segunda-feira, 27 de março de 2023

Vitória preocupante

A vitória contra Gibraltar foi útil para a campanha nas eliminatórias da Euro 2024. Só que a Holanda nem comemorou muito: sabe que decepcionou mesmo diante de um adversário fraco (John Thys/AFP/Getty Images)

Como pode uma vitória ser preocupante? Afinal de contas, os três pontos foram conseguidos - em tese, não há nada de problemas. Contudo, não é bem assim, quando se trata de uma seleção bem mais forte contra uma bem mais fraca. Eis o caso da seleção da Holanda (Países Baixos), nas eliminatórias da Euro 2024: tendo goleado Gibraltar nas eliminatórias da Copa do Mundo passada (7 a 0 e 6 a 0), ganhou por 3 a 0. Só que a atuação dos jogadores da Laranja em De Kuip deixou claro que há muita coisa a ser melhorada, para tentar a classificação ao torneio europeu de seleções.

Não que se pudesse esperar caminho aberto dos gibraltarinos, diante de uma anfitriã escalada para buscar o ataque desde o começo (tanto que só um volante, o estreante Mats Wieffer, foi escalado). O que se viu nos primeiros minutos - bem, talvez na partida toda - foi o previsível: a seleção visitante totalmente fechada, enquanto a Holanda buscava algum espaço. Já havia sinais de boas atuações: Memphis Depay aparecia mais, Xavi Simons tinha vontade com a bola nos pés, Nathan Aké era opção constante na esquerda. 

Só que, na hora de finalizar... os problemas apareciam. O primeiro era a natural falta de espaço para entrar na área com troca de passes: as chances da Holanda vinham em chutes de média distância (Steven Berghuis aos 9', Aké aos 10', Wieffer aos 16'). Até aí, mérito dos jogadores de Gibraltar. O segundo, porém, já era demérito da Holanda: falta de precisão. Passes errados, chutes descuidados... jogadas que poderiam virar chances de gol eram desperdiçadas. Só mesmo o cruzamento de Denzel Dumfries que Memphis Depay cabeceou para as redes, aos 23', foi oportunidade aproveitada. De resto, a Holanda seguiu estéril no ataque. Talvez, nem por falta de capacidade: Georginio Wijnaldum, por exemplo, pode justificar as três chances perdidas (aos 28', 32' - poderia ser bonito voleio - e aos 42') pela falta de ritmo. Já Wout Weghorst, nem isso pode falar: mal teve a bola nos pés. E quando teve, não brilhou, perdendo uma chance aos 41' e "jogando de zagueiro" num desvio de escanteio, aos 45'.

Diante de tamanha imprecisão, as alterações de Ronald Koeman até que deram certo no segundo tempo. Novamente, Donyell Malen teve lá sua utilidade ao jogar: trouxe mais velocidade pela direita, com a bola nos pés. Mesmo voltando do problema estomacal, Cody Gakpo também garantiu mais técnica pela esquerda, com Xavi Simons recuando para o meio. Bastou isso para um começo mais promissor na etapa complementar, com Gakpo tendo chance aos 48' e, quase na sequência, o gol de Nathan Aké, após jogada feita na área adversária. Mais um minuto, e com a expulsão de Liam Walker (falta que pareceu mais séria do que de fato foi sobre Wieffer), parecia que o caminho se abriria para a goleada esperada.

Com voluntariedade no apoio ao ataque e dois gols, Aké talvez tenha sido o único da Laranja com algo a comemorar (Pro Shots/Icon Sport/Getty Images)

Que nada. Novamente, a Holanda teve a bola, cercou mais a área de ataque, teve Virgil van Dijk e Matthijs de Ligt comumente avançando para ajudar... e não passou disso. Quando passou, os chutes foram acertados nos defensores de Gibraltar. E quando eles eram superados, até o goleiro Dayle Coleing apareceu, fazendo pelo menos três boas defesas. Coleing só foi superado quando um chute de Aké desviou em John Sergeant e foi direto para as redes - o terceiro gol foi computado até merecidamente para o lateral esquerdo, muito provavelmente o melhor holandês em campo.

E a vitória esperada veio. Só que as declarações dos próprios jogadores da Laranja deixaram claro: esperava-se muito mais. Começando por Van Dijk ("É óbvio que a gente devia ter feito melhor", à emissora NOS, ainda no gramado), continuando por De Ligt ("Esperávamos uma goleada para a torcida se divertir, mas infelizmente não aconteceu") e terminando por Ronald Koeman, que lamentou não só a vitória discreta, mas também a semana turbulenta ("Precisamos melhorar, em absoluto. Estou chocado com alguns momentos nos jogos"). 

É bom lembrar que a situação da Holanda está sob controle. Melhor ainda lembrar que, se tudo der errado nas eliminatórias "normais", a Laranja está garantida na repescagem por vaga na Euro, por ter vencido seu grupo na Liga das Nações. Só que as atuações apagadas deixaram claro: sem criatividade nem intensidade, a Holanda sofrerá nas semifinais da Nations League, em junho, contra a Croácia. Sofrerá ainda mais contra Grécia e Irlanda, seleções tradicionalmente aguerridas. Que podem causar mais problemas do que Gibraltar jamais poderia.

Por incrível que pareça, foi uma vitória preocupante da Holanda.

Eliminatórias da Euro 2024
Holanda 3x0 Gibraltar
Data: 27 de março de 2023
Local: De Kuip (Roterdã)
Juiz: Morten Krogh (Dinamarca)
Gols: Memphis Depay, aos 23', e Nathan Aké, aos 50' e aos 82'

Holanda
Jasper Cillessen; Denzel Dumfries, Matthijs de Ligt (Tyrell Malacia, aos 77'), Virgil van Dijk e Nathan Aké; Georginio Wijnaldum (Cody Gakpo, aos 46'), Mats Wieffer (Daley Blind, aos 63') e Memphis Depay (Davy Klaassen, aos 63'); Steven Berghuis (Donyell Malen, aos 46'), Wout Weghorst e Xavi Simons. Técnico: Ronald Koeman

Gibraltar
Dayle Coleing; Graeme Torrilla (Niels Hartman, aos 86'), Jayce Olivero, John Sergeant e Kian Ronan (Aymen Mouelhi, aos 76'); Roy Chipolina, Bernardo Lopes e Lee Casciaro (Julian Valarino, aos 86'); Liam Walker, Jamie Coombes (Ethan Jolley, aos 65') e Ethan Britto. Técnico: Julio Ribas

Nenhum comentário:

Postar um comentário