domingo, 12 de maio de 2024

Segunda divisão: ufa!

O Willem II teve mais frequência na primeira colocação da segunda divisão, mas "esticou" a ansiedade pelo título até a última rodada. Pelo menos, valeu a pena: taça e volta à Eredivisie (Geert van Erwen/Soccrates/Getty Images)

As 38 rodadas foram disputadas, a segunda divisão da Holanda (Países Baixos) se acabou - pelo menos na temporada regular: vem aí a repescagem de acesso -, e é possível falar que os dois times que conseguiram as vagas diretas de acesso à Eredivisie puderam soltar a interjeição de alívio que é o título deste texto de análise da temporada. De modos diferentes. Porque o Willem II, campeão da Eerste Divisie, ocupou uma das duas primeiras posições da tabela desde a 9ª rodada, mas perdeu gradativamente o conforto que chegou a ter na liderança, garantindo a taça somente na última rodada. Já o Groningen, que voltou à primeira divisão como vice-campeão, sofreu bem mais. A certa altura, chegou a figurar mais no meio da tabela, com perigo de ficar do lado de baixo dela. Mas se aprumou, iniciou uma arrancada irresistível nas rodadas finais... e coroou tal arrancada chegando ao vice-campeonato, e ao consequente acesso direto à Eredivisie, na última rodada.

Não que o Willem II tenha sido muito mais tranquilo. Afinal de contas, o começo de temporada foi problemático para os Tricolores: mesmo com duas vitórias, o time ainda estava muito inconstante em campo. Foi então que a diretoria tomou decisão polêmica: demitir Reinier Robbemond, o técnico que iniciara a temporada, logo após a quarta rodada (vitória sobre o NAC Breda: 4 a 1, em jogo iniciado em 3 de setembro e terminado dois dias depois, após suspensão). Após duas semanas sob o comando do interino Peter van den Berg, outro Peter chegou para conduzir os trabalhos: o belga Peter Maes. Experiente em clubes de seu país, como o Mechelen e o Lokeren, Maes teria a sua primeira experiência fora do país natal. Ficaria a dúvida sobre como ele se sairia, diante de um grupo de jogadores já estabelecido.

O começo do Willem II foi preocupante, mas o técnico Peter Maes chegou, ajudando a equipe a se estabilizar de vez até o título (Geert van Erwen/Soccrates/Getty Images)

Pois Maes nem demorou tanto assim para ver o Willem II decolar. Ele assumiu o time na 8ª rodada (vitória sobre a equipe B do AZ - 2 a 0). Era só o início de uma sequência de seis vitórias, que levaria o time de Tilburg da oscilação no meio da tabela ao primeiro lugar, na 13ª rodada (curiosamente, rodada em que o time perdeu: 1 a 0 para o time B do Ajax). Contudo, excetuando-se tal queda e um empate com o ADO Den Haag - 1 a 1, na 18ª rodada -, o Willem II só teve vitórias no primeiro turno da Eerste Divisie, desde a chegada de Peter Maes. Obviamente, de nada adiantaria o técnico sem alguns jogadores se catapultarem para o destaque. E isso começou a acontecer na estabilidade do zagueiro Erik Schouten, no entrosamento que começou a surgir no meio-campo (Matthias Verreth e Jesse Bosch cuidando da marcação, Ringo Meerveld criando as jogadas), e em dois goleadores que apareceram: a dupla Jeremy Bokila (11 gols)-Jeredy Hilterman (16 gols-goleador do Willem II na temporada). Com isso, o Willem II pelo menos já se garantia na repescagem de acesso/descenso: foi o melhor do segundo "período", entre a 11ª e a 19ª rodadas da segunda divisão.

