quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Eredivisie feminina: quando virá o equilíbrio?

Não adianta: os outros clubes tentam, mas ainda não houve desafiante a perturbar o domínio do Twente no Campeonato Holandês (Gerrit van Keulen/AFP/Getty Images)

Era possível esperar que o PSV reagisse, após uma temporada altamente decepcionante em 2022/23. Era possível esperar um salto de desempenho de Feyenoord e ADO Den Haag, que fizeram campanhas dignas - e até promissoras - no Campeonato Holandês feminino passado. Era mais possível ainda pensar que o Ajax, tantos investimentos depois, enfim voltasse a ser um concorrente de peso, que fizesse frente. De nada adianta. Por mais que a liderança seja numa margem alcançável - três pontos à frente do Ajax -, o Twente continua imperturbável na primeira posição da Vrouwen Eredivisie, que volta nesta sexta-feira, com o início da 12ª rodada.

Pois é: o domínio dos Tukkers é até maior do que sugere sua vantagem na ponta. Em 10 jogos, 10 vitórias. 47 jogos, só dois gols sofridos. Um time absolutamente entrosado, com duas fortes candidatas a novos símbolos - se é que são só candidatas - do futebol feminino na Holanda (Países Baixos): a goleira Daphne van Domselaar, titular absoluta da seleção, e a atacante Fenna Kalma. Esta é quase um caso à parte: goleadora do campeonato passado, com 33 gols em 24 jogos, Kalma promete repetir a dose, já tendo 16 bolas na rede em 10 jogos. Pelos critérios da IFFHS (Federação Internacional de História e Estatística do Futebol), ela foi a maior artilheira do futebol feminino mundial em 2022: marcou 45 tentos.

Fenna Kalma: goleadora antes, goleadora agora (Rico Brouwer/Soccrates/Getty Images)

Mas a força do Twente, conforme supracitado, é seu entrosamento. Que une jogadoras novatas e já conhecidas, como Caitlin Dijkstra e Marisa Olislagers, à experiência indubitável de Renate Jansen - todas elas, fortemente cotadas para estarem entre as 23 convocadas da Holanda (Países Baixos) à Copa do Mundo de mulheres. Jovens? Estão lá e estão bem vistas, também, na lateral direita Kim Everaerts e na zagueira Marit Auée, ambas habitualmente presentes nas seleções neerlandesas de base. Resultado: um time que parece não conhecer desafios insuperáveis em sua liga. Pega o Ajax, o perseguidor habitual? Vitória - 3 a 1, na 9ª rodada, com direito a pênalti pego por Van Domselaar. O Feyenoord, confiável? 1 a 0 fora de casa, na 10ª rodada. E o Fortuna Sittard, surpresa mais agradável? Goleado: 6 a 0, na 11ª rodada, a última do ano passado.

Com tamanho domínio, sem erros até agora na temporada, o desafio do Twente é manter algo que o motive. Em vídeo, o diretor geral do clube, Paul van der Kraan, já estabeleceu um deles, meio na gozação: terminar a temporada invicto. Fez isso elogiando os 100% de aproveitamento até agora: "É maravilhoso. Eu já disse a René [René Roord, diretor técnico do Twente - e para constar, pai de Jill Roord] e ao técnico [Joram Pot]. Eu disse: se está assim no meio do caminho, tem que terminar assim também. Nunca se conseguiu isso na Holanda". Por outro lado, fica difícil haver um parâmetro técnico, como reconheceu Van Domselaar ao jornal De Telegraaf, ainda no fim do ano passado: "Na temporada passada, a gente ganhou do Zwolle por 3 a 1; agora, foi 6 a 0. Pessoalmente, eu esperava jogos mais equilibrados. Para o time, é bom que eu não apareça tanto; para o meu desenvolvimento, é menos bom".

Romée Leuchter desponta no Ajax - como tantas outras, parece uma transferência esperando para acontecer (Patrick Goosen/BSR Agency/Getty Images)

O Ajax que o diga. Afinal de contas, um dos destaques da primeira metade da temporada agora é apenas lembrança: a meio-campista Victoria Pelova, em plena evolução, ganhou uma grande chance com a transferência para o Arsenal-ING. Se serve de consolo, as Ajacieden tiveram desempenho até mais honroso na Liga dos Campeões feminina: fizeram jogo duro nos play-offs por vaga na fase de grupos, antes de serem eliminadas pelo Arsenal. E de todo modo, o time de Amsterdã ainda pode fazer frente ao Twente. Tem Romée Leuchter, outra das badaladas jovens holandesas, outra novata muito próxima de uma transferência para um centro mais competitivo. Tem a inquestionável liderança de Sherida Spitse. Tem Lize Kop, enfim livre das lesões para voltar a ser confiável no gol. Tem Chasity Grant e Tiny Hoekstra, ambas boas coadjuvantes para Leuchter. Só não terá Nikita Tromp: a atacante foi mais uma vítima de rompimento de ligamento cruzado anterior do joelho, no futebol feminino mundial. Ainda assim, o time de Amsterdã parece o mais capacitado para tentar desafiar o Twente.

Há surpresas boas, sim, no Campeonato Holandês feminino. A maior delas, o Fortuna Sittard: para um time que disputa sua primeira temporada na Vrouwen Eredivisie, estar em terceiro lugar já é algo - personificado nas boas atuações da atacante belga Tessa Wullaert, de quem mais se esperava. O ADO Den Haag segue com alguma solidez, no último ano do trabalho do técnico Sjaak Polak. E o Feyenoord vê os destaques habituais - Cheyenne van der Goorbergh, Pia Rijsdijk, Sabine Ellouzi -, e agora terá uma técnica promissora: Jessica Torny, de passagens por todas as seleções de base da Holanda (Países Baixos), preferiu deixar de ser auxiliar de Andries Jonker na seleção principal para dar, no Stadionclub, mais um passo numa trajetória que, muitos creem, terminará com ela treinando as Leoas Laranjas. Todos esses, times coletivamente fortes. Que por isso, desbancam um PSV que continua extremamente decepcionante, tendo o único destaque em Esmee Brugts.

Cenário insuficiente para fazer frente ao Twente que segue dominando o futebol feminino dos Países Baixos - embora sequer tenha estado na fase de grupos da Liga dos Campeões feminina (outro objetivo para os Tukkers). Nada agradável para um país que sediará, aliás, a final da Champions desta temporada, em Eindhoven. Como consolo, as boas jogadoras holandesas continuam surgindo. Até que, uma hora, deixarão a terra natal. É preferível isso, a jogar numa liga nacional em que o equilíbrio continua faltando.

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