sexta-feira, 11 de novembro de 2022

Os holandeses na Copa: Aké

Devagar, discretamente, Aké se firmou como titular da Holanda - até mais preponderante do que é em seu clube. Assim emplacará presença na Copa (KNVB Media/Divulgação)

Ficha técnica
Nome: Nathan Benjamin Aké
Posição: Zagueiro/lateral esquerdo
Data e local de nascimento: 18 de fevereiro de 1995, em Haia 
Clubes na carreira: Chelsea (2012 a 2017), Reading-ING (2015, por empréstimo), Watford-ING (2015 a 2016, por empréstimo), Bournemouth-ING (2016, por empréstimo, e de 2017 a 2020), Manchester City-ING (desde 2020) 
Desempenho na seleção: 29 jogos e 3 gols, desde 2017 
Torneios pela seleção: Liga das Nações (2018/19, 2020/21, 2022/23), Euro (2020+1)

(Versão revista e ampliada do texto de apresentação para o guia deste blog na Euro 2020+1)

Devagar e sempre: este parece ter sido o lema a guiar a carreira de Nathan Aké - não só na seleção masculina da Holanda (Países Baixos), mas em clubes. Sem nunca ter atuado no país natal, ficou sem muito espaço no Chelsea em que surgiu. Começou a despontar em times mais modestos da Inglaterra, entrou nas convocações da Laranja com papel periférico, ganhou algum destaque nos tempos de Bournemouth, enfim virou opção real em termos de seleção, chegou ao Manchester City, lá ganhou mais espaço... e agora, chega à primeira Copa da carreira como provável titular da equipe holandesa. O ponto alto da carreira paciente de "Baby Gullit" (apelido popular, mesmo sem ser oficial, dado em razão da óbvia semelhança com o ex-jogador).

Tal evolução começou antes mesmo da carreira começar para valer, a bem da verdade. Porque o nativo de Haia, filho de pai marfinense e mãe holandesa, também pianista amador nas horas de folga - como Stefan de Vrij, colega de seleção - fez o caminho habitual de um jogador neerlandês: jogar num clube amador durante a infância (o VV Wilhelmus, entre 2001 e 2003), de lá ir para uma agremiação profissional (o ADO Den Haag, no qual ficou de 2003 a 2005), e acelerar a formação como jogador num grande do país - o Feyenoord, no qual ficou de 2007 a 2011, progredindo dentro das equipes de base do Stadionclub. E a partir de 2009, começando também o caminho nas seleções inferiores dos Países Baixos, pela equipe sub-15.

Mas como outros contemporâneos, a carreira de Aké já começou para valer em outro país. Porque, em 2011, tão logo ele chegou à seleção sub-17 (já então, como zagueiro), o Chelsea o levou, para que já atuasse como júnior dentro de Stamford Bridge. E o começo foi promissor: o zagueiro concluiu 2011 sendo eleito o "Jogador Jovem do Ano" dentro do clube inglês. De quebra, esteve no grupo da Holanda campeã da Euro sub-17 daquele ano, ainda que indo e vindo do banco.

Em 2012, no bicampeonato europeu sub-17 da Holanda, Aké já foi titular - e até gol marcou, na fase de grupos, contra a Eslovênia. Mas a aparição no time principal do Chelsea demorou um pouco mais: só em 26 de dezembro, contra o Norwich City, na 19ª rodada do Campeonato Inglês. Curiosamente, Aké jogou menos na Premier League... e mais na Liga Europa: na campanha vitoriosa dos Blues, atuou durante os 90 minutos da vitória contra o Rubin Kazan, nas quartas de final, e entrou nos últimos oito minutos contra o Basel, na semifinal.

Aké até teve chances no Chelsea - mas nunca conseguiu ocupar um lugar para valer no grupo principal em Stamford Bridge (chelseafc.com)

O jovem holandês ainda recebeu um voto de confiança do Chelsea: em 2013, renovou contrato até 2018. De quebra, era nome certo no time B dos Blues. Mas nada disso significou que Aké ganhou chances consistentes: só 11 minutos em um jogo, na Premier League 2013/14. Embora tivesse começado a participar da seleção sub-21 da Holanda, pegaria uma fase ruim da Laranja Jovem, que ficaria fora da Euro da categoria por um longo tempo. 

E em 2014/15, Aké tomou o mesmo caminho de vários jovens que então atuavam no clube: uma sequência de empréstimos, para ter mais ritmo de jogo. Começou pelo Reading: foi cedido por um mês aos Royals, e lá fez cinco jogos, em abril de 2015. Agradou, foi reintegrado ao Chelsea, e até participou de um jogo na campanha do título inglês dos Blues: fez 17 minutos nos 3 a 0 sobre o West Bromwich, pela penúltima rodada, merecendo lembrança do técnico José Mourinho - o português prometeu que Aké receberia uma medalha pelo título, mesmo com a minúscula participação na campanha.

Só outro empréstimo, ao Watford, durante a temporada 2015/16, fez Aké embalar para valer na carreira. Nos Hornets, o holandês já apelidado "Baby Gullit" (pelo cabelo e pela aparência evocando o ex-jogador) ganhou versatilidade tática: além de escalado habitualmente na zaga, ganhou do técnico Quique Sánchez Flores espaço na lateral esquerda. Já teve bem mais jogos: 24 pelo Campeonato Inglês, sendo 20 como titular. Até mesmo o primeiro gol da carreira adulta marcou, nos 3 a 0 do Watford no Liverpool, pela 17ª rodada. 

