domingo, 13 de novembro de 2016

Foi por muito pouco

Hoje Memphis Depay mereceu ouvir elogios: salvou a Holanda do vexame (AP)
Jogadores holandeses se maravilhavam. A mesma coisa com os jornalistas holandeses, que noticiaram a façanha com destaque. E vários torcedores se derramaram redes sociais afora. Seleção holandesa de futebol? Que nada. O valor mais alto que se alevantou neste domingo, em relação ao esporte dos Países Baixos, foi outra atuação corajosa de Max Verstappen na Fórmula 1: nem mesmo uma desastrada parada nos boxes inibiu o piloto da Red Bull Racing, que persistiu num Grande Prêmio do Brasil muito chuvoso, até conseguir um impressionante terceiro lugar no pódio.

Por esse primeiro parágrafo, já é possível ter uma noção do desalento com que holandeses se referem à seleção masculina de futebol, na atualidade. E o que se viu neste domingo, no estádio Josy Barthel, em Luxemburgo, pelas eliminatórias da Copa de 2018, justificou mais uma vez o desânimo. A vitória por 3 a 1 pode até ter devolvido à Laranja o segundo lugar no grupo A da qualificação europeia para o mundial, mas não enganou ninguém quanto à qualidade do jogo: a equipe novamente decepcionou. Aliás, bordejou um vexame histórico, como se comentará aqui. O pior é que a ameaça de vexame esteve presente desde o começo da partida.

A Holanda até atacou, contando sempre com seu único jogador que ainda pode ser chamado de craque: Arjen Robben. Sempre que pegava a bola, o camisa 11 tentava alguma jogada - e quase sempre trazia perigo. Como aconteceu aos 10 minutos, quando quase marcou, exigindo boa defesa do goleiro Ralph Schon. No rebote, Wesley Sneijder demorou para chutar: passou a Davy Klaassen, que arrematou em cima da defesa. Esporadicamente, outros jogadores também ajudavam Robben na criação. Como Georginio Wijnaldum, que finalizou de fora da área aos 13', para outra boa defesa de Schon.

Todavia, outra vez, o meio-campo esteve espaçado demais, dificultando a rapidez nas jogadas. O que levava a dois efeitos colaterais. Primeiro, as repetitivas escolhas de sempre recuar a bola para que Jeffrey Bruma e Virgil van Dijk recomeçassem a jogada de trás, ou lançar a bola a Daley Blind, para que este tentasse um cruzamento da esquerda - na maioria das vezes, infrutífero. Depois, sem nenhum meio-campista com grande capacidade na marcação, cada bola perdida dava espaço para que Luxemburgo tentasse contragolpes. Nada que tenha atormentado muito a defesa (que até esteve bem). Mas de vez em quando trazia umas escaramuças. Como num chute de Stefano Bensi, fora da área, aos 14', rebatido por Bruma. Ou um arremate perigoso de David Turpel, aos 29', que Maarten Stekelenburg defendeu em dois tempos.

A Holanda tinha cerca de 70% da posse de bola, mas não fazia quase nada de útil com ela. Só voltou a trazer perigo aos 31'. Em jogada envolvendo... Robben, claro. Após Bart Ramselaar ajeitar, o nativo de Bedum dominou, finalizou, e Schon rebateu com o pé - na sobra, Klaassen cabeceou por cima do gol. Finalmente, aos 36', um gol que só exemplificou a importância mastodôntica que o ponta direita ainda tem na seleção holandesa: Wijnaldum lançou em profundidade, Klaassen ajeitou rápido e tocou para que Robben (impedido...) invadisse a área e concluísse com calma no canto direito de Schon., marcando o quarto gol em seus últimos cinco jogos pela seleção.

Pelo menos, algo havia sido feito. Mas os espaços continuavam existentes. E foram sobrecarregando cada vez mais a defesa, ainda mais com as atuações razoáveis de Turpel e Daniel da Mota. Até os 44 minutos, quando Da Mota recebeu a bola pela esquerda e foi empurrado atabalhoadamente por Joshua Brenet. Caiu na área, o juiz inglês Anthony Taylor marcou o pênalti claro, e Maxime Chanot converteu com categoria para marcar o primeiro gol de Luxemburgo contra a seleção holandesa desde a histórica vitória do país nas eliminatórias para a Euro 1964, há 53 anos.

Só empatar com Luxemburgo já seria um vexame tremendo. Pior ainda foi ver que a Laranja voltaria para o segundo tempo sem Arjen Robben nem Wesley Sneijder: Danny Blind decidiu colocar em campo Memphis Depay e Steven Berghuis. No caso da troca de Robben por Berghuis, mais do que compreensível: cada sinal de problema físico é razão suficiente para poupá-lo, e o próprio Robben confirmou que sentira leves dores no intervalo, e que o problema não era grande: "Eu senti cãibras na parte posterior da coxa. No intervalo, olhamos, não parecia grave, e eu obviamente queria continuar, mas o médico não quis correr riscos. Até porque o gramado estava uma vergonha". Verdade: a chuva e o frio prejudicaram a grama do Josy Barthel.

