quarta-feira, 8 de maio de 2019

Pior cenário possível

Depois do começo eficiente, quem poderia imaginar uma queda do Ajax? Por isso doeu tanto a derrota em Amsterdã (ANP)
Estava bom demais para ser verdade. O Ajax vinha de seu primeiro título na temporada, celebrando a Copa da Holanda. A Johan Cruyff Arena absolutamente lotada. Vários personagens históricos do futebol holandês (de Ronald Koeman, técnico da seleção, a Louis van Gaal, passando por Wesley Sneijder) presentes, para verem o que tinha tudo para ser a continuação de um sonho, mais uma consagração Ajacied na Liga dos Campeões. Mas havia um time muito capacitado para tentar evitar isso: o Tottenham. Que obedeceu ao seu lema histórico: ousou e fez, vencendo de forma heróica em Amsterdã, indo à final da Champions League e impondo uma das mais duras decepções que o futebol holandês viveu em muito tempo.

Decepção que já podia ser temida na péssima surpresa que os torcedores tiveram na Johan Cruyff Arena, minutos antes do apito inicial: a dúvida sobre a presença de David Neres no jogo, por dores musculares sentidas desde a final da Copa da Holanda, virou ausência do brasileiro após o aquecimento. A mudança imprevista faria o ataque do Ajax ter de jogar como se desacostumou: com uma referência mais fixa na área - no caso, Kasper Dolberg. E o atacante dinamarquês decepcionou novamente, mostrando os mesmos defeitos vistos após a sequência de lesões por que passou: lentidão, apatia, falta de sintonia com o modo como o Ajax jogava.

Pelo menos, o problema ofensivo ficou menos aparente graças ao providencial gol precoce marcado por De Ligt para abrir o placar. O Tottenham teve de ir para o ataque, e foi com muito perigo - como provaram os chutes em sequência de Son Heung-min e Lucas, aos 23' e 24', ambos defendidos por André Onana. Mas aí, os outros dois atacantes compensaram. Mesmo bem marcado, Tadic conseguia acelerar as chances de ataque Ajacieden - e trazia perigo nos chutes, como aos 30'. E Hakim Ziyech provou novamente seu talento: segurando a bola, perigoso nas finalizações, solidário na troca de passes. Ninguém mais do que o marroquino merecia o segundo gol, aos 35', para coroar a eficiência que parecia levar o Ajax à sétima final de Liga dos Campeões em sua história, quando o primeiro tempo acabou.

Mas só parecia. Porque Mauricio Pochettino se lembrava muito bem da mudança tática que assustara o Ajax no jogo de ida: usar Fernando Llorente tanto como "pivô" para os meio-campistas quanto como atacante, para as bolas aéreas. Era hora de voltar a jogar assim, com o espanhol entrando no lugar de Victor Wanyama, já que a situação para os Spurs era de tudo ou nada. Ao mesmo tempo, o Ajax voltou para o jogo... relaxado. Apostava num contra-ataque para o terceiro gol. Pior: o meio-campo dos Godenzonen já estava cansado, pelo que se viu nos primeiros minutos da etapa complementar. E o Tottenham passou a rondar mais e mais a área do Ajax. Passou a trazer mais e mais perigo nas bolas altas, nas quais só De Ligt é acima de qualquer suspeita na defesa. Impunha a força física no meio-campo, com Moussa Sissoko útil como na ida. Mesmo cansado, o time da casa seguia avançando - Louis van Gaal se irritou ao lembrar, no pós-jogo da emissora Ziggo Sport: "Com 2 a 0 de vantagem, para quê ter oito homens posicionados numa bola parada sem perigo?".

Foi a hora do time de Londres aproveitar. Com Lucas como destaque, mudando o jogo em quatro minutos. Primeiro, ao puxar o contragolpe que só parou nas redes de Onana, aos 55', aproveitando cansaço de Schöne na marcação (e também a boa saída de Danny Rose, colocando a bola entre as pernas de De Ligt). Depois, ao aproveitar que Onana não completou o milagre feito na finalização à queima-roupa de Llorente, pegar a sobra e empatar, aos 59'.

A partir de então, ficaram visíveis os velhos erros do Ajax. Os temores nas bolas aéreas. O susto da defesa contra um time intenso - foi assim que o AZ fez 1 a 0, neste returno de Campeonato Holandês, pressionando os Amsterdammers. Ao mesmo tempo que atacava, o Tottenham não deixava espaço para os contragolpes de Tadic e Ziyech. Quando deixou, os dois destaques do time holandês faziam coisas muito úteis (como o complemento do sérvio impedido por Kieran Trippier, aos 69', ou a bola na trave do marroquino, aos 79').

Mas no geral, o sentimento desde o 2 a 2 era de que a queda do Ajax era um desastre esperando para acontecer naquele segundo tempo. Por mais jogadores que fossem para a defesa, a equipe de Ten Hag simplesmente... não sabia defender. Magallán entrou já nos acréscimos - e escorregou no lance decisivo. No último segundo, quando Dele Alli deixou Lucas livre para completar a melhor atuação de sua carreira com o gol da virada.

E agora... o Ajax ainda tem o Campeonato Holandês para tentar conquistar. Está em vantagem, na disputa com o PSV. Mas depois de um sonho que esteve tão próximo, quem se importa em Amsterdã? Mais: será que o cansaço dos Ajacieden ajudará o time de Eindhoven, numa próxima rodada com adversários traiçoeiros no domingo (PSV contra AZ, Ajax contra Utrecht)? A ver.

Mas não agora, porque a queda do Ajax ocorreu no pior cenário possível. Do pior jeito possível. Vieram os aplausos, mais do que justos pela temporada que se viu em Amsterdã. E as lágrimas misturando orgulho e tristeza. Mas... até quando o futebol holandês se contentará só com aplausos?

O Ajax mereceu todos os aplausos da torcida na Johan Cruyff Arena, e mais alguns. Mas preferia a vaga (ANP)
Liga dos Campeões - semifinal (jogo de volta)

Ajax 2x3 Tottenham


Local: Johan Cruyff Arena (Amsterdã)
Data: 8 de maio de 2019
Árbitro: Felix Brych (Alemanha)
Gols: Matthijs de Ligt, aos 5', e Hakim Ziyech, aos 35'; Lucas, aos 55', 59' e 90' + 5

Ajax
André Onana; Noussair Mazraoui, Matthijs de Ligt, Daley Blind e Nicolás Tagliafico; Lasse Schöne (Joël Veltman), Frenkie de Jong e Donny van de Beek (Lisandro Magallán); Hakim Ziyech, Kasper Dolberg (Daley Sinkgraven) e Dusan Tadic. Técnico: Erik ten Hag

Tottenham
Hugo Lloris; Kieran Trippier (Erik Lamela), Toby Alderweireld, Jan Vertonghen e Danny Rose (Ben Davies); Victor Wanyama (Fernando Llorente) e Moussa Sissoko; Son Heung-min, Christian Eriksen e Dele Alli; Lucas Moura. Técnico: Mauricio Pochettino

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