O Twente seguiu devagar e sempre, contra os badalados PSV e Ajax. Riu por último, campeão da Eredivisie feminina (Pro Shots) |
Era uma vez três "porquinhos" - ou melhor, dois lobos maus e um porquinho. Todos estavam muito ansiosos antes do Campeonato Holandês feminino começar nesta temporada 2020/21. O lobo mau vindo de Amsterdã se chamava Ajax, e estava bem ansioso para comprovar sua força, com a vinda de a zagueira Stefanie van der Gragt (titular da seleção feminina) para se juntar a um time bem entrosado, com Victoria Pelova, Nikita Tromp e Marjolijn van den Bighelaar como destaques. Já o lobo mau de Eindhoven, chamado PSV, foi ainda mais feroz em sua apresentação: de uma só vez, repatriou Mandy van de Berg e Sari van Veenendaal, a melhor goleira do mundo em 2019, para se afirmar como o favorito à conquista da Vrouwen Eredivisie - até porque teria nomes como a promissora Esmee Brugts e o destaque Joëlle Smits. O porquinho Twente foi bem mais modesto, manteve seus destaques, só ousou numa vinda... mas foi quem saiu sorrindo no fim da fábula, campeão holandês entre as mulheres.
Um fim surpreendente, porque quando o campeonato começou, os lobos maus pareciam soprar forte para derrubar a casa sólida do Twente, Aliás, o Ajax fez isso na primeira rodada, vencendo os Tukkers na primeira das 14 rodadas da temporada regular (3 a 1, em setembro do ano passado). O PSV ainda foi fragilizado por um surto de infecções pelo coronavírus, que o impediu de estrear na data prevista, mas já começou vencendo o Heerenveen (2 a 1) - e quando enfim pôde jogar a primeira rodada, fez 5 a 1 no VV Alkmaar. O Twente começou capengando (além da derrota para o Ajax na estreia, ficou no 1 a 1 com o Zwolle), e só venceu duas vezes nas cinco primeiras rodadas.
Porém, aos poucos a temporada regular foi correndo. Nela, o PSV foi apresentando um problema preocupante: a equipe de Eindhoven mostrava a força esperada contra os adversários mais frágeis. Só que alguns nomes de destaque, como Van Veenendaal, falhavam com frequência acima do desejável. E contra os adversários a sério na disputa do título, o time de mulheres dos Boeren fraquejava quase sempre. Foi assim na vitória que fez o Twente bradar que estava a sério na Vrouwen Eredivisie: o 3 a 2 da sétima rodada. Na partida seguinte, mais um jogo para o porquinho mostrar que não era qualquer lobo mau que destruiria sua morada: 2 a 1 no Ajax.
Àquela altura, já era possível notar as qualidades que o Twente possuía. Mesmo com poucas contratações, os destaques da equipe treinada por Tommy Stroot eram muito confiáveis. Daphne van Domselaar no gol, Lynn Wilms na lateral direita, Sisca Folkertsma no meio-campo, Anna-Lena Stolze e Fenna Kalma na frente: todas elas sempre tinham um nível de atuação razoável. Mas o grande símbolo da regularidade da equipe de Enschede era uma boa e velha conhecida: a capitã Renate Jansen. Pode não ser brilhante tecnicamente, pode não ser a atacante mais falada da Holanda, mas bem ou mal, sempre faz seus gols, sempre se sacrifica pela equipe, e tem certa experiência. Talvez por isso, Renate é figura certa nas convocações da seleção feminina da Holanda (Países Baixos).
A capitã Renate Jansen (no centro) simbolizou a constância do Twente rumo ao título (Pro Shots) |
A reta final da temporada regular indicou que o leme virava no campeonato. Nas rodadas finais, PSV e Ajax tropeçavam entre si e entre outros. Basta lembrar o 1 a 1 do Ajax com o Heerenveen, na 11ª rodada, a derrota do mesmo Ajax para o Zwolle na rodada seguinte - 1 a 0 - e o empate do PSV com o ADO Den Haag na 13ª e penúltima rodada. Os lobos maus ficavam mais fracos, de tanto soprar sem derrubar a casinha do Twente. Que devagar e sempre, com esmero, somava pontos para terminar as 14 rodadas como líder do Campeonato Holandês, concluindo a campanha com 2 a 1 no PSV, trazendo belíssimo gol de Fenna Kalma. Eram 32 pontos do "porquinho", contra 31 dos "lobos maus".
Àquela altura, o lupino de Amsterdã já recobrara suas forças com outra contratação recebida com pompa e circunstância: Sherida Spitse, mais uma neerlandesa retornada ao país natal pela saudade familiar. Mas se a questão era ter força, o Twente deu uma cartada tão discreta quanto certeira: trazer Kika van Es - menos falada, reserva atual na seleção da Holanda, mas voltando da Inglaterra (Everton) para ser absoluta na lateral esquerda dos Tukkers. E o PSV, ora vejam, contava com a velha conhecida Joëlle Smits para se destacar em meio a tantas contratações - Smits já se credenciava como a goleadora da Vrouwen Eredivisie.
E no quadrangular pelo título, com seis rodadas, coube ao lobo mau de Eindhoven e ao porquinho de Enschede tirarem de vez o Ajax do páreo. Na primeira rodada, o PSV fez 3 a 1 nos Ajacieden; o Twente os despachou de vez na 3ª rodada (2 a 1, fora de casa) e na 4ª também (Twente 1 a 0, em casa). Só restou a Spitse, vinda para liderar o Ajax em campo, lamentar, à ESPN holandesa: "Eu não voltei para isso". Mas na quinta e penúltima rodada do quadrangular, o licantropo Amsterdammer feriu o lobo de Eindhoven, fazendo 3 a 2.
Faltava um tijolo para o porquinho prático de Enschede conseguir concluir sua bonita casa com o título. Mas ele estava difícil de ser conseguido: o ADO Den Haag segurava as pontas, com o 0 a 0 fora de casa. No entanto, como em toda fábula infantil, o final foi feliz: a quatro minutos do fim, o esforço do Twente foi premiado com o gol de Stolze. O gol da vitória. O gol do título. O gol que dava o melhor fim possível à passagem de Lynn Wilms, de saída para o Wolfsburg.
A fábula da Vrouwen Eredivisie podia terminar com o porquinho Twente, feliz, zombando dos lobos maus PSV (vice-campeão) e Ajax (3º colocado). Nem ligou para a derrota ao PSV nesta última rodada. Já podia cantar alegre: "Quem tem medo do lobo mau, lobo mau, lobo mau...".
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