domingo, 3 de julho de 2022

A Holanda na Euro feminina: carruagem ou abóbora?

Após anos vitoriosos, a seleção da Holanda escorregou um pouco no futebol feminino europeu. Volta a correr por fora na Euro. Mas a torcida ainda confia na melhora para tentar o bi (Rico Brouwer/Soccrates/Getty Images)

Era uma vez uma seleção que não era exatamente uma Gata Borralheira, e nem sofria com madrastas malvadas ou meio-irmãs invejosas, mas que vivia no segundo escalão do futebol feminino, até a Euro 2017 - ou talvez em 2016, quando uma cidadã chamada Sarina Wiegman assumiu o comando dessa seleção. Eis que, durante aquela Euro, Sarina se revelou uma tremenda "fada-madrinha", no comando da realização de sonhos. Com isso, por muito tempo, a seleção das mulheres da Holanda (Países Baixos) viveu tempos de Cinderela: campeã europeia em casa, vice-campeã mundial, cheia de personagens fundamentais para catapultar o interesse pela modalidade no país... mas no futebol, nunca há o "felizes para sempre" dos contos de fadas. Desde os últimos tempos do trabalho de Sarina Wiegman - para seguir com a metáfora da história -, fica a impressão de que soaram as doze badaladas do relógio, e a carruagem na qual a Holanda desfilou por algum tempo está virando abóbora. Assim as "Leoas Laranjas" chegam para a Euro que começa na próxima quarta: com a impressão de que escorregaram, de que novamente correm por fora, de que novamente precisam conquistar algo.

Também, pudera. As desconfianças crescem. É verdade que o trabalho de Sarina Wiegman demonstrava esgotamento, e Jill Roord reconheceu isso, em entrevista à edição de fevereiro da revista World Soccer: "Nós estávamos muito acostumadas a ela, porque estivemos juntas por muito tempo, mas acho que para nós, e para ela, é bom ter algo novo, após um certo tempo". Todavia, após quase um ano de trabalho, o técnico anglo-americano Mark Parsons sofre com as comparações (injustas mas naturais) ao que a antecessora fez. E as atuações das holandesas também não trazem muitas razões para elogios. Nas eliminatórias da Copa feminina, em que pese o primeiro lugar no grupo C da qualificação europeia e a proximidade da vaga no Mundial, apenas os 12 a 0 contra o Chipre foram merecedores de algum elogio. De resto, ora vitórias apenas previsíveis (contra Belarus e Islândia), ora resultados até árduos (como os dois empates contra a República Tcheca). E a derrota no amistoso da sexta retrasada - 5 a 1 para a Inglaterra, treinada justamente por... Sarina Wiegman - deixou a pesada impressão de que esta luta Parsons já perdeu: seu trabalho seguirá sendo desfavoravelmente comparado ao da vitoriosa antecessora.

Então o trabalho vindo desde agosto de 2021 é desastroso? Não necessariamente. É apenas um trabalho que mostra o nível real da seleção neerlandesa, sem o "doping psicológico" vivido entre 2017 e 2019. O que se viu no Torneio da França, em fevereiro passado, mostrou isso. A Holanda empatou (e até chegou a estar em vantagem) contra o Brasil, seleção de nível técnico parecido com o dela; venceu com autoridade a Finlândia, seleção inferior a ela; e perdeu para a França, seleção de fato melhor e mais favorita ao título europeu. Todos esses resultados, recebidos com serenidade. Porque condiziam com a realidade. 

