sábado, 10 de junho de 2017

O São Paulo x Ajax de 1997: lembranças nebulosas

Há exatamente 20 anos, o estádio Cícero Pompeu de Toledo - claro, o popular Morumbi - recebeu um jogo que passaria em brancas nuvens. Aliás, pelo aspecto técnico, até passou, visto que foi um esquecível empate em 1 a 1 entre São Paulo e Ajax, num jogo amistoso. Mas se houve um motivo para aquela partida realizada em 10 de junho de 1997 ficar na memória dos 7.342 espectadores que estavam no Morumbi, este foi a neblina espessa que tomou conta do ambiente, por volta dos 35 minutos do segundo tempo.

Certo, o Ajax vivia um tempo em que a euforia causada pelo time campeoníssimo da temporada 1994/95 diminuíra. A equipe de Amsterdã perdera o Campeonato Holandês para o PSV; na Liga dos Campeões, vira o sonho da terceira final consecutiva parar numa derrota para a Juventus, nas semifinais; e finalmente, não vinha tendo bons resultados no périplo sul-americano que vinha fazendo para fechar aquela temporada 1996/97. Ao passar pelo Chile, caiu para a Universidad Católica (1 a 0); na Argentina, o Boca Juniors conteve os Ajacieden (3 a 2).

Finalmente, quando chegou a São Paulo, ficou claro que o grupo de jogadores não seria o que de melhor o Ajax teria para oferecer. Alguns destaques remanescentes dos títulos de 1995 até figuravam na equipe, como Marc Overmars ou Danny Blind, mas a maioria do time era formada por reservas - e Louis van Gaal vivia seus últimos dias como treinador daquela equipe que formara, antes de se transferir a peso de ouro para o Barcelona. Trabalhando no jornal Folha de S. Paulo à época, o jornalista Rodrigo Bueno ainda lembrou mais uma ausência: "Van der Sar era o famoso titular, mas a Holanda estava disputando o Nelson Mandela Challenge (venceu a África do Sul por 2 a 0 em Joanesburgo) [amistoso jogado em 4 de junho de 1997]. No entanto, ele veio para São Paulo e distribuiu fotos autografadas para crianças e fãs no Morumbi [contra a África do Sul, aliás, Van der Sar ficou na reserva; o titular holandês foi Ed de Goey]".

O São Paulo também não estava muito alegre: curtia as feridas do título estadual perdido para o Corinthians, cinco dias antes. Ainda assim, a impressão não era melancólica como a do Ajax, mas otimista: no Campeonato Paulista, começara a aparecer uma geração que explodiria no título paulista do ano seguinte, com gente como Fábio Aurélio e Dodô, que jogaram a partida amistosa (Denílson estava na Seleção Brasileira que disputara o Torneio da França e ganharia a Copa América). Assim, a equipe treinada por Darío Pereyra foi com força máxima, contra um Ajax que entrava para sua 13ª partida contra uma equipe brasileira - a segunda em território nacional (a primeira também fora no Morumbi: goleada da Seleção Brasileira em amistoso, 5 a 0, em 1979).

Durante o jogo, com ritmo mais acelerado, o São Paulo pressionou mais durante o primeiro tempo, na fria noite daquela quarta-feira. Porém, sem muita pontaria, deu pouco trabalho ao goleiro Fred Grim, reserva de Van der Sar (o mesmo Grim que comandou a seleção holandesa interinamente em três partidas, neste 2017). No segundo tempo, o ritmo foi diminuindo. E mesmo sem se esforçar muito, o Ajax conseguiu um gol, aos 73': Grim cobrou tiro de meta longo, a bola foi escorada, e o reserva Nordin Wooter dominou pela esquerda, driblou Bordon e chutou rasteiro, no canto direito de Rogério Ceni.