E o que já era razoável ficou melhor no empréstimo seguinte de Aké: o Bournemouth, na temporada 2016/17. Nos Cherries, o holandês se mostrou fundamental no time treinado por Eddie Howe: foram 12 jogos na primeira metade da Premier League, três gols (um deles, marcante: o gol da vitória na virada de 3 a 1 para 4 a 3 no Liverpool, na 14ª rodada), firmeza tanto na zaga quanto na lateral esquerda, capacidade de desarmes nas divididas. Isso foi percebido pelo Chelsea: já no começo de 2017, Aké foi reintegrado a Stamford Bridge. Para, novamente, ser pouco usado: só cinco partidas. De todo modo, valeu para que, enfim, Aké entrasse no radar da seleção masculina da Holanda. E fizesse sua primeira partida vestindo Laranja: um amistoso contra Marrocos, em 31 de maio de 2017 (vitória holandesa, 2 a 1 em Agadir).

Ali, sim: no Bournemouth, enfim, a carreira de Aké decolou, e ele virou destaque no time (Dan Istitene/Getty Images)

Porém, estava claro: o caminho de Aké não era no Chelsea, era no Bournemouth. Um ano antes que o contrato de longa duração terminasse, o clube de Londres o liberou - e Aké chegou ao Bournemouth para ficar, sendo o recorde de transferências da história do clube rubro-negro. Nos três anos passados em Dean Court, Aké se converteu num confiável defensor. A regularidade esperada veio nas duas primeiras temporadas, atuando em todas as rodadas da Premier League - em 2018/19, inclusive, mostrando um lado goleador (4 gols). O nível técnico justificava: Aké seguia sendo um dos nomes da espinha dorsal do Bournemouth, firme no miolo de zaga, avançando bem como lateral esquerdo.

Ronald Koeman percebeu isso. E se Aké não virou titular da seleção holandesa, passou a ser nome ainda mais frequente nas convocações da Laranja do que já tinha sido em 2017, sob Dick Advocaat, no fracasso pelas eliminatórias da Copa de 2018. O zagueiro até mesmo gol fez - num amistoso contra a Itália, em junho de 2018. E sempre que Virgil van Dijk, Matthijs de Ligt ou Daley Blind estivessem indisponíveis, Aké era o nome à disposição mais confiável possível.

Aké ganhou espaço no Manchester City aos poucos (Alex Lifesey/Getty Images)

E quando a pandemia possibilitou a reabertura do futebol mundo afora, Aké ganhou a chance de ir um estágio acima: foi anunciado como novo reforço do Manchester City, em julho de 2020. Com Van Dijk fora de combate pela lesão no joelho, o zagueiro se tornou titular também na seleção, nos primeiros jogos sob o comando de Frank de Boer. Até o amistoso contra a Espanha: uma lesão muscular na coxa o tirou da partida em Amsterdã, em novembro de 2020, já aos cinco minutos de jogo.

De lá para cá, os problemas musculares seguiram incomodando Aké. A ponto de tirá-lo das primeiras convocações neerlandesas em 2021. Ainda assim, ele se restabeleceu para fazer parte da reta final da primorosa temporada do Manchester City, campeão inglês. E se valeu da confiabilidade demonstrada nas últimas temporadas para merecer a presença na Euro. Nela, foi até "atropelado" pela evolução notável de Jurriën Timber - atuou vindo do banco de reservas, contra Ucrânia e Áustria, na fase de grupos. 

Ainda assim, a evolução de Aké seguiria na temporada 2021/22. Pelo Manchester City, é possível dizer que nunca ele tinha sido opção tão frequente quanto foi na boa temporada dos Citizens: mesmo mais reserva, foram 14 jogos na campanha do bicampeonato inglês (com dois gols), mais seis jogos na campanha pela Liga dos Campeões, obtendo bons números (em média, nos números do SofaScore, Aké fazia duas interceptações por jogo). Na seleção da Holanda, mesmo com a troca de técnicos, ele seguiu como opção defensiva válida. Algo provado na sua única aparição nas eliminatórias da Copa: entrar no penúltimo minuto para fortalecer a defesa, no jogo derradeiro contra a Noruega, quando o placar já era o 2 a 0 que dava à Laranja a vaga no Mundial.

Em 2022, com Van Gaal disposto a dar chances e a alta disputa por posições na zaga, Aké aproveitou as oportunidades. No primeiro jogo da seleção no ano, não só começou como titular no amistoso contra a Dinamarca, como também marcou gol na vitória por 4 a 2. No amistoso seguinte, contra a Alemanha, começou no banco, mas entrou para os 16 minutos finais. E na Liga das Nações, os quatro jogos indicaram a evolução. Se o começo, mesmo com o 4 a 1 na Bélgica, foi de um Aké mais concentrado na defesa, a reta final o mostrou seguro, ousado em campo, até levando a bola ao ataque se tivesse espaço. E dando a impressão de que, atualmente, pode se considerar titular da seleção.

De qualquer jeito, mesmo se não começar jogando contra Senegal, Aké continua sendo opção confiável na zaga da Holanda. Só que a titularidade nunca esteve tão próxima. E Aké nunca pareceu tão pronto para ocupá-la.

(Andre Weening/Orange Pictures)


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