Com o grupo de jogadores tranquilo, o foco na seleção masculina da Holanda vai todo para Louis van Gaal. E ele aproveita para tentativas de renovação - como Noa Lang, a quem aconselhou (Pro Shots) |
Louis van Gaal assume: ele é o que na Holanda (Países Baixos) chamam "procescoach". Ou seja: é um técnico do processo, dos trabalhos de longo prazo, de acompanhar o mesmo grupo por alguns anos. Tudo o que ele não pode ter, nesta terceira passagem pela seleção masculina neerlandesa, quando está conhecendo um grupo de jogadores no meio do caminho. Em duro cenário: no fogo das eliminatórias de uma Copa do Mundo. Nem por essas limitações Van Gaal está deixando de lado as experiências. Para sua sorte, terá nestas datas FIFA jogos em que esse "laboratório" é mais permitido: Letônia (nesta sexta-feira, em Riga, às 15h45 de Brasília) e Gibraltar (na próxima segunda, em Roterdã, também às 15h45 no horário brasileiro). Justamente os dois adversários considerados mais fracos no grupo G da qualificação europeia para o Mundial de 2022.
É o que Van Gaal está tentando fazer, aqui e ali, num grupo de 26 convocados que se apresentou em ambiente tranquilo, no centro de treinamentos de Zeist - até porque o crédito aumentou, com a goleada contra a Turquia, na rodada passada. Tanto que os jogadores pouco tiveram a falar. Os únicos a aparecerem mais foram dois nomes que vêm de um cenário caótico no Barcelona: Memphis Depay e Frenkie de Jong (sem contar Luuk de Jong, que não falou - e voltará a ser assunto), dois dos únicos a escaparem mais das críticas que cobrem o time azul e grená de cima a baixo. Ambos foram firmes na crença de que, uma hora, o Barcelona deixaria a situação. Falando à ESPN neerlandesa, Memphis foi enfático ao negar o arrependimento na mudança de time: "Oras, nem se pergunta uma coisa dessas. É o Barcelona, cara". Frenkie, um pouco mais resumido, também foi mais otimista: "Estamos em má fase, agora. Mas quando se olha para os nossos jogadores, temos um time bom. (...) Pelos nomes, podemos não ser um dos três, ou quatro, melhores times da Europa. Mas estamos logo abaixo".
Enfim, numa seleção com 26 nomes treinando calmamente, Van Gaal (e seu grande carisma) chamaram mais a atenção. Até pela tentativa que o técnico faz de tentar renovar a seleção, numa e noutra posição. Ele próprio reconheceu essa necessidade, na entrevista coletiva do começo da semana, ainda nos Países Baixos. Por isso aumentou a convocação - foram 23 nomes nas datas FIFA passadas, são 26 nesta: "Quero sentir, ouvir, ver novos jogadres. Sempre estou à procura de melhores jogadores para a seleção". Por isso surpreendeu com algumas escolhas - até previstas, na verdade.
A mais falada delas foi Noa Lang. Ponta direita, considerado um dos responsáveis pelo começo promissor do Club Brugge na temporada (tanto no Campeonato Belga quanto na Liga dos Campeões), Lang teve sua primeira convocação para a seleção adulta - esteve na fase de grupos da Euro sub-21 passada, mas foi cortado por um problema muscular. Mais do que seu talento, seu temperamento quente é o assunto mais falado sobre o atacante. A tal ponto que Van Gaal confirmou, na entrevista coletiva: "Já tive uma conversa boa com ele. Eu fiz um alerta para que ele não fizesse provocações". Noa Lang confirmou, mas... "faz parte, um pouco, de quem eu sou. Seria chato se todo mundo fosse igual. Só preciso levar para o lado positivo". E Van Gaal indicou, já em Riga, nesta quinta-feira: "Eu estou revirando o mundo atrás de um ponta-direita. Só Quincy Promes e Steven Bergwijn podem jogar por ali. Mas precisaremos de Lang ali". Como titular, perguntou um jornalista? Van Gaal: "Pode ser".
