quarta-feira, 22 de março de 2023

Um recomeço desconfiado

Na sua volta à seleção masculina da Holanda, Ronald Koeman traz as boas lembranças da primeira passagem. Mas tem alguns problemas para consertar no início das eliminatórias da Euro (René Nijhuis/BSR Agency/Getty Images)

Na primeira passagem de Ronald Koeman como técnico, entre fevereiro de 2018 e agosto de 2020, a seleção masculina da Holanda (Países Baixos) teve bons momentos. De uma equipe traumatizada por ausências na Euro 2016 e na Copa de 2018, a Laranja se reabilitou, ficou mais consistente, e passou boa impressão ao ser vice-campeã na Liga das Nações de então e ao garantir vaga na Euro 2020. Retomar esta boa impressão, fazer o time ser mais vistoso do que na campanha (correta mas discreta) da Copa do Mundo passada, é o grande objetivo nesta volta do ex-zagueiro ao comando da Oranje. Contudo, há certas desconfianças nestas datas FIFA que marcam o retorno pós-Copa do time neerlandês, abrindo as eliminatórias da Euro 2024, contra França - sexta, 24, às 16h45 de Brasília, em Saint-Dénis - e Gibraltar - segunda, 27, às 15h45 de Brasília - , em Roterdã.

A maior das desconfianças nem é culpa de Koeman, 60 anos recém-completos: foi o corte de Frenkie de Jong ("Tomou uma pancada nos últimos dez segundos do jogo contra o Real Madrid", justificou Koeman na entrevista coletiva da segunda passada). A medida de como o meio-campista é indispensável vem nas declarações tanto do próprio técnico ("Ele é um jogador importante para este time. O time será diferente com outros jogadores, isso é claro. Ele tem qualidades que poucos jogadores têm") quanto de Memphis Depay ("É chato não vê-lo aqui. Pelo menos, falei com ele, e ele disse que não é uma lesão grave"). De fato, a qualidade de organização que o meio-campo da camisa 21 tem na Laranja faz e fará falta. E a ausência trouxe a óbvia dúvida: quem preencherá a lacuna?

Caberá, provavelmente, a um entre dois estreantes pela seleção neerlandesa masculina. O primeiro já veio na convocação original: Mats Wieffer, 23 anos, começou a temporada lesionado, mas precisou de poucos meses para se tornar indispensável ao Feyenoord, atual líder (e favorito) no Campeonato Holandês, também exibindo qualidade nos desarmes (menos) e nos lançamentos em profundidade (mais). E Ronald Koeman sinalizou que poderia apostar nele: "Eu o vi jogando no domingo [vitória do Feyenoord sobre o Ajax pelo Campeonato Holandês], e não teria medo de escalá-lo".

Mats Wieffer mal se estabeleceu no meio-campo do Feyenoord e já recebeu a aposta de Koeman (KNVB Media)

Outro estreante em convocações na Holanda também pode ser jogado no desafio de pegar os vice-campeões do mundo no Stade de France: Lutsharel Geertruida. Pelo menos, o defensor do Feyenoord chega à seleção graças a uma grande fase que vive, amparado no esforço notável que faz na defesa: com velocidade e capacidades defensivas, Geertruida pode jogar tanto no miolo de zaga quanto na lateral. Além do mais, se apresentou com moral: foi dele o gol da supracitada vitória do Feyenoord no clássico contra o Ajax, domingo passado. Com a ausência obrigatória de Denzel Dumfries contra a França (suspenso pela expulsão contra a Argentina, na Copa, na confusão após o jogo), Geertruida foi convocado. Escolha discutida: afinal de contas, outra opção de lateral direito, Jeremie Frimpong está muito bem no Bayer Leverkusen alemão. Coube a Koeman explicar porque escolheu Geertruida e deixou Frimpong fora da convocação: "O lateral, comigo, precisa defender bem. No aspecto defensivo, ele [Frimpong] ainda traz dúvidas".

As desconfianças sobre a Holanda vão além. Ronald Koeman sinalizou desde a entrevista de sua volta, em janeiro: com ele, a seleção masculina voltará a jogar com quatro na defesa, deixando de lado a escolha que Louis van Gaal fez na Copa, por três zagueiros. Tem alguma razão de ser: a opção de Van Gaal foi polêmica. Todavia, isso também foi feito pelos sucessores de Van Gaal após a Copa de 2014 - e a Holanda não tinha nomes capazes de darem a intensidade necessária, mergulhando na forte crise que viveu naqueles anos. Com o 4-3-3, a Laranja precisará se mostrar bem mais dinâmica do que mostrou no Catar. E para completar, na quinta-feira, uma só infecção viral fez cinco jogadores serem cortados de uma só vez, pelo menos para a partida desta sexta. Três dos cortados seriam estreantes na Laranja: o goleiro Bart Verbruggen (vem bem na temporada, com o Anderlecht-BEL), Sven Botman e Joey Veerman (este, pedido nas convocações havia muito tempo). Além deles, Matthijs de Ligt e Cody Gakpo ficarão de fora contra a França.

