terça-feira, 2 de agosto de 2022

A Holanda nas Copas masculinas: 1978 - (Não) Foi a mesma coisa

Como em 1974, a Holanda foi vice-campeã na Copa do Mundo. Mas em 1978, ela teve um caminho cheio de turbulências (ANP Archief)

(Aqui, antes de mais nada, um texto mais completo e profundo sobre a participação da Holanda na Copa de 1978)

A Holanda impressionara na Copa de 1974 - até inesperadamente, diante de todas as atribulações dos meses anteriores. Quatro anos depois, a princípio, o desempenho da Laranja poderia ser considerado tão honroso quanto no Mundial da Alemanha: afinal de contas, repetiu-se o vice-campeonato, consolidando que o país passara para o primeiro escalão do futebol mundial, pelo menos naquela época. E o segundo lugar obtido pelos Países Baixos na Copa de 1978 também chegou de modo surpreendente, de certa forma. No entanto, se o resultado foi o mesmo, a forma não foi: a campanha foi menos embasbacante, as dificuldades foram maiores, a Holanda oscilou muito ao longo dos seus sete jogos na Argentina.

É correto dizer que as oscilações ficaram de fora da campanha nas eliminatórias: com cinco vitórias e um empate contra Bélgica, Islândia e Irlanda do Norte, no grupo 4 da qualificação europeia, a vaga para a Copa foi conquistada tranquilamente. Elas começaram junto ao início do ano do Mundial. Primeiro, com o que já se sabia: Johan Cruyff até atuou nas eliminatórias, mas ficaria de fora da Copa, por uma decisão pessoal que despertou várias teorias de motivo (protesto contra o governo militar argentino, protesto contra a premiação baixa que a federação holandesa ofereceria por resultado - até que o próprio Cruyff explicasse, anos mais tarde, que desejava ficar com a família, após ela ser vítima de um sequestro-relâmpago). Depois, já em 1978, a troca de técnico: Jan Zwartkruis, que comandara a Laranja na qualificação, foi "rebaixado" a auxiliar do austríaco Ernst Happel, campeoníssimo com o Feyenoord - mas contestado por parte do grupo, em razão de seu autoritarismo.

Houve mais problemas no caminho dos Países Baixos até aquela Copa. Cerca de duas semanas antes da viagem à Argentina, país-sede, Wim van Hanegem decidiu deixar o grupo de convocados que já treinava: sem garantias de que seria titular, Van Hanegem preferiu abrir mão do lugar na Copa. Uma vez já no quartel-general da Laranja na Copa - o afastado Gran Hotel Potrerillos, a 60 quilômetros de Mendoza -, Hugo Hovenkamp foi outra baixa forçada, desta vez por lesão. E o clima sob o comando de Ernst Happel estava cada vez mais tenso. Por isso, mesmo com vários remanescentes de 1974 - Jan Jongbloed no gol; Wim Rijsbergen e Ruud Krol na defesa (aliás, de lateral direito no vice-campeonato de quatro anos antes, Krol jogava como um tremendo zagueiro, dos melhores do mundo em 1978); Johan Neeskens, Wim Jansen e os gêmeos Van de Kerkhof (Willy e René) no meio-campo; Johnny Rep e Robert Rensenbrink no ataque.

Rensenbrink foi um dos únicos da Holanda a já mostrar alto nível desde a fase de grupos (Fotocollectie/Anefo)

Rensenbrink já despontou como o melhor jogador holandês na Copa na primeira fase de grupos: fez os três gols dos 3 a 0 no Irã, na estreia. Contudo, um 0 a 0 contra o Peru, em ótima atuação da Albirroja, já dificultou um pouco a situação da Laranja. E no último jogo da fase inicial, contra a Escócia, sérios riscos foram corridos: os escoceses chegaram a estar com vantagem de 3 a 1, e pelo saldo, mais um gol deles deixaria a Holanda fora da Copa, pelo maior número de gols pró do adversário. Mas Johnny Rep chutou, de longe, diminuindo a derrota para 3 a 2 (o outro gol holandês, de Rensenbrink, foi o 1000º da história das Copas). Mesmo perdendo, a Holanda estava classificada. Mas precisava mudar. A segunda fase - também em grupos, como na Copa de 1974, com os vencedores fazendo a final - não podia ser a mesma coisa.