A temporada chegou à metade, 2024 começou, e o Willem II já estava na liderança, que não mais perderia. Ainda assim, a solidez que fora encontrada em campo teve alguns solavancos. No começo do returno, o time teve uma sequência de três empates que fez diminuir a vantagem aos concorrentes (Roda JC, ADO Den Haag, os crescentes Dordrecht e Groningen, o De Graafschap). Pior ainda: na 28ª rodada, tomou a virada do segundo colocado Roda JC - de 2 a 1 para 3 a 2. Mesmo assim, os destaques continuavam bem: Meerveld, Hilterman, Bokila, Thijs Oosting (este, meio-campo convertido em atacante). E uma sequência de quatro vitórias entre a 29ª e a 32ª rodadas deixou claro para a torcida em Tilburg: o Willem II podia até não dominar tanto, a expectativa seguiria, mas o acesso viria. 

O final da campanha exemplificou muito bem isso. Entre a 35ª e a 37ª rodada, três empates, com Roda JC e Groningen chegando perigosamente perto na tabela. Na 37ª rodada, inclusive, o time perdia para o Dordrecht... até os 90' + 3 (48 minutos do segundo tempo), quando o experiente Michael de Leeuw fez o gol do 1 a 1, que garantiu o ponto do acesso - e a manutenção da liderança. Que virou título, enfim, na última rodada: o Willem II perdia em casa para o Telstar, por 2 a 0, mas correu atrás da virada. Que chegou nos acréscimos, aos 90' + 3, quando Ringo Meerveld fez 3 a 2. E provou à torcida: o Willem II a fez sofrer, oscilou, mas fez tudo isso numa posição confortável. Confirmada com o título da segunda divisão - e a volta à Eredivisie, após dois anos.

O Groningen viveu uma epopeia até confirmar o bate-e-volta, uma temporada após o rebaixamento: péssimo começo, persistência no trabalho, evolução gradual, arrancada final imparável para o vice-campeonato e a vaga direta (Pieter van der Woude/BSR Agency/Getty Images)

O Willem II poderia ter outra frente de competição, na Copa da Holanda, mas parou na segunda fase dela. Eliminado pelo... Groningen. Que teve uma caminhada ainda mais nervosa na segunda divisão, até conquistar o acesso de maneira consagradora. Nervosa e... inesperada. Porque ninguém esperaria que o bate-e-volta fosse feito, após o rebaixamento da temporada passada. Ainda mais porque boa parte do grupo que jogava na Eerste Divisie pelos Groningers já estava por lá: os zagueiros Thijmen Blokzijl e Isak Määttä, o volante Laros Duarte, o meia-direita Luciano Valente, os atacantes Thom van Bergen e Romano Postema. A única diferença era o técnico - talvez quem mais merecesse a aposta: Dick Lukkien (cuja carreira de técnico iniciara no Groningen, dentro de comissões técnicas) vinha de sete anos brilhantes no Emmen, clube que com ele ganhara presenças frequentes na Eredivisie. Contudo, o começo foi preocupante: nas dez primeiras rodadas, só quatro vitórias. Pior ainda: entre a 8ª e a 14ª rodada, uma sequência de sete jogos sem vencer (quatro derrotas e três empates). Não bastasse a dor da lembrança do rebaixamento, o Groningen rondava as últimas posições da tabela - chegou a ficar na 14ª posição, na 14ª rodada, após empate em 0 a 0 com o Roda JC. Nem mesmo a repescagem de acesso parecia uma possibilidade. Algo perto do vexatório, para um clube tão tradicional no futebol da Holanda (Países Baixos).

Mas a diretoria nem pensava em demitir Dick Lukkien. Ele, por sua vez, seguiu apostando nos titulares em que já apostava - e em nomes importantes, que chegaram com experiência de segunda divisão (o goleiro Hidde Jurjus, ex-De Graafschap, e o zagueiro Marco Rente, ex-Heracles Almelo). A expectativa começou a virar realidade a partir da 16ª rodada, com uma vitória sobre o FC Eindhoven (2 a 1). Era o ponto de partida para uma sequência de oito rodadas sem derrotas, sendo sete vitórias - a única exceção foi na 19ª rodada, 1 a 1 contra o MVV Maastricht. Ainda não era uma retomada de plena força do time do norte holandês. Mas a sequência positiva já o recolocava na quinta posição, praticamente uma garantia de estar na repescagem de acesso, o que aplacaria um pouco a tensão da torcida. De quebra, o time avançava na Copa da Holanda - iria até as semifinais, só perdendo para o futuro campeão Feyenoord. Era elogiável. Mas... por quê ser somente elogiável, se podia ser consagrador?

