segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Estabilidade para crescer

Pois é: a Holanda cresceu dentro dos torneios europeus. Mas seus representantes neles precisam continuar bem para consolidar esse crescimento (Bert Kassies/Reprodução)

Já era previsto. As campanhas de clubes holandeses em torneios europeus ajudavam: foi o Ajax semifinalista da Liga dos Campeões em 2018/19, foi o Feyenoord indo à final da Conference League em 2021/22 - de quebra, então, o PSV alcançou as quartas de final, e o Vitesse dificultou as coisas para a futura campeã Roma na segunda fase -, foi o AZ semifinalista da Conference na temporada passada. E a Holanda/Países Baixos, enfim, aparece um pouco mais nas competições europeias: superando Portugal, à frente da França atualmente no ranqueamento de coeficientes da UEFA (índice que determina o número de vagas de cada país em torneios europeus de clubes). Depois de cinco anos, o país voltou a ter dois times na fase de grupos da Liga dos Campeões. E são consideráveis as chances de clubes neerlandeses terem três vagas na fase de grupos ampliada que a Champions League apresentará a partir de 2024/25. Nada mal para um país cujos times cometiam alguns vexames em fases preliminares, de vez em quando - houve eliminações para times de Croácia (PSV, para o Osijek, na 3ª fase preliminar da Liga Europa 2016/17), Noruega (Ajax, para o Rosenborg, nos play-offs da Liga Europa, também em 2016/17), Chipre (ADO Den Haag, para o Omonia Nicosia, na terceira fase preliminar da Liga Europa 2011/12), Luxemburgo (Utrecht, para o Differdange, na segunda fase preliminar da Liga Europa 2012/13), Romênia (Vitesse, para o Petrolul Ploiesti, na terceira fase preliminar da Liga Europa 2013/14)...

Mas essa melhora não quer dizer que a Holanda já esteja pronta para ser considerada "a melhor liga do resto", abaixo dos quatro mais célebres campeonatos nacionais da Europa. A vantagem para Portugal pode até ser estável, mas a França ainda pode voltar à frente nos coeficientes - até porque o Twente já caiu, eliminado pelo Fenerbahçe-TUR nos play-offs da Conference League. De mais a mais, Feyenoord e PSV estão numa corda bamba: caíram em grupos acessíveis na Liga dos Campeões, mas precisarão de esforço pela vaga nas oitavas de final. Na Liga Europa, o Ajax corre sérios riscos de cair para a Conference League, tão árduo será o grupo. Já na Conference, o AZ já teve um aviso de que não será tão fácil repetir o desempenho de 2022/23. Pelo menos, a situação é de estabilidade, indicando a sequência do crescimento. A federação holandesa dá a força que já costuma dar há algumas temporadas, remanejando as partidas dessas quatro equipes no Campeonato Holandês para lhes dar mais tempo de recuperação. E é possível, sim, pensar na classificação de algum dos quatro representantes que irão às fases de grupos dos respectivos torneios. Quem sabe de mais de um clube. É ver, abaixo, as perspectivas de cada um.

Liga dos Campeões

O Feyenoord se lembra da decisão contra a Lazio, na Conference League passada, para ter otimismo: sim, é possível superar o grupo E e avançar às oitavas de final da Liga dos Campeões (Geert van Erven/Orange Pictures/BSR Agency/Getty Images)

Feyenoord (lista de inscritos)

Antes do sorteio dos grupos da Champions, o Stadionclub era considerado o "cabeça-de-chave" dos sonhos. Afinal de contas, não ofereceria a mesma resistência de um Manchester City ou de um Real Madrid em sua chave. Tanto que o Atlético de Madrid ganha, até obviamente, mais protagonismo nos guias. Além do mais, o começo da temporada, com derrota na Supercopa da Holanda e um empate na primeira rodada, trouxe a indagação sobre a falta que Orkun Kökcü, destaque no título holandês de 2022/23, fazia para a equipe de Arne Slot (cuja permanência foi comemorada como um troféu). A indagação, porém, já começa a diminuir. Em primeiro lugar, porque o Feyenoord já parte para a ponta do Campeonato Holandês, com goleadas em sequência. Em segundo lugar, porque há entrosamento entre boa parte do grupo - principalmente na defesa, com os quatro nomes (Lutsharel Geertruida, Gernot Trauner, Dávid Hancko e Quilindschy Hartman) acostumados a jogar juntos. 

Em terceiro lugar, porque as contratações começam a embalar - que o digam Calvin Stengs, crescendo ao jogar no meio-campo, e Luka Ivanusec, um gol e um passe para gol nos dois jogos que fez pela Eredivisie. O atacante japonês Ayase Ueda poderia ajudar, mas ficará fora da estreia no grupo E, contra o Celtic-ESC, na terça-feira, por lesão - assim como Santiago "Bebote" Giménez, o goleador da equipe, também estará ausente, suspenso pela expulsão na eliminação contra a Roma, na volta das quartas de final da Liga Europa de 2022/23. Mas ambos poderão ajudar quando voltarem. Porque o Feyenoord seguramente pode disputar a segunda vaga do grupo, com Celtic-ESC e, principalmente, a Lazio-ITA. A qual, aliás, o Stadionclub já venceu e eliminou, na fase de grupos da Liga Europa passada. Num De Kuip lotado, que traz outro fator que sempre poderá ajudar o Feyenoord: sua torcida.

O PSV retornou à fase de grupos da Liga dos Campeões. E começa a evoluir suficientemente para disputar a sério a classificação, no grupo B (NESimages/Marcel ter Bals/DeFodi Images/Getty Images)


Enfim, o PSV voltou. Tentou em 2021/22: o Benfica-POR impediu, segurando empate sem gols no Philips Stadion, com um a menos. Tentou em 2022/23, e o Rangers-ESC frustrou isso com uma vitória também em Eindhoven. Mas agora, veio a revanche perfeita: o Rangers foi superado com uma goleada na volta (5 a 1, após 2 a 2 em Glasgow), e o time de Eindhoven está de volta à fase de grupos da Liga dos Campeões, depois de cinco anos. Tal volta animou os Boeren, não só pelo dinheiro que rende, mas pelo que possibilitou em campo. Estar nos grupos, por exemplo, justifica as várias contratações feitas - Armel Bella-Kotchap para a zaga, Jerdy Schouten para o meio-campo, Noa Lang e Hirving Lozano (o ídolo "Chucky" voltou, até a pedidos da família - que mesmo adaptada à Itália, sentia saudades de Eindhoven) para o ataque. Justifica até mesmo que Johan Bakayoko, promissor na ponta-direita, tenha minimizado sondagens de Paris Saint-Germain (menos concreta) e Brentford-ING (mais concreta) para contratá-lo, preferindo ficar em Eindhoven. 

É certo que a defesa ainda inspira dúvidas: para muitos, dúvidas personificadas no brasileiro André Ramalho. E dúvidas potencializadas pela saída de Ibrahim Sangaré, volante que protegia bem a zaga. Ainda assim, talvez seja algo até natural, tendo em vista que Peter Bosz, o técnico, habitualmente gosta de times ofensivos (talvez até demais). E os resultados promissores no Campeonato Holandês indicam que o PSV começa a encontrar o seu jeito de jogar. Terá dificuldades já na estreia no grupo B, é verdade: afinal, pegará o Arsenal, cabeça-de-chave e grande favorito da chave, fora de casa. E o Sevilla-ESP, à primeira vista, parece mais cotado para ser o segundo classificado às oitavas de final da Champions. Só que o Sevilla foi justamente o algoz do PSV na segunda fase da Liga Europa passada - Liga Europa, na qual os Rojiblancos têm um status tão campeoníssimo que a crendice popular lhes atribui até "preferência" em jogá-la. Aí, quem sabe, entre a capacidade que o PSV já começa a mostrar em seu lado ofensivo, com Joey Veerman, Ismael Saibari, os citados Bakayoko e Noa Lang, o ídolo Luuk de Jong, para tentar voltar às oitavas de final da Champions, após sete anos...

