O futebol feminino já tinha voltado internamente na Holanda (Países Baixos), com o início do Campeonato Holandês de mulheres - no qual o Ajax já se insinuou bem, com duas vitórias. Faltava apenas o grande estandarte da modalidade para o mundo - e até para os neerlandeses. Pois bem: não faltará mais a partir desta sexta, às 11h de Brasília. Na Sapsan Arena de Moscou, a seleção holandesa feminina voltará a campo após seis meses, pela sexta rodada do grupo A das eliminatórias da Euro 2022 - que seria em 2021, mas foi adiada, por causa da pandemia de COVID-19. A vaga para tentar defender o título continental ganho em 2017 - se a Euro 2022 ocorrer... - está muito perto: com seis vitórias em seis jogos nas eliminatórias, nove pontos à frente exatamente da seleção russa, mais um triunfo ampliaria a vantagem já enorme que as Leoas Laranjas têm na chave.
No entanto, os fatos ocorridos internamente na seleção fazem crer que a campanha de qualificação para a Euro inicia os últimos dias de um ciclo, que se encerrará no torneio olímpico de futebol feminino em Tóquio-2021. Afinal de contas, se definiu no mês passado que Sarina Wiegman trocará de seleção tão logo os Jogos Olímpicos acabem: a treinadora da Holanda tomará o rumo da seleção inglesa. E sua anunciada saída é o marco do fim de uma era: afinal, comandando as Leoas Laranjas desde meados de 2016, Sarina é o símbolo da ascensão irresistível da seleção feminina nos últimos anos.
Ainda assim, já antes mesmo da pandemia, estava claro que 2021 seria, muito provavelmente, o último ano de Wiegman como técnica da seleção - no cenário anterior, a renovação de contrato fizera prever exatamente isso: o trabalho seria feito nos Jogos Olímpicos, seguiria até a Euro, e aí sim Sarina seguiria seu rumo. Quis o destino que a pandemia alterasse tudo. E que Sarina fosse o nome escolhido pela federação inglesa para, a partir de 2021, comandar outras Leoas - as Lionesses, que irão com toda a força na Euro que sediarão, em busca do título que ainda não têm.
De certa forma, exatamente por essa previsibilidade é que a saída vindoura da treinadora foi bem recebida pela federação - o diretor Nico-Jan Hoogma foi compreensivo: "Eu entendo este passo, e o momento dele, mesmo que seja ruim para nós. E temos todo o tempo para nos focarmos na sucessão, fazendo isso com cuidado". E a própria Sarina Wiegman repetiu nesta semana a mesma coisa que citou no anúncio de sua saída: "Seria lindo terminar bem. E temos duas metas: o torneio olímpico e a vaga na Euro. E é claro que eu espero que realizemos nosso último sonho: ter sucesso nos Jogos Olímpicos".
Para esse sucesso, está cada vez mais claro que as Leoas Laranjas terão poucas alterações contra a Rússia. Quase nenhuma, a bem da verdade: nas 24 convocadas, estão ainda todos os destaques do vice-campeonato mundial em 2019, que jogaram juntas pela última vez num torneio amistoso em março, contra Brasil, Canadá e França. A única estreia é no gol, com a arqueira reserva Daphne van Domselaar, do Twente - sem contar o retorno da atacante Sisca Folkertsma às convocações. E a única mudança foi forçada pela pandemia: jogando no Valerenga norueguês, a meio-campista Sherida Spitse teve de ficar no país em que atua - já que a viagem seria para a Rússia, país considerado na "zona laranja" da pandemia, com alto risco de infecção pelo novo coronavírus, o Valerenga quis impedir que Spitse tivesse de ficar em quarentena preventiva após a viagem pela seleção.
As dores no dedo do pé já foram solucionadas. A saudade do país natal foi matada durante a quarentena. Então, Lieke Martens está pronta a retomar seu ritmo (BSR Agency) |
Sem problemas: ainda estarão nas Leoas Laranjas Sari van Veenendaal, Jackie Groenen, Daniëlle van de Donk, Vivianne Miedema, Jill Roord (provável titular com a ausência de Spitse)... e Lieke Martens. Enfim livre das dores num dedo do pé que a perturbaram em 2019, a atacante do Barcelona se mostrou altamente motivada em entrevista ao diário Algemeen Dagblad, para ganhar ritmo de jogo e retomar o nível técnico que a levou a ser a melhor do mundo segundo a FIFA, em 2017: "A montanha-russa acabou. Estou completamente recuperada (...) Durou o bastante. Já tive bons momentos, mas ainda tenho fome e motivação para arrebentar".
De quebra, Martens evocou em suas palavras um fenômeno notável: o retorno de algumas importantes jogadoras à Vrouwen Eredivisie, como Mandy van den Berg (ex-colega de seleção) e a supracitada Van Veenendaal. E se mostrou disposta a pensar no caso de também retornar ao país natal, daqui a algum tempo: "Às vezes, sinto falta de equilíbrio em minha vida (...). Tenho 27 anos, e mais dois anos de contrato, então posso voltar depois disso. Só vejo pontos positivos, e tenho alguma inveja das minhas colegas de time que moram em Barcelona, que jogam em alto nível com a família e os amigos por perto. Espero que se viva uma situação assim na Eredivisie, e acho que estamos bem envolvidas nisso".
De fato, se a base da seleção feminina neerlandesa está inalterada - e assim seguirá até Tóquio, provavelmente -, aqui e ali já se começa a mencionar a chance de retorno dos grandes símbolos do título europeu de 2017 e do vice na Copa do Mundo passada. Até porque, aqui e ali, algumas novatas são chamadas: Aniek Nouwen, Lynn Wilms, Fenna Kalma, a estreante Van Domselaar. Além do mais, a favorita a suceder Sarina Wiegman também já está acostumada ao trabalho com jogadoras mais novas: Jessica Torny, atual comandante da seleção sub-20.
Podem ser elas os nomes que simbolizem um novo ciclo da seleção feminina nos próximos anos. Porque mesmo que as principais jogadoras continuem nas Leoas Laranjas por uns bons anos, é inegável que a saída de Sarina Wiegman é o primeiro sinal de que algo está acabando. E os últimos dias antes do fim disso começam agora, na volta da seleção feminina.
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