Mas se Robben saiu por mera precaução, Sneijder deixou o campo por opção tática. Não rendeu bem na ponta esquerda - e criticou naturalmente a escalação ali, após sofrer com a compactação do 4-5-1 luxemburguês: "Eu ficaria entre as linhas, mas nem linhas havia. Aí eu fiquei de ponta esquerda, e ponta esquerda eu não sou. Estava bem, não teve nada a ver com lesão. Fiquei meio chateado, mas tomei banho, me vesti e fui para o banco. E conseguimos o que viemos conseguir. Levamos os três pontos, e isso é o mais importante". Até porque o protagonista da vitória holandesa foi justamente o substituto de Wesley.

Curioso: sem Robben nem Sneijder, com um empate incômodo, quando o risco de vexame parecia gigante, a vitória veio com um destaque inesperado. Memphis Depay nem pareceu o jogador cada vez mais subutilizado no Manchester United: foi bastante ativo pela ponta esquerda, deu trabalho à defesa, foi o destaque que ainda pode ser neste grupo de jogadores. Marcar não só o segundo gol (aos 58', completando de cabeça o cruzamento de Daley Blind), mas também o terceiro (cobrança de falta perfeita, aos 84'), além de ter criado várias jogadas, foi a massagem no ego necessária para um jogador que caiu tão acentuadamente de produção nos últimos tempos. Na entrevista coletiva, Danny Blind exultou: "Para mim, não foi surpresa nenhuma a boa atuação dele. Ele deu uma impressão de estar determinado. É uma ótima recompensa para ele". E o próprio Memphis transmitiu a sensação de querer reagir, em suas palavras à NOS, emissora pública holandesa de tevê, após o jogo: "Desde meu primeiro toque na bola, me senti bem. Eu ainda consigo. É um sentimento maravilhoso".

Final feliz? Longe disso. Tudo bem, a Holanda venceu, evitou o vexame, voltou à segunda posição do grupo A, onde ficará até voltar a jogar, em março do ano que vem. Mas sabe-se que as coisas não estão boas. E quem foi mais claro sobre isso no time foi Arjen Robben, à NOS: "Precisamos ser realistas: a seleção não está mais alcançando o nível com que nos acostumamos. Temos um problema de qualidade pelas pontas. O gramado não prestava, mas às vezes [nosso jogo] era horrível. Não estamos bem em muita coisa. Cometemos muitos erros com a posse de bola. Estou feliz com os três pontos, mas precisamos ser realistas. Não posso dizer que jogamos bem. Dá para melhorar, precisa melhorar". Bem mais razoável do que Danny Blind, que preferiu valorizar o adversário na entrevista coletiva: "É a melhor geração da história de Luxemburgo. Eles perderam só de 1 a 0 para a Suécia, conseguiram um ponto em Belarus, e a Bulgária precisou fazer 4 a 3. Não se pode fechar os olhos para a realidade".

É verdade: não se pode fechar os olhos para a realidade, mesmo. Foi por muito pouco que a Holanda não passou por um vexame até pior do que ficar fora da Euro 2016. Se houve alegria aos holandeses no esporte, neste domingo, ela veio de Max Verstappen.

Eliminatórias para a Copa de 2018 - Europa
Luxemburgo 1x3 Holanda
Data: 13 de novembro de 2016
Local: Estádio Josy Barthel, em Luxemburgo
Juiz: Anthony Taylor (Inglaterra)
Gols: Arjen Robben, aos 36', Memphis Depay, aos 58' e 84'; Maxime Chanot, aos 44'

Holanda
Maarten Stekelenburg; Joshua Brenet, Jeffrey Bruma, Virgil van Dijk e Daley Blind; Bart Ramselaar (Marten de Roon, aos 89'), Davy Klaassen e Georginio Wijnaldum; Arjen Robben (Steven Berghuis, no intervalo), Bas Dost e Wesley Sneijder (Memphis Depay, no intervalo). Técnico: Danny Blind

Luxemburgo
Ralph Schon; Laurent Jans (Mathias Jänisch, aos 26'), Kevin Malget, Maxime Chanot, Enes Mahmutovic e Daniel da Mota (Kevin Kerger, aos 75'); Florian Bohnert, Stefano Bensi (Vincent Thill, aos 82'), Chris Philipps e Mario Mutsch; David Turpel. Técnico: Luc Holtz


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