Willy na esquerda, René na direita: os irmãos gêmeos Van de Kerkhof sustentaram a dupla no PSV e na seleção holandesa à base de talento (Créditos não encontrados) |
Depois deles vieram vários. Nos anos 1980 (e nos 1990 também), os Koeman, Erwin e Ronald. Nos 1990 (e na década de 2000 também), os De Boer, Frank e Ronald, já até homenageados aqui no Espreme a Laranja. Mas o fato é que a primeira dupla de irmãos gêmeos holandeses a atuar pela seleção e chamar a atenção do mundo - não só pelo parentesco e pela semelhança - surgiu nos anos 1970. Pelo talento e pelo pitoresco de ver dois gêmeos num mesmo time, Willy e René van de Kerkhof são mais dois personagens da geração dos vice-campeonatos mundiais de 1974 e 1978 que volta e meia são celebrados. Merecem ainda mais comemorações nesta quinta-feira, 16 de setembro: afinal, ambos completam 70 anos de idade.
Começo igual, posições diferentes
A família Van de Kerkhof já tinha vinculações com o futebol a partir do patriarca: Reinier van de Kerkhof (1910-1956) atuou por algum tempo no Deurania, clube amador de Deurne, cidade próxima a Helmond, onde a família vivia. Filho mais velho dos seis rebentos do casal Reinier-Mien, Gerard van de Kerkhof - nascido em 1943 - também tentou a sorte no futebol. Sem muito sucesso: após passar apenas por clubes menores, Gerard encerrou a carreira em 1973.
Anos antes, ainda na década de 1960, os gêmeos René e Willy começaram também a buscar seguir o que o pai fizera e o irmão mais velho fazia. O início foi no mesmo lugar: o RKSV MILO, clube amador de Helmond, cidade natal de ambos. Mas mesmo com o começo igual, as posições já eram mais diferentes. Willy jogava mais atrás, como meio-campista, se esforçando nos desarmes, também iniciando a criação de jogadas. Já René era mais insinuante: jogando pela ponta-direita, costumeiramente entrava pela área para finalizar as jogadas.
Mesmo em posições diferentes, ambos continuaram iguais no começo. As carreiras de René e Willy começaram para valer quando ambos chegaram ao Twente, em 1970. No clube de Enschede, ambos tomaram a titularidade - cada um em sua posição - já na primeira temporada, 1970/71. Foram personagens que fundamentaram as bases de um bom momento da história dos Tukkers, começando com a chegada às semifinais da Copa da UEFA e a terceira posição no Campeonato Holandês, em 1972/73. René mais goleador, Willy mais esforçado (sem deixar de fazer seus gols), ambos se notabilizaram o suficiente para darem um salto nas duas carreiras, a partir de 1973.
René (à esquerda) e Willy jogaram pouco na Copa de 1974. Mas já naquela época começaram a ocupar espaço na seleção (Arquivo Nacional de Imprensa dos Países Baixos) |
Em clubes, os irmãos Van de Kerkhof se transferiram para o PSV - então, ainda um clube sem muita visibilidade além dos Países Baixos. E as portas da seleção masculina se abriram para eles. René foi o primeiro: já estreou pela Laranja em março de 1973, num amistoso contra a Áustria (derrota holandesa, 1 a 0). E até marcou um gol em seu segundo jogo - goleada por 8 a 1 contra a Islândia, nas eliminatórias da Copa de 1974. Holanda classificada, foi a vez de Willy estrear, já no ano da Copa: o meio-campista fez o primeiro jogo pela seleção em 5 de junho, num amistoso pré-Copa, contra a Romênia. Mais do que isso: ambos foram convocados para o Mundial que mostrou uma seleção antológica. Ficaram na reserva: René só jogou o segundo tempo da final contra a Alemanha, e Willy sequer teve minutos em campo naquela Copa. Mas já davam sinais de que seriam nomes importantes nos anos que viriam.
Brilho em conjunto
De fato, foi o que aconteceu. A dupla fraterna teve papel preponderante numa geração que começou a levar o PSV a grandes alturas. Pela Eredivisie, três títulos nacionais (1974/75, 1975/76 e 1977/78). Mais duas Copas da Holanda (1973/74 e 1975/76). E principalmente, o título que o PSV precisava para se credenciar como um dos grandes clubes holandeses: a Copa da UEFA, em 1977/78. Willy no meio-campo, René no ataque, os Van de Kerkhof se garantiram ali como grandes ídolos em Eindhoven - quando nada, porque Willy fez um dos gols na final da Copa da UEFA, vencida contra o Bastia francês. Pela seleção, o esforço de Willy e a ofensividade de René também fez com que eles virassem nomes suficientemente confiáveis, mesmo nas turbulências vividas entre as Copas de 1974 e 1978. Ambos estiveram na Euro 1976 - Willy como titular, até fazendo gol na decisão do terceiro lugar contra a Iugoslávia, René só jogando na citada decisão.
