terça-feira, 6 de outubro de 2020

Com todo o cuidado

Frank de Boer começa a treinar a seleção holandesa para valer - tentando alterar o mínimo possível, pelo menos neste início (ANP)


No fundo, Frank de Boer sabe o tamanho da pressão que atrai para si ao ser técnico da seleção masculina da Holanda (Países Baixos), que vai para mais três datas FIFA ao longo desta e da próxima semana - há amistoso nesta quarta, contra o México, em Amsterdã, além de mais dois jogos pela Liga das Nações (dia 11, contra a Bósnia, em Zenica, e dia 14, contra a Itália, em Bérgamo). Mais do que isso: De Boer sabe o tamanho da desconfiança que tem sob o seu trabalho. Por tudo isso, o técnico que começará seu trabalho à frente da Laranja fez questão de alertar, na entrevista coletiva da segunda-feira passada, logo após a apresentação dos 24 convocados na cidade de Zeist: "Primeiro, quero ter uma visão panorâmica, como se eu estivesse num helicóptero. Acho lógico que, se você acabou de chegar, não faz tantas experiências". 

Trocando em miúdos: pelo menos neste começo de trabalho, Frank de Boer cumprirá exatamente o critério principal que norteou a federação holandesa na escolha do sucessor de Ronald Koeman - não mexer excessivamente na base que Koeman deixou pronta. Tanto que, entre os 24 convocados (eram 25, antes dos cortes de Mohamed Ihattaren e Steven Bergwijn, ambos lesionados), a única novidade digna de nota era a estreia de Teun Koopmeiners, promissor volante do AZ, nas convocações da Laranja. Nem mesmo nomes contestados, como Kevin Strootman ou Ryan Babel, ficaram de fora. E Frank de Boer deixou claro, na entrevista coletiva, que ambos têm certa importância: "Por que chamá-los? Ora, continuam jogando, continuam sendo importantes dentro e fora de campo". Por falar no "fora de campo", Frank até mesmo indicou que a palavra dos mais veteranos em matéria de seleção deve ser preponderante: "É claro que os mais jovens escutam o que eu falo, mas escutarão ainda mais se vier de um Gini [Wijnaldum], um Daley [Blind], um Virgil [van Dijk]".

Se o novo técnico da seleção masculina holandesa tem toda a cautela possível antes de fazer as alterações previsíveis que uma hora fará ("No processo, sempre avaliaremos o que deve ou não mudar"), os principais jogadores também foram cuidadosamente otimistas com o comandante que acabou de chegar. Na entrevista coletiva de segunda passada, ladeando o técnico, o capitão Van Dijk acalmou: "Não havíamos indicado nem o nome dele nem o de nenhum outro, mas Frank é dos mais adequados nomes para seguir a linha de Koeman". Nesta terça, Wijnaldum até falou um pouco mais ("Fui escalado na ponta-direita [contra a Itália], fiz o meu melhor, mas prefiro jogar no meio-campo"), mas nada que ameaçasse ou questionasse De Boer ("Nós não conversamos com ele sobre posicionamento. Ele só conversou na segunda-feira, sobre suas ideias de futebol, apontou o que vai bem e onde podemos melhorar, e foi positivo").

Até mesmo a única lamentação na convocação foi unânime: a ausência de Ihattaren. Iniciando a temporada no banco de reservas do PSV (até surpreendentemente), supostamente abatido por não ter saído do banco contra Polônia e Itália, na Liga das Nações (boatos deram até conta de que Ihattaren pensava em voltar atrás em sua escolha de "seleção", pensando em jogar por Marrocos), o jovem ponta-de-lança tinha tudo para receber alguns minutos de oportunidade - ainda mais no jogo contra o México. Mas uma leve lesão muscular foi o suficiente para o corte. Mesmo assim, no que depender de quem estiver na seleção, as portas seguirão abertas. Tanto da parte de Frank de Boer ("Ele tem um grande futuro à frente, e pode ser importante para nós já na Euro"), quanto da parte de Wijnaldum ("Eu o vi pela primeira vez na convocação passada, pude aconselhá-lo, é um bom rapaz").

Nesta foto, há um nome que não jogará mas poderia (Tim Krul, à frente); outro que terá chance com a suspensão de Memphis Depay (Luuk de Jong, no meio); e mais outro contestado que segue na convocação, Ryan Babel, no fundo (Pim Ras Fotografie)


O único momento em que Frank de Boer aumentou um pouco seu tom foi ao lamentar o amistoso bissexto contra o México: "O ideal seria não jogar [esse amistoso], porque aí a preparação seria mais tranquila. Eu preferia que nos preparássemos melhor". Ainda assim, até mesmo o jogo contra El Tri - cujo integrante Edson Álvarez, jogador do Ajax, reconheceu que jogos contra a Holanda "têm peso especial após aquela partida na Copa de 2014" - pode trazer benefícios ao técnico. Afinal de contas, será uma rara oportunidade para fazer testes, experimentar novos nomes. Como o supracitado Koopmeiners, no meio-campo. Ou talvez ver Hans Hateboer jogando como faz melhor na Atalanta, como ala, num time com três zagueiros. Ou até mesmo ver Tim Krul, o único goleiro que anda em fase aceitável dos três relacionados na Oranje - o titular Jasper Cillessen é reserva no Valencia, e Marco Bizot anda falhando pelo AZ no início do Campeonato Holandês.

Ainda assim, Frank de Boer sinaliza que nem mesmo o amistoso terá mudanças bruscas (com relação aos goleiros, o treinador opinou que "nesse momento, os três convocados são os que merecem estar aqui"). As únicas mudanças para os jogos que vêm por aí devem mesmo ser Stefan de Vrij, enfim, como titular da zaga laranja ao lado de Van Dijk, bem como Luuk de Jong ocupando a vaga do suspenso Memphis Depay contra a Bósnia ("Cresci muito na temporada passada", reconheceu o atacante do Sevilla). 

Afinal de contas, Frank de Boer sabe que já chega com desconfianças. E tentará começar a vencê-las com todo o cuidado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário