Ao fazer seu planejamento para os próximos anos, a federação holandesa de futebol traçou um objetivo final: um título. Qualquer título. Liga das Nações, Euro, Copa do Mundo, não importa qual. Afinal, mesmo que a cobrança por isso na Holanda (Países Baixos) seja suportável e tenha outros adicionais - lá não basta ganhar, precisa ganhar e jogar bem -, ter apenas um título de expressão é incômodo. E poucas vezes a chance da Laranja foi tão grande quanto nestas fases finais da Nations League. Sediadas justamente em casa. E tendo o primeiro estágio na semifinal contra a Croácia, nesta quarta, 14, às 15h45 de Brasília, em De Kuip (Roterdã) - ganhando, o eventual título seria decidido contra Espanha ou Itália, que fazem a outra semifinal na quinta, 15, em Enschede.
O foco no título foi exemplificado em fatos como a preparação dos convocados ter se iniciado já na segunda-feira passada, no centro de treinamentos da federação, na cidade de Zeist. O técnico Ronald Koeman justificou: "Eles [jogadores] fizeram os últimos jogos por seus times nas ligas no fim de semana de 28 de maio. Estavam prontos [para treinar]. Esperar uma semana para começarmos a preparação seria um tempo longo demais. Eles precisam manter a forma". Para alternar descanso e treinos, os trabalhos foram feitos em Zeist até a quarta-feira, junto a alguns convocados da Holanda para a Euro sub-21, com os jogadores ganhando folga geral na quinta e na sexta. E entre eles, a mentalidade foi bem resumida pelo capitão Virgil van Dijk: "Eu quero vencer a Liga das Nações. É a meta sagrada. Claro que é melhor fazer isso de uma maneira bonita, mas o que importa é levar aquele prêmio. Temos o direito".
Para tentar isso, os problemas apareceram. Num setor da Laranja que já sofre tanto com a falta de opções como o ataque, o jogador mais técnico fará falta: com lesão muscular, Memphis Depay se apresentou somente para constar - foi cortado assim que se apresentou e fez exames. Fecho coincidente com uma temporada em que Memphis sofreu demais com lesões: em levantamento de Bart Frouws, jornalista da revista Voetbal International, nesta temporada o atacante jogou apenas 520 minutos por clubes (Barcelona até o ano passado, Atlético de Madrid neste) e 505 minutos pela seleção. Ainda assim, sua ausência trouxe duas dúvidas: como será o ataque da Oranje nas partidas decisivas? E quem substituirá Memphis no meio da área? Hora para os mais novatos, como Xavi Simons e Cody Gakpo, assumirem a responsabilidade.
Sem Memphis Depay, Cody Gakpo assumirá a responsabilidade de ser o principal atacante nas decisões da Liga das Nações - e parece recebê-la bem (KNVB Media/Divulgação) |
Pelo menos, as respostas estão encaminhadas. Na entrevista coletiva que concedeu no sábado, Ronald Koeman deixou implícito: "Outra pessoa vai jogar na área. Temos algumas possibilidades". E depois, abriu quais eram: "Malen, Gakpo e Weghorst". Tempos depois, coube a um dos mencionados indicar que está pronto para assumir a responsabilidade - Cody Gakpo: "Agora que jogo no Liverpool, acho essa posição [atacante de referência, camisa 9] boa. Estou convencido de que ser atacante combina comigo". E Xavi Simons, dos melhores jogadores do Campeonato Holandês passado, jovem que começa a justificar a badalação? Koeman: "A princípio, ele é uma opção para a ponta esquerda, mas também pode ser o 'camisa 10'". Paralelamente, com a evolução técnica que viveu na reta final da temporada no Borussia Dortmund (em que pese a decepção da perda do título alemão), Donyell Malen é considerado pelo treinador holandês uma "solução" para o problema sobre o titular da ponta-direita. Sendo assim, é muito provável ver o trio Malen-Gakpo-Xavi Simons começando como titular contra a Croácia.
Mais complicadas são outras questões que assolam Koeman. As más atuações em março, nas eliminatórias da Euro 2024 (goleada sofrida para a França, vitória com muitas chances e poucos gols contra Gibraltar), deixaram marcas: "Pode e deve melhorar". Outra polêmica esteve na reserva da lateral direita. Afinal de contas, Jeremie Frimpong foi considerado o melhor da posição no Campeonato Alemão passado, jogando pelo Bayer Leverkusen. Esteve entre os convocados da Copa passada, mesmo sem jogar nenhum minuto no Catar. Ainda assim, o técnico da seleção segue dando preferência a Lutsharel Geertruida como reserva de Denzel Dumfries - nas datas FIFA passadas, alegou que Frimpong tem dificuldades na marcação.
A situação piorou desta vez: Frimpong foi novamente deixado de fora, até foi incluído na convocação holandesa para a Euro sub-21, mas preferiu pedir dispensa dela. Decisão que causou questionamentos de Koeman: "Se entendo? Não, e não acho bacana, não acho correto. A seleção sub-21 vai jogar uma Euro, e se um jogador acha que ele já está acima deste nível, está escolhendo errado". Por um lado, faz sentido: afinal, Kenneth Taylor e Ryan Gravenberch, ambos com experiência pela Holanda adulta, jogarão a Euro de jovens. Por outro, aumentam os temores de que Frimpong, ainda sem partidas vestindo laranja, possa decidir mudar de seleção: ainda pode defender Gana (país de ascendência) ou Inglaterra (país natal).
