As boas atuações do goleiro Jurjus são fundamentais na evolução do De Graafschap para fugir da lanterna (Erik Pasman/ANP) |
A morte de Johan Cruyff abalou tanto a Holanda – e, claro, o futebol holandês – que até os amistosos da seleção ficaram um pouco em segundo plano. E mesmo a ocorrência deles (tanto a desalentadora derrota para a França quanto a vitória surpreendente contra a Inglaterra) fez com que torcida e imprensa “se esquecessem” que há um Campeonato Holandês em disputa.
Pois bem, ele volta a partir deste sábado, com a 29ª rodada. E terá outra partida decisiva. Mas é na parte de baixo da tabela: se o Ajax virou a disputa pelo título ao vencer o PSV em pleno Philips Stadion na rodada anterior (agora, os Ajacieden é que têm dois pontos de vantagem em relação aos Boeren), agora De Graafschap e Cambuur farão o jogo direto para tentarem escapar da 18ª posição, também conhecida como “lanterna”, a única a causar o rebaixamento direto à segunda divisão.
De fato, aparentemente, não causaria grande interesse – cá entre nós, talvez nenhum interesse – a partida entre o último (Cambuur, 16 pontos) e o penúltimo (De Graafschap, 17 pontos) colocados desta Eredivisie. Todavia, os rumos das duas equipes tornaram mais interessante o jogo de abertura da rodada, neste sábado, às 13h30 de Brasília, no estádio De Vijverberg, na cidade de Doetinchem. E pode-se dizer que o De Graafschap, mandante do jogo, é o “responsável” por isso. Afinal de contas, comparado ao turno, o returno dos “Superboeren” mostra uma mudança admirável.
Claro que essa mudança não ocorreu de uma hora para outra. Mesmo nas 17 rodadas iniciais, quando a equipe de Doetinchem conseguiu ridículos 5 pontos, havia mostras de talento aqui e ali. Para começo de conversa: até pela constante exigência de serviço a que é submetido, o goleiro Hidde Jurjus mostra talento, ao somar explosão nas defesas à queima-roupa e calma no posicionamento. Sua média de gols sofridos (1,96 por jogo – foram 55 em 28 jogos) é alta, mas menor do que a dos dois arqueiros do Cambuur na temporada (o titular Leonard Nienhuis sofreu 2,21 gols por partida; seu reserva, Harm Zeinstra, tem a pior média entre os guarda-metas da temporada da Eredivisie – 2,87 gols sofridos por jogo). E mesmo ao sofrer tantos gols, Jurjus ainda mostra capacidade suficiente para ser constantemente mencionado como um dos melhores da posição neste campeonato – e provável reforço para algumas equipes.
E também há gente promissora nos jogadores de linha. Na zaga, Robin Pröpper (irmão de Davy, o meio-campista do PSV) mostra algum talento na saída de bola. E no meio-campo, cuja importância é potencializada para o time no 4-4-2 “em losango”, o inglês Andrew Driver mostra força física – e sua habilidade, mesmo mediana, já é suficiente para ajudar os atacantes Cas Peters e Vincent Vermeij, dois outros destaques do De Graafschap na temporada. No banco, o belga Nathan Kabasele é costumeira opção vinda do banco de reservas, trazendo velocidade pelas pontas do ataque.
As atuações da equipe contra o trio de ferro no turno mostravam as possibilidades claras de reação: três derrotas vendidas duramente. Contra o Feyenoord, um 1 a 2 apertado; contra o PSV, o De Graafschap levara 3 a 0 no primeiro tempo, mas chegou a conseguir o empate antes de levar o 6 a 3 final; contra o Ajax, chegaram a empatar também, e a vitória dos Amsterdammers (2 a 1) teve algo de injusta.