Liga Europa

Mesmo se classificando para a fase de grupos da Liga Europa, o Ajax já era alvo de desconfianças e vaias da torcida. À beira da estreia, isso só piora (Laurens Lindhout/Soccrates/Getty Images)


Mesmo com classificação, a vaia. O time de Amsterdã notou isso nos play-offs: mesmo garantindo vaga nos grupos da Liga Europa, a atuação na derrota do jogo de volta contra o Ludogorets-BUL (1 a 0, em plena Johan Cruyff Arena) foi tão lenta, tão monótona, que os apupos foram até óbvios. E o responsável pela goleada na ida - 4 a 1 - que justificava a situação tranquila dos Ajacieden nos play-offs já nem estava mais no clube: a vitória na Bulgária foi a despedida de Mohammed Kudus, que confirmou nas entrevistas pós-jogo sua saída do Ajax, rumo ao West Ham. Era mais um capítulo do começo preocupante de temporada que se vive no clube da estação Bijlmer Arena. O diretor de futebol, Sven Mislintat, começa a ser questionado pela qualidade técnica de algumas contratações; Maurice Steijn, o treinador, acaba sendo o "pararraio" das críticas ao que se vê em campo; e finalmente, o time do Ajax obviamente sofre com tantas saídas (o citado Kudus, Jurriën Timber, Edson Álvarez, Davy Klaassen, o ídolo Dusan Tadic...). Diante do aziago sorteio do grupo B, com um Olympique de Marselha que começa razoável na França e um Brighton embalado na Inglaterra, mais um AEK que sempre inspira cuidados, as desconfianças sobre os Amsterdammers são mais do que justificadas. Ainda mais se considerando que o time vive seu pior início de temporada no Campeonato Holandês, após 59 anos, sem vitórias após cinco rodadas (mesmo com um jogo a menos). Na estreia da próxima quinta, contra o Marseille, mesmo em casa, o Ajax terá de vencer essa crise nascente. Dentre todos os quatro holandeses em competições europeias, começa a temporada como coadjuvante. Quem diria?!

Conference League

O AZ escapou de fases preliminares mais difíceis do que se esperava, na Conference League. E nos grupos, parece ter estofo para avançar (Ed van de Pol/ANP/Getty Images)


A dureza relativamente inesperada que o AZ teve para chegar à fase de grupos da Conference League foi um aviso valioso. Na terceira fase preliminar, contra o Santa Coloma andorrano, apenas a vitória na volta (2 a 0) teve algum brilho, após o 1 a 0 na ida. E nos play-offs para decidir lugar nos grupos, contra o SK Brann (Noruega), a equipe de Alkmaar já teve dificuldades na ida: mesmo no seu AFAS Stadion, precisou correr atrás do empate em 1 a 1. Na volta, aparentemente controlava tudo ao fazer 2 a 0 fora de casa, mas sofreu com a bola aérea, tomou o empate (3 a 3, após ter vantagem por 3 a 1)... e suou na disputa de chutes da marca do pênalti, antes da vitória por 6 a 5 que levou os Alkmaarders aos grupos. Era um sinal: por mais que o time se refaça relativamente bem das sucessivas saídas, elas começam a impactar o rendimento em campo, até inevitavelmente. Jesper Karlsson, de saída já definida para o Bologna-ITA, fez falta - para nem falar em Tijjani Reijnders, que já se fora para o Milan bem antes das fases preliminares começarem. E bastou a classificação para a fase de grupos para Pantelis Hatzidiakos, capitão e titular na zaga, também confirmar que estava saindo (e também para um clube italiano, o Cagliari). 

Repetindo: foi um aviso. E para a sorte do AZ, o aviso parece assimilado. Os substitutos pouco a pouco se adaptam ao estilo do time: o português Alexandre Penetra já começa a ter algum entrosamento na zaga, ao lado de Riechedly Bazoer, enquanto tanto Ruben van Bommel quanto Ernest Poku - um jovem trazido, o outro da base do AZ - se mostram opções já confiáveis na ponta esquerda do ataque. De quebra, alguns nomes muito úteis, continuam no time de Pascal Jansen e continuam em boa fase. Yukinari Sugawara na lateral direita, o trio Sven Mijnans-Dani de Wit-Jordy Clasie no meio-campo, Vangelis Pavlidis como principal esperança de gols no ataque. Em suma: mesmo com as perdas impactando cada vez mais, mesmo que repetir a campanha de semifinalista em 2022/23 seja exigência mais difícil, o time holandês de Alkmaar parece capacitado para passar do grupo E. Nem tanto contra o Aston Villa, acostumado ao nível alto da Premier League inglesa. Mas sim contra o Zrinjski Mostar (Bósnia), o adversário da estreia da próxima quinta, e contra o Legia Varsóvia-POL.

Nenhum comentário:

Postar um comentário