E a caminhada do Groningen começou a ficar consagradora justamente na arrancada final. No terceiro período (20ª a 29ª rodadas), Dick Lukkien "encontrou" o time. Os destaques começaram a aparecer quando os Groningers mais precisavam. Por exemplo, o volante Leandro Bacuna, ex-Aston Villa, que fez questão de voltar ao clube em que começou, para ajudá-lo a subir rapidamente. Outra cria da tradicional base do clube, o citado Romano Postema enfim embalou como o Groningen já esperava havia tempos: foi empilhando gols (chegou a 18, na temporada). Também volante, o norueguês Johan Hove ajudou a estabilizar o meio-campo, e a proteger a zaga. Resultado? Com apenas um empate e uma derrota nas dez rodadas do terceiro período, o Groningen foi o melhor dele, garantindo lugar na repescagem de acesso. Mas... por quê se contentar com a repescagem, se a vaga direta começou a parecer possível?

Entre vários nomes que viveram a dor da queda do Groningen e vivem a alegria da volta rápida, Leandro Bacuna foi um veterano que voltou ao clube em que começou, para ajudá-lo (Pieter van der Woude/BSR Agency/Getty Images)

E o Groningen continuou enfileirando vitórias na reta final. Principalmente sobre adversários diretos na disputa pelo acesso, que agora disputarão a repescagem: 4 a 2 no De Graafschap (30ª rodada), 2 a 0 no ADO Den Haag (32ª rodada, fora de casa), 3 a 0 no Emmen (jogo atrasado da 22ª rodada). Vinha a estabilidade na 3ª posição, sendo um perseguidor ao Roda JC. Vinha até a perspectiva de... título, que parecera tão distante nas primeiras rodadas. E o ápice veio nas últimas, que reservaram caprichosamente encontros contra os dois primeiros colocados da segunda divisão, então. O sonho remoto do título se acabou na 36ª e antepenúltima rodada, contra o futuro campeão Willem II (empate em 1 a 1). E quase que o sonho do acesso precisaria ser trocado pela repescagem, na penúltima rodada: enquanto o Roda JC fazia 2 a 0 no Cambuur e mantinha a segunda posição, o Groningen perdia para o Telstar. A ponto do locutor do estádio do Roda informar que o jogo já se encerrara, com derrota do Groningen, motivando invasão da torcida do clube aurinegro da cidade de Kerkrade. Mas... não tinha acabado. Mais ainda: aos 90' + 5, Thom van Bergen fez o gol salvador do empate contra o Telstar (1 a 1). O clube se mantinha com chances de vice-campeonato e acesso direto, três pontos atrás do Roda JC, com saldo de gols superior a ele. E o que haveria na 38ª e última rodada? Groningen x Roda JC...

Depois de tanto sofrimento, a apoteose foi até tranquila. Porque, na última rodada, no esperado jogo, dentro de um Euroborg entupido de gente, o Groningen foi sempre superior. Já abriu o placar no primeiro tempo. Fez mais um gol no segundo tempo. E a torcida, por sua vez, foi precavida: só invadiu o campo quando o juiz encerrou a partida com o 2 a 0, a vitória do acesso consagrador, coroando a ascensão que o Groningen viveu desde a metade da temporada até exatamente a última rodada. Com a arrancada dele e a continuidade do Willem II esticando a ansiedade do título, as duas histórias de acesso terminaram com um gigante "ufa!" de alívio. E com a festa que sempre vem depois desse "ufa!".

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