segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Agora não houve desculpas

A desilusão de Jeffrey Bruma reflete bem a desilusão da Oranje: ausência da Euro é bem provável (VI Images)

15 de outubro de 2013. Já classificada para a Copa do Mundo, a Holanda ainda tinha um desafio em sua última partida pelas eliminatórias: enfrentar a Turquia, em Istambul, com o adversário sedento pela última chance de ganhar a segunda posição do grupo D, disputada com Hungria e Romênia. Pois bem: naquela que foi a primeira partida de Memphis Depay pela Oranje, a equipe não tomou conhecimento da pressão, e fez tranquilos 2 a 0 nos turcos, acabando com as esperanças de chegarem à Copa. Atuação segura a ponto de merecer aplausos da fervilhante torcida turca ao fim dos 90 minutos.

Um ano, dez meses e 21 dias depois, o cenário é bem diferente. A Holanda enfrentou a Turquia, pelas eliminatórias da Euro 2016. Não mais em Istambul, mas em Konya. E a equipe que levou o jogo como bem quis foi a anfitriã, não mais a Oranje. Algo estampado nos categóricos 3 a 0 do placar, que trouxe o cenário que tanto a torcida temia: cair para a quarta posição do grupo A da qualificação, dois pontos atrás dos turcos, competidores diretos pela terceira posição que leva à repescagem. Em suma: nunca foi tão grande o perigo da Holanda perder sua primeira competição grande desde a ausência na Copa de 2002. 

E se o destino ainda fora um adversário a mais, pela lesão de Robben e a expulsão de Martins Indi que jogaram a partida de quinta passada nas mãos da agora classificada Islândia, agora não houve desculpas holandesas para a atuação ainda pior que se viu na Torku Arena. Danny Blind manteve o 4-3-3 velho de guerra, trouxe Van Persie de volta aos titulares (era necessário), e jogou as fichas na improvisação de Jaïro Riedewald, 18 anos (fará 19 nesta quarta), zagueiro do Ajax, na lateral esquerda.

De nada adiantou. Os mesmos defeitos que são vistos desde a segunda passagem de Guus Hiddink foram repetidos: um time excessivamente espaçado, que permitia a troca de passes entre os turcos - e a fácil marcação dos atacantes. Na parte ofensiva, aliás, as tentativas foram estéreis e repetitivas: apenas esforços de Memphis Depay e Luciano Narsingh pelas pontas, e jogadas nas quais Robin van Persie fazia o pivô para Wesley Sneijder chutar, vindo de trás. Não só o destino era sempre o mesmo (ora a linha de fundo, ora as mãos do goleiro Volkan Babacan), como a atuação apagada de Van Persie e Sneijder faz crer, de fato, que já é hora de pensar a seleção sem suas presenças. E que a geração deles está perto de dizer adeus sem um título. Como tantas outras, de tantos outros craques, no caso laranja.

Na defesa? Novamente, ingenuidades gritantes que facilitaram a vida turca. Com a subida da linha de quatro marcadores, o excessivo avanço de De Vrij ao meio-campo abriu o espaço para que Arda Turan (o melhor do jogo, com apenas 55 minutos em campo) lançasse a bola que Oguzhan Özyakup (nascido em Zaandam, e atleta da seleção holandesa sub-17 no mundial da categoria, em 2009) tocou na saída de Cillessen para abrir o placar. O segundo gol, então, foi ainda pior, com mais erros. 1) Van der Wiel cobrou um lateral para Daley Blind, que estava cercado por turcos; 2) Blind estava "na fogueira", mas perdeu a bola facilmente para Arda Turan; 3) A falha de Cillessen, que deixou passar um chute fraco; 4) A inacreditável preocupação de Jeffrey Bruma com um impedimento - que não existe em cobranças de lateral, como se sabe.

No segundo tempo, com a vitória garantida, a Turquia mostrou porque ganhava. Se estava no 4-4-2, isso não impedia de mostrar proximidade entre seus jogadores, envolvendo facilmente a Oranje em sua marcação. Restou a entrada de Luuk de Jong, para o famoso "abafa", que se revelou infrutífero. E o terceiro gol dos turcos, no fim do jogo, só foi a pá de cal numa Holanda ainda mais desalentadora do que fora contra a Islândia. O abatimento era tamanho que Van Persie só conseguiu dizer: "É terrível". O outro veterano, Sneijder, teorizou: "Talvez estejamos numa fase de muito azar". Danny Blind, de novo, atribuiu o revés a falhas individuais ("A Turquia se aproveitou delas").

Torcida e imprensa, atônitos, são catastróficos. O AD Sportwereld, caderno de esportes do diário  Algemeen Dagblad, foi definitivo na manchete desta segunda: "Fracos demais para a Euro". Dentro, a coluna do ex-jogador Willem van Hanegem foi virulenta contra os jogadores: "Na Oranje há alguns jogadores que só se preocupam com eles mesmos. Memphis é um exemplo, com os sapatos bonitos dele, parece Goldfinger. Do jeito que os jogadores se vestem, parecem ir a um jogo amistoso de bodyboarders. (...) A culpa é toda nossa, colocamos os jogadores num pedestal. Memphis toca a bola de calcanhar e o narrador já exagera. (...) Não quero culpar Danny Blind, é fácil demais".

Com tudo isso, incrível é saber que a Holanda ainda pode muito bem chegar à repescagem. Não é nada irreal voltar à terceira posição do grupo, ao vencer o Cazaquistão e ver a República Tcheca superar a Turquia, na próxima rodada. E os tchecos já fizeram isso uma vez, na fase de grupos da Euro 2004. Para ir às quartas de final, a Oranje precisava vencer a Letônia, e também de uma vitória deles, já classificados, contra a Alemanha. Desconfiava-se da motivação do time de Nedvěd, Poborský e cia, que já tinha a vaga assegurada. Mas fez 2 a 1 e despachou os germânicos da Euro, enquanto a Oranje fez 3 a 0 nos letões e foi às quartas.

Pode até acontecer. Mas não depende mais da Holanda. E ela não anda fazendo por merecer tal sorte dentro de campo.

Um comentário:

  1. Cara, queria saber sua opinião sobre o êxodo de jogadores holandeses saindo muito cedo da Holanda e não se desenvolvendo de forma correta nos clubes onde atuam... Quanto isso tem ou não afetado a seleção, afinal as seleções sub da Holanda ainda tem se classificado com frequência as fases finais dos torneios...

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