Aposta arriscada do Roda JC: a união do acionista Korotaev e a novidade Anelka como conselheiro técnico (Marcel van Hoorn/ANP) |
“Anelka é do Roda”. Calma, Alexandre Kalil não se mudou para Kerkrade, a cidade do mencionado clube holandês (até porque Kalil tem muito a fazer, prefeito belorizontino que se tornou). No entanto, a frase inicial é verdade: o Roda JC é o mais novo empregador do ex-atacante francês, de 37 anos. E é possível dizer que sua chegada, para ser um conselheiro técnico, simboliza que novamente o clube irá apelar para uma situação conhecida nas duas últimas temporadas do Campeonato Holandês: na dificuldade, arrisca-se. Seriamente ameaçado pelo rebaixamento de novo, o Roda contratou nada menos que nove jogadores nesta janela de transferências recém-encerrada.
Até justificável: o clube seguiu exatamente essa receita em 2015/16. Chegou ao final do turno em 15º lugar, a primeira posição fora da zona de repescagem/queda. Aproveitou a pausa do inverno europeu para contratar oito jogadores (quatro por empréstimo, quatro em definitivo). Alguns deles emplacaram: principalmente no meio-campo, com o cazaque Georgi Zhukov, o turco Ugur Inceman e o espanhol Marcos Gullón. E ainda vale a pena mencionar alguns que estavam nos Koempels desde o começo da temporada, como o atacante Maecky Ngombo. Alguns bons resultados vieram, principalmente na parte final da temporada (como o 2 a 1 no NEC, na penúltima rodada, com golaço do meia Tom van Hyfte). E o Roda conseguiu se salvar.
Salvou-se evitando, por sinal, o retorno à segunda divisão que frequentara em 2014/15 – e da qual só saiu nos play-offs, superando o NAC Breda. E se caiu, foi apenas e tão somente por terminar na última colocação em 2013/14 – e já estivera nos play-offs contra a queda, ao terminar em 16º na temporada anterior. Sem contar a persistente ameaça de falência. Ameaça que quase virou fato em meados de 2015, não fosse Frits Schrouff, empresário de Kerkrade e torcedor fanático do “Orgulho do Sul”, que decidiu virar acionista majoritário, comprando 99,8 por cento das ações do clube. O dinheiro que Schrouff investiu permitiu aquela compra “de baciada” na pausa da temporada 2015/16, que deu certo e impediu novo rebaixamento.
Eis que a temporada atual mostra situação semelhante. Em uma disputa altamente equilibrada contra o rebaixamento, o Roda JC terminou o primeiro turno da Eredivisie atual na penúltima posição, apenas um ponto acima do lanterna Go Ahead Eagles. Pior: ficou nove rodadas sem vencer. Pior ainda: entre a 14ª e a 18ª rodada, sequer marcou gols. Para aprofundar ainda mais a crise: a primeira vitória em casa na temporada veio somente há duas rodadas (4 a 0 sobre o Excelsior).
Foi aí que surgiu um novo “salvador da pátria”, como Frits Schrouff já fora. Aliás, o Roda JC já está acostumado a ter alguém com tal papel em sua história, desde os tempos do mecenas Nol Hendriks, conselheiro do clube e diretor técnico entre 1981 e 2006, que não só investia, mas também chegava até a ser “olheiro” do clube (e teve certo êxito – basta lembrar que o Roda foi vice-campeão holandês, em 1994/95).
Neste janeiro de 2017, o “salvador” surgiu na figura de um empresário suíço de ascendência russa, morador de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos: Aleksei Korotaev. Negociando desde outubro para tornar-se acionista minoritário do clube de Kerkrade, Korotaev afinal foi anunciado, em 24 de janeiro. E a história de sua aproximação com o clube aurinegro é daquelas bizarras, esquisitas, tragicômicas. Empresário em sua cidade adotiva, o suíço desejava investir em futebol havia muito tempo. Aí, o “cupido chegou”, na forma de Stijn Janssen, advogado de 44 anos. Outro torcedor fanático do Roda JC, Janssen foi trabalhar justamente em Dubai, após o escritório para o qual trabalha ter aberto uma filial na cidade emiratense.
