Ainda que tenha feito uma campanha irretocável nas eliminatórias da Euro-2021-que-virou-2022 (dez vitórias em dez jogos), a seleção feminina da Holanda (Países Baixos) deixou em 2020 uma pulga atrás da orelha de quem a acompanhou no empolgante 2019 que fizera. Mesmo vice-campeã mundial, teve atuações apenas corretas na campanha de qualificação para a Euro na qual defenderá o título. Quando encararam seleções do mesmo tamanho, as Leoas Laranjas decepcionaram: empates contra Brasil, Canadá e França (torneio amistoso, em março), e uma derrota para os Estados Unidos (2 a 0, amistoso em novembro), com atuação até pior do que tivera contra as americanas na final da Copa. Ficava, então, a dúvida: como viria a seleção para os primeiros amistosos deste 2021 olímpico, por ora, contra Bélgica - sexta passada, em Bruxelas - e Alemanha - nesta quarta-feira, em Venlo?
Pois a Holanda começou o ano bem, muito bem. Contra a Bélgica, adversária regional, a vantagem no retrospecto já fazia crer num bom desempenho (de 30 jogos, a Holanda vencera as "Chamas Vermelhas" em 22). De quebra, mesmo se valendo da escalação costumeira - e contestada em alguns casos, como na escalação de Daniëlle van de Donk, criticada pelas atuações no Arsenal -, Sarina Wiegman fez uma opção interessante ao colocar Jill Roord na ponta-direita, substituindo Shanice van de Sanden, habitual titular e ausente da convocação por razões familiares. Na defesa, sem a lesionada Dominique Janssen, Lynn Wilms dividiu o miolo de zaga com Stefanie van der Gragt.
Pois deu certo. Os nomes podiam até ser os mesmos - Jackie Groenen, Sherida Spitse, Vivianne Miedema, Lieke Martens... -, mas a Holanda mostrou uma velocidade maior já contra a Bélgica. Antes mesmo que Miedema fizesse 1 a 0, aos 33', Jill Roord já acertara chutes no travessão. Porteira aberta, viu-se o esperado quando as holandesas jogam bem entre meio e ataque: trocas de passes, chegadas velozes, muitos gols. Sim, a Bélgica chegou a assustar quando Marie Minnaert diminuiu para 2 a 1. Mas a reta final do jogo mostrou qualidades já conhecidas: a ajuda das meio-campistas no ataque (assim Van de Donk fez um belo gol, de calcanhar, aos 81'), o valor de Van der Gragt no jogo aéreo (assim a zagueira marcou o quinto gol: de cabeça), a utilidade de Lieke Martens quando tem velocidade e a bola nos pés (fez um gol, e marcou outros tantos).
O dinamismo maior mostrado por Martens e Van de Donk foi uma das razões para celebração na goleada das Leoas Laranjas sobre a Bélgica (Reprodução/One Football) |
Já valeu para atrair elogios - quando nada, porque a Bélgica será tão participante da Euro 2022 quanto a Holanda. Mas ficava a dúvida: como a representação dos Países Baixos jogaria diante da Alemanha, adversária bem mais respeitável (ainda que ausente do torneio olímpico que ocorrerá em Tóquio), contando com craques como Alexandra Popp e Dzsenifer Marozsán? Pois as Leoas Laranjas ressaltaram as razões para otimismo dadas contra a Bélgica. Começaram mais ofensivas em Venlo, já acertando a trave com Roord aos 4', e enfim fazendo 1 a 0 aos 16' numa boa jogada ofensiva: Spitse lançou, Miedema ajeitou, Groenen finalizou com chute forte. De quebra, exigiram muito trabalho da goleira Merle Frohms, que vitou gols de Miedema e Martens (35') e Van de Donk (40').
O porém foi o de sempre: a fragilidade do miolo de zaga. Nele veio o gol de empate, aos 44', com Klara Bühl livre para cruzar e Laura Freigang livre para completar. De quebra, no segundo tempo, com as neerlandesas cansadas, a Alemanha chegou bem mais perto do gol: Marozsán aos 53', Bühl aos 57', Svenja Huth aos 69'... em todas essas chances, destacou-se a goleira Lize Kop. Reserva contra a Bélgica (Sari van Veenendaal foi titular, como de costume), Kop recebeu talvez a grande chance desde que começou a ser convocada para a seleção feminina. Mostrou força física, explosão e destemor nas saídas de gol. E se consolidou como a principal reserva entre as goleiras. Até porque a veterana Loes Geurts, que fora convocada após grave concussão cerebral, foi novamente cortada por lesão.
Lize Kop recebeu chance valiosa no gol dos Países Baixos - e mostrou qualidades (Laurens Lindhout/Soccrates/Getty Images) |
De quebra, quando tinha a bola no ataque, a Holanda seguia trazendo tanto perigo quanto a Alemanha. E conseguiu, com dificuldades, o gol da vitória, aos 60' - Groenen chutou no travessão, e só aí Van de Donk, de estatura baixa, conseguiu marcar de cabeça, no rebote. Com duas vitórias, as Leoas Laranjas venciam o triangular amistoso para celebrar a candidatura tripla das três nações (Países Baixos, Alemanha e Bélgica) a sediar a Copa do Mundo feminina em 2027. Comprovaram, em campo, o que Sherida Spitse celebrou após o apito final: "As alemãs jogam mais com a bola nos pés, se mexem muito - diferente, por exemplo, das norte-americanas, que se valem mais da força física. Podemos nos orgulhar".
Iniciando seus últimos meses à frente da seleção feminina antes de tomar o rumo da Inglaterra, Sarina Wiegman também comemorou o acerto, mais do que nas mudanças táticas, na mudança de postura do time: "Em alguns momentos, deu muito certo". Ainda há muito tempo. Sequer há certeza de que o torneio olímpico de futebol feminino efetivamente ocorrerá. Mas o fato é que, se a Holanda precisava ressaltar que merece respeito, começou fazendo isso muito bem em 2021, com uma reação promissora.
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