sexta-feira, 6 de novembro de 2015

À procura da tática perfeita

Fischer voltou a jogar bem. Mas isso não é o suficiente num incerto Ajax (Olaf Kraak/ANP)
Durante algumas vezes nesta temporada, o Ajax viveu momentos de turbulência em campo. Lidera o Campeonato Holandês, mas não dá confiança alguma à sua torcida – e ela tem lá suas razões, tendo em vista a campanha ruim dos Amsterdammers na Liga Europa. Além do mais, várias vitórias conseguidas na temporada foram bem ilusórias. E quando a equipe enfrentou adversários de maior nível técnico, saiu de campo com empate ou derrotada. Foi assim contra o PSV, no primeiro clássico deste Campeonato Holandês; contra o Feyenoord, pela Copa da Holanda; e contra Celtic e Fenerbahçe, pela fase de grupos da Liga Europa.

Agora, neste final de semana, enfim os Ajacieden têm nova chance para comprovarem a justiça de sua primeira posição na Eredivisie. Enfrentam o Feyenoord, na segunda edição do Klassieker em onze dias, agora pela 12ª rodada da liga. E se valerão de uma boa rodada passada: goleando o Roda JC por 6 a 0, viram no domingo o Stadionclub novamente ter seu embalo quebrado, por uma atuação ruim e pela derrota para o ADO Den Haag (1 a 0) – aliás, comprovando o “dedo podre” desta coluna, que elogiara o Stadionclub e destacava Dirk Kuyt, no texto da sexta anterior. Com isso, abriram três pontos de vantagem na liderança. 

Ainda assim, não se sabe direito a cara tática com que o Ajax irá a campo. E essa indecisão se deve até à própria irregularidade dos resultados. Nesta temporada, o Ajax já jogou no 4-3-3 velho de guerra – e os resultados não agradaram, principalmente com a eliminação vexatória na terceira fase preliminar da Liga dos Campeões. Então, Frank de Boer decidiu fortalecer um pouco mais a defesa, mesmo seguindo no 4-3-3. Começou bem (basta lembrar dos quatro jogos sem sofrer gols no Holandês), mas a derrota no clássico contra o PSV – e a má atuação, deixando os Boeren dominarem o jogo em plena Amsterdam Arena – também deu sinais de que aquele esquema não poderia ser usado a ferro e fogo.

Assim, contra o Roda JC, Frank de Boer decidiu arriscar. E a equipe foi a campo num 3-4-3, esquema que não era visto no time Ajacied havia muito tempo. Pois deu muito certo: tudo bem que era contra o 10º colocado do Campeonato Holandês, mas a velocidade exibida nos ataques e, principalmente, nos contra-ataques do Ajax foi bastante elogiável. Bastou mostrar um pouco de técnica nas finalizações, e estava feito o 6 a 0 – maior goleada da temporada na Eredivisie, igualando o mesmo placar do PSV contra o Cambuur.

Mas o que aconteceu para essa mudança, ainda mais lembrando que a vitória anterior (3 a 1 no Vitesse, pela 10ª rodada) fora suada? Provavelmente, uma pista foi a mudança no meio-campo. O volante Riechedly Bazoer até chega ao ataque e mostra mais técnica, mas também tem mais lentidão. Assim, foi trocado por Thulani Serero. E o sul-africano, com seu estilo “motorzinho” já conhecido, jogou mais à frente da defesa e deu mais tranquilidade para que Nemanja Gudelj e Davy Klaassen chegassem ao ataque, oferecendo mais opções de jogada e de finalização.

O que não quer dizer que Bazoer está condenado ao banco. Exatamente pelos fatores supracitados (poder chegar ao ataque e mostrar mais técnica com a bola nos pés), o camisa 6 já se destacou em algumas partidas, como nas vitórias contra Heracles e Vitesse – nesta, foi o melhor em campo, ao marcar o gol da virada e participar da maioria das jogadas de ataque. Pode-se dizer, até, que Bazoer desponta como outra grande revelação do campeonato, além de Anwar El Ghazi. A ponto de já ter sido chamado por Danny Blind para a seleção holandesa, ainda nas eliminatórias da Euro - e de estar novamente na relação de jogadores da Oranje para os amistosos contra País de Gales e Alemanha.

Outra pista para responder as perguntas sobre a razão do sucesso do 3-4-3 no Ajax está nos atacantes. Principalmente em Viktor Fischer. Enfim livre da séria lesão muscular que o tirou de grande parte das duas últimas temporadas, Fischer rapidamente recuperou o ritmo de jogo e o destaque que ganhava quando apareceu, na temporada 2012/13. Com três gols nas últimas duas rodadas, além da velocidade que traz pela esquerda do ataque, o dinamarquês já desponta como protagonista no ataque da equipe, apagando até o bom começo de Anwar El Ghazi. Não impressiona que Morten Olsen já o tenha convocado para a seleção dinamarquesa que disputará as duas partidas da repescagem pela vaga na Euro 2016. Continuando assim, o camisa 7 Ajacied rapidamente voltará a ser cobiçado em janelas de transferências.

É bom destacar também que a maior chance que os meio-campistas de ataque têm para avançar ameniza aquela que ainda é a principal lacuna ofensiva: a falta de um atacante confiável, de um “finalizador” nato. Arkadiusz “Arek” Milik até começou bem em sua chegada, mas já perdeu o crédito de confiança que a torcida lhe dava, tanto que até já frequentou o banco de reservas. O polonês até voltou a marcar contra o Roda JC, por duas vezes, mas ainda tem o que recuperar. Outros dois atacantes que tiveram o espaço diminuído nas últimas partidas foram Amin Younes (previsível demais pela esquerda) e Daley Sinkgraven (já no olho do furacão, após as falhas que cometeu ao ajudar a defesa, resultando em alguns gols contra o Ajax, em partidas anteriores).

Aliás, a defesa também foi “ajudada” nos últimos tempos. Joël Veltman já não é tão afoito em suas saídas para o ataque; enfim, cumpre bem a função primordial de um zagueiro. Com isso, dá mais segurança até ao parceiro de zaga, Jaïro Riedewald. Kenny Tete também tem dosado melhor seus avanços ao ataque. Bastou Mitchell Dijks ter algumas boas atuações para que os danos defensivos fossem menores. E mesmo com os problemas físicos de Dijks, Riedewald foi deslocado para a esquerda com sucesso, com Nick Viergever formando a zaga com Veltman.

Todavia, nem mesmo essas evoluções fizeram as desconfianças sumirem da Amsterdam Arena. Afinal de contas, pela Liga Europa, nesta quinta passada, o empate sem gols contra o Fenerbahçe voltou a mostrar a falta de um finalizador confiável: Milik novamente passou em branco, sumindo do jogo aos poucos. E se a defesa conseguiu controlar os perigos trazidos pelo time turco, novamente o 4-3-3 mostrou seu problema crônico no Ajax. Não só houve falta de gente que pudesse finalizar, mas também se viu um espaçamento excessivo entre meio-campo e ataque. Prato cheio para a defesa mais compactada do Fener. Além disso, as lesões de Fischer e El Ghazi atrapalharam, e às vezes o egoísmo matou jogadas promissoras: caso exemplar ocorreu com Younes, que preferiu chutar para fora a cruzar para um Klaassen que estava livre, já no final da partida. E a má atuação jogou o time à beira da eliminação na fase de grupos do torneio continental. 

No domingo, o Ajax irá a De Kuip ainda tendo em mente a dura derrota no Klassieker da terceira fase da Copa da Holanda, quando o Feyenoord marcou o gol da vitória no último lance do jogo. Além disso, não terá El Ghazi, que lesionou o tornozelo e ficará fora por algumas semanas. Mesmo assim, uma vitória em Roterdã lhe dará vantagem de seis pontos na frente. E aí os Ajacieden poderão começar a pensar em despontar como os favoritos definitivos à Eredivisieschaal. Isso, com Frank de Boer ainda à procura da tática perfeita.

(Coluna originalmente publicada na Trivela, em 6 de novembro de 2015)

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