Mark Flekken já merecera comentários de Van Gaal antes mesmo de ser convocado. Pelo que faz no Freiburg, o goleiro mereceu a primeira chamada para a seleção (Pro Shots/onsoranje.nl) |
Outra novidade já tinha sido indicada por Van Gaal desde a entrevista coletiva após a goleada contra a Turquia: "Eu preciso vê-lo melhor, mas tenho ouvido que ele é muito bom". Ele, quem? Mark Flekken: o goleiro é um dos destaques do Freiburg, que começou muito bem o Campeonato Alemão (4º colocado, uma das defesas menos vazadas da Bundesliga). Aos 28 anos, Flekken nunca defendeu nenhum clube holandês - nascido em Kerkrade, fez toda a carreira adulta na Alemanha, país vizinho. Chegou como um dos quatro goleiros convocados, estreando na Laranja, sob elogios de Van Gaal, na entrevista coletiva na Holanda ("Ele é incrivelmente bom com o jogo nos pés") e na outra coletiva, já na Letônia ("Frans [Hoek, treinador de goleiros] é quem fica mais em contato com eles, mas já notei que é um rapaz bem aberto"). Embora Flekken chegue abaixo dos outros três na hierarquia - o provável titular Justin Bijlow, Joël Drommel e Tim Krul -, mostra o otimismo esperado de um estreante: "Eu nem tenho palavras".
Até mesmo quem ficou de fora da convocação causa cobranças a Van Gaal. Caso de Arnaut Danjuma Groeneveld: iniciando bem no Villarreal, o atacante de ascendência nigeriana (que já jogou na Laranja sob Ronald Koeman, em 2018) esteve ausente. Muitos cobraram, em imprensa e torcida: por quê Danjuma fora e Luuk de Jong - considerado um símbolo da má fase do Barcelona - chamado? Só aí o técnico da seleção reaqueceu sua velha relação de amor e ódio com os jornalistas. Primeiramente, justificou: "Ele mudou de clube tardiamente [no fim da janela de transferências]. Só melhorou nos últimos quatro jogos". E, aí sim, ligou a velha metralhadora: "Ele poderia estar, decidi não chamá-lo, mas isso não significa que ele não estará nas próximas. Não preciso de vocês [jornalistas] para dizerem que ele está jogando bem. Vocês acham que a federação não tem olheiros?"
No mais, nada de problemas, nada de polêmicas. Em que pese frases atravessadas como as recém-citadas, Van Gaal anda mais sorridente, de fato. E mesmo treinando modos alternados de jogar (em Zeist, além do 4-3-3 habitual, o técnico praticou um esquema com dois atacantes, dando preferência às bolas altas), ele já tem muitos titulares inquestionáveis. Denzel Dumfries, Virgil van Dijk, Daley Blind Frenkie de Jong, Memphis Depay, Steven Berghuis... todos esses são nomes certos. Por enquanto, Stefan de Vrij também o é, na zaga, segundo o técnico: "De Ligt melhorou, está cada vez mais perto da titularidade, mas De Vrij anda numa fase extraordinária". Só há uma preocupação: Georginio Wijnaldum. Primeiro, por estar ausente contra a Letônia, cumprindo suspensão por cartões amarelos. Depois, pelas atuações discretas no Paris Saint-Germain. Mas nada com que se importar muito, de acordo com Louis: "Eu tenho muita confiança em alguns jogadores. Ele [Wijnaldum] estava machucado antes da Copa de 2014, mas foi convocado, e jogou quase tudo".
Por tudo isso, Van Gaal está tranquilo para fazer as tentativas, em meio a uma Holanda cuja escalação está encaminhada. Porém, essas tentativas não podem ser "tentativa e erro": só o acerto manterá a tranquilidade que a Laranja vive. Ainda mais diante dos dois adversários mais frágeis do grupo. Quaisquer resultados que não sejam duas vitórias voltarão a fechar o horizonte que se abriu para a Copa.
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