sábado, 29 de junho de 2019

Já ganhou (o respeito)

O gol de Van der Gragt fechou o placar - e abriu o caminho das semifinais para uma Holanda que merece respeito (FIFA/Getty Images)

A seleção feminina da Holanda avançava na Copa do Mundo. Mas, mesmo seguindo no torneio, com quatro vitórias em quatro jogos, era notável que as Leoas Laranjas tinham problemas preocupantes. É certo que não há seleções que não sigam com erros, mesmo durante uma Copa do Mundo. No entanto, há um momento em grandes torneios em que a equipe necessita impor respeito, mostrar por que chegou tão longe. Na melhor hora possível, a Oranje mostrou isso: teve sua melhor atuação na Copa, superou a Itália, e chegou aos seus objetivos iniciais - a semifinal do torneio, e à vaga no torneio olímpico de futebol feminino, nos Jogos de Tóquio, em 2020.

A rigor, desde que a bola rolou em Valenciennes, a Holanda já fazia por merecer elogios. Por opção tática da Itália (deixando deliberadamente a posse de bola nos pés laranjas) e por mérito próprio, as holandesas tiveram mais força ofensiva. Os méritos próprios residiram, principalmente, no meio-campo. Nem tanto por Daniëlle van de Donk: a camisa 10 seguiu aparecendo bastante no ataque, mas quase sempre fez opções erradas de jogada no primeiro tempo - com exemplo claro nos acréscimos do 1º tempo, quando um erro de passe de Elena Linari abriu espaço para um contra-ataque de quatro holandesas contra três italianas, e Van de Donk escolheu a jogada individual. Entretanto, Jackie Groenen e Sherida Spitse compensavam plenamente no meio. Groenen era precisa nos desarmes, e mostrava velocidade na direita, enquanto Spitse ditava o ritmo do jogo: ora recuava para ajudar a defesa, ora avançava para auxiliar o ataque.

Porém, algo ainda preocupava, na Holanda. O ataque tinha a bola nos pés, mas raramente causava problemas à goleira da Itália, Laura Giuliani - que, a rigor, só apareceu aos 29', num arremate fraco de Vivianne Miedema, e aos 43', numa cobrança de falta de Spitse, que mandou a bola diretamente às suas mãos. Shanice van de Sanden tentava as jogadas individuais, mas não tinha espaço - ou era precipitada nos avanços. Miedema mostrava lentidão. O único ponto notável do trio ofensivo da Laranja era Lieke Martens: superando dores num dedo do pé que quase a tiraram do jogo, a camisa 11 buscava a bola, tentava jogadas pela esquerda, ia para o meio-campo ajudar Van de Donk. Ainda assim, cabia prestar muita atenção ao ataque italiano. Mesmo enfraquecidas pela ausência de Cristiana Girelli, as Azzurre começaram a bloquear o espaço da Holanda. E em poucos passes, tiveram chances mais perigosas - como aos 18', quando Valentina Bergamaschi cabeceou fracamente para a defesa de Sari van Veenendaal, e aos 36', num chute cruzado de Valentina Giacinti, que passou rente à trave.

O calor fortíssimo em Valenciennes (33º, forçando duas paradas técnicas para refresco) deixava o jogo mais lento. Mas era também muito equilibrado. Quem acertasse mais no segundo tempo, provavelmente levaria a vaga nas semifinais. E a Holanda começou a se aproximar disso, com muita velocidade. Só que as chances perdidas se avolumavam: era Miedema cabeceando fraco após cruzamento de Van de Sanden aos 49',  era um chute de Groenen que batia em duas italianas - e nela própria - e saía aos 51', era um cruzamento de Desiree van Lunteren (bem no jogo) que Miedema furava aos 52', era a bola na travessão de Daniëlle van de Donk aos 58'. Tantas chances perdidas poderiam custar caríssimo.

A Holanda perdia chances demais contra a Itália, mesmo superior no segundo tempo. Até que Miedema aproveitou e acalmou o time (Rico Brouwer/Soccrates/Getty Images)


Só restava a Sarina Wiegman fazer as mudanças que podia: por exemplo, colocar Lineth Beerensteyn no lugar da cansada Van de Sanden, aos 56'. E só restava à Holanda ter a paciência que a treinadora pedira na entrevista pré-jogo, e manter a posse de bola. Vinham as chances - como outro chute de Spitse, mandando a bola rente à trave, aos 66'. Mas faltava aproveitá-las. Não faltou mais a partir dos 70', com o gol do alívio: Miedema, desviando de cabeça para marcar seu terceiro gol na Copa.

Ainda cabia ter todo o cuidado com as italianas, até pela entrada de Anna Maria Serturini, veloz meio-campista. Mas a Holanda nem precisava desse conselho: mostrava serenidade, mantinha a posse de bola no campo de ataque (méritos a Van de Donk, boa na retenção), tinha superioridade clara. E o gol de Van der Gragt, aos 80', em outra bola aérea - sexto gol de bola alta da Holanda na Copa - foi o início da festa e da comemoração.

Sim, comemoração. Porque a Holanda já alcançou coisas neste Mundial, termine em quarto lugar ou seja campeã. Já ganhou o respeito de quem acompanha o futebol feminino no mundo. Já provou que o título da Euro 2017 não foi sorte de principiante. Só não ganhou ainda a semifinal, seja contra Alemanha ou contra Suécia. E talvez, saber que não ganhou nada seja a chave para as Leoas Laranjas fazerem ainda mais história do que já fizeram.

Copa do Mundo feminina - quartas de final
Holanda 2x0 Itália
Data: 29 de junho de 2019
Local: Stade du Hainaut (Valenciennes)
Árbitro: Claudia Umpierrez (Uruguai)
Gols: Vivianne Miedema, aos 70', e Stefanie van der Gragt, aos 80'

Holanda
Sari van Veenendaal; Desiree van Lunteren, Dominique Bloodworth, Stefanie van der Gragt (Anouk Dekker) e Merel van Dongen; Jackie Groenen, Daniëlle van de Donk e Sherida Spitse; Shanice van de Sanden (Lineth Beerensteyn), Vivianne Miedema (Jill Roord) e Lieke Martens. Técnica: Sarina Wiegman

Itália
Laura Giuliani; Alia Guagni, Sara Gama, Elena Linari e Elisa Bartoli (Lisa Boattin); Valentina Bergamaschi (Anna Maria Serturini), Aurora Galli, Manuela Giugliano e Valentina Cernoia; Valentina Giacinti e Barbara Bonansea (Daniela Sabatino). Técnica: Milena Bertolini


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