As desconfianças sobre o trabalho de Mark Parsons à frente da seleção de mulheres crescem cada vez mais. A pressão, também. Mas o técnico inglês tem coisas boas a mostrar (Gerrit van Cologne/AFP/Getty Images)

Em termos de convocações, Mark Parsons também merece um crédito inegável: tem sido bem mais receptivo a novidades, a abrir espaço nas listas e nas escalações para novatas. A participação do técnico foi decisiva na escolha de Damaris Egurrola Wienke para defender a Holanda. Kerstin Casparij, Caitlin Dijkstra, Marisa Olislagers, Romée Leuchter, Esmee Brugts, Jacintha Weimar, Kayleigh van Dooren (as duas últimas, na lista de espera da convocação para a Euro)... todas elas tiveram as suas primeiras chances na seleção com o treinador anglo-americano, variando um pouco a escalação manjada que se viu em boa parte da passagem de Sarina Wiegman. E isso, porque Parsons seguiu sem dar muitas chances àquela que seja, talvez, a novata mais badalada de todas as jogadoras holandesas. Goleadora do Campeonato Holandês feminino, com 33 gols em 24 jogos, atacante das mais promissoras, símbolo do Twente bicampeão nacional, Fenna Kalma só jogou uma ou outra partida. E ficou restrita à lista de espera.

De certa forma, compreensível. Porque se Kalma é uma das melhores atacantes da Holanda, a titular da posição dela na seleção é uma das melhores atacantes do mundo: claro, Vivianne Miedema. Além do mais, ainda que se recuperando de lesões, Lieke Martens tem técnica inegável, e ainda pode ajudar. Jill Roord vive a grande fase de sua carreira. O que, cada vez mais, falta em velocidade para Sherida Spitse, lhe sobra plenamente em experiência. Jackie Groenen, mesmo em baixa por clubes, colabora bastante na seleção. Daniëlle van de Donk já tem uma tremenda motivação só por ter sido convocada, após a lesão séria que sofreu. E há Sari van Veenendaal, Stefanie van der Gragt, Dominique Janssen... todas calejadas, sabedoras do caminho das pedras.

Talvez este time enfastiado não vá muito longe na Euro. Talvez sofra já na fase de grupos, contra Suécia (dia 9 de julho, em Sheffield, às 16h de Brasília), Portugal (13 de julho, às 16h de Brasília, em Leigh) e Suíça (dia 17, ao meio-dia brasileiro, em Sheffield). Mas, se a história é pensar em contos de fadas... por quê não imaginar que a Holanda pode se focar para, outra vez, transformar a abóbora numa carruagem, como fez em 2017?

Um rápido comentário para cada convocada

Goleiras

1 - Jacintha Weimar (Feyenoord), substituta de Sari van Veenendaal (PSV), cortada por lesão

Se o time feminino do Feyenoord teve uma atuação considerada digna, em sua primeira temporada no Campeonato Holandês, grande parte desse mérito foi para a goleira ágil que Weimar foi durante a Vrouwen Eredivisie. Isso foi notado por Mark Parsons, que já deu em 2021 a primeira chance à goleira: Weimar foi titular no amistoso contra o Japão, que terminou com empate sem gols. Mesmo que não fosse a opção preferencial a Sari van Veenendaal - Van Domselaar era essa opção -, Weimar já agradou o suficiente para entrar no radar das convocações. Tanto que ficou na "lista de espera" para a Euro: não entrou na lista de 23 convocadas, mas estaria a postos em caso de necessidade. Veio a tal necessidade, com a lesão no ombro que Van Veenendaal sofreu contra a Suécia, forçando o seu corte. E Weimar está na Euro, como terceira goleira da Holanda. O ponto alto de uma ascensão rápida na carreira.

16 - Daphne van Domselaar (Twente)

A queda técnica de Lize Kop, goleira do Ajax, perturbada ao longo da temporada 2022/23 após uma concussão cerebral, abriu espaço para equilibrada concorrência pelo posto habitual de terceira goleira nas convocações da Holanda. Moon Pondes, Jennifer Vreugdenhill, Jacintha Weimar... todas essas recebiam chances nas listas de Mark Parsons. Até Van Domselaar agarrar (com algum trocadilho) a chance. Ser escolhida como uma das três goleiras no Torneio da França - com uma atuação, nos 3 a 0 sobre a Finlândia, já era um bom sinal sobre as possibilidades de convocação para a Euro. Ser titular num Twente bicampeão holandês, com atuações até mais regulares do que a titular Van Veenendaal no PSV, ainda mais. E o destino tornou tudo ainda melhor: a experiente Loes Geurts, reserva imediata habitual no gol da Holanda, abdicou da convocação pela gravidez de seu primeiro filho. E Van Domselaar vai à Euro como a primeira opção para o gol, caso seja necessário. Está mais do que capacitada, com calma e firmeza sob as três traves.

23 - Barbara Lorsheyd (ADO Den Haag)

Twente, Ajax, PSV: os clubes de mais destaque no futebol de mulheres dos Países Baixos geralmente são esses. Mas o ADO Den Haag costumeiramente fica logo abaixo, com participações honrosas na liga nacional. E uma das mais experientes jogadoras do time de Haia é a goleira de 31 anos, também com aparições aqui e ali nas convocações desde os tempos de Sarina Wiegman. Mesmo perdendo espaço nas listas em algum momento, o equilíbrio na disputa pelas vagas de reserva de Van Veenendaal, a experiência de Lorsheyd em relação a suas compatriotas e, indiretamente, a retirada de Loes Geurts para dar à luz seu primeiro filho abriram lacuna que precisava ser preenchida por um nome experiente. Aos 31 anos, Lorsheyd será este nome, entre as três goleiras.

Laterais

4 - Merel van Dongen (Atlético de Madrid-ESP)

Convocação tão inquestionável quanto passível de debate. Van Dongen oferece variedade tática à seleção, podendo ser escalada no miolo de zaga ou na lateral esquerda, e sua ascensão sobre o grupo de jogadoras também é conhecida - a defensora é das mais carismáticas e mais experientes da geração, sempre disposta a entrevistas e a esforços dentro de campo. O que não quer dizer que seja acima de qualquer suspeita com a bola nos pés: a lateral esquerda também sofre para marcar adversárias que sejam mais rápidas do que ela - que o diga Kadidiatou Diani, francamente superior a ela no encontro amistoso entre holandesas e francesas pelo Torneio da França. Na medida entre prós e contras, porém, a experiência dos 29 anos de idade pesou mais a favor do que as inseguranças defensivas pesam contra. E Van Dongen voltará a uma Euro, após nove anos - foi a 2013, mas estava fora na campanha campeã de 2017 -, sabendo que é a primeira opção para a defesa no banco de reservas, caso seja necessário.

5 - Lynn Wilms (Wolfsburg-ALE)

Wilms poderia ter corrido risco de perder a titularidade que foi sua na lateral direita, até o torneio olímpico do ano passado. Afinal de contas, logo após os Jogos de Tóquio, a jogadora teve de passar o resto de 2021 fora dos campos, em recuperação de uma lesão lombar. Enquanto isso, foram testadas Sisca Folkertsma (por pouco tempo, até sofrer outra grave contusão no joelho), Kerstin Casparij (evoluindo no Twente, mas ainda com coisas a aprender, novata que é) e Samantha van Diemen (só um jogo, após despontar no Feyenoord). Nenhuma delas, com jeito de tomar a posição de vez. Por isso, tão logo voltou a jogar no começo do ano, Wilms também retomou o posto na destra. E se mostra um pouco mais ousada em seus avanços ofensivos. Caso cuide também da defesa, quem sabe se fortaleça de vez para preencher a lacuna que fica desde que Desirée van Lunteren deixou a seleção, no fim de 2019.

18 - Kerstin Casparij (Twente)

Enquanto Lynn Wilms se recuperava da lesão lombar, várias jogadoras tiveram chances na lateral direita da Holanda. E Kerstin Casparij foi quem mais a aproveitou. Nem tanto pelo que fez vestindo a camisa laranja, é verdade: em partidas pelas eliminatórias da Copa e no Torneio da França, Casparij mostrou dificuldades na recomposição defensiva, e alguma timidez no apoio. Nada que inviabilizasse sua presença nas convocações. Afinal de contas, ainda é novata (22 anos), tendo margem de evolução. De mais a mais, Casparij foi um pilar na defesa do Twente campeoníssimo na Holanda, nas últimas temporadas. Dentro da renovação gradual por que a seleção feminina dos Países Baixos passa, ela já é um dos nomes aprovados - e terá na Euro a primeira grande experiência de sua carreira.

