sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Até resistiu bastante

O choro holandês pela eliminação na Copa do Mundo poderia ter vindo após atuação apática. Teve o consolo na eletrizante reação que melhorou um pouco a impressão deixada (KNVB Media/Divulgação)

A história da eliminação da Holanda (Países Baixos) na Copa do Mundo de 2022 tem dois pontos de vista possíveis. Um, talvez, seja até o mais adequado: a Argentina passou porque jogou melhor ao longo dos 120 minutos, teve mais técnica, mais presença no ataque, mais domínio, mais competência, diante de uma Laranja que foi inofensiva durante a maior parte do jogo no estádio Lusail. Mas o outro tem a emoção que faz tão bem (e é tão necessária) ao futebol. Afinal de contas, os neerlandeses transformaram uma partida definida nos sete minutos finais, mais acréscimos. Ainda que no desespero, conseguiram levar a Albiceleste às últimas instâncias antes de vê-la classificada às semifinais. Se serve de consolo, até que a Holanda resistiu bastante antes da queda na Copa - até previsível.

No primeiro tempo, a partida teve o aspecto de "jogo de xadrez" que muita gente esperava para ela. De um lado, a Holanda que voltava a ter dificuldades: sem espaço nenhum para atacar, com seus atacantes (Memphis Depay e Steven Bergwijn - este, voltando a ser titular) rendidos à defesa argentina com três zagueiros, com os laterais fundamentais contra os Estados Unidos voltando a encontrar uma marcação que os bloqueava. Por mais que Cody Gakpo se esforçasse, chance de verdade, nos primeiros 45 minutos, a Holanda só teve no chute de Bergwijn para fora, aos 24', após tabela rápida com Memphis.

Se a decisão de jogar com o mesmo esquema da Holanda dava certo - três zagueiros, tendo Rodrigo de Paul superando as dores musculares para entrar como titular -, a Argentina também não tinha muito espaço. Era melhor do que a adversária, tinha mais a bola, tinha jogadas pelas laterais, tinha Enzo Fernández aparecendo bem... e tinha Lionel Messi, também buscando jogo. Só que o espaço não aparecia, já que a Holanda também se defendia bem. Ainda assim, bastou um erro, aos 32'. Com Messi tendo a bola, Blind foi lento para acompanhar a jogada, Nathan Aké teve dúvidas sobre quem marcaria... e apareceu o espaço que o camisa 10 argentino precisava. Ele passou, Nahuel Molina recebeu e bateu: 1 a 0. A Argentina conseguia uma vantagem importantíssima. E a presença de Messi ficava ainda mais preponderante - algo expresso em tentativas como o chute a gol, aos 40'.

A sensação de controle argentino no jogo ficou até maior no segundo tempo. Van Gaal alterou a Holanda já no intervalo, aumentando a força física no meio-campo com a entrada de Teun Koopmeiners e tentando trazer mais velocidade ao ataque, com a vinda de Steven Berghuis (no lugar de Bergwijn, em outra má partida na Copa). Nada. Ao contrário: a Argentina ficou até mais perigosa no ataque - De Paul quase fez aos 59', e Messi mandou cobrança de falta quase perfeita na rede por cima do gol, aos 63'. Veio uma mudança tática: Blind saiu, Luuk de Jong entrou, e voltava o 4-3-3 velho de guerra. Nada. Pior: Dumfries cometeu pênalti, derrubando Acuña para evitar drible. Messi cobrou com perfeição: o goleiro Andries Noppert mal teve como se mexer para evitar o 2 a 0. Parecia o fim.

Aí entrou Wout Weghorst.

Inicialmente, só para ser mais um a tentar aproveitar as bolas aéreas que a Holanda usaria cada vez mais em busca de algo. Conseguiu, aos 83': fez o primeiro da Laranja, num cruzamento de Berghuis, trazendo de volta a sensação de que, quem sabe, a Argentina outra vez sucumbisse ao nervosismo de um mau momento no jogo. E de que ainda era possível à Holanda. Berghuis tentou, aos 85': chute na rede pelo lado de fora. Virgil van Dijk foi para o ataque, como sempre acontece na hora do abafa. Várias faltas surgiram perto da área. Na primeira, aos 90' + 1, Gakpo chutou na barreira. Na segunda... no último dos 10 minutos de acréscimo, Koopmeiners rolou a bola, Weghorst dominou em meio à marcação e chutou para o 2 a 2 incrível. Até inacreditável, diante do que a Holanda (não) jogara. Uma jogada ensaiada e praticada com brilhantismo trouxera a Laranja de volta à vida.

