quarta-feira, 5 de junho de 2019

Por um final feliz

Sorrisos e tranquilidade: a Holanda se preparou no melhor dos ambientes para as fases decisivas da Liga das Nações. E espera ter algo para comemorar (VI Images)

Os torcedores de PSV e Feyenoord têm todo o direito de se irritarem com o oba-oba, todos os adeptos de outros clubes holandeses se aborreceram com a "arrogância de Amsterdã" (afinal, trata-se de um clube amado e odiado no país)... mas o fato é que a campanha do Ajax na Liga dos Campeões recém-encerrada foi mais uma grande massagem no ego de todo o futebol holandês, mais uma lembrança de que a Holanda ainda pode impor respeito. Porém, ficou faltando um final feliz. O gosto de "quero mais" ficou no ar. Eis a responsabilidade que a seleção holandesa masculina terá nas fases decisivas da Liga das Nações - a começar por esta quinta, na semifinal contra a Inglaterra, na cidade portuguesa de Guimarães. Mas ainda que seja uma responsabilidade, é muito exagero falar em pressão.

Em primeiro lugar, porque a Liga das Nações é um torneio amistoso, antes de mais nada: a única vaga que dá é para a repescagem das eliminatórias da Euro 2020. É unânime entre os jornalistas holandeses: para a Laranja, ganhar a Nations League só valerá pelo dinheiro (mais) e pelo prestígio (bem menos). Em segundo lugar, porque não há grandes problemas para o técnico Ronald Koeman. O treinador já tem na cabeça seu time titular, já o escala há muito tempo, a torcida já o decorou de cor e salteado. Se havia alguma polêmica, era o interesse do Barcelona em tirar Koeman da seleção, contratando-o como treinador - interesse que Koeman deixou correr, até afastá-lo de vez nesta semana: "Já falei à federação [que fico]. Não é o momento de sair, quando falta ainda um ano para a Eurocopa. No que depender de mim, podem acabar com os boatos". 

Porém, é inegável que há alguns acertos já pedidos para Koeman. O primeiro veio a partir da convocação. Está certo que o ataque da seleção naturalmente já atrai desconfianças, há algum tempo. Porém, a paciência com Ryan Babel parece ter acabado após sua má atuação contra a Alemanha, nas Eliminatórias da Euro, em março passado. Para muitos, era hora de experimentar como titular Luuk de Jong, em ótima fase, como um dos goleadores do Campeonato Holandês desta temporada. Ou então, era hora de dar uma chance a Wout Weghorst, destaque do Wolfsburg no Campeonato Alemão, com 17 gols em 34 jogos - meio gol por partida, média nada desprezível.

De nada adiantou. No anúncio dos 25 convocados, Koeman deixou claro que Babel seguirá titular no ataque, enquanto Luuk de Jong fica como opção na reserva e Weghorst sequer é convocado (para surpresa do próprio Wolfsburg): "É necessário avaliar que nós trabalhamos com um grupo fixo na Liga das Nações, um grupo que merece estar na semifinal. Sempre haverá pontos de discussão, e tem mais é de ser assim". Ainda assim, o treinador da Oranje reconheceu, sobre Weghorst: "Eu o informei, como informo qualquer jogador cortado. A reação dele foi madura, mas é claro que ficou triste".

A outra dúvida de Koeman, pelo menos, fica entre dois jogadores já convocados. Ambos, no meio-campo. O volante Marten de Roon recebe cada vez mais elogios, como nome-chave da excelente campanha da Atalanta no Campeonato Italiano, que levou o time de Bergamo à Liga dos Campeões na próxima temporada. Entretante, por melhor e mais útil que seja na saída de bola (e é), De Roon ficou pouco falado, diante das esplendorosas aparições de Donny van de Beek pela Liga dos Campeões, no Ajax - principalmente contra Juventus, e no jogo de ida contra o Tottenham. Fica a dúvida: manter De Roon ajudando Frenkie de Jong na saída de bola, ou tornar o meio-campo mais ofensivo, com Van de Beek? É bem provável que o técnico escolha a primeira opção.

Nem Ronald Koeman nem Virgil van Dijk tiveram muitos problemas diante da imprensa (VI Images)

Sendo assim, com essas duas questões resolvidas por enquanto, a preparação da Holanda para a Liga das Nações foi a mais tranquila possível - tanto no começo, ainda no centro de treinamentos da federação em Zeist, quanto na reta final, quando houve a viagem para o balneário português de Lagos. Foram vários sorrisos, nenhum problema, jogadores falando mais sobre coisas das próprias carreiras - como o óbvio interesse de outros clubes nas contratações de Matthijs de Ligt -, a recepção alegre aos campeões europeus Virgil van Dijk e Georginio Wijnaldum, e várias declarações óbvias.

Koeman, por exemplo, falou sobre a alegre surpresa com a evolução holandesa dentro da Liga das Nações ("No começo, eu não esperava que a coisa estaria como está agora"), e comentou sobre a elogiadíssima dupla de zaga da Laranja: "Van Dijk é um dos melhores defensores do mundo, claro. Se há um momento para indicar um zagueiro que pode ser escolhido [o melhor do mundo], Virgil traz o pacote completo. (...) De Ligt tem 19 anos, mas parece ter 25. É muito inteligente, faz um trabalho extraordinário e pode crescer ainda mais. Ficará ainda melhor com o passar dos anos. Espero que ele escolha um grande clube".

Por sua vez, o capitão Van Dijk desconversou sobre os elogios ("Sigo trabalhando discretamente, mas não me acho numa categoria de craques. Eu me sinto bem, e até agora a temporada foi bem, mas é só o começo para mim") e enfatizou que superará o cansaço do fim de temporada ("Todos estamos muito cansados, mas isso não é desculpa. Todos temos de jogar bem, e estamos prontos, também"). O mesmo falou Wijnaldum: "Não bebi nada depois do título na Liga dos Campeões. Álcool, só nas férias". E ainda vieram elogios previsíveis à seleção da Inglaterra, com Virgil: "Alguns colegas meus [de Liverpool] jogam na seleção. Falei com alguns deles, mas todos estão focados. Eles darão tudo, e queremos fazer o mesmo". Mais do que isso, elogios a Harry Kane: "É o melhor atacante da Premier League e um dos melhores do mundo. Não sei se ele joga amanhã. Veremos".

A Holanda também verá o que lhe espera na Liga das Nações. E a melhor definição do momento foi dada por Ronald Koeman: "O importante para mim nem é que sejamos o primeiro campeão da Liga das Nações, mas que sejamos campeões. É um torneio da UEFA. A vitória pode não dar vaga na Euro, pode não ser a Euro, mas significará que estamos no bom caminho". De fato. O título no torneio amistoso nem de longe significará que a Holanda virou a melhor seleção do mundo. Mas será uma prova da evolução inegável. E será o final feliz desejado.

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