Lá, trabalhando e acompanhando o Roda JC de longe, Janssen encontrou Korotaev. E o resto, ele contou à revista Voetbal International: “O assunto das nossas conversas era sempre futebol. Falávamos das últimas notícias de transferências, analisávamos jogos a que havíamos assistido. Aleksei é um amante intenso de esportes. Quando jovem, até atuou na base do Servette [clube suíço], mas uma lesão interrompeu seu sonho”. Juntas a fome de Janssen em fazer o clube do coração melhorar com a vontade de comer (e investir em futebol) de Korotaev, bastou o empresário suíço apresentar-se ao conselho e à direção em Kerkrade para ser aceito no ato.
Obviamente, os olhares de esguelha e desconfiança para chegada tão repentina foram gigantescos. O próprio diretor geral do Roda, Wim Collard, reconheceu isso: “É lógico que compreendemos [o ceticismo]”. Porém, em tempos nos quais um clube da Eredivisie sofre cada vez mais com as rusgas entre conselheiros e o mecenas (o ADO Den Haag, já comentado aqui – e agora, aliás, na zona de repescagem/rebaixamento), Collard se apressou em tentar tranquilizar a torcida sobre o temor de Korotaev ser um “para-quedista”: “Acreditem que estamos muito alertas, com os acontecimentos anteriores no futebol. Fizemos nossa lição de casa. (...). As pessoas ligadas ao Roda JC, e a imprensa, podem ter certeza que não definimos isso em uma noite”.
Chegando no final de janeiro, houve tempo para um pequeno aporte financeiro do novo acionista, que permitiu negociações frenéticas, e a chegada às pressas de nove jogadores antes do final da janela. Um deles, o atacante grego Athanasios Papazoglou, chegou para já ser titular absoluto. Outros dois atacantes, Gyliano van Velzen e Simeon Raykov, entraram na rodada passada. Chegaram a Kerkrade ainda o atacante Beni Badibanga; os meio-campistas Stefan Savic, Ognjen Gnjatic e Mohamed El Makrini; e o zagueiro Bryan Verboom - mais o novato Lyes Houri, que foi para a categoria de base.
Todavia, a apresentação que interessava era mesmo a de Aleksei Korotaev. Ocorrida na semana passada, trouxe um cidadão que repetiu clássicos discursos de mecenas, em vários lugares do mundo, em vários momentos: “É um sonho que se torna realidade. Espero ficar ligado a este clube por 50 anos. Em cinco anos, quero ver o Roda jogando a Liga dos Campeões”. Não bastasse isso, havia ainda a surpreendente contratação de Anelka como conselheiro técnico – o francês foi vizinho de Korotaev em Dubai. E o francês também foi rápido para tentar dirimir as desconfianças sobre sua capacidade para o cargo: “Eu acho que posso reconhecer um jogador talentoso. Joguei muito tempo, em vários lugares. Vi muitos jogadores talentosos. Já fiz esse serviço em Xangai, Mumbai e na Argélia”. Korotaev ainda falou sobre o jogo que ocorreria domingo passado: “O Roda vai ganhar do Ajax por 2 a 1”.
Todavia, a apresentação que interessava era mesmo a de Aleksei Korotaev. Ocorrida na semana passada, trouxe um cidadão que repetiu clássicos discursos de mecenas, em vários lugares do mundo, em vários momentos: “É um sonho que se torna realidade. Espero ficar ligado a este clube por 50 anos. Em cinco anos, quero ver o Roda jogando a Liga dos Campeões”. Não bastasse isso, havia ainda a surpreendente contratação de Anelka como conselheiro técnico – o francês foi vizinho de Korotaev em Dubai. E o francês também foi rápido para tentar dirimir as desconfianças sobre sua capacidade para o cargo: “Eu acho que posso reconhecer um jogador talentoso. Joguei muito tempo, em vários lugares. Vi muitos jogadores talentosos. Já fiz esse serviço em Xangai, Mumbai e na Argélia”. Korotaev ainda falou sobre o jogo que ocorreria domingo passado: “O Roda vai ganhar do Ajax por 2 a 1”.
Não deu – embora os Koempels tenham até vendido caro a vitória, no final os visitantes de Amsterdã conseguiram um 2 a 0 que lhes manteve na vice-liderança do Campeonato Holandês. E o Roda JC segue na penúltima colocação do campeonato. É esperar para ver se a brincadeira com a sorte vai, de novo, render a salvação. E, principalmente, se Korotaev será uma fada madrinha fiel ou um príncipe que abandona a gata borralheira.
(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 10 de fevereiro de 2017)
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