Weghorst já reanimara a Holanda levemente, ao diminuir a vantagem da Argentina. Mas seria com o gol em jogada inesperadamente ensaiada que ele faria o jogo ganhar nova vida em definitivo (Alberto Pizzoli/Getty Images)

Mas ainda não tinha acabado.

E na prorrogação, é justo dizer, a Holanda mal conseguiu jogadas de ataque. Tinha o esforço, em Timber (ótima partida), em Luuk de Jong, num Weghorst que, pelo menos nesta partida, foi indiscutível. Só que faltava o talento - só presente em Berghuis, que tentou um chute a gol aos 119'. De resto, a Argentina voltou a se assentar aos poucos. Teve a entrada de Ángel di María, para ajudar na reta final. E terminou os 120 minutos com muito mais chances para a vitória: só Van Dijk evitou o gol de Enzo Fernández aos 114', Weghorst salvou na defesa (Enzo Fernández bateu dois minutos depois, e o desvio do atacante com a cabeça fez a bola sair por cima), e Noppert trouxe os lances finais de salvação: defesa em chute de Messi (119'), defesa que impediu gol olímpico de Di María (120'). Até a trave salvou, quando Enzo Fernández chutou, no último lance com bola rolando.

Nos pênaltis, falhar seria proibido. E a Holanda falhou demais para um time que se pretendia tão preparado para as séries de cobranças em momentos decisivos. Nos erros de Van Dijk e Berghuis, com as defesas que confirmaram Emiliano "Dibu" Martínez como um goleiro confiável na hora necessária. Nas cobranças perfeitas da Argentina, indefensáveis para Noppert, rendendo a ida da Albiceleste às semifinais.

Veio a eliminação. Pelo menos, a Holanda resistiu mais do que se esperava.

COPA DO MUNDO FIFA 2022 - QUARTAS DE FINAL

Holanda 2x2 Argentina - Argentina 4x3 nos pênaltis

Data: 9 de dezembro de 2022
Local: Lusail (Doha)
Árbitro: Antonio Mateu Lahoz (Espanha)
Gols: Nahuel Molina, aos 32', Lionel Messi, aos 73', e Wout Weghorst, aos 83' e aos 90' + 11
Ordem dos pênaltis: Van Dijk (0 a 0 - Emiliano Martínez pegou), Messi (1 a 0), Berghuis (1 a 0 - Emiliano Martínez pegou), Paredes (2 a 0), Koopmeiners (2 a 1), Montiel (3 a 1), Weghorst (3 a 2), Enzo Fernández (3 a 2 - cobrança para fora), Luuk de Jong (3 a 3) e Lautaro Martínez (4 a 3)

HOLANDA
Andries Noppert; Jurriën Timber, Virgil van Dijk e Nathan Aké; Denzel Dumfries, Marten de Roon (Teun Koopmeiners, aos 46'), Frenkie de Jong e Daley Blind (Luuk de Jong, aos 65'); Cody Gakpo (Noa Lang, aos 113'); Memphis Depay (Wout Weghorst, aos 78') e Steven Bergwijn (Steven Berghuis, aos 46'). Técnico: Louis van Gaal

ARGENTINA
Emiliano Martínez; Nahuel Molina (Gonzalo Montiel, aos 106'), Cristián Romero (Germán Pezzella, aos 78'), Nicolás Otamendi, Lisandro Martínez (Ángel di María, aos 111') e Marcos Acuña (Nicolás Tagliafico, aos 78'); Rodrigo de Paul (Leandro Paredes, aos 66'), Enzo Fernández e Alexis MacAllister; Lionel Messi e Julián Álvarez (Lautaro Martínez, aos 82'). Técnico: Lionel Scaloni

Nenhum comentário:

Postar um comentário