20 - Dominique Janssen (Wolfsburg-ALE)

Janssen é das mais experientes jogadoras da seleção, como se sabe. Fornece possibilidades táticas muito úteis, também: pode tanto jogar no miolo de zaga, quanto jogar na lateral esquerda (onde é mais comum vê-la). E a jogadora de 27 anos também possui capacidade elogiável nas cobranças de bolas paradas - principalmente em faltas, tanto que é a cobradora principal do Wolfsburg onde joga. Porém, Dominique anda em má fase: tem falhado na marcação, deixando espaços por onde as adversárias podem atacar. Foi assim pelo Wolfsburg, na semifinal da Liga dos Campeões. Anda sendo assim na seleção, mais do que o recomendável. Só uma melhora pode revitalizar a importância que Janssen tem na equipe.

Zagueiras

2-Aniek Nouwen (Chelsea-ING)

Chegada ao Chelsea nesta temporada, Nouwen já teve algo a comemorar: o título inglês da temporada recém-encerrada. Mas ainda é pouco para apagar a má impressão que a zagueira ainda deixa na zaga holandesa. Mesmo titular costumeira no miolo da defesa ao lado de Van der Gragt, Nouwen se mostra lenta na maioria das vezes, com dificuldades no toque de bola. Algumas vezes, a zagueira se atrapalha nos recuos e passes laterais, cedendo a bola ao adversário. Pelo menos, começa a exibir a mesma capacidade no jogo aéreo que Van der Gragt tem - tanto que fez gol nos 3 a 0 sobre Belarus, jogo atrasado das eliminatórias da Copa que serviu de preparação para a Euro. E pelo ritmo de jogo, Nouwen emplacará seu segundo torneio grande como titular.

3-Stefanie van der Gragt (Ajax - deixará o clube na próxima temporada)

Van der Gragt também não fornece muita segurança no miolo de zaga - nunca forneceu, a bem da verdade. Ainda assim, é impossível deixá-la de fora do time titular. Em primeiro lugar, porque poucas jogadoras são tão experientes em termos de seleção, no grupo de convocadas, com duas Copas e o título da Euro 2017 no currículo, como titular absoluta em tudo isso. Em segundo lugar, porque Van der Gragt é a "menos ruim" da defesa: tem firmeza na marcação, e é excelente no jogo aéreo - o que ajuda até em termos ofensivos (a zagueira fez um gol salvador no 2 a 2 contra a República Tcheca, nas eliminatórias da Copa). Em que pese a fragilidade física - já passou por operações nos dois joelhos -, "Stef" é a única jogadora mais consolidada, numa defesa holandesa que causa preocupações. Se lhe faltam velocidade e alguma técnica, lhe sobra esforço.

15-Caitlin Dijkstra (Twente)

Se Casparij é nome certo na lateral direita do Twente, Dijkstra é igualmente garantida no miolo de zaga do atual bicampeão da Eredivisie feminina. Mudar para o clube de Enschede, após a falta de espaço no Ajax, foi fundamental para a jogadora de 23 anos ter uma sequência de jogos que a mantivesse em ritmo de jogo e em chances de buscar uma vaga na seleção. Vaga conseguida, ao longo da campanha nas eliminatórias da Copa. Vaga consolidada, no Torneio da França: nos 3 a 0 contra a Finlândia, quando várias reservas ganharam chance de Mark Parsons, Dijkstra foi a autora de um dos gols. E estará a postos para a substituição de qualquer uma das duas titulares do miolo de zaga.

