Cada vez mais só, Danny Blind precisa isolar o razoável grupo da seleção holandesa do caos na federação (Soenar Chamid/VI Images) |
Localizado na cidade de Noordwijk, o hotel Huis ter Duin é para a seleção holandesa algo parecido ao que a Granja Comary é para a brasileira: um lugar clássico para apresentação dos jogadores convocados, antes do início dos trabalhos. Foi assim também agora, na chegada dos 23 convocados de Danny Blind para o amistoso contra a Grécia (amanhã, em Eindhoven) e, principalmente, para a estreia nas eliminatórias da Copa de 2018 - no próximo dia 6, contra a Suécia, em Solna. E o clima durante a chegada foi otimista.
Aliás, antes mesmo dela era possível notar certa ansiedade nos convocáveis. Tentando ganhar uma sequência de jogos que afaste definitivamente os temores de nova lesão, na Roma e na Laranja, Kevin Strootman carregou no tom ao diário Algemeen Dagblad: "Devemos olhar a ausência na Euro como um acidente. Contra a França, no grupo [das eliminatórias], será muito difícil. Mas todos os outros países na nossa chave têm jogadores piores. Então, é deixar a porcaria de lado, e dar todo o gás". Strootman não é o único a encarar com vontade a nova fase da Oranje. Outro que pode ter novo fôlego na carreira é Maarten Stekelenburg: a semanas de completar 34 anos, o goleiro do Everton ficou na lista final de Blind pai. E "Stekel" chegou ao Huis ter Duin muito motivado, tanto pelo bom começo de temporada defendendo os Toffees quanto pela frase definitiva do treineiro da Oranje, ao comentar os vários goleiros "convocáveis".
Citando a ida de Jasper Cillessen para o Barcelona - e a possibilidade do atual titular da seleção perder ritmo de jogo na reserva dos Culés -, Blind alertou: "Temos mais possibilidades, no que se refere aos goleiros. Não é um assunto definido como já foi. Por exemplo: estou muito surpreso com Stekelenburg, que está muito bem, em alto nível. E Vorm, que ficou de fora agora, está muito bem no Tottenham". Isso, sem citar Jeroen Zoet, o reserva mais imediato de Cillessen. Com tudo isso, dá para compreender quando Stekelenburg comenta: "Agora é recomeçar por aqui, e ver até onde posso ir".
Strootman e Stekelenburg são os exemplos citados. Mas há Georginio Wijnaldum, que tem no Liverpool a grande chance de sua carreira; há as novidades interessantes - como o volante Jorrit Hendrix, que mereceu sua primeira convocação pelo estupendo começo de temporada no PSV; há a disputa interessante no ataque, entre Bas Dost, Luuk de Jong e Vincent Janssen; há gente como Steven Berghuis e Quincy Promes, que aproveitaram bem as chances nos amistosos, e viraram reais opções para o time titular - no caso de Promes, desbancando Memphis Depay, sequer chamado.
Enfim, a mudança de geração está feita. Pode não ser a melhor geração que já vestiu o uniforme laranja, mas é a que terá a função de levar a Oranje à 11ª Copa do Mundo de sua história. Tarefa um pouco mais possível, com a Suécia, rival mais potencial pelo segundo lugar da chave, enfraquecida pelas várias saídas definitivas da seleção: Andreas Isaksson, Kim Källstrom - e acima de tudo, Zlatan Ibrahimovic. Fica apenas a expectativa por qual será o grau da ajuda dos veteranos remanescentes, como Wesley Sneijder (o único presente na convocação, perto do recorde de partidas com a seleção), Arjen Robben (se as lesões permitirem...) e Robin van Persie (se voltar a merecer chamadas).
Se fosse só pelo time, dava para ter uma expectativa mais positiva em relação à seleção holandesa. Mas o cenário fora de campo se revela cada vez mais caótico para a Oranje. Não por culpa dos jogadores, mas pelos acontecimentos que revelam a total desorganização da federação. No começo, já fora a saída de Ruud van Nistelrooy. Depois, a defecção veio de Dick Advocaat; após somente duas partidas como auxiliar de Danny Blind, o "Pequeno General" foi seduzido pela ideia de seguir como técnico e aceitou a oferta do Fenerbahçe (onde treinará Van Persie, Gregory van der Wiel e Jeremain Lens). Tudo bem: por meio de seu diretor técnico, o ex-goleiro Hans van Breukelen, a KNVB foi atrás de Ruud Gullit, tentando convencê-lo a ser auxiliar de Blind. Não deu certo: segundo Van Breukelen, Gullit fez algumas exigências sobre cláusulas contratuais, e a negociação fracassou no fim da semana passada.
Ao anunciar sua saída, Bert van Oostveen acendeu o pavio da explosiva semana da Oranje (Pro Shots) |
Poderia ter ficado só nisso, mas o início desta semana trouxe duas bombas. A primeira, até "desejável": o diretor de futebol profissional da federação, Bert van Oostveen, anunciou sua saída. Obviamente, a explicação lembrou o principal fracasso do dirigente: "Os últimos tempos como diretor foram ótimos, mas simultaneamente muito intensos. Por isso passei a pausa de verão [europeu] pensando sobre meu futuro. Eu preferia ter parado após uma boa participação na Euro. Era o cenário ideal, e eu também pararia imediatamente. Mas não pôde ser assim". Van Oostveen já teve seu substituto anunciado: Gijs de Jong, que estava na diretoria operacional da KNVB.
Terminou aí? Não. Entrevistado no programa de tevê RTL Late Night, segunda passada, Gullit não só criticou a federação, mas também jogou a terceira bomba no ventilador: o outro auxiliar de Danny Blind também deixaria a comissão técnica. Convidado pela FIFA para trabalhar num projeto de reestruturação, Marco van Basten aceitou a proposta, e só ficará com Blind até os jogos das datas FIFA de novembro. Van Basten confirmou a saída, a contragosto, e o comandante do time laranja deixou clara sua irritação ao saber que está momentaneamente sozinho, como último a saber: "Havíamos assinado um contrato juntos, e aí naturalmente supõe-se que iremos até o fim. Eu não teria saído. Posso lembrar que Marco me falou que tinha interesse [no trabalho]". Isso, porque o próprio pai de Daley revelou que poderia ter largado a Oranje: "Eu recebi um telefonema, sim. De um lugar no Oriente Médio. Lá os clubes ficam interessados em técnicos europeus, vez por outra. E parece que os treinadores holandeses são atraentes ao mercado, assim há possibilidades para mim (risos). Falando sério: estou focado no meu trabalho aqui. É o que conta".
Jorritsma: querido pelos jogadores, antiquado para a KNVB (ANP) |
Como se não bastasse, há o complicador adicional da provável saída de Hans Jorritsma. Personagem pouco conhecido do público, Jorritsma é o responsável da comissão técnica pela logística, e por atender aos pedidos dos jogadores. No entanto, a federação prefere demiti-lo ao fim do contrato, em1º de janeiro de 2017, após 20 anos de serviços, por desejar um personagem mais moderno, capaz de fazer mais tarefas do que apenas cuidar da logística - alguém que aja como Oliver Bierhoff faz na seleção alemã. Só faltou combinar com os jogadores e com Blind: o treinador comentou que os 23 atletas assinaram uma carta pedindo que a KNVB mantenha Jorritsma na comissão técnica.
Se está mais calma e estabilizada dentro de campo após vitórias em amistosos, fora dele a Holanda vive o caos (o caos!), pela falta de organização e prontidão. Só falta aparecer um escândalo de corrupção. A bagunça já está lá. É de se imaginar o que ocorrerá caso venha a derrota para a Suécia...
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