sábado, 25 de março de 2017

Esqueçam

Danny Blind parece perguntar: "o que eu posso fazer?". A federação talvez faça, com a demissão (Maurice van Steen/VI Images)
Na sexta, 24 de março, este blog publicou a coluna cujo faz-tudo publica no site Trivela, há quase nove anos. E o tom era até positivo: indicava que a seleção da Holanda passava por um período de depressão, mas que estava notando, pouco a pouco, que a vida continua. E que a Laranja não era um time irremediavelmente ruim. Podia muito bem vencer a Bulgária, em Sófia, pela quinta rodada das eliminatórias europeias para a Copa de 2018 - e, a partir disso, poderia provar a superioridade em relação às outras seleções do grupo A (excetuando-se a França).

Pois bem, o que se viu neste sábado, no estádio Vasil Levski, fez com que o blogueiro se reavaliasse pesadamente. E que era melhor esquecer o conteúdo publicado no dia anterior: sim, a Holanda é um time ruim. Já passava por dificuldades, claro. Mas, bem ou mal, notavam-se perspectivas aqui e ali: o empate fora de casa contra a Suécia, uma derrota honrosa para a França em casa, a vitória tranquila sobre Belarus. No entanto, a vitória sobre Luxemburgo já tivera dificuldades. E por fim, fazia tempo que a Laranja não passava uma impressão tão desalentadora, tão desanimadora, quanto a que se viu na derrota por 2 a 0 para a Bulgária, que deixou a equipe na quarta posição do grupo.

O desânimo que tomou conta da torcida holandesa (e o volume das críticas dos jornalistas) só foram menores, talvez, do que a surpresa provocada pelo técnico Danny Blind, tão logo a escalação foi anunciada. Sem Stefan de Vrij, lesionado no tornozelo, a zaga precisava de mudanças. E Blind deu chance imediata e inesperada a Matthijs de Ligt, 17 anos e sete partidas pela equipe adulta do Ajax no Campeonato Holandês. Já parecia ousadia demais convocar De Ligt, e ele figurou na lista de 25 chamados. Escalá-lo, então, parecia insensatez. Mas o novato tornou-se o estreante mais jovem da história da Oranje desde 1931, formando a zaga que começou jogando em Sófia com Bruno Martins Indi. Outra surpresa: para tornar o meio-campo mais acelerado, Blind colocou Davy Klaassen como titular no setor, junto a Kevin Strootman e Georginio Wijnaldum, deixando Wesley Sneijder no banco de reservas.

Em entrevista à tevê holandesa, antes do jogo, Blind assumiu a responsabilidade pela escalação de De Ligt: "É um risco assumido. Eu não tenho um zagueiro destro [Martins Indi é canhoto]: não tenho Bruma, não tenho Van Dijk, nem mesmo Vlaar. Confio nele, pelo desempenho nos treinos". Porém, apostando nas bolas longas e na pressão contra a saída de bola holandesa, a Bulgária ensaiava trazer mais perigo - tanto que conseguira falta próxima à área, já nos primeiros segundos de jogo. Bastaram apenas cinco minutos de jogo para que se visse quanto a aposta do treinador fora errada e irresponsável. Num dos lançamentos longos, De Ligt falhou ao tentar acompanhar Spas Delev. E o atacante búlgaro aproveitou saída hesitante de gol de Jeroen Zoet (que ainda atrapalhou De Ligt) para ficar com a meta à sua frente, e fazer 1 a 0.

De Ligt (no centro) foi a aposta de Blind. E jogado na fogueira, queimou-se como um garoto desamparado (ANP)
O gol definiu o espírito da partida. Motivou ainda mais a Bulgária para continuar pressionando a saída de bola, já no meio-campo, contra uma Holanda que seguia em sua via-crúcis: um time dando espaço para os contra-ataques, perdendo bolas no meio-campo (principalmente com Kevin Strootman, de atuação péssima) - e quando tinha a posse de bola, tentava tocar para achar espaço no 4-1-4-1, de modo infrutífero. Além de sempre procurar a aposta de sempre, Arjen Robben, que tentava puxar espaço pela direita - sem estar, no entanto, no 1-contra-1 em que é tão bom, sempre tendo dois marcadores à sua espera.

Com os espaços deixados nas costas de Rick Karsdorp e Daley Blind, pelas laterais, a Bulgária chegava costumeiramente - principalmente pela direita, com o dia elogiável de Stanislav Manolev. Não demorou muito e, aos 20', veio o merecido segundo gol, em nova infelicidade de De Ligt. Mais uma bola longa, e Delev teve espaço para dominar a bola, virar-se e arriscar belo chute colocado, no canto esquerdo de Zoet, para deixar os anfitriões em definitiva tranquilidade com o 2 a 0.

Pior ainda do que a fragilidade na defesa, era a inatividade holandesa no meio-campo e no ataque. Bem postada na defesa, a Bulgária não dava espaço para criação de jogadas. No entanto, já com vantagem suficiente no placar para poder apostar nos contra-ataques, começou a ficar na defesa. Aí, a Holanda começou a tentar ataques - e esbarrou na própria inapetência. Apenas Davy Klaassen e Bas Dost tentavam algo. Porém, raras vezes se entendiam, e as bolas ficavam nas mãos do goleiro Nikolay Mihaylov. A falta de criação no meio-campo era tão exasperante que Robben precisava trazer a bola da direita para o setor. Mas, aos poucos, aos trancos e barrancos, a Oranje tentava algo. Principalmente, com Dost. Aos 40', o chute do atacante saiu longo, por cima do gol; mas aos 44', veio a primeira grande chance (talvez a única holandesa no jogo). Num lançamento de Strootman, Klaassen escorou de cabeça, e o atacante bateu pela linha de fundo.