A mão fraturada de René foi um fator a mais na tensão durante a final da Copa de 1978 - na qual ambos se destacaram pela Holanda (Reprodução) |
Na Copa de 1978, então, os Van de Kerkhof foram nomes fundamentais na campanha de mais um vice-campeonato mundial. Titulares em todas as partidas do torneio disputado na Argentina, marcaram um gol cada um na segunda fase que levou a Laranja à final (Willy nos 5 a 1 contra a Áustria, René nos 2 a 2 contra a Alemanha). René foi até personagem de um momento pitoresco: pouco antes da final, o capitão argentino Daniel Passarella reclamou ao juiz italiano Sergio Gonella que o gesso na mão fraturada do atacante poderia ser perigoso em campo. Gonella ordenou: ou René encobria o gesso, ou o jogo não começaria em Buenos Aires. René reclamou muito, mas afinal colocou gaze e esparadrapo na mão, por cima do gesso. Só aí pôde começar aquela partida que, por mais que trouxesse uma derrota para a Holanda (Argentina 3 a 1), foi a única vez em que irmãos gêmeos jogaram uma decisão de Copa. Mais um fator a notabilizar a dupla, que até mesmo se arriscara na música, lançando algumas canções
Separação por um tempo: um foi, o outro ficou
Pelos anos seguintes à Copa de 1978, Willy e René van de Kerkhof continuaram como destaques no PSV e na seleção. Emplacaram mais um grande torneio defendendo a Oranje, a Euro 1980 - mesmo como membros de uma geração já decadente, eram até destaques da equipe, titulares nos três jogos da eliminação na fase de grupos (e Willy até fez gol, na derrota por 3 a 1 para a Alemanha). Aliás, aquela eliminação começou a jogar o futebol neerlandês no limbo em que ele passaria boa parte da década de 1980. Tal limbo representaria uma espécie de separação entre as carreiras de ambos.
O atacante René teve a presença diminuindo gradativamente na seleção - teve sua última partida por ela em outubro de 1982, contra a Holanda, nas eliminatórias da Euro 1984. No PSV, após dez anos de clube, preferiu conhecer um pouco da vida fora de Eindhoven: aceitou a proposta do Apollon Smyrnis, clube grego em que passou uma temporada. Teve mais sucesso entre 1984 e 1985, na curiosa experiência em Hong Kong: jogando pelo Seiko, foi campeão nacional naquele país. E mesmo quando voltou ao país natal para a reta final da carreira, René van de Kerkhof teve seus últimos momentos em clubes pequenos. Os dois, em terras conhecidas: o Helmond Sport, da cidade em que nasceu, e o FC Eindhoven, primo pobre da cidade homônima. E René parou, em 1989.
Já o meio-campista Willy teve mais longevidade, até por depender menos da velocidade em sua posição (a principal característica de René eram os dribles pela ponta, vale lembrar). Além do mais, o outro Van de Kerkhof se tornou veterano no mesmo ambiente em que já era ídolo, ficando no PSV durante boa parte da década de 1980. Mais do que isso: de certa forma, Willy foi o único veterano da seleção dos anos 1970 a continuar sua trajetória na Laranja. Não só foi um nome a receber os novatos que chegavam pouco a pouco (Ruud Gullit, Marco van Basten, Frank Rijkaard, Ronald e Erwin Koeman, Gerald Vanenburg, Wim Kieft), como foi titular nas campanhas fracassadas da Holanda nas eliminatórias de Euro 1984 e Copa de 1986. Aliás, muito se reclama que Willy, aos 34 anos, poderia ter jogado na partida de volta da repescagem por vaga no Mundial, contra a Bélgica. A Oranje ficou fora do torneio pelos gols fora de casa, e aí, sim, o veterano parou com a seleção. Pelo menos, o PSV lhe deu a maior das recompensas: já mais como um reserva calejado, Willy fez parte do grupo campeão europeu, em 1988, último ano de sua carreira.
Só com as carreiras encerradas, ambos voltaram a se aproximar. Cada um com sua família, ambos vivem em Helmond. Costumeiramente, sempre aparecem em Eindhoven, para assistirem aos jogos do PSV onde são ídolos. E sempre aparecem lado a lado, sorridentes, para simbolizarem a primeira dupla de irmãos gêmeos que ficou famosa no futebol dos Países Baixos.
Willy na esquerda, René na direita, os dois continuam sendo símbolos do PSV, muito tempo após pararem de jogar (Eindhovense Dagblad) |
Wilhelmus Antonius "Willy" van de Kerkhof
Data de nascimento: 16 de setembro de 1951, em Helmond
Clubes: Twente (1970 a 1973) e PSV (1973 a 1988)
Seleção: 63 jogos e 5 gols, entre 1974 e 1985
Reinier"René" Lambertus van de Kerkhof
Data de nascimento: 16 de setembro de 1951, em Helmond
Clubes: Twente (1970 a 1973), PSV (1973 a 1983), Apollon Smyrnis-GRE (1983 e 1984), Seiko-HKG (1984 e 1985), Helmond Sport (1985 a 1988) e FC Eindhoven (1988 e 1989)
Seleção: 47 jogos e 5 gols, entre 1973 e 1982
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