19-Marisa Olislagers (Twente)

Eis um nome que pode ajudar a Holanda mais do que parece na Euro. Na seleção, Olislagers é costumeiramente convocada para a reserva da defesa. Mas, caso necessário, também sabe jogar com correção no meio, protegendo a zaga - aliás, é exatamente como mais joga no Twente. E no clube bicampeão holandês, Olislagers não só protege a zaga, como costuma iniciar as jogadas que serão finalizadas pelo ataque do Twente. Essa rapidez entre defesa e ataque fez com que a meio-campista se sobressaísse em meio às concorrentes pela posição, como Jill Baijings e Kayleigh van Dooren, e até a nomes mais experientes, como Kika van Es. A polivalência de Olislagers pode ser muito útil.

Meio-campistas

6-Jill Roord (Wolfsburg-ALE)

Por muito tempo, Roord lamentava usar a camisa 12 na Holanda - típica de uma jogadora que sempre entra, sempre joga, mas nunca é titular absoluta. Isso acabou definitivamente nos últimos anos. Já nas eliminatórias para a Euro, jogadas em meio à eclosão da pandemia, a meio-campista assumiu protagonismo, se valendo de lesões e quedas de produção de outros nomes para crescer como um nome que não só cria muitas jogadas, como até mesmo pode avançar para finalizar (não à toa, é comum vê-la escalada na ponta-direita, até). Em clubes, a migração para o Wolfsburg também lhe fez bem: Roord foi um dos destaques da campanha que foi até as semifinais na Liga dos Campeões feminina. Diante da inconstância de outros destaques holandeses, Roord está pronta para aparecer. Vive a melhor fase da carreira.

8-Sherida Spitse (Ajax)

Ah, ela está cansada? Sim, está cansada. Tem cada vez mais dificuldades de manter a intensidade na marcação? Tem. Mas não há como desprezar o tamanho da experiência que Spitse tem, aos 32 anos de idade, como jogadora com mais partidas pela seleção feminina da Holanda - até agora, 202 jogos vestindo laranja. No Ajax, é a grande referência histórica - algo comprovado pela renovação do contrato, até 2025, contemplando até uma carreira de treinadora após parar de jogar. Além do mais, apesar dos pesares, Spitse ainda mostra muita capacidade no seu ponto forte: as bolas paradas e os lançamentos. Basta lembrar o passe alto para Beerensteyn marcar gol contra o Brasil, no Torneio da França, em fevereiro. Ou mesmo a cobrança de escanteio para Lieke Martens abrir o placar no amistoso contra a Inglaterra. Enfim: "capitã sem braçadeira", Spitse é indispensável entre as titulares. Enquanto puder, seguirá vestindo a camisa 8 da seleção. Muito compreensível.

10-Daniëlle van de Donk (Lyon-FRA)

Eis uma cidadã que já está muito contente só por estar na Euro. Em condições normais, nem precisaria disso: afinal de contas, Van de Donk era titular habitual das Leoas Laranjas, chegara ao Lyon, e vivia boa fase no fim de 2021, com velocidade nas chegadas ao ataque. Mas tudo isso virou um enorme ponto de interrogação quando a meio-campista sofreu uma grave lesão, em novembro passado: o rompimento de um tendão próximo ao tornozelo. A recuperação ocupou todo o primeiro semestre, causando dúvidas, no mínimo, sobre a viabilidade da presença de Van de Donk no torneio continental. Mas o esforço valeu a pena: ela voltou a tempo de figurar no título do OL na Liga dos Campeões feminina - esteve na final, ainda que no banco de reservas. Voltou a tempo de disputar as rodadas finais do Campeonato Francês - até marcando gol, contra o Issy-Les-Molineaux, no começo de junho. E o esforço na reabilitação, documentado até numa série no perfil da seleção feminina no YouTube, teve sua recompensa: não só a meio-campista estará na Euro, como mereceu elogios de Mark Parsons ("Não é sempre que uma jogadora faz a diferença dentro e fora de campo, Daniëlle é muito importante pela liderança"). Ela ainda começou no banco contra a Inglaterra (amistoso) e contra Belarus (eliminatórias da Copa). Mas já voltou a ser titular no amistoso derradeiro pré-Euro, contra a Finlândia. Antiguidade, afinal, é posto. Ainda mais depois de todo o esforço.