Com algum tempo para trabalhar na pausa de inverno, veio a “reação” no returno. Entre aspas, obviamente: afinal, são cinco derrotas nos 11 jogos pela Eredivisie em 2016 - entre elas, quedas para PSV (4 a 2) e Feyenoord (3 a 1). Todavia, as três vitórias e os três empates já serviram para os Superboeren conseguirem algo que parecia impossível pela baixíssima pontuação no primeiro turno: deixar a última posição e, pelo menos, ganhar a esperança de permanência na primeira divisão, mesmo que pela repescagem para a qual vão 16º (antepenúltimo) e 17º (penúltimo) colocados do campeonato.
Por sua vez, a torcida em Doetinchem já era elogiada pela fidelidade, pela animação e pela presença maciça nos jogos. E isso só aumentou com a ligeira ascensão dos alviazuis. Um bom exemplo veio na 27ª rodada, quando a equipe venceu o Roda JC por 3 a 0: a certa altura do primeiro tempo, uma das placas eletrônicas de publicidade ao lado do gramado caiu, forçando a interrupção do jogo por alguns minutos. A torcida não só se prontificou a ajudar os comissários na remontagem da placa, mas também continuou incentivando a equipe enquanto fazia isso. Esse cenário de otimismo justifica plenamente as renovações anunciadas dos contratos com o técnico Jan Vreman e sua comissão técnica, e com o atacante Vermeij, goleador da equipe na Eredivisie (ambos, até 2017). De quebra, Jurjus e Vermeij foram convocados para a seleção holandesa sub-21 que disputou amistosos contra Noruega e Sérvia nesta semana, vencendo ambos (dois 1 a 0 – aliás, Vermeij fez o gol contra os sérvios).
Se a animação no De Graafschap é crescente, o cenário no Cambuur é inverso. Não que a situação no turno estivesse boa: afinal, o time de Leeuwarden o terminou na zona de repescagem/rebaixamento. Além do mais, oferecia menor resistência aos três grandes do país: levou 6 a 0 do PSV em casa, e sofreu 5 a 1 do Ajax (contra o Feyenoord, derrota por “apenas” 2 a 0). Ainda assim, estava em 16º lugar, com 13 pontos, oito acima da última posição. Parecia possível até sair do fundo da tabela: ao começar a pausa de inverno, os Leeuwarders estavam a três pontos do Roda JC, na 15ª posição, primeira a garantir a permanência na Eredivisie. De quebra, havia um protagonista em quem a equipe podia confiar: o atacante nigeriano Bartholomew Ogbeche. Com passagens por Paris Saint Germain, mais futebol inglês e espanhol, sem contar uma Copa do Mundo na carreira (2002), Ogbeche era garantia de gols ao Cambuur: marcara 9 vezes em 15 jogos, no primeiro turno.
Só que 2016 está diminuindo drasticamente as perspectivas de salvação. Primeiro, Ogbeche deixou o clube em janeiro, rumo ao Willem II, um concorrente na disputa para sair das últimas posições (o Willem II é o 15º colocado). Uma sequência de cinco derrotas consecutivas fez o técnico Henk de Jong pagar pela crise com a demissão, dando lugar a Marcel Keizer, vindo do Emmen, da segunda divisão. Por fim, em 11 jogos no ano até agora, uma vitória (1 a 0 no Zwolle, na 25ª rodada) e dez derrotas: é a pior campanha do returno. Sem referências técnicas dentro dos titulares, o Cambuur caiu para a última posição, e agora está a nove pontos da salvadora 15ª colocação. Dentro de campo, cabe ao ponta-de-lança irlandês Jack Byrne e ao atacante Martijn Barto tentarem assumir o protagonismo que Ogbeche suportava sozinho.
Por essa queda, o Cambuur acabou permitindo a aproximação do De Graafschap. Nas últimas rodadas, ambos se alternam na última posição, tentando escapar dela. E assim como Ajax e PSV fizeram na rodada passada, jogarão por um triunfo que pode garantir a salvação na elite ao vencedor, ainda que temporária. Certo, o nível técnico não será lá essas coisas. Mas diga isso aos ansiosos torcedores de ambos…
(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 1º de abril de 2016)
(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 1º de abril de 2016)
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