sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Eredivisie feminina: casa de ferreiro

O Ajax é o atual campeão e pode até chamar a atenção na Liga dos Campeões, só que o Twente mantém o domínio pleno no Campeonato Holandês (Hans van der Valk/BSR Agency/Getty Images)

A segurança (ainda com falhas aqui e ali) da goleira Regina "Reg" van Eijk. O comando indiscutível que Sherida Spitse tem sobre o grupo, a partir da defesa. A qualidade da revelação Lily Yohannes, no meio-campo. Os gols de Romée Leuchter e Chasity Grant, no ataque. Tudo isso faz o Ajax ter uma campanha extremamente surpreendente, no melhor sentido, na Liga dos Campeões feminina: mesmo estreando, a equipe Ajacied de mulheres disputa a sério uma vaga nas quartas de final, a duas rodadas do fim da fase de grupos. Como primeira equipe holandesa jogando os grupos da Champions League, ela impressiona. Entretanto, no âmbito doméstico, ao contrário do que possa parecer, o Ajax é forçado a ser coadjuvante. Porque no Campeonato Holandês de mulheres, que será retomado neste sábado, continua o hábito das temporadas recentes: o Twente dá as cartas.

Basta ver: nas 11 rodadas da Vrouwen Eredivisie disputadas até agora, são 11 vitórias das Tukkers, colocando-as (obviamente) com 33 pontos, dez acima das Ajacieden. Mesmo que elas vençam o jogo a menos que têm - contra o Heerenveen, em fevereiro -, ainda seria uma larga vantagem para o time de Enschede. Que deve isso, basicamente, à solidez que mostra em campo. Chega a ser até engraçado: entram e saem jogadoras, e o Twente continua firme, parecendo autoconfiante. Se o time perdeu Daphne van Domselaar no gol, Daniëlle de Jong continua dando conta do recado, além do entrosamento de quem ficou (Kim Everaerts e Marisa Olislagers nas laterais, Marit Auée e Caitlin Dijkstra na zaga), justificando a defesa menos vazada: nove gols, junto ao Ajax. O meio-campo também conta com entrosamento, no trio Danique van Ginkel-Suzanne Giesen-Wieke Kaptein (esta, já em ritmo de despedida, rumo ao Chelsea). E no ataque, se não há mais Fenna Kalma, há a experiência e a confiabilidade da capitã Renate Jansen. Que auxilia a jovem norte-americana Taylor Ziemer e, principalmente, Liz Rijsbergen. Vinda do ADO Den Haag, Rijsbergen justifica a fama de principal revelação neerlandesa da atualidade: já são oito gols na Vrouwen Eredivisie, colaborando com as 32 bolas na rede que fazem do time de Enschede o melhor ataque.

Se Twente e Ajax seguem soberanos, com o Twente um pouco à frente, é bom destacar também o principal ponto positivo deste Campeonato Holandês como um todo: o maior número de equipes médias fazendo um bom papel. Do Fortuna Sittard, já nem é mais necessário falar: o terceiro colocado já parece ter chegado para ficar no futebol feminino dos Países Baixos. O time já tem sua experiência, também mostra entrosamento, e o ápice disso está no ataque: lá está a jovem Hanna Huizenga - assim como Liz Rijsbergen, outra revelação para os próximos anos do futebol holandês - e a experiente Tessa Wullaert, goleadora atual da liga (11 gols), o grande nome do futebol feminino da Bélgica (e não só da atualidade, talvez). 

Eshly Bakker aproveitou a chance no neófito time do Utrecht. Que faz papel digno na temporada de estreia (Roy Lazet/Soccrates/Getty Images)

Mas nem só de Fortuna Sittard viveram as boas novidades. Em sua primeira temporada, o Utrecht impressionou. Com um time experiente em termos de futebol feminino na Holanda - Liza van der Most, Naomi Piqué, Marthe Munsterman -, contando com um trabalho rapidamente encaixado da técnica Linda Helbling e os gols de Eshly Bakker (são sete, até agora), as Utregs chegaram a ficar na primeira posição: nas primeiras quatro rodadas, quatro vitórias. O tempo passou, o time caiu para sexto lugar, mas segue com papel honroso. Assim como o Zwolle, quarto colocado, ancorado num time jovem, que conta com os gols de Bo Tess van Egmond. E o PSV, de tantas decepções nas temporadas recentes, enfim parece ter acertado o passo. Se não exatamente para disputar o título, para mostrar boas atuações, alternando a experiência (Siri Worm, Joëlle Smits) à juventude (a goleira Lisan Alkemade, a meio-campista Nina Nijstad, a atacante Chimera Ripa).

Há ainda as dificuldades. O Feyenoord chegou a passar as seis primeiras rodadas na lanterna, sem vitórias, e só se recupera aos poucos. O AZ, na primeira temporada retomando seu departamento de futebol feminino, ainda tateia o melhor caminho a seguir, nas últimas posições (embora tenha um destaque, a atacante Floor Jolijn Spaan). O Excelsior tem algumas qualidades, mas sofre com alguns momentos ingênuos de sua defesa. E o Heerenveen, lanterna, com somente uma vitória, já sabe que trocará de rumo ao fim da temporada, com a saída prometida do técnico Hans Schrijver.

Por falar em saída de treinador(a), à primeira vista, surpreendeu demais o anúncio de que a comandante do Ajax, Suzanne Bakker, deixará a equipe quando 2023/24 acabar. Mas basta ver as palavras da diretora do futebol feminino no clube de Amsterdã, Daphne Koster, para entender a decisão: "Depende de mim pensar não só em como estamos agora, e continuar assim, mas em ver onde queremos chegar". Ou seja: para o Ajax, não basta só o destaque na Liga dos Campeões de mulheres. É preciso querer estabelecer um domínio no Campeonato Holandês. Domínio que parecia perto, com a retomada do título em 2022/23. Mas que está passando longe, de novo. Porque, na casa de ferreiro da Vrouwen Eredivisie, o espeto é do Twente.

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