A essa altura, no final do primeiro tempo, Danny Blind já colocara para aquecer o Wesley Sneijder velho de guerra, mais Wesley Hoedt, zagueiro. E ambos entraram para o segundo tempo. A entrada de Sneijder era mais do que justa, no lugar de um anônimo Georginio Wijnaldum. No entanto, o mal já estava feito, e não dava para notar na substituição de De Ligt por Hoedt um lamentável ar de "fritura", como se um jovem de 17 anos fosse o único culpado dos males que ocorriam para a Laranja em Sófia.

Tanto De Ligt não era culpado que o segundo tempo seguiu no mesmo ritmo do primeiro. A Holanda seguiu com a posse de bola - e sem saber o que fazer com ela. Até forçou Mihaylov a trabalhar mais: num chute de Quincy Promes, aos 58', e num arremate de Klaassen (após triangulação com Sneijder e Dost), aos 62'. Mas o time seguia perdido, atarantado contra uma Bulgária que já conseguira o que queria. E talvez a grande prova de como a Holanda esteve perdida em campo veio aos 70', com a entrada de Luuk de Jong no lugar de Quincy Promes. Luuk foi fazer a dupla de ataque com Bas Dost, enquanto Sneijder foi ocupar a lacuna deixada na ponta esquerda. Dois atacantes altos - mas nem Sneijder, nem Robben têm o cruzamento para a área entre suas características principais. E a pressão que a Holanda ensaiava morreu.

Aí, foi inevitável a derrota. Justa, mas inesperada. Que colocou a Holanda na quarta posição do grupo A, superada pela própria Bulgária. E que começou a tornar a chegada à Copa de 2018 algo distante: não só pela distância para a França, líder do Grupo A (12 pontos), mas pela distância para a repescagem (já são seis pontos para a Suécia, vice-líder, que goleou Belarus - 5 a 0). E mesmo que chegue à segunda posição, em caso de esperada derrota para a França, a Laranja ficaria com a perspectiva de chegar apenas a 19 pontos. Muito provavelmente, seria a pior segunda colocada - logo, não teria a vaga na repescagem.

Robben lamenta em gestos. E em palavras: "Dizer o quê?" (European Press Agency)
Porém, mesmo a repescagem parece distante demais, após a atuação triste neste sábado. Arjen Robben, o capitão, sintetizou tudo em duas frases: "Dizer o quê? É um pesadelo". Após entrar no segundo tempo, Wesley Hoedt mostrou certo inconformismo com a opção de Blind por De Ligt: "Eu aceito, mas não entendo. Escalar [De Ligt] porque é destro? Oras, Van Dijk e Bruma são destros e podem jogar juntos. Por que dois canhotos [Hoedt e Martins Indi] não poderiam?" E Sneijder também fez algumas críticas: "Faltou eficiência e agressividade. Não dá para treinarmos duro como treinamos, e aí começar o jogo de uma maneira tão ruim. Parece que jogamos no lixo outra chance de estar num grande torneio".

Para Blind, restou a tristeza, expressa nas frases à tevê holandesa: "Estou triste. Foi uma atuação muito ruim, está claro. Eles marcaram na primeira bola longa que conseguiram no jogo. Daí, puderam jogar como queriam". E talvez, a consciência de que sua sina de demissionário já está marcada, com tantos resultados ruins: "Eu preciso pensar, e a federação também fará isso". Na entrevista coletiva, mais indicações: "Preciso ser honesto, comigo e com a federação". Honestidade que Arjen Robben já mostrou, ao criticar o alarido pedindo a demissão de Blind: "Não acho que um novo técnico traria jogadores diferentes dos que estão aqui. Já antes da Copa de 2014 não tínhamos muita qualidade". E confirmando que não jogará o amistoso contra a Itália: "Combinamos que eu voltaria [ao Bayern] depois de hoje. Não estou fugindo da raia, mas nada está em jogo na terça".

Bem, se algo estava em jogo, a Holanda perdeu. E talvez o amistoso contra a Itália seja apenas o começo da procura nos escombros, após mais um vexame para a longa coleção dos últimos anos. Esqueçam o que se escreveu aqui: sim, a seleção da Holanda está ruim. Muito ruim.

Eliminatórias para a Copa de 2018 - Europa
Bulgária 2x0 Holanda
Data: 25 de março de 2017
Local: Estádio Vasil Levski, em Sófia
Juiz: William Collum (Escócia)
Gols: Spas Delev, aos 5' e 20'

Bulgária
Nikolay Mihaylov; Strahil Popov, Bozhidar Chorbadzhiyski, Vasil Bozhikov e Petar Zanev (Anton Nedyalkov, aos 86'); Simeon Slavchev; Stanislav Manolev, Georgi Kostadinov, Ivelin Popov (Bozhidar Kraev, aos 67') e Aleksandar Tonev; Spas Delev (Nikolay Bodurov, aos 88'). Técnico: Petar Hubchev

Holanda
Jeroen Zoet; Rick Karsdorp, Matthijs de Ligt (Wesley Hoedt, no intervalo), Bruno Martins Indi e Daley Blind; Kevin Strootman, Davy Klaassen e Georginio Wijnaldum (Wesley Sneijder, no intervalo); Arjen Robben, Bas Dost e Quincy Promes (Luuk de Jong, aos 68'). Técnico: Danny Blind

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