domingo, 19 de março de 2017

Perto de "vvvoltar"


O VVV-Venlo já prepara a festa da volta à primeira divisão (Daniel van den Berg/vvv-venlo.nl)
Quick Boys, Achilles ’29, Go Ahead Eagles… vez por outra, há nomes pitorescos nos clubes do futebol holandês. Outro fenômeno comum nas nomenclaturas das agremiações daquele país é a “sopa de letrinhas”: PSV, NEC, NAC (Breda), MVV, ADO, o falido AGOVV Apeldoorn... Pois bem: geralmente, nessas siglas, as letras “V” são referentes a “voetbal” (futebol) e “vereniging” (união, associação). Bastou que fosse fundado um clube, na cidade de Venlo, em 7 de fevereiro de 1903, para que ficasse previsível o nome: Venlose Voetbal Vereniging, Associação de Futebol de Venlo. O tempo e a coincidência pitoresca encarregaram-se de tornar o VVV-Venlo um clube que conseguiu unir, em um só nome, a curiosidade e as letras.

E é justamente a equipe aurinegra que está às portas do retorno à Eredivisie. Assim como ocorreu com os últimos campeões da segunda divisão holandesa, o VVV conseguiu disparar num certo momento da temporada. E atualmente, com a Eerste Divisie já na 30ª rodada (a ser iniciada hoje), a oito do final, os Venlonaren já ostentam 69 pontos. Na teoria, uma vantagem já gigante para o segundo colocado: 11 pontos. Na prática, quase inalcançáveis 15 pontos para o único time que possa impedir o acesso direto à primeira divisão, luxo único para o campeão. “Como assim? Quem é o segundo colocado?”, há de perguntar o leitor. Calma, que ele já virará assunto. Sexta-feira, no Espreme a Laranja (sabe como é, piada sem graça e pênalti não se perdem...).

A curiosidade do VVV-Venlo em sua campanha já na rota do título é que o clube não possui muitos destaques individuais em sua equipe. Goleador? Longe disso: o topo da lista está com Tom Boere, do FC Oss, clube nas últimas posições da tabela, autor de 28 gols. Depois, vem Piotr Parzyszek, do De Graafschap (que caiu da Eredivisie, via repescagem), com 19 gols. E jogadores do VVV só aparecerão na sétima posição da lista, com os atacantes Ralf Seuntjens e Vito van Crooy, cada um com 13 gols. Clube com mais gols marcados? Não, também não é: é o segundo, com 65. O líder da Eerste Divisie só ponteia na defesa menos vazada (18 gols sofridos) e no número de chutes a gol (255).

Desta forma, é possível dizer que o principal mérito do VVV-Venlo em sua campanha está na coesão do time – e no equilíbrio entre experiência e juventude. Mesmo tendo se frustrado na busca do acesso, em 2015/16 (foi eliminado na segunda fase dos play-offs, pelo Go Ahead Eagles), a diretoria seguiu confiando no trabalho de Maurice Steijn como técnico. Manteve no elenco Ralf Seuntjens, o principal destaque da temporada passada. Algumas perdas foram contrabalançadas com contratações razoáveis para os baixos padrões técnicos da segunda divisão – os meio-campistas Clint Leemans e Joey Sleegers são bons exemplos.

E os reforços entrosaram-se bem com a base que já existia, fosse com os mais experientes no clube (o volante Danny Post e o zagueiro Jerold Promes), fosse com as novidades (das quais o atacante Vito van Crooy, 20 anos, é a mais satisfatória). Assim, o caminho foi aberto para a volta à primeira divisão, após quatro anos. Já se fala abertamente que é questão de tempo a comemoração da “vvvolta” do VVV-Venlo – onde, só para continuar com os “v”, já jogou VV...Vampeta, que passou o primeiro semestre de 1995 cedido ao clube de Venlo.

Contudo, se o VVV-Venlo é o destaque mais claro desta temporada na segunda divisão holandesa, o vice-líder supracitado também tem lá suas razões para merecer atenção. Não que também seja barbada para subir: afinal de contas, as equipes B que disputam a Eerste Divisie já sabem que a promoção à elite é proibida para elas. Até por isso, o Jong Ajax, time de aspirantes dos Amsterdammers, dá oportunidade constante a gente que logo aparecerá no time de cima. E o nível da geração tem sido bom o suficiente para ocupar a segunda posição, com 58 pontos – quatro à frente do MVV Maastricht, único clube a poder ameaçar na prática o título do VVV.

Van de Beek, Nouri, Kluivert, De Ligt e Sierhuis (de cima para baixo, da esquerda para direita): a nova geração do Ajax já dá capa de revista, é é considerada "o futuro" (Reprodução/Voetbal International)
Basta citar a lista de jogadores jovens que, nesta temporada, já atuaram no Jong Ajax e também receberam as primeiras oportunidades entre os comandados por Peter Bosz: o zagueiro Matthijs de Ligt, os meio-campistas Frenkie de Jong e Abdelhak Nouri, os atacantes Pelle Clement e Justin Kluivert – sem contar David Neres, que vai sendo “treinado” no Jong Ajax antes de ser mais usado no time de cima. Com mais ritmo de jogo, os novatos ganham mais confiança e preparação para serem opções imediatas para Peter Bosz, além de virarem apostas quase imediatamente. Nouri já esteve sob os holofotes nesta temporada; Kluivert também; e a “febre da vez” é De Ligt, 17 anos, que teve atuação primorosa contra o Copenhague, nesta quinta, pela Liga Europa – a ponto dos exagerados já pedirem sua presença na convocação de Danny Blind para os jogos contra Bulgária (eliminatórias da Copa) e Itália (amistoso). E até mesmo gente exclusiva do Jong Ajax, como o atacante Kai Sierhuis, tem merecido certa atenção.

Além dos novatos, já falados a ponto de merecerem capa da revista Voetbal International, há também o caso de gente mais velha que, para ganhar ritmo após se recuperar de lesão, joga algumas partidas antes de voltar ao time de cima. Ou mesmo ganha nos aspirantes as oportunidades que não recebe na equipe principal. O que já aconteceu com muita gente, nesta temporada, pelo Jong Ajax: Jaïro Riedewald, Davinson Sánchez, Heiko Westermann, Thulani Serero, Mateo Cassierra, Vaclav Cerny... aconteceu até mesmo com Tim Krul, que fez duas solitárias partidas pelo Jong Ajax na segunda divisão antes de deixar o clube. E também acontece com outro exemplo de equipe B que faz boa campanha: o Jong PSV, quarto colocado. Pelos aspirantes de Eindhoven, já estiveram Oleksandr Zinchenko, Siem de Jong, Steven Bergwijn, Jürgen Locadia...

O que não quer dizer que os Eindhovenaren também não desovem na equipe de jovens suas “cartas na manga”. Uma vez ou outra, Phillip Cocu já se valeu dos préstimos dos atacantes Sam Lammers e Ramon-Pascal Lundqvist. E já se fala que, para 2017/18, mais gente do Jong PSV aparecerá no grupo de cima para não sair mais: o zagueiro Jurich Carolina, o volante Pablo Rosario, o meio-campista Kenneth Paal, além dos citados. Pelo menos para isso, a inclusão das equipes B dos grandes clubes na segunda divisão tem servido: para dar ritmo de jogo aos novatos holandeses – que assim, quem sabe, rendam o que não têm rendido nas seleções de base.

(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 17 de março de 2017)

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