Além do mais, se alguns bons nomes seguem na defesa e no meio-campo, o gol e o ataque continuam pontos de interrogação. Com Andries Noppert (o titular da Copa) tendo lesão muscular na coxa, Koeman foi conservador ao chamar os arqueiros, trazendo de volta Jasper Cillessen e Mark Flekken, ausentes da Copa. O ataque, já sem opções que chamassem muito a atenção, perdeu dois possíveis convocados: tanto Luuk de Jong quanto Vincent Janssen, ambos presentes na Copa, anunciaram a saída definitiva da seleção, por opções pessoais. E Ronald Koeman assumiu: "Neste grupo, há alguns rapazes que podem jogar bem [como atacantes], mas chamar Brobbey [reserva do Ajax, atualmente] é um indicativo de que não temos muitas alternativas". Valeu até chamar já Donyell Malen, em relativa recuperação no Borussia Dortmund.

Mas nem tudo é ruim nos Países Baixos. Há motivos para celebração da seleção. Quase um ano após vestir laranja pela última vez, meio ano após a fratura na tíbia que o afastou da Copa, voltando a ter ritmo de jogo na Roma, Georginio Wijnaldum está de volta às convocações. E já chegou motivado - e elogiando o novo técnico: "Por incrível que pareça, gostei do meu período de recuperação. E mesmo que eu seja muito grato a Van Gaal, eu me sinto melhor com Koeman". Memphis Depay, então, escancarou o motivo do grupo receber bem o técnico que volta: "Eu prefiro o 4-3-3, sempre disse isso. Quando você joga com dois na frente, às vezes se sente numa ilha, de tão isolado que fica".

Wijnaldum e sua experiência, também retornando à seleção (René Nijhuis/BSR Agency/Getty Images)

O clima tranquilo segue com um provável celebrado: Daley Blind recebeu a convocação, mesmo na reserva do Bayern de Munique, e tem a grande chance de completar - seja contra França ou contra Gibraltar - 100 jogos pela Laranja. Koeman deve dar a Blind a chance, mas já alertou: "Ele não será meu titular". Caminho aberto para Tyrell Malacia ou Nathan Aké ocuparem a esquerda. No ataque, o espaço para ser a referência na área também parece próximo para Wout Weghorst, que partiu do gol marcante contra a Argentina na Copa para viver um sonho, como indicou em declarações à revista Voetbal International: "Olhe onde estou agora: titular do Manchester United, novamente convocado para a seleção, tenho uma família maravilhosa. Eu sou muito sortudo".

Enfim, a Holanda tem desconfianças. Mas pela lembrança da boa fase que já viveu sob Ronald Koeman, ele recebeu o voto de confiança. Até porque, desta vez, não deixará a seleção no meio do caminho, como fez em 2020 em nome do sonho de treinar o Barcelona: "Nunca digo nunca, mas a chance de eu voltar a treinar um clube é pequena (...) Agora quero comandar a Holanda num torneio, num grande torneio". Tem a chance disso, na Euro. E se fizer bem seu trabalho, tem tudo para chegar à Copa em 2026. 

Ou seja, a Holanda já não terá de trocar tanto seu técnico. Já é um bom começo...

Os 25 convocados da Holanda (Países Baixos)

Goleiros: Jasper Cillessen (NEC), Mark Flekken (Freiburg-ALE) e Kjell Scherpen (Vitesse) - Bart Verbruggen (Anderlecht-BEL) foi cortado, pelo menos para o jogo contra a França

Laterais: Denzel Dumfries (Internazionale-ITA), Lutsharel Geertruida (Feyenoord), Tyrell Malacia (Manchester United-ING) e Daley Blind (Bayern de Munique-ALE)

Zagueiros: Virgil van Dijk (Liverpool-ING), Nathan Aké (Manchester City-ING), Jurriën Timber (Ajax) e Stefan de Vrij (Internazionale) - Sven Botman (Newcastle-ING) e Matthijs de Ligt (Bayern de Munique-ALE) foram cortados, pelo menos para o jogo contra a França

Meio-campistas: Georginio Wijnaldum (Roma-ITA), Marten de Roon (Atalanta-ITA), Davy Klaassen (Ajax), Kenneth Taylor (Ajax), Mats Wieffer (Feyenoord), Xavi Simons (PSV) e Ryan Gravenberch (Bayern de Munique-ALE) - Joey Veerman (PSV) foi cortado, pelo menos para o jogo contra a França

Atacantes: Memphis Depay (Atlético de Madrid-ESP), Wout Weghorst (Manchester United-ING), Steven Berghuis (Ajax), Brian Brobbey (Ajax) e Donyell Malen (Borussia Dortmund-ALE) - Cody Gakpo (Liverpool-ING) foi cortado, pelo menos para o jogo contra a França

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