sábado, 30 de setembro de 2017

Acostumando-se à decadência

O futebol holandês está assim como o Feyenoord deixou o campo em Nápoles, na terça passada: desalentado e desanimado (feyenoord.nl)

É possível apontar que a crise do futebol holandês não começou neste ano. Nem no passado. Nem no retrasado. Na verdade, há pelo menos dez anos fica claro como os clubes do país estão perdendo terreno – basta citar que, na temporada 2007/08, o Ajax já havia cometido o mesmo vexame desta temporada, ao cair tanto na terceira fase preliminar da Liga dos Campeões (para o Slavia Praga) quanto na primeira fase da antiga Copa Uefa (para o Dinamo Zagreb). Entretanto, pelo que se está vendo atualmente, também é possível dizer: poucas vezes as esperanças no futebol holandês foram tão escassas como são agora.

Com dezesseis partidas jogadas até agora nas competições continentais, entre as fases preliminares e as fases de grupos, os representantes da Holanda venceram apenas... duas. E o responsável pelos triunfos foi um médio, o Utrecht (3 a 1 no Valletta, de Malta, na segunda fase preliminar da Liga Europa; e 1 a 0 no Zenit, pelos play-offs por vaga na fase de grupos). De resto, cinco empates e nove derrotas. Apenas 12,5 por cento de aproveitamento. E pelo que se viu nas segundas rodadas das chaves de Liga dos Campeões e Liga Europa, a tendência é continuar assim.

Em Nápoles, o Feyenoord já começou com sua defesa atrapalhada pelo destino. No final de semana passado, Eric Botteghin lesionou os ligamentos do joelho (ficará fora dos campos até o fim da temporada); e justamente no aquecimento para pegar o Napoli, em pleno gramado do San Paolo, Jan-Arie van der Heijden rompeu um músculo de sua panturrilha (desfalcará o Stadionclub por seis semanas). 

Com uma defesa reserva – Jerry St. Juste e Renato Tapia -, contra um Napoli sempre veloz e marcando a partir da saída de bola, não foi de se impressionar que o 1 a 0 de Lorenzo Insigne tenha vindo de uma falha na saída de bola. Aliás, sair atrás no placar com precocidade, outra vez, fez a torcida temer por uma goleada como a do Manchester City, na primeira rodada. Ela não aconteceu, porque o time se recompôs suficientemente. Mas o 3 a 1 foi até pouco para a superioridade napolitana. E é de se pensar se o Feyenoord será páreo até para um Shakhtar Donetsk que tem feito jogo duro, com a vitória sobre os Partenopei e a derrota magra para o Manchester City.

Nesta quinta, pela Liga Europa, a situação foi ainda mais melancólica. Até porque o Vitesse começou pressionando o Nice, nos primeiros minutos, principalmente com jogadas pelas pontas, nas quais Milot Rashica era quem mais aparecia. Até que, aos 16 minutos da etapa inicial, numa cobrança de escanteio, um desvio de Dante serviu para iludir toda a defesa do Vites, e Alassane Pléa ficou livre para o 1 a 0 do time francês. O jogo estava encaminhado: tal gol abateu a equipe de Arnhem, que pouco apareceu no ataque depois. E as falhas defensivas seguiram. Como no segundo gol, já nos acréscimos do primeiro tempo, quando Allan Saint-Maximin viu o caminho aberto pela péssima marcação de Alexander Büttner na lateral esquerda, avançando até o 2 a 0. O terceiro gol – de novo, Pléa – só serviu para piorar o desalento.

Pela lista de coeficientes da Uefa na temporada, a Holanda está no 34º lugar. Alguém que olhe o copo “meio cheio” dirá que é um índice melhor que o de Bélgica e Hungria. No entanto, consegue ser pior que o de Liechtenstein, Lituânia, Bielorrússia e Cazaquistão. Além do mais, na classificação unindo os índices das últimas cinco temporadas, a Holanda não só fica distante da Turquia (10ª colocada), mas também corre risco de perder sua posição para Áustria, Grécia, República Tcheca... 

Enfim, poucas vezes o futebol holandês teve um cenário interno tão desanimador. O pior é que, ao invés de sentir a forte necessidade de melhorar, o que parece haver no país é a crença de que o destino é mesmo a célere decadência, sem chance nenhuma de reação (ou a profunda descrença de que um dia as coisas podem mudar). Símbolo disso foram os resultados da sexta rodada do Campeonato Holandês, na qual ficou claro o equilíbrio por baixo que a Eredivisie encara. O Feyenoord liderava, mas protagonizou um vexame: sofreu a primeira derrota em casa de sua história para o NAC Breda – 2 a 0, em pleno De Kuip, de onde não saía com um revés desde janeiro de 2016.

Tal revés abriu caminho para PSV e AZ alcançarem a liderança da liga. Mas o time de Alkmaar também fracassou: perdeu por 2 a 0 para o Excelsior, também em casa. O PSV conseguiu uma goleada por 7 a 1, até impressionante: não pelo seu nível técnico, mas porque nada dava a imaginar que o Utrecht se renderia tão facilmente na reta final da partida. E se o Vitesse devia uma reação à sua torcida, após o vexame na Copa da Holanda, conseguiu fazê-lo com juros e correção monetária: ganhou do Ajax (2 a 0) em plena Amsterdam (até 25 de outubro) Arena, na primeira derrota que os Ajacieden sofreram em casa desde agosto do ano passado. A decepção foi tamanha que até cogitou-se demissão de Marcel Keizer pelos lados de Amsterdã – por enquanto, fica.

Enfim, clubes jogando com um estilo tático antiquado, dando espaços e mais espaços. Um campeonato cada vez pior de se ver. E nada leva a crer que a Holanda fará a necessária autoavaliação a curto prazo. Pelo visto, a decadência dos times do país vive seu capítulo mais dramático. Como se não bastasse a seleção, que deverá viver, dentro de duas semanas, seu ponto mais baixo em 30 anos.

(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 29 de setembro de 2017)

Nenhum comentário:

Postar um comentário