E não foi. Primeiro, a federação forçou uma perda de poder de Ernst Happel: bem melhor relacionado com os jogadores, o auxiliar Jan Zwartkruis passou a ter mais influência. Depois, vieram algumas mudanças na escalação: jogadores mais jovens, como o lateral Jan Poortvliet e o zagueiro Ernie Brandts, ganharam espaço com a lesão de nomes mais experientes. E o aspecto ofensivo, aliado ao espírito de luta, mostrou uma outra Holanda. Que já recuperou respeito com o 5 a 1 sobre a Áustria, estreia na segunda fase. Depois, no clássico contra a Alemanha, repetição da rival de 1974, a Laranja mostrou poder de reação: ficou atrás por duas vezes no placar, e buscou o empate em 2 a 2. Melhor ainda no jogo que definiu a chegada à final da Copa: os holandeses saíram atrás contra a Itália, mas viraram para 2 a 1 em grande estilo, incluindo o gol da vitória, de Haan - grande chute de fora da área.

Na final, contra a Argentina, bem que a Holanda se esforçou de novo. Num jogo truncado e ríspido, cheio de violência, a equipe europeia também bateu, quase tanto quanto levou. Aos poucos, uma mudança tática (apostar em cruzamentos, com a entrada de Dick Nanninga) fez a Holanda melhorar, e empatar ainda no tempo normal. Mais ainda: a virada quase veio, nos acréscimos, com um toque de Rensenbrink na trave. E na prorrogação, usando da motivação que a torcida lhe trazia no Monumental de Núñez, a Argentina conseguiu a vitória por 3 a 1. Se servia de consolo, a Holanda mostrara espírito de luta, e poderia sair despercebida de um ambiente altamente tenso como estava a Argentina da época. Mas, novamente, era vice-campeã. 

Ou seja: o final foi o mesmo da Copa de 1974. Mas o caminho da Holanda até ele não foi.

E só as memórias intensas daquela geração conduziriam a Laranja, que viveu no ostracismo durante os anos 1980, fora das Copas daquela década. Até outra geração surgir...

Os convocados da Holanda para a Copa de 1978

Goleiros
8-Jan Jongbloed (Roda JC) - 5 jogos, 6 gols sofridos
1-Piet Schrijvers (Ajax) - 3 jogos, 4 gols sofridos
19-Pim Doesburg (PSV) - não jogou

Defensores
5-Ruud Krol (Ajax) - 7 jogos
2-Jan Poortvliet (PSV) - 5 jogos
22-Ernie Brandts (PSV) - 4 jogos, 1 gol, 1 gol contra
20-Wim Suurbier (Schalke 04-ALE) - 4 jogos
17-Wim Rijsbergen (Feyenoord) - 3 jogos
4-Adrie van Kraay (PSV) - 2 jogos
7-Piet Wildschut (Twente) - 1 jogo
15-Hugo Hovenkamp (AZ)*

Meio-campistas
11-Willy van de Kerkhof (PSV) - 7 jogos, 1 gol
10-René van de Kerkhof (PSV) - 7 jogos, 1 gol
6-Wim Jansen (Feyenoord) - 7 jogos
9-Arie Haan (Anderlecht-BEL) - 6 jogos
13-Johan Neeskens (Barcelona-ESP) - 5 jogos
3-Dick Schoenaker (Ajax) - 1 jogo
14-Johan Boskamp (Molenbeek-BEL) - 1 jogo

Atacantes
12-Robert Rensenbrink (Anderlecht-BEL) - 7 jogos, 5 gols
16-Johnny Rep (Bastia-FRA) - 7 jogos, 3 gols
18-Dick Nanninga (Roda JC) - 4 jogos, 1 gol
21-Harry Lubse (PSV) - não jogou

Técnico: Ernst Happel

*Lesionado, Hovenkamp foi cortado com a Copa já em andamento. Por isso, deixou a seleção da Holanda com 21 jogadores

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