12-Victoria Pelova (Ajax)

Durante muito tempo, Pelova era a novidade que não tinha espaço dentro do meio-campo da Holanda, extremamente fixo no trio Spitse-Groenen-Van de Donk. Sob Sarina Wiegman, só houve mais chances aqui e ali no torneio olímpico. Mas no pós-Tóquio, a lesão de Spitse e as idas frequentes de Jill Roord para o ataque abriram, enfim, o caminho para que Pelova ganhasse, enfim, uma sequência maior de jogos dentro da seleção. Mas é justo dizer: de nada adiantaria o espaço aparecer se ela não estivesse em boa fase. E Pelova viveu a melhor temporada de sua carreira no Ajax: não só ajudando na criação de jogadas, mas principalmente atacando pelas pontas, abrindo espaço para as companheiras de time. Mais uma contribuição até em termos de seleção: as contusões de Lieke Martens nos últimos tempos deixaram uma lacuna, que Pelova preencheu costumeiramente na ponta esquerda. Enfim: se na Euro passada, a jovem ainda nem sonhava com seleção principal, esta Euro pode marcar sua migração definitiva entre as que disputam vaga no time titular.

14-Jackie Groenen (Manchester United-ING)

Há algum tempo, a carismática volante vive dois lados. Em clubes, a passagem de Groenen pelo Manchester United é decepcionante até agora: sem conseguir chamar a atenção dentro de campo, sem conseguir impor seu estilo firme e acelerado no meio-campo, sofrendo com algumas lesões - a ponto de, cada vez mais, perder espaço no time inglês (comenta-se um interesse da Juventus). Já na seleção holandesa, continua uma titular inquestionável: esforçada na marcação, capaz até de alguns gols graças à capacidade nos chutes de fora da área - foi assim, por exemplo, que Groenen colaborou com gols contra a Islândia, em setembro do ano passado, nas eliminatórias da Copa, e no amistoso contra a África do Sul, em abril. Por trazer essa intensidade tão necessária à seleção (e tão pedida por Mark Parsons), é que Groenen continua inquestionável no time titular. E assim deverá seguir na Euro. Mas precisará de mais regularidade nos clubes, para manter a força midiática que tem em seu país.

21-Damaris Egurrola Wienke (Lyon-FRA)

Por muito tempo, Damaris Berta Egurrola Wienke foi uma jogadora que tinha variedade de seleções a poder escolher para defender. Afinal, trata-se de uma norte-americana (nascida em Orlando, na Flórida), filha de uma holandesa de Groningen e de um espanhol do País Basco. Além do mais, tratava-se de uma meio-campista promissora e talentosa, com bom toque de bola, sem deixar de ser aguerrida na marcação. Por tudo isso, Damaris chamava a atenção desde a sua passagem pelo Everton-ING, após o começo no Athletic Bilbao-ESP. E era "disputada" pelas seleções das três nacionalidades em que cabia - tendo até jogado uma partida pela Espanha, em 2019 (como era só uma partida, poderia optar por uma nova seleção para defender). A persistência de Mark Parsons, que conversou algumas vezes para a sondagem, e a proximidade com Daniëlle van de Donk, colega de time no Lyon e amiga pessoal, fizeram com que Damaris se definisse pela Holanda, no fim de março. Tão logo fez a escolha, a meia já entrou para as convocações. Já marcou dois gols pela seleção, ambos no amistoso contra a África do Sul, em abril, sua segunda partida vestindo laranja. Ainda é reserva no meio, mas a Euro será o primeiro torneio grande do que pode ser uma trajetória de grande futuro. E de grande ajuda para a seleção.

