quarta-feira, 24 de março de 2021

Coisas que acontecem - e não deviam

Azar em algumas jogadas, culpa própria em outras. E a Holanda já começa as eliminatórias da Copa do Mundo tendo com que se preocupar (Thomas Bakker/Pro Shots)

Quando foram sorteados os grupos das eliminatórias europeias para a Copa do Mundo de 2022, foi relativamente unânime: o grupo em que a seleção masculina da Holanda caíra era traiçoeiro, com Turquia e Noruega oferecendo alguma dificuldade. Mas que, se a Laranja tivesse atenção e jogasse o que tem capacidade para jogar, poderia chegar à Copa. Pelo menos na estreia, contra a Turquia, fora de casa, no entanto, certas coisas aconteceram, por erros ou por acidente. Por elas, a Laranja começou a qualificação com muita preocupação, por causa da derrota por 4 a 2 em Istambul.

Curiosamente, o jogo no Olimpic Atatürk começou dando a impressão de que a equipe neerlandesa seria superior. Tanto que, já aos 2', Memphis Depay recebeu de Donyell Malen e já fez o goleiro Ugurcan Çakir trabalhar. Se atacava mais, a seleção visitante obviamente tinha mais gente no campo de ataque. Eis o problema: a marcação para contra-ataques ficou muito prejudicada. Prato cheio para uma Turquia firme na defesa - e contando com o iluminado dia de Burak Yilmaz. Prova disso foi o lance do primeiro gol turco, aos 15': imediatamente após jogada aérea em que se pediu pênalti em Malen, um contragolpe, Hakan Çalhanoglu passou, Yilmaz bateu de fora, a bola desviou em Matthijs de Ligt e dificultou bastante a situação de Tim Krul, indo direto para o canto direito. O desvio aconteceu por azar; a falha defensiva, nem tanto.

Foi o bastante para a Holanda revelar um problema crônico: muita posse de bola e pouca efetividade. A competência para superar a firme linha de cinco na defesa turca - os quatro defensores, mais o recuo de Okay Yokuslu (em ótima atuação, indo e voltando rapidamente) - era quase nenhuma. E quando havia chance de chute, Çakir agia: o goleiro turco pegou um chute perigoso de Malen aos 20', e agarrou cobrança de Memphis aos 27'. Ao mesmo tempo, nas raras vezes em que ousava, a seleção da casa seguia achando espaço livre no meio. Marten de Roon estava lento na volta para a defesa, tanto De Ligt quanto Daley Blind se atrapalhavam no miolo... e quem queria ajudar, atrapalhava. Foi o caso de Malen: tentando voltar para ajudar na marcação aos 34', acabou cometendo pênalti, que Yilmaz converteu para o 2 a 0 da Turquia. Já era um grande problema - e azares como o cabeceio de De Ligt bater na trave, aos 45' (houve reclamação de que a bola teria circulado atrás da linha), não ajudavam.

Um gol de fora da área, outro de pênalti, outro de falta: Burak Yilmaz voltou a dar dor de cabeça à Holanda (EPA)

Bastou o segundo tempo começar, e com 33 segundos de bola voltando a rolar, Çalhanoglu fazia 3 a 0 - o chute foi preciso, no canto esquerdo, mas Krul pareceu mal posicionado. E a partida parecia perdida, para uma Holanda desanimada, que só chegou perto do gol aos 58' (cobrança de falta do esforçado Steven Berghuis), e ainda viu o gol de Ozan Tufan aos 63' só impedido pelo bloqueio preciso de De Ligt. Uma grande mudança era necessária. Ela veio. Primeiro, com a entrada de Luuk de Jong, fazendo com que o velho e bom "abafa" se antecipasse, com cada vez mais cruzamentos para a área. Depois, com as vindas de Ryan Gravenberch e Davy Klaassen: a dupla do Ajax tornou o meio-campo mais rápido e ativo em campo.

Talvez por isso, vieram os gols que devolveram a esperança de reação à Laranja. Klaassen aos 74', em bonita jogada: recebeu já ajeitando o corpo, e finalizou muito bem. Dois minutos depois, Luuk de Jong diminuiu para 3 a 2, desviando cobrança de falta ao partir para dividir a bola com Çakir e se antecipar ao goleiro. Mas justamente aí, quando a Holanda fazia o que precisava fazer e começava a pensar em arrancar um ponto, para compensar tanta posse de bola, Burak Yilmaz mostrou o tamanho da importância no time da Turquia: aos 81', o capitão da equipe da casa cobrou falta com precisão para o 4 a 2, esfriando de vez os visitantes. Quando tentaram de novo, na reta final, aí Çakir mostrou seu valor. Defendendo chutes de Luuk de Jong, de Patrick van Aanholt (vindo para ser ainda mais ofensivo do que Owen Wijndal já tentara ser, sem sucesso, na lateral esquerda)... e principalmente, agarrando o pênalti que Memphis Depay bateu, já nos acréscimos.

Klaassen entrou e, pelo menos, ajudou a Laranja a ter alguma esperança em Istambul (Pro Shots/Thomas Bakker)

E ficou no placar uma derrota preocupante. Não só o ataque mostrou excessiva dependência de Memphis Depay (que começou bem, mas decaiu com o jogo), como a defesa sofreu com a lentidão do meio e a insegurança demonstrada por Krul no gol. Com isso, aumentam ainda mais as dúvidas crônicas sobre o trabalho de Frank de Boer. Nada está perdido: foi a primeira de dez rodadas, os próximos adversários são plenamente acessíveis - Letônia e Gibraltar -, ainda há possibilidade da Holanda reagir. Ainda assim, já voltam os temores da Laranja ficar fora de outra Copa. Por coisas que acontecem, seja por azar ou por erros. Mas não deviam acontecer. Nem uma, nem outra.

Eliminatórias para a Copa de 2022 - Europa
Turquia 4x2 Holanda
Data: 24 de março de 2021
Local: Olimpic Atatürk (Istambul)
Juiz: Michael Oliver (Inglaterra)
Gols: Burak Yilmaz, aos 15', 34' e 81', e Hakan Çalhanoglu, aos 46'; Davy Klaassen, aos 74', e Luuk de Jong, aos 76' 

Turquia
Ugurcan Çakir; Zeki Çelik, Ozan Kabak, Caglar Söyüncü e Umut Meras; Okay Yokuslu; Kenan Karaman (Kaan Ayhan), Ozan Tufan (Taylan Antalyali) e Hakan Çalhanoglu (Enes Ünal); Burak Yilmaz (Deniz Türüç) e Yusuf Yazici (Caner Erkin). Técnico: Senol Günes

Holanda
Tim Krul; Kenny Tete (Denzel Dumfries), Matthijs de Ligt, Daley Blind (Ryan Gravenberch) e Owen Wijndal (Patrick van Aanholt); Marten de Roon (Luuk de Jong), Frenkie de Jong e Georginio Wijnaldum; Steven Berghuis, Memphis Depay e Donyell Malen (Davy Klaassen). Técnico: Frank de Boer


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