Ronald Koeman já começa o trabalho sob pressão, após as más atuações da seleção em março. Um dos campeões da Euro 1988, sabe o que um título significaria (KNVB Media/Divulgação) |
Outro questionamento é anterior até mesmo à volta de Ronald Koeman: o goleiro titular. Escolhido para jogar na Copa do Mundo, Andries Noppert sofreu uma lesão muscular logo após ela, em janeiro - e passou boa parte deste 2023 se recuperando. Mas voltou a jogar pelo Heerenveen, na reta final do Campeonato Holandês. Bastou para ser pré-convocado e, depois, inscrito na Liga das Nações. E o técnico da Laranja confirmou de vez que o titular da Copa segue muito bem cotado: "Sempre mantivemos contato com Andries. Sabíamos que ele estaria nos últimos jogos da temporada. (...) Em março ele já poderia ter sido chamado, mas estava machucado. Achamos que ele está entre os três melhores". Contudo, deve-se evocar que Justin Bijlow, titular no começo da passagem de Louis van Gaal, recuperou a forma e fez parte do Feyenoord campeão holandês. E mesmo Jasper Cillessen - criticado nas datas FIFA passadas, em queda no NEC na reta final da temporada nos Países Baixos, fora agora - segue com portas abertas, de acordo com Ronald Koeman ("Na próxima temporada, veremos de novo. Só não o convocamos agora por causa da sua forma").
No mais, enquanto não treinam Denzel Dumfries e Nathan Aké (ambos chegando mais tarde, após a final da Liga dos Campeões que disputaram), os treinos em Zeist sinalizaram um bom ambiente, em fatos como a simpática campanha da federação holandesa para valorização do futebol amador - os convocados vestiram as camisas dos clubes em que começaram a jogar. Os treinos também deixam expectativas sobre como será o meio-campo: fora o intocável Frenkie de Jong, se terá nomes elogiados como Joey Veerman ou Mats Wieffer ou se seguirá com veteranos como Georginio Wijnaldum. Mostram ainda uma curiosidade: mesmo estreando em convocações na seleção, graças à boa temporada que fez no AZ, Tijjani Reijnders ficou fora da lista de 23 que terão direito a jogo. E não mostram mais Matthijs de Ligt, cortado nesta segunda-feira, por dores na panturrilha - Daley Blind, na "minilista de espera", substituiu o colega de seleção e de clube.
Só que o imperativo está numa coisa: ser campeão. Se Virgil van Dijk começou falando disso, Frenkie de Jong continuou, à revista Voetbal International: "Pode não ser uma Euro ou uma Copa, todos sabem e sentem isso. Mas é um troféu, entre quatro participantes fortes". E Ronald Koeman terminou evocando o único título que a Laranja masculina tem - e uma derrota que viveu na primeira passagem treinando a seleção: "Vimos como Portugal ficou feliz em 2019, quando os enfrentamos na final [da Liga das Nações]. Sempre falam de Euro ou Copa, mas agora é a Liga das Nações que está aí. Ainda falam de 1988 [título na Eurocopa], quando eram só oito times participantes. Isso diz o bastante. É algo que fica. Estamos malucos para conquistar esse torneio".
Se assim for, que assim seja. Não só pela vitória de um torneio. Mas para vencer as desconfianças que cercam a seleção da Holanda - desconfianças justificadas.
Os 25 convocados da Holanda (Países Baixos) para as decisões da Liga das Nações
Goleiros: Andries Noppert (Heerenveen), Justin Bijlow (Feyenoord) e Mark Flekken (Freiburg-ALE, se transferindo para o Brentford-ING)
Laterais: Denzel Dumfries (Internazionale-ITA), Lutsharel Geertruida (Feyenoord), Tyrell Malacia (Manchester United-ING) e Nathan Aké (Manchester City-ING)
Zagueiros: Sven Botman (Newcastle-ING), Daley Blind (Bayern de Munique-ALE), Jurriën Timber (Ajax) e Virgil van Dijk (Liverpool-ING)
Meio-campistas: Frenkie de Jong (Barcelona-ESP), Georginio Wijnaldum (Roma-ITA), Marten de Roon (Atalanta-ITA), Teun Koopmeiners (Atalanta-ITA), Joey Veerman (PSV) e Mats Wieffer (Feyenoord)
Atacantes: Donyell Malen (Borussia Dortmund-ALE), Cody Gakpo (Liverpool-ING), Xavi Simons (PSV), Steven Bergwijn (Ajax), Noa Lang (Club Brugge-BEL) e Wout Weghorst (Manchester United-ING)
(Tijjani Reijnders, do AZ, também foi convocado, mas não foi relacionado para os jogos, ficando apenas à disposição para o caso de cortes até o jogo de estreia. Daley Blind estava no mesmo caso, mas substituiu Matthijs de Ligt, que foi cortado)
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