Atacantes

7-Lineth Beerensteyn (Bayern de Munique-ALE, em transferência para a Juventus-ITA)

Eis uma jogadora que aproveitou bastante as chances que surgiram nos últimos dois anos. Desde os tempos de Sarina Wiegman, Beerensteyn já era outra "12ª jogadora" - mas com isso, vinha a incômoda sensação de que dificilmente seria titular, por mais que fizesse em campo. Pois bem: a prova de que podia mais começou a vir também nos gramados. No torneio olímpico em Tóquio, quase sempre Beerensteyn entrou bem quando veio do banco de reservas: o jogo da eliminação, nas quartas de final, mostrou isso, quando a atacante foi quem mais ajudou Martens. Por falar nesta, suas ausências por lesão (e o consequente avanço de nomes como Jill Roord e Victoria Pelova, dentro do esquema tático) abriram espaço para Beerensteyn ter mais partidas jogando nas Leoas Laranjas, sob Mark Parsons. Chances aproveitadas: foram dois gols em cinco jogos nas eliminatórias da Copa, até agora, além dela poder ser considerada a melhor holandesa na participação pelo Torneio da França, com bom poder de finalização, exemplificado no gol feito contra o Brasil. Além do mais, com a constante tentativa de colocar Miedema jogando mais atrás na seleção, é possível imaginá-la como a nova atacante de área, de vez em quando. E a evolução em termos de clube foi premiada com uma transferência, do Bayern de Munique para a Juventus-ITA. Enfim: se Beerensteyn ainda não é titular da Holanda, nunca esteve tão perto disso.

9-Vivianne Miedema (Arsenal-ING)

Desde sua consagração individual no torneio olímpico - não só goleadora em Tóquio, como a mulher que mais gols marcou numa só edição de Jogos Olímpicos (10) -, Miedema consolidou: é o grande destaque, a grande craque desta seleção no momento. É certo que o brilho pelo Arsenal não foi tão intenso em 2021/22 quanto em outras temporadas (14 gols em 22 jogos pelo Campeonato Inglês). Mas "Viv" tem compensado isso com outras coisas. Tornou-se uma atacante muito completa: cada vez mais, é comum ver Miedema jogando mais atrás, com a bola dominada, até criando as jogadas para avantes mais adiantadas, como uma ponta-de-lança - e Mark Parsons sinalizou algumas vezes que pensa em escalá-la também assim na seleção. De quebra, Miedema se notabilizou por tomar posturas cada vez mais dignas de uma líder: foi figura fundamental nas negociações para a federação decidir pagar às seleções femininas a mesma quantia paga aos homens, no tocante a direitos de imagem, e tem sido colunista bastante arguta, no diário Algemeen Dagblad (ali comentou, por exemplo, de como consultas com psicólogos a ajudaram a melhorar a saúde mental). Isso tudo, sem contar o que já se conhece: sua capacidade para manter o domínio de bola e para finalizar, dentro da área. Sintetizando: atualmente, Vivianne Miedema é o grande destaque da seleção holandesa feminina. E se ainda há esperança de que as Leoas Laranjas podem ir a algum lugar na Euro, ela é o grande símbolo dessa esperança.

11-Lieke Martens (Barcelona-ESP, em transferência para o Paris Saint Germain-FRA - cortada por lesão no pé, sofrida contra a Suíça, no último jogo da fase de grupos)

A atacante de quem a Holanda mais esperava, até um tempo atrás, já teve um forte impacto contrário, ao cometer um erro decisivo na eliminação do torneio olímpico, perdendo pênalti no fim do tempo normal contra os Estados Unidos, nas quartas de final. Talento para se recuperar do abatimento, sobrava a ela. O problema é que Martens sofreu demais com lesões na temporada: foram pelo menos duas relativamente sérias - uma no fêmur, outra no músculo posterior da coxa -, impedindo que ela mantivesse sequência de jogos, tanto no Barcelona, como na seleção. Sim, Lieke colaborou na boa temporada da equipe feminina barcelonista: foram 16 gols em 21 jogos na campanha de mais um título espanhol. No entanto, ao ficar mais no banco de reservas, num time com muitos talentos, ficou claro que seu espaço e seu tempo no time espanhol se encerravam. E na seleção, como poucas vezes nos últimos anos, o lugar de Martens começou a ser ameaçado, pela boa fase de Lineth Beerensteyn e pela evolução de Victoria Pelova. Porém, basta isso acontecer para a melhor jogadora do mundo em 2017 comprovar seu valor. Ela tem feito isso nos últimos jogos da Holanda antes da Euro: marcou o único gol contra a Inglaterra, fez mais um contra Belarus (nas eliminatórias da Copa), se esforçou, apareceu bastante nas jogadas de ataque. Basta fazer isso, para Martens seguir sendo o que ainda é, apesar dos pesares: um dos símbolos desta seleção e desta geração no futebol feminino dos Países Baixos.

