sexta-feira, 11 de agosto de 2023

Sobrou esforço, faltou decisão

Lieke Martens, se curvando para chorar a eliminação da Holanda na Copa de mulheres: a dedicação foi inquestionável e comovente, mas a Espanha sempre foi melhor (ANP)

Uma coisa deve ficar clara, sem rodeios: a seleção feminina da Holanda (Países Baixos) foi, como costuma ser, de um esforço comovente. Nas quartas de final da Copa do Mundo de mulheres, a equipe correu riscos de ver a Espanha decidir o jogo muito antes do que acabou acontecendo. Foi técnica e claramente inferior às espanholas. Pela dedicação, as holandesas conseguiram se segurar, empatar, levar o jogo até os estertores da prorrogação. E até tiveram chances de inverter os papéis, de conseguirem o que seria uma vitória extremamente animadora. Só que a Holanda não teve poder de decisão. A Espanha teve. E por isso, as Leoas Laranjas estão eliminadas da Copa.

Como já se escreveu aqui, poderiam estar eliminadas muito antes do que aconteceu. Porque já a partir dos primeiros minutos, ficou claro que a conhecida estratégia espanhola de manter a posse de bola teria bem mais sucesso do que qualquer vontade que a equipe laranja (jogando de azul na quinta/madrugada de sexta) pudesse ter. Pela esquerda, o duo Esther González-Alba Redondo começou a dominar rapidamente Victoria Pelova e Sherida Spitse. E por ali vieram as primeiras chances da Espanha: um chute de Jennifer Hermoso para fora aos 4', um complemento de Alba Redondo por cima do gol aos 6', as incríveis duas bolas na trave da mesma Alba aos 17' (primeiro completando lançamento de Teresa Abelleira, depois tentando no rebote), Esther González aos 22', Mariona Caldentey aos 25', o gol anulado de Esther González aos 36'... o sofrimento holandês já começava no meio-campo, em que a Espanha envolvia fácil e plenamente Jackie Groenen e Damaris Egurrola, a substituta de Van de Donk. Numa frase: era incrível o 0 a 0 ainda estar no placar ao fim dos primeiros 45 minutos.

A pressão da Espanha continuou já nos primeiros segundos da etapa final, num chute colocado de Esther que passou rente à trave. Só restava à Holanda apostar nas bolas longas. Para melhorar isso, Andries Jonker decidiu voltar ao esquema com quatro defensoras, tirando Jill Roord (de fato, discreta), colocando Lynn Wilms na direita e adiantando Victoria Pelova para o meio-campo. Quase teve o prêmio imediato no minuto seguinte à entrada de Wilms, quando Beerensteyn caiu ao ser acossada por Irene Paredes, e a juíza Stéphanie Frappart marcou o pênalti - desmarcado depois, a conselho do VAR e revisão de Frappart. De todo modo, a Holanda melhorou um pouco, com Lieke Martens tendo mais a bola e Lineth Beerensteyn se esforçando muito para segurar a bola e puxar contra-ataques, mesmo sem ter a mesma qualidade nas finalizações.

Porém (ai, porém), a estratégia da Holanda de aguentar a pressão espanhola era arriscada demais. Um erro e tudo se perderia. E o erro veio - da jogadora que talvez mais simbolizasse o esforço: Stefanie van der Gragt, que, como na final da Copa de 2019, cometeu pênalti ingênuo ao esticar a mão na bola em um cruzamento de Salma Paralluelo. Claro, o VAR alertou, Stéphanie Frappart marcou, e Mariona converteu o que parecia o gol da classificação da Espanha. Que só não o foi porque o esforço holandês teve o prêmio, na mais tardia das horas. Com Van der Gragt, no que seria o último jogo de sua carreira, compensando o erro do pênalti feito, da melhor maneira possível: avançando ao ataque com a bola dominada (e aproveitando erro de Ivana Andrés, que voltava de lesão e substituiu a machucada Laia Codina) e finalizando com precisão para o 1 a 1 relativamente milagroso, nos acréscimos - não sem antes quase cometer gol contra, no último lance do tempo normal.

Van der Gragt, talvez a mais dedicada jogadora da Holanda, não merecia encerrar a carreira com a pecha do pênalti que cometeu. E não encerrou: que gol para o empate nos acréscimos! (Rico Brouwer/Soccrates/Getty Images)

Ao mesmo tempo em que a Holanda resistia, porém, permanecia a sensação de que a Espanha seguia melhor, tecnicamente. Assim como era inegável a dedicação holandesa, com as substituições que mudavam posicionamento (Katja Snoeijs entrou e liberou Beerensteyn para as pontas; Damaris deu lugar a Caitlin Dijkstra, volante muito recuada). E uma chance ou outra aparecia para o que seria uma virada de lavar a alma. Só que Beerensteyn perdeu as duas mais visíveis. Aos 110', mesmo puxando contra-ataque, chutou em diagonal para fora; no minuto seguinte, após lateral cobrado, na pequena área, ela completou por cima do gol. Dois erros daqueles pesados, em um jogo tão equilibrado e dramático.

Porque a Espanha tinha, como sempre teve, jogadoras mais capacitadas para acertarem o gol em momentos decisivos. Poderia ser Aitana Bonmatí, destaque espanhol, que saiu antes (e nem se destacou muito). Poderia ser Alexia Putellas, o destaque supremo, que entrou antes. Mas foi Salma Paralluelo, a jovem mais promissora da Espanha - que já fizera gol contra a Holanda, na semifinal do Mundial sub-20 do ano passado. Num contra-ataque, Lynn Wilms veio para o meio, e deixou a direita livre para Paralluelo fazer o que melhor sabe: dominar a bola com campo livre, deixar Nouwen sozinha com um drible excepcional, e arrematar para o 2 a 1 da Espanha. Que, afinal, se classificou merecidamente.

Porque, se a Holanda esbanjou esforço, faltou a ela o que sobrou na Espanha: jogadoras que aproveitaram a chance no momento decisivo.

Copa do Mundo Feminina da FIFA 2023 - quartas de final

Espanha 2x1 Holanda
Data: 10 de agosto de 2023
Local: Estádio Regional (Wellington)
Juíza: Stéphanie Frappart (França)
Gols: Mariona Caldentey, aos 81', Stefanie van der Gragt, aos 90' + 2, e Salma Paralluelo, aos 111'

Holanda
Daphne van Domselaar; Sherida Spitse (Katja Snoeijs, aos 85'), Stefanie van der Gragt (Kerstin Casparij, aos 106') e Dominique Janssen; Jackie Groenen; Victoria Pelova, Jill Roord (Lynn Wilms, aos 61'), Damaris Egurrola  (Caitlin Dijkstra, aos 96') e Esmee Brugts (Aniek Nouwen, aos 89'); Lieke Martens e Lineth Beerensteyn. Técnico: Andries Jonker

Espanha
Cata Coll; Oihane Hernández (Olga Carmona, aos 90'), Irene Paredes, Laia Codina (Ivana Andrés, aos 77') e Ona Battle; Teresa Abelleira, Aitana Bonmatí (Irene Guerrero, aos 87') e Jennifer Hermoso; Alba Redondo (Salma Paralluelo, aos 71'), Mariona Caldentey (Alexia Putellas, aos 100') e Esther González (Eva Navarro, aos 100'). Técnico: Jorge Vilda

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