, poucas surpresas foram vistas. As maiores delas foram o lateral direito Kenny Tete, 19 anos, que ocupa a titularidade no Ajax, e Jaïro Riedewald, de 18 anos, zagueiro, também no Ajax, que está se saindo bem ao ocupar a vaga deixada por Niklas Moisander. Embora dificilmente ambos sejam titulares (Van der Wiel e Martins Indi são bem mais experientes, mesmo questionados), Blind aproveitou a convocação para alertar gente que ficou de fora, como Daryl Janmaat e Nigel de Jong: "Eu vejo vinte jogos por fim de semana, e semanalmente vejo gente experiente cometendo falhas. Você pode ter experiência, mas não pode deixar a pressão lhe vencer". Com o volante, o treinador foi até mais longe: "Talvez eu precisasse dele só para o jogo contra a Turquia, fora de casa, mas aí seria só o caso de evitar sofrer gols. Outros podem fazer isso melhor".

Ainda assim, fica o mistério: como Blind escalará a equipe? O 4-3-3 que será mantido terá condições de evitar o contra-ataque, arma principal dos islandeses na vitória por 2 a 0 em Reykjavik, ano passado? Supondo que Robben e Depay são presença certa no time, quem ocupará o lugar central no ataque: Van Persie, Luuk de Jong ou Huntelaar? Blind "filho" jogará na lateral esquerda ou no meio? Blind pai não respondeu a nada disso.

O importante, na verdade, será corrigir a lentidão da equipe na recomposição da defesa para o ataque (grande erro cometido sob Hiddink). Achar espaços no ataque e mostrar velocidade para fazer os gols e vencer as "quatro finais" que ainda restam nas eliminatórias da Euro 2016. Para isso, antes de tudo, são necessários o foco que Blind pediu - e a vontade que Robben representa.