(Abaixo, a reportagem sobre São Paulo 1x1 Ajax, feita por Wagner Lima para o programa "Gazeta Esportiva", da TV Gazeta paulistana, na edição de 11 de junho de 1997)


Isso foi o que se viu. Porque, logo após o gol dos visitantes holandeses, por volta dos 30 minutos daquela etapa complementar, uma neblina espessa tomou conta do Morumbi, e quase nada mais se viu. Presente no Morumbi (tanto a trabalho, pela Folha, quanto para ver o Ajax de que é simpatizante), Rodrigo Bueno lembrou: "Só nessa fria noite eu vi uma neblina interromper um jogo". Não foi o único: na transmissão ao vivo que o SBT fazia, o narrador Silvio Luiz e o comentarista Juarez Soares começaram a passar certos apuros para descrever o que ocorria. No início, os repórteres Luiz Ceará e Antônio Petrin até podiam ajudar; depois, nem mesmo eles, no gramado, conseguiam ver os lances. Restou a Silvio e a Juarez dar um jeito, como em tantas outras transmissões da dupla, nos tempos de TV Bandeirantes ou no mesmo SBT:

- "Eu trouxe vela. E você, trouxe vela, Juarez?"
- "Silvio, não dá para enxergar nada. Quero ver o que os jogadores vão fazer."
- "Então canta aquele tango de Gastón e Le Pera 'Por la noche que me quieras todo se perdió'"

Assim, quase invisível, a partida transcorria. Até que, aos 80', Silvio Luiz teve uma das narrações mais pitorescas de sua vitoriosa carreira:

"Eu não tô vendo nada... ih, foi gol! Ééééééé do São Paulo! Eu não vi quem é que fez, mas foi do São Paulo!"

Quem fizera tinha sido França: numa bola fortuita cruzada para a área, o atacante são-paulino escorou para as redes defendidas por Grim, aos 81'. Foi a deixa mais do que adequada para o juiz Oscar Roberto de Godói aproveitar o adiantado da hora e encerrar a partida antecipadamente, já que a neblina seguia espessa. Mas Rodrigo Bueno seguiu no Morumbi. E tentando entrevistar os jogadores do Ajax, o atual comentarista da FOX Sports conseguiu uma ótima lembrança das mãos do volante Martijn Reuser: "Fui tentar algumas entrevistas e, quem sabe, levar alguma recordação. O Reuser foi o último jogador a entrar no vestiário, creio, e pedi a ele uma camisa. Ele estranhou que eu o chamei pelo nome. Ele ficou surpreso, acho, com o fato de alguém reconhecê-lo no Brasil. O Ajax tinha muitas figuras conhecidas, como Overmars, mas Reuser só compunha elenco mesmo. Ele ficou lisonjeado por ser lembrado e me deu a camisa que os jogadores do Ajax usam por baixo do uniforme, uma camisa branca diferenciada mesmo. É algo que não se acha em lojas".

Uma das raras lembranças nebulosas daquele 10 de junho de 1997, no Morumbi.

São Paulo 1x1 Ajax
Amistoso Internacional
Data: 10 de junho de 1997
Estádio: Cícero Pompeu de Toledo (Morumbi)
Público: 7.342
Árbitro: Oscar Roberto de Godói
Gols: Wooter, aos 73', e França, aos 81'.
São Paulo: Rogério Ceni; Cláudio (Alberto), Rogério Pinheiro, Bordon e Serginho; Axel, Belletti, Luis Carlos (Edmílson) e Fábio Aurélio; Marques (França) e Dodô. Técnico: Dario Pereyra.
Ajax: Fred Grim; Mario Melchiot, Danny Blind (Nordin Wooter), Arno Splinter e Winston Bogarde; Richard Knopper, Richard Witschge, Martijn Reuser e Dennis Schulp (Kizito "Kiki" Musampa); Marc Overmars e André Hoekstra (Dave van den Bergh). Técnico: Louis van Gaal

3 comentários:

  1. Nossa! Bela matéria Felipe! Quanto ao amistoso, na minha opinião teria tido mais valor se tivesse contado com a participação de Edwin Van der Sar como titular. Teria sido o único confronto entre os dois goleiros de que mais gostei. Ceni e Van der Sar.

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  2. Eu, meus irmãos e meu pai eestavamos entr as 7.342 pessoas do jogo.

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