13-Renate Jansen (Twente)

Não adianta: Fenna Kalma pode impressionar mais com o tanto de gols que faz, a alemã Anna-Lena Stolze é mais aguda no ataque, mas se há um símbolo do Twente que domina o futebol feminino da Holanda na atualidade, é Renate Jansen. Motivos não faltam: sua experiência (é a capitã do Twente), sua dedicação em campo (a movimentação de Renate abre espaços para as chegadas das colegas mais novas), sua disposição para ajudar na marcação (pode cercar a saída de bola adversária, bem como prender a bola, caso necessário). E isso se reflete na seleção, há muito tempo: Renate Jansen já tem 12 anos usando a camisa laranja, foi opção tão discreta quanto confiável nos últimos vitoriosos anos da seleção. Sempre foi reserva,mas figurou na vitória da Euro 2017, no vice mundial em 2019, no torneio olímpico do ano passado (valendo por 2020)... e aos 31 anos - fará 32 em dezembro -, Renate Jansen terá mais um torneio pela seleção na carreira. Porque tem a segurança e o esforço necessários em torneios grandes assim. Sempre dá a certeza: se necessário, estará lá para fazer o que for preciso.

17-Romée Leuchter (Ajax)

O Ajax já começa a fazer no futebol feminino neerlandês o que faz no masculino: ou seja, revelar muitas jogadoras. Na defesa, Lisa Doorn; no meio-campo, Nadine Noordam; no ataque, Nikita Tromp. Mas o grande símbolo da boa geração que aparece em Amsterdã é Romée Leuchter. Mostrando velocidade pelos lados - principalmente o esquerdo -, sem deixar de chegar à área para finalizar, a atacante foi a segunda maior goleadora do Campeonato Holandês feminino em 2021/22: foram 25 gols em 24 jogos, desempenho que só não chamou mais a atenção porque Fenna Kalma conseguiu ser ainda mais espetacular. Ainda assim, a velocidade de Leuchter - algo sempre recomendável, num time intenso como a Holanda quer ser - fez com que ela recebesse chances no Torneio da França, estreando pela seleção contra o Brasil. Deu certo para ela: Leuchter está na Euro. Mais uma para quem o torneio continental pode ser só o começo.

22-Esmee Brugts (PSV)

Brugts já era apontada como uma revelação surgida no PSV, pelo menos, há alguns anos. Mas só em 2021/22, enfim, deu a sequência final esperada para alguém habituada a jogar pelas seleções de base da Holanda. Com habilidade nos dribles pela ponta-direita, a atacante se sobressaiu em meio a uma temporada decepcionante do clube de Eindhoven. Teve sua primeira convocação no ano passado, enfim estreou pela seleção no torneio da França (substituindo Pelova, contra o Brasil, no segundo tempo), e até gol já fez, nos 12 a 0 contra o Chipre, pelas eliminatórias da Copa. Já serviu para Brugts provar que estava pronta para vencer a concorrência pela convocação contra gente mais experiente, porém em queda técnica, como Shanice van de Sanden. E também já valeu para Brugts, desde já, ser opção preferencial ao ataque holandês no banco de reservas. Quem sabe, ela seja a maior candidata holandesa a surpresa positiva na Euro...

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