Qazaishvili é apontado por todos como o grande destaque do Vitesse (Maurice van Steen/VI Images) |
Quando o georgiano Merab Jordania comprou o Vitesse e tornou-se presidente do clube, em 2010, a intenção era clara: tornar o clube de Arnhem capaz de vencer o Campeonato Holandês já em 2015, trazê-lo às competições europeias com certa frequência etc. Não obteve muita confiança. O que era bem justo, porque Jordania não era daquelas pessoas cujo histórico inspira confiança (até preso fora, duas vezes, em 2003 e 2005); e porque de ascensões e quedas velozes de clubes guiados por mecenas o futebol está cheio, como Twente e ADO Den Haag estão provando.
Em meio a muitas brigas internas, Jordania vendeu suas ações do Vitesse àquele de quem era testa-de-ferro (o russo Alexander Chigrinsky), e largou o clube em 2013. Poderia ser o ponto de início da queda célere rumo ao abismo. Não está sendo. Porque o ambiente interno dos Arnhemmers foi pacificado com essa mudança. Sorte do time, que se manteve na metade de cima da tabela e confirma outra boa campanha no Campeonato Holandês: na rodada passada, superou o Heracles Almelo e chegou à quarta posição, com 31 pontos, ocupando a posição de “melhor do resto” na liga.
E é possível dizer que os aurinegros mostram, atualmente, o melhor futebol da Holanda, se o critério usado for a ofensividade. Bem escreveu o site catenaccio.nl (aqui, a tradução em inglês, do blog Benefoot), no ano passado: se o futebol holandês, totalmente desorientado em termos táticos na atualidade, ainda aposta nos cânones do Futebol Total - marcação por pressão, variação de posições, encurtamento de espaços ao adversário -, o time que mais os apresenta em campo é o de Arnhem.
Não chega a ser novidade ver boas campanhas do Vitesse. No ano passado, o time foi aos play-offs por vaga na Liga Europa, e ganhou a vaga (caiu para o Southampton na terceira fase preliminar, mas aí é outra história); em 2013/14, chegou até a sonhar com o título, mas contentou-se com um sexto lugar razoável e nova participação nos play-offs. Todavia, agora o Vites mostra diferenças em relação a essas temporadas. Se há duas temporadas, era clara a dependência excessiva de Wilfried Bony no ataque, agora a equipe sabe criar mais jogadas ofensivas, e mostra mais velocidade em campo.
Isso possibilita à equipe de Arnhem fazer jogos muito renhidos contra os times grandes. Mesmo tendo perdido para o Ajax em casa (3 a 1, na 10ª rodada), a equipe ficou por muito tempo na frente do placar, e pressionou bem mais o líder da Eredivisie. Contra o PSV, na 15ª rodada, a mesma coisa: criou chances, deu trabalho ao goleiro Jeroen Zoet... mas tomou o gol da vitória dos Boeren no último minuto do jogo.
Entretanto, contra os adversários de nível igual ou pior, o estilo trouxe bons resultados. Basta ver o que ocorreu nas partidas contra times que disputam vaga nos play-offs pela Liga Europa. Duas goleadas seguidas, contra Groningen (5 a 0, 8ª rodada) e Zwolle (5 a 1, 9ª rodada); contra o NEC, vitória simples, por 1 a 0; e contra o Heracles Almelo, empate por um gol.
A velocidade ofensiva, na verdade, só se justifica pela solidez defensiva do Vitesse. Já há algumas temporadas, Eloy Room é considerado um dos melhores goleiros da Eredivisie: elástico e seguro, deixou no banco o experiente Piet Velthuizen. E ainda foi convocado por Patrick Kluivert para defender a seleção de Curaçao, quando o ex-atacante tornou-se treinador dos curaçalinos. Na zaga, a linha de quatro defensores atua de modo tão entrosado que nem mesmo as mudanças ocorridas nos jogadores a perturbam. Se Jan-Arie van der Heijden tomou o caminho do Feyenoord, Arnold Kruiswijk tomou o posto de jogador básico no setor; se Guram Kashia caiu de produção, Maikel van der Werff veio do Zwolle e tomou o lugar do georgiano, antigo capitão do time. E sem grandes alterações no modo de jogar, a defesa se fez notar, também: tomou 17 gols no campeonato, número só maior do que os 11 gols sofridos pelo líder Ajax.
Mas é na montagem de meio-campo e ataque que se justifica a ascensão do Vitesse. O que começa como 4-3-3 transforma-se num interessante 4-2-1-3. Os volantes Sheran Yeini e Marvelous Nakamba fazem trabalho de marcação dedicado o suficiente para liberar Valeri Qazaishvili. E “Vako” tornou-se um dos destaques da Eredivisie: não só cria muitas das jogadas ofensivas, mas também chega ao ataque para finalizar. O que só ajuda outros dois destaques do ataque, bons na conclusão: o albanês Milot Rashica e o inglês Dominic Solanke. Justamente os três principais goleadores do Vitesse na Eredivisie: Rashica e Qazaishvili têm sete gols, Solanke marcou cinco.
Solanke, aliás, é símbolo de um dos principais pontos que auxilia o Vitesse: a manutenção das ligações “oficiosas” com o Chelsea. Merab Jordania pode ter saído, mas Alexander Chigrinsky também é amigo de Roman Abramovich. Sendo assim, continuam frequentes os empréstimos de jovens para ganharem ritmo na Holanda antes de voltarem a Stamford Bridge. Atualmente, Solanke é o grande destaque, mas também são frequentes no time o volante Lewis Baker e o atacante Isaiah “Izzy” Brown. Sem ter aproveitado muito as poucas chances que teve, o brasileiro Nathan acabou sendo eclipsado pelo trio de ingleses no elenco principal.
Contudo, a pausa de inverno trouxera uma incógnita indesejável: Peter Bosz, técnico da equipe desde 2013, aceitou proposta do Maccabi Tel Aviv e foi treinar o vice-líder do campeonato israelense. Primeiramente interino, o auxiliar Rob Maas logo foi efetivado, mas ficava a dúvida sobre o impacto da mudança. A julgar pela primeira rodada do returno, ele inexistiu. A vitória categórica sobre o Cambuur, penúltimo colocado (2 a 0), fez o Vitesse superar o Heracles atingido em cheio não só pela saída de Oussama Tannane, mas também pela goleada no clássico contra o Twente (4 a 0).
Agora, jogando contra o líder Ajax neste sábado, os Arnhemmers podem comprovar se têm estofo para desafiar o Trio de Ferro neste returno e seguirem sendo “os melhores do resto” no Campeonato Holandês. Capacidade para isso, mostram ter.
(Coluna originalmente publicada na Trivela.com, em 22 de janeiro de 2016)
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