Robben marcando pela seleção holandesa (contra País de Gales, em novembro de 2015); dá saudades, mas Oranje precisa superá-las (Stu Forster; Getty Images) |
Amsterdã, 5 de junho de 2010. No amistoso de despedida da sua torcida, rumo à Copa do Mundo que começaria dali a seis dias, a seleção da Holanda indica que está pronta para um papel digno no torneio, ao golear a Hungria por 6 a 1 na Amsterdam Arena. Poupado após ter jogado a final da Liga dos Campeões pelo Bayern de Munique, Arjen Robben é colocado no segundo tempo do amistoso – e brilha, marcando dois gols. Todavia, ele deixa um travo amargo e um ponto de interrogação em todo o país, ao lesionar um músculo da coxa no fim do jogo. Ficava a pergunta torturante: iria Robben à África do Sul?
A delegação foi, estreou no torneio, mas o esperava. E após uma semana de tratamento ultraintensivo com o fisioterapeuta Dick van Toorn, Robben voou para a Copa. No primeiro jogo em que foi relacionado, contra Camarões, o camisa 11 saiu do banco – e participou da jogada do gol de Klaas-Jan Huntelaar que decidiu o 2 a 1 na Cidade do Cabo. Nas oitavas de final, ele abriu o placar contra a Eslováquia. Enfim, após a dúvida, Robben brilhou de novo, só abaixo de Wesley Sneijder em importância técnica na campanha do vice-campeonato mundial.
Seis anos, quatro meses e dois dias depois, a Laranja viveu uma situação semelhante. Voltou a ficar à espera de Robben, antes das partidas contra Belarus (nesta sexta) e França (próxima segunda), pelas eliminatórias da Copa de 2018. Mas ao contrário da ansiedade gostosa que cerca uma Copa do Mundo, como em 2010, o cenário é mais melancólico e preocupante. Melancólico, porque as desconfianças seguem sobre a equipe comandada por Danny Blind. Preocupante porque, apesar de já ter uma equipe predominantemente jovem em campo, o técnico ainda parece precisar muito de Arjen. Mas ele estará ausente, de novo, por contusões. Não poderá ocupar o posto de capitão da Oranje - ainda dele.
Se essas lesões já eram renitentes quando Robben estava no esplendor técnico, agora o perturbam de modo quase definitivo. Basta ver o que ocorre com ele no Bayern. Ainda na pré-temporada, o canhoto mais famoso do futebol mundial lesionou um músculo da coxa, num amistoso contra o Lippstadt 08, em julho. Ficou dois meses em recuperação. Voltou em 21 de setembro, pelo Campeonato Alemão, entrando durante o jogo contra o Hertha Berlim... e marcando gol. Daí, no sábado passado, enfim começou uma partida como titular, contra o Köln... e saiu machucado de novo – agora, nas costelas.
A bem da verdade, Danny Blind já não relacionara o nativo de Bedum entre os 23 jogadores convocados, um dia antes do jogo contra o Köln. E o treinador da seleção foi bem claro e cauteloso na abordagem do assunto: “Precisamos ver as coisas numa conversa com a federação, o Bayern e o próprio Robben. Mas ainda está muito cedo. Ele queria muito [vir], mas também tem compromissos com o clube. Se houver uma possibilidade, veremos o que fazer”. Ainda assim, ficou uma esperança, como o treinador da Oranje sinalizou na segunda-feira passada, durante a apresentação dos chamados. A lesão nas costelas sofrida no sábado já não incomodava tanto Robben, e os contatos com a equipe médica do Bayern seriam mantidos. Se estivesse pronto, o capitão da seleção viajaria para integrar-se ao grupo que treinou na cidade de Noordwijk.
Assim ficou a situação: por mais que os 23 jogadores já treinassem, a espera por Robben seguia. Até o início desta sexta, prazo final para que o jogador fosse incluído na lista dos relacionados para o jogo contra Belarus. Sem recuperação completa, aquele de quem todos ainda esperam algo na seleção holandesa de novo estará ausente. Restou a Danny Blind lamentar: “Falei com ele, que não virá – e isso também vale para o jogo contra a França. Ele não está suficientemente em forma, o que é chato”.
Se fosse só o apego do técnico por um jogador brilhante tecnicamente, sua ausência não abateria tanto. Mas incomoda notar que outro veterano, Wesley Sneijder, foi até mais fundo na lamentação dos problemas físicos por que passa o colega de geração: “Ele [Robben] é muito importante para nós.
Não só dentro, mas fora de campo também. É uma peça fundamental, que não podemos perder. Já vimos isso no passado, é a dura realidade”. E o que dizer se um novato que desponta como possível substituto, Quincy Promes, é o primeiro a falar que Robben “não pode ser substituído”?
Pior ainda é reconhecer que Robben continua sendo importante, apesar da relação custo-benefício cada vez mais desvantajosa para Bayern e Holanda. Machuca-se muito? Sim. Mas segue demonstrando vontade e disposição de atender às convocações de Blind, sempre que possível. Uma vez no grupo de jogadores, o calvo precoce também apresenta um espírito de liderança inegável, como se viu na Copa de 2014. Sem contar a conhecidíssima capacidade de mudar uma partida, com sua jogada-muito-manjada-mas-que-ninguém-para de cortar para a esquerda e chutar. Continua sendo assim, mesmo atualmente: foi assim que Robben marcou um dos gols contra o País de Gales, em novembro do ano passado, no seu ultimo jogo pela seleção. E foi assim que marcou contra o Hertha Berlim. Ou seja: não é um caso de desprezo puro e simples. Em forma, o ponta direita pode ser útil, sim, senhora.
O excessivo apego à importância (inegável) de Robben fica ainda perturbador tendo em vista que a renovação holandesa já está completa. Não, a geração não impressiona tecnicamente. Ainda assim, pensar mais num atleta ausente do que nos 23 que lá estão dá a sensação de que o temor de novo vexame nas eliminatórias da Copa existe – temor exagerado, já que a Holanda foi razoável na estreia contra a Suécia, e pode muito bem vencer os bielorrussos nesta sexta. Claro, pensar em superar os franceses já é bem mais difícil. No jogo de Amsterdã, dia 10, os Bleus são favoritos, mesmo com os problemas na zaga (o convocado Jérémy Mathieu não só pediu dispensa, mas decidiu parar de defender a seleção; e o substituto, Eliaquim Mangala, lesionou-se).
Holanda atual é mediana. Mas é o que há para hoje. E parece mais entrosada (Remko de Waal/ANP) |
Todavia, mesmo inferior, a Oranje demonstra mais firmeza do que no amistoso entre ambas, em março passado. Enfim, parece haver um time titular de fato. Começando por uma defesa relativamente entrosada. Jeroen Zoet parece ter ganho definitivamente a vaga de titular no gol (“Cillessen não jogará”, informou Blind), Rick Karsdorp pode ganhar chance na lateral direita, e o recuperado Stefan de Vrij pode oferecer mais qualidade no miolo de zaga. No meio-campo, Kevin Strootman e o supracitado Sneijder tiveram lesões leves, mas já se integraram aos treinamentos normais e estão à disposição para as partidas. Com a ausência de Robben, Sneijder ganha cada vez mais importância: tanto pelo que ainda tenta oferecer tecnicamente (foi dele o gol contra a Suécia, pelas eliminatórias), pela experiência indubitável: jogando contra Belarus e França, alcançará as 125 partidas pela seleção.
No ataque é que se deu uma polêmica. Não na posição de “camisa 9”, que é de Vincent Janssen – pelo menos por enquanto. Mas na ponta esquerda: além da volta de um Memphis Depay em baixa no Manchester United, a escolha de Danny Blind por Siem de Jong para substituir o lesionado Steven Berghuis pegou mal. A escolha pelo irmão mais velho de Luuk, voltando à Oranje após três anos, soou estranha: só recentemente Siem fez seu primeiro jogo completo pelo PSV, enquanto Jens Toornstra tem ido muito bem no Feyenoord líder do Campeonato Holandês.
De todo modo, essa base mais entrosada das últimas partidas – e com uma média de idade mais baixa – tem ficado em segundo plano, diante do peso da ausência de Robben. Mas é assim que a Holanda precisará enfrentar Belarus, que surpreendeu... a França, adversário da próxima segunda. E talvez seja assim que a Laranja precise jogar daqui para frente. Robben faz e fará falta? Muita. Porém, a Oranje deve seguir, mesmo sendo um time pior sem ele.
(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 7 de outubro de 2016. Revista e ampliada)
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