terça-feira, 13 de outubro de 2015

Não merecia

Após o vexame, nada a dizer. Só lamentos e promessas (Koen van Weel/ANP)
"Hup Holland!" Assim é um dos gritos mais conhecidos da torcida holandesa para incentivar sua seleção. Depois da rodada passada, com a dependência de uma vitória da Islândia contra a Turquia para chegar à repescagem das eliminatórias da Euro 2016, o grito foi alterado: "Hup Ijsland!". Lógico, um alento aos islandeses, para que se esforçassem no jogo de Konya. Mas, depois do final da história, impossível não pensar em como isso conotava também uma falta de confiança profunda na própria seleção. Desconfiança "justificada" pelo que se viu nesta terça: o 3 a 2 da República Tcheca, em plena Amsterdam Arena, que consumou o vexame temido. A ausência da Oranje de mais um torneio grande, 14 anos após a Copa de 2002.

Curiosamente, o início da partida até deu razões para otimismo. Afinal de contas, os primeiros cinco minutos mostraram um volume ofensivo promissor da equipe. Novamente aparecendo com destaque, El Ghazi tentou fazer as jogadas tradicionais pela direita, Memphis Depay também começava com algo pela esquerda; enfim, pelo menos motivação não faltaria. Aí... aí entrou a exemplificação do que um time calmo e bem treinado pode fazer. A Holanda tentou repetir o que fizera contra o Cazaquistão (4-3-3, convertendo-se em 4-1-4-1, com Blind jogando à frente da defesa). Só que a República Tcheca não era o Cazaquistão: jogando num 4-5-1, a equipe visitante conseguia manter linhas de meio-campo e defesa próximas o suficiente para que a defesa sempre ficasse povoada, minorando gradualmente a pressão holandesa.

E se tinha somente Tomas Necid como atacante "de ofício", a seleção tcheca aos poucos se aproveitou do entrosamento deficiente da defesa laranja para começar a trazer mais perigo, graças ao avanço organizado de quem podia apoiar. Já a linha de quatro defensores, sob pressão, já não mostrava tanta segurança como contra os cazaques. Além disso, Riedewald e Tete deixaram espaços pelas laterais. E foi pela direita que Pavel Kaderábek avançou livre para fazer o primeiro gol, dando o sinal do desastre final. Mais do que isso: foi após uma cobrança de lateral, pela esquerda, que Josef Sural entrou como quis na área holandesa, passou entre Jeffrey Bruma e Virgil van Dijk e chutou por baixo do goleiro Zoet. Sem que Jaïro Riedewald estivesse perto para evitar.

Era o golpe fatal. Não importava a entrada de Robin van Persie, novamente saindo da reserva, colocando o time num 4-4-2, com Daley Blind preenchendo a lacuna do substituído Riedewald na lateral esquerda, enquanto Van Persie e Huntelaar serviam de referências na frente. Nem importava a expulsão de Marek Suchy, no final do primeiro tempo. Porque o desânimo já tinha se apossado de jogadores e torcida, que sequer vaiou ao fim do primeiro tempo.

E se houvesse alguma dúvida, ainda, o acidental gol contra de Van Persie só dava ares mais desalentadoras ao drama holandês. Aí a tática foi mandada às favas: as entradas de Bas Dost e Jeremain Lens colocaram a Oranje num 3-3-4. Até que o esforço deu resultado, com os dois gols que diminuíram a vantagem tcheca. Ainda assim, o gol da Turquia tirou qualquer resquício de ilusão que um milagre pudesse acontecer. E, a bem da verdade, a Holanda nem merecia, pela campanha preguiçosa e desorganizada nas eliminatórias da Euro.

O pós-jogo foi o que se suspeitava. Dos jogadores, desolação: Sneijder lamentou e prometeu ("Nós sofremos os gols muito facilmente, após o 3 a 0 estava tudo acabado. Mas ainda estou bem e não penso em parar"). Daley Blind falou em união ("Naturalmente, estou triste e penso no técnico também como meu pai, mas o grupo está totalmente do lado dele"). Klaas-Jan Huntelaar foi mais realista ("Se você não se classifica após dez jogos, isso é uma questão de qualidade. Não ganhamos nenhum jogo contra as equipes classificadas").

A reação da torcida e da imprensa era de desânimo ou de raiva. A mídia foi lacônica: "Oranje perde Euro após novo revés", no "AD Sportwereld", caderno de esportes do diário "Algemeen Dagblad"; "Holanda empobrecida perde e está fora da Euro", noticiou o site da NOS, a emissora pública de tevê; "A desolada Holanda perde a Euro", informou a revista "Voetbal International"; "Holanda naufraga e está fora da Euro", no jornal "De Telegraaf", o maior do país. Na torcida, as cornetas sopraram justa e fortemente: chegou-se a dizer que Bruma e Van Dijk era "a pior zaga da história da seleção", no Twitter. Mas a repercussão mais doída veio não da Holanda, mas da Inglaterra. Mais precisamente, o ex-jogador Gary Lineker, hoje respeitado comentarista: "Good heavens, Holland have turned into Andorra" ("Meu deus, a Holanda se transformou em Andorra").

Enquanto isso, Danny Blind desconversava sobre erros: "Não vou dizer que as coisas mudarão, agora é hora de ver onde erramos. (...) A única coisa que devemos fazer é olhar para frente. Eu aceitei trabalhar junto de Hiddink e depois ocupar seu cargo. Aceitei antes, e seguirei agora". Dono das decisões e cada vez mais sob pressão, o diretor de futebol profissional da federação holandesa, aberta van Oostveen, também confirmou: "Sempre houve pressão sobre o diretor, e ela agora será mais forte do que nunca. Entendo muito bem a tristeza de todos. Mas nós continuaremos, Danny e eu. Vamos construir o projeto para a Copa de 2018".

Será necessário muito cuidado nesse projeto. Afinal, o da Euro deu espetacularmente errado. E se errar é humano, persistir no erro... a Confederação Brasileira de Futebol já mostrou o que acontece nesse caso.

Um comentário:

  1. Lembra da frase do Kuper?

    "Um dia nós, torcedores holandeses, olharemos para hoje e riremos, mas provavelmente isso só ocorrerá lá por 2034".

    Tem chão até lá em? E vendo os times holandeses jogando as competições europeias e o mal desenvolvimento dos jovens que jogam fora da Holanda é para se temer mesmo.

    O Blind vai ter muito trabalho